História Girl Meets Evil - Confiar.

__________ P.O.V.

Entreolhamo-nos em uma tensão crescente.

Meus braços pesam e me impedem de erguer as mãos para tocá-lo. O odor inebriante me cativa, seu fôlego se choca contra meus lábios. O calor que flui dele me extasia e aquece. Gotículas de suor se formam em minhas costas e têmporas. O aperto em meus pulsos se afrouxa e não passa de um toque sutil, mas os olhos nunca me abandonam, me hipnotizam com seu vigor dominante. Suas pupilas dilatadas dançam por meu rosto e me desvelam, me desarmam. Meus lábios sedentos engolem o ar da noite junto com seu suspiro.

Os grilos cricrilam ao longe. Perto de nós, o único som entrecortado é o de nossas respirações. Seu rosto se torna um vislumbre e suas pálpebras pesam, meu queixo se ergue e os lábios quase encostam nos meus, em um toque espectral. Um estalido alto nos assusta, e nos mergulha na escuridão. Todos os refletores que iluminam os jardins e as guaritas se apagam. Todas as lâmpadas ornamentais nas árvores e arbustos tremeluzem, piscam com interferências e se apagam.

Jungkook se afasta, se apruma e ergue o pescoço, com os olhos vorazes, vigiando o escuro. Seu peito se enche de ar e ele me solta.

— Q-que foi...? — Indago, tomada pela vergonha.

— Os portões funcionam com energia elétrica. Vou até a guarita.

— Os seguranças vão cuidar disso.

— É. Me espera aqui.

Como se conseguisse enxergar além das sombras, Jungkook se esgueira pelos arbustos e volta ao seu carro. Os faróis se acendem e iluminam o caminho. O ronco do motor é quase silencioso, abaixo das pedrinhas que estalam sob os pneus.

Estive prestes a cometer uma loucura, envolvida por aquele... Aquele... Balanço a cabeça com veemência e saio dos arbustos em disparada, fugindo desse lugar, dessa situação, daquele cheiro, dele... e de mim.

Apresso-me pelas escadas e tateio os corredores escuros. Em algum momento da minha fuga, as lâmpadas zumbem, piscam e se acendem. Ouço passos nos corredores, uma conversa murmurada entre meu Appa e Srta. Jeon, e me precipito sobre a porta do meu quarto, empurrando-a. Encosto-a, ofegante. Corro os olhos pelo cômodo e vejo uma das caixas de papelão que ainda guardam minhas coisas.

Rasgo um pedaço e o dobro, prendendo na porta, para fechá-la. Dou passos para trás, meus ombros sobem e descem rápido, por causa da respiração descompassada. Passo o braço pela testa, zonzeando pelo quarto. Lembro-me do único em quem confio para falar sem reservas... Meu diário. Sempre me alivio ao escrever. Alcanço a mesinha de cabeceira e abro a primeira gaveta, tirando o caderno e uma caneta de lá. Sento-me na cama e abro na primeira página vazia.

Cuspo todas as palavras que se formam em minha mente, expulsando meus demônios para dormir em paz.

***

O vapor frio bruxuleia como fumaça pelo ar, sopra minha pele e a queima. Descortino ramos de galhos e espinhos congelados, ferindo os dedos. A dor que poderia me desencorajar só me faz desvendar mais rápido o que há por trás dessa cobertura. O cômodo que se revela à minha frente é familiar, em minha casa. Lençóis diáfanos cobrem os móveis, mas posso ver suas formas através das luzes azuladas que irrompem nas janelas e banham o quarto. A sensação que cresce em meu interior é de medo.

Esse é o quarto de Jisoo.

Corro pelo lugar e puxo um dos lençóis, que flutua e solta uma camada de poeira, espiralando no ar. O móvel é uma penteadeira vazia, com um espelho rachado. Meu reflexo se divide em dois. Em um deles posso ver minha magreza, os cabelos escorridos e a pele lívida, sob a luz azulada. Na outra rachadura os reflexos são quase dourados, meus cabelos são longos, volumosos, caindo em ondas perfeitas até a cintura. Meus olhos são grandes, de olhar intenso, com lábios sorridentes e um sinal no queixo.

Jisoo.

Na parte azulada do reflexo, eu, estou parada. O reflexo de Jisoo, no entanto, se abaixa e abre uma gaveta na penteadeira. Meus olhos se embaçam e fito a gaveta. Ela se abre sozinha, e um fundo falso estala. Tremo de medo, e volto a erguer os olhos para o reflexo no espelho. A metade em que Jisoo reflete está ainda mais clara, com as luzes alaranjadas do sol poente, e destoa da minha figura no escuro. Ela ergue um caderno aberto e me mostra uma frase na caligrafia tremida.

Não confie...

— ... Em... quem? — Sussurro.

A imagem de Jisoo perde o sorriso, e sua expressão se torna aterrorizada. Ela grita, mas é minha garganta que arde. Toco meu pescoço, sinto a vibração do ar, das cordas vocais. Mas, é ela que grita, até o espelho se quebrar, lançando os estilhaços contra mim. Tento me proteger, meu corpo não me obedece.

Meus olhos se abrem e eu me sento de vez na cama. Tremo da cabeça aos pés. Tenho absoluta certeza de que fechei a porta com um pedaço de papelão na noite anterior, porém percebo que ela está entreaberta. Evito olhar para os cantos do quarto e hesito antes de colocar os pés no chão. Sabe como é... É debaixo da cama que se escondem os monstros. Ouço outra porta se abrir e bater.

—Já vou! — É a voz de Jungkook que ecoa no corredor. Fito o despertador ao lado da cama. Não acredito que vou me atrasar no primeiro dia de aula.

Pulo para ir até o banheiro e tomar o banho mais rápido da minha vida.

***

Visto o uniforme, uma saia preta e uma camisa branca, com uma gravata em forma de laço. Calço as meias 3/4 pretas e os sapatos envernizados de boneca. Corro até o espelho e faço uma maquiagem muito leve, penteio os cabelos e os prendo com uma fita vermelha. Confiro minha figura no espelho, e lembro do pesadelo que tive mais cedo. Abano a cabeça e pego minha mochila sobre a cama.

Quando chego à cozinha, duas empregadas se ocupam do fogão e da pia. Srta. Jeon bebe uma caneca de chá, encostada no balcão, e Jungkook está sentado à mesa, comendo uma pilha de panquecas. A mãe de Jungkook ergue o olhar para mim e sorri, engolindo. Ela se aproxima de mim e passa uma mão pela manga da minha camisa, desamassando. 

— Aish, você está tão bonita. — Ela murmura e ri. — O que quer comer?

— Não estou com fome. — Forço um sorriso, porque estou apreensiva. Não consigo comer, de tão nervosa.

— Não vai passar a manhã em jejum, quer passar mal? Cho-ah, pegue as frutas da __________.

— Jungkook, assim que sair da escola, vá para o estágio. — Appa entra na cozinha e vem até mim, beijando o topo da minha cabeça. — Depois quero ver como vai ficar seu horário, pra que o estágio não atrapalhe a escola. Você tem que tirar notas boas se quiser continuar trabalhando comigo.

— Sim, Sr. Kwon. — Jungkook responde de boca cheia.

— E você. — Appa acaricia meus cabelos. — Já passei minhas ordens ao Jungkook, sobre você.

— Sobre mim? Que ordens?

— Você vai e volta pra escola com Jungkook ou Sehun. Mais ninguém. Está me ouvindo? — Pestanejo. — Cuidado com as companhias, por lá. Ouviu?

— Sim, Appa.

— __________ é muito responsável, Ji Yong. — Srta. Jeon intervem. — E Jungkook estará por perto pra cuidar dela.

— Obedeça seu irmão. — Appa aponta com o queixo para Jungkook.

Meu "irmão" levanta-se da mesa e suspira. Deve estar cansado de comer tanto, porque há mais louça perto dele do que de qualquer outra pessoa na cozinha. Ele pega a mochila de couro que jaz no balcão e cumprimenta a mãe, depois meu Appa. Então se vira para mim, com um sorriso de bom moço, que não condiz em nada com quem ele é.

Delinquente abusado. 

— Já terminou de tomar café, __________?

— Não. — Pego o recipiente com alguns morangos, framboesas, amoras e mirtilos. — Vamos. Eu como no caminho.

— Então tá. — Nos despedimos e saímos um ao lado do outro pelo corredor. — Viu, Monstrinha? Me obedeça. — Ele fala de forma divertida. Ele não parece se lembrar da situação em que estivemos na noite passada, e se ele decidiu esquecer, também esquecerei.

— É, e você tem que cuidar de mim. — Tiro a mochila do meu ombro e a bato contra seu peito. Jungkook ofega e para de andar um instante, segurando as alças, porque eu a solto. Jogo uma framboesa na boca e mastigo. Sorrio para ele, que responde revirando os olhos.

— Folgada. — Ele joga minha mochila sobre seu ombro.

— Chato.

— Ah, vou falar antes que esqueça. — Ele ergue o dedo indicador e o bate contra os lábios, quando descemos as escadas, na direção da garagem. Temo que ele queira retomar o assunto da noite anterior. — Teve pesadelo de novo? Eu te ouvi gritar.

— Ah, isso... — Ouço meu próprio resfolegar aliviado e mordo um morango, mastigando. — Tive.

— Você nunca dorme bem?

— Desde que cheguei a Juggi, não. — Meneio a cabeça, passando a língua pelos lábios.

— Hm...

— Por que? Por acaso está preocupado? — Olho para ele de lado. Jungkook pula alguns degraus e tira a chave do carro do bolso.

— Não, só estou cansado de acordar com seus gritos. É irritante. — A forma como ele fala dói um pouco, porque sinto que o atrapalho com algo que eu nem posso controlar. Mordo os lábios e fecho o recipiente com as frutas.

— Não tenho culpa se você não dorme cedo porque tem que sair por aí pegando todas as meninas da cidade. — Retruco, e ele destrava o carro. — Ainda saiu ontem com Yoongi? — Pergunto, e ele entra no carro, jogando as duas mochilas sobre o meu banco.

— Sim. — Responde somente. Eu entro no carro, colocando as duas mochilas no colo.

— Hm... Elas... eram bonitas? — Fito a casa que começa a ficar para trás, porque ele dirige pela estrada até o portão. — Assim... vocês estão namorando? — Sondo, porque quero saber se Yoongi está solteiro. Jungkook inclina a cabeça para o lado, em um gesto que ele faz habitualmente, e desliza as mãos pelo volante.

— Por que está tão interessada no meu encontro, Monstrinha?

— Não no seu encontro, idiota, no do Yoongi.

— Ah, não sei. Yoongi não é de falar dessas coisas. — Seu sorriso se desfaz. Ele desconversa e liga uma música que me impede de ouvir qualquer outra coisa.

***

O gramado na frente do lugar está cheio de alunos que se reencontram depois das férias. O estacionamento também está quase lotado com motocicletas, bicicletas e carros de alunos e professores. Alguns alunos se desviam do carro de Jungkook, e olham para nós com curiosidade. Sinto borboletas no estômago, porque detesto ser novata. Ele estaciona em uma vaga e pega a mochila do meu colo. Desce do carro e me espera sair para travar as portas. Apresso-me para alcançá-lo, e Jungkook se vira de lado, com uma careta.

— Aigoo, Monstrinha. O que está fazendo?

— Entrando na escola? — Respondo aturdida.

— Está me seguindo.

— Aish. E não é o que eu devia fazer?

— Não. — Ele dá um tapinha na minha testa. — Ah, olha lá. — Jungkook acena para uma moça que está na escadaria de acesso ao prédio principal. Ela parece tão surpresa com a ação do meu "irmão", que aponta para si mesma, para confirmar que o aceno foi para ela. — Aish. Vem. — Ele me puxa pela mão e me leva até a moça. — Oi, er...

— Lisa. — A moça pigarreia, sorrindo incerta. — Sou eu, Lalisa. Nós estudamos na mesma sala desde... Sempre.

— É, isso. Você é do grêmio, né?

— Sim. — Empertiga-se um pouco, com um sorriso mais confiante. É quase como se ela se sentisse mais importante por pertencer ao grêmio, ou por Jungkook lembrar deste fato. — Precisa de ajuda? — Lisa parece não se dar conta da minha presença ao lado de Jungkook, que ainda segura minha mão.

— Não eu, minha irmã. Pode apresentar a escola pra ela? — Ele me puxa para frente, e eu dou uns passos. A moça se vira para mim, pestanejando. — Ela é...

— Kwon __________. Annyeonghaseyo. — A moça se curva para mim, e eu sorrio, cumprimentando-a da mesma forma.

— Me desculpe por não saber seu nome. — Falo, e ela ri.

— Ani, ani. Não precisa se preocupar. Aaah... Você é que é famosa, não eu.

— Certo, estão apresentadas. Vou indo. — Jungkook me solta e passa a mão por minha cabeça. Sinto a fita se desenroscar dos meus cabelos e olho para trás. Ela pende entre os dedos dele, que pisca para mim e ri. Arqueio a sobrancelha, mas dessa vez não me importo. Sei que roubar coisas minhas já se tornou nossa piada interna. Volto-me para Lisa, que perfura as costas de Jungkook com um olhar devotado.

— Então, Lisa... — Tento chamar sua atenção e arrumo meu cabelo, que Jungkook bagunçou.

— Hm? Aish, ele fica mais bonito a cada dia. — Ela estala os lábios.

— Quem?

— Seu irmão. Que homem. — Lisa ri e me puxa pela mão. — Venha. — Ela penteia a franja com os dedos e se estica. — A escola precisa me ver com você. — Lisa ri e me olha. — Se já não tiver muitas amigas populares, podemos lanchar juntas, hoje.

— Amigas populares? — Acho graça da visão que ela tem de mim.

— É, vou aproveitar sua companhia enquanto posso. Quando a turminha da Tzuyu te encontrar, vai querer que fique com elas. — Lisa rola os olhos nas órbitas e nós caminhamos pelos corredores da escola.

Ela me mostra as salas de aula, os laboratórios, o pátio e o refeitório. As salas de atividades extra-curriculares, em um prédio auxiliar, têm cozinhas para as aulas de culinária, mesas redondas para as aulas de economia doméstica e a biblioteca. A área por trás do prédio principal é dedicada à educação física, com a quadra e o campo de futebol, os estúdios de balé e dança e o auditório do teatro da escola. Não entramos nessa área, porque o sinal toca.

— Qual é sua série?

— 2º ano "A".

— Hm... É a turma da Tzuyu e do Yugyeom... — Lisa faz uma careta e me puxa pela mão.

— Tem alguma coisa errada com isso?

— Bom, é que o Yugy... tem meio que uma rusga com seu irmão. Aish, espero que ele não encarne em você. — Ela faz uma careta me deixa na porta da sala. — Enfim, tenho que ir pra minha sala antes que me atrase. Boa aula.

— Pra você também. — Sorrio, mais animada, porque estava com medo de ficar o dia todo sozinha.

— Então, fighting! — Ela murmura, e ergue o punho fechado, sorrindo mais abertamente.

— Fighting! — Murmuro em resposta e entro na sala de aula.

Todo mundo já está aqui, e todas as cabeças se viram para mim quando entro. Meu sorriso começa a derreter, como gelo sob o sol, e o professor se levanta da mesa. Ele anda até mim e pede para ver minha ficha, que eu ainda não tenho. Então pergunta meu nome baixinho, e me acompanha até que eu fique à frente. Todos os olhares estão sobre mim, e meu estômago ferve. Sinto meu rosto esquentar.

— Bem, acho que devemos dar as boas-vindas à nova aluna. Se apresente, senhorita. — O professor fala, e empurra minhas costas para que eu fale. Tusso levemente e fito a classe, sem me dirigir a ninguém em específico.

— Sou Kwon __________. Sou de Juggi, mas morava em Seul. — Curvo-me para a turma. — Annyeonghaseyo.

— Pode se sentar ali, na cadeira vazia ao lado do Sr. Kim.

O professor aponta. Fito a única cadeira vazia da classe e me dirijo a ela sob o burburinho feminino que se forma ao meu redor. Ouço coisas como: "Na internet ela parece mais alta", ou "É ela? A irmã dela morreu no aniversário, né? Que tragédia...", "Para, ela não é tão bonita assim". "Nossa, ela é tão magra", ou "Ela deve gastar rios de dinheiro pra manter esse cabelo", ou "riquinha esnobe, olha só a mochila dela. Deve custar todos os wons que eu vou ter na vida" ou o que mais me dói "Soube que ela tem depressão, coisa de quem não tem o que fazer".

Baixo a cabeça, segurando a alça da mochila com mais força. Sento-me na cadeira e quero afundar, cavar um buraco e sumir.

A aula começa e as conversas paralelas acabam.

Os professores entram e saem depois, e eu tenho a impressão de que alguém me observa. Passo a aula inteira ouvindo murmúrios com meu nome, vindos das meninas, que me lançam olhares furtivos e curiosos. Uma delas vem até mim e me pede para tirar uma foto com ela. Não faço a mínima ideia do porquê. Mas, ainda estou incomodada com algo mais invisível. Até fitar o tal Sr. Kim, ao meu lado, que tem o cotovelo apoiado sobre a mesa e o queixo apoiado na mão. Seus lábios grossos se expandem em um sorriso, e os cabelos quase cobrem os olhos.

— Oi. — Ele fala.

— Oi. — Respondo, desviando o olhar.

— Sou Yugyeom, mas pode me chamar de Yugy. — Ele continua, e eu assinto. Esse é o tal desafeto de Jungkook que nos perseguiu ontem? Não sei o que fazer. Estou petrificada na cadeira. — Você é tímida demais pra uma pessoa famosa.

— Eu não sou famosa. — Quero convencer o mundo disso, antes que ele me convença do contrário.

— Como não? Todas as meninas da escola usam as coisas que você usa porque você usa. Chega a ser entediante. Eu nem sabia quem você era, mas conhecia seu nome, porque Kwon __________ é o nome mais falado entre as adolescentes. — Ele ri, se divertindo. Não há maldade em seu jeito de falar. Nem parece a ameaça que nos aterrorizou ontem no carro. — Ah, vai dizer que não sabia? Você tem milhares de seguidores nas redes sociais.

— Bem...

— É, você sabe. — Ouço seu resfolegar e ele se aproxima um pouco de mim. — Olha, relaxa. A turma parece estar muito distante de você, porque você parece muito distante da realidade delas. — O olho de soslaio. — Hm... Aish, Jungkook já deve ter me descrito como o maníaco da faca pra você, né? — Pestanejo. — Posso te dar uma referência da minha índole. Sou amigo daquele seu primo... O Jackson.

— Você conhece o Jackson?

— É.

— Vocês dois, eu sei que a conversa pode estar muito interessante, mas temos toda uma aula de álgebra para ver. — A professora chama nossa atenção e toda a turma nos observa.

Vou demorar a me acostumar com isso.

***

O sinal toca para o fim das aulas e eu respiro aliviada, o primeiro dia acabou e não me envolvi em nenhuma confusão, pelo menos. Coloco minha caneta no estojo, jogando-o na mochila. Guardo meu caderno por trás do diário e ergo o olhar. Uma menina muito bonita, com um sorriso amigável, acena para mim. Atrás dela há duas outras garotas. Percebo que todas usam uma mochila parecida com a minha.

— Oi, __________, tudo bem? Eu acho que já me conhece, mas mesmo assim vou me apresentar. Ahm... Sou Tzuyu.

— Ah, oi, Tzuyu. — Respondo e fecho a mochila, me levantando. Temos praticamente a mesma altura.

— Me conhecia mesmo? — Ela ergue as sobrancelhas, e olha para as meninas atrás delas, que sorriem em aprovação. — Estou ficando famosa. — Tzuyu ri. — Eu queria te dar as boas-vindas e dizer que, se você quiser um grupo de amigas mais... selecionadas, pode contar comigo. Posso te mostrar a escola, você pode lanchar conosco. Sinta-se à vontade, tá?

— Tá. — Sorrio mais, e assinto. Lembro-me da impressão que Lisa passou dela, e mantenho os dois pés atrás. — Bom, eu tenho que ir. Sehun está me esperando.

— Sehun é seu namorado? — A língua de Tzuyu para entre os dentes.

— Não, é meu motorista.

— Hm... Deve ser estranho ter um motorista. — As três garotas riem e eu sorrio mais de lado.

— É, mas o Sehun é legal. — Aceno para elas. — Até amanhã, meninas.

Sinto os olhares delas às minhas costas, e não consigo deixar de pensar que há certa afetação e falsidade no comportamento dessas garotas. Percorro os corredores até a saída da escola, e agora os olhares são mais intensos sobre mim, sinto que cada pessoa desse lugar está falando sobre mim. Desço os degraus da entrada e vejo Jungkook conversando com Taehyung e Jimin no estacionamento. No carro ao lado deles está Sehun, e eu suspiro aliviada.

Gente que eu conheço. SOCORRO. Quase corro até eles, e Jimin é o primeiro a me ver. Ele sorri até seus olhos se transformarem em risquinhos e estende a mão para mim. Eu seguro a dele, e Jimin acaricia meus dedos.

— Oi, __________. Como foi o primeiro dia?

— Ei, Jimin... — Rio baixinho. — Bem, tirando todas as fofocas, acho que me saí bem. — Encolho os ombros. E fito Taehyung. Ele mantém a cabeça inclinada para o lado, me observando com seus olhos bonitos e o sorriso quadrado. — Oi, Taehyung.

— Me chama de Tae, __________. — Ele sorri e pisca para mim.

— Monstrinha, o Sehun tá esperando. — Jungkook se intromete na conversa, desvencilhando a mão de Jimin da minha e me empurra na direção do carro. Eu rio e aceno para Taehyung e Jimin, que respondem com o mesmo cumprimento. Sinto uma pontada na cintura, e é Jungkook que me cutuca. Faço uma careta e rio.

— Para, Jungkook.

— Vai logo. Até mais tarde. — Ele murmura.

Aceno para ele, que se vira e volta aos amigos. Vejo que minha fita está amarrada ao zíper de um dos bolsos da mochila dele, e franzo o cenho, com um meio sorriso enternecido. Não consigo medir a distância entre mim e o carro e acabo batendo a lateral do corpo contra a porta.

— Srta. Kwon? — Sehun arregala os olhos, e eu o olho desconcertada.

— Oi, Sehun, como vai? Tudo bem? — Rio, passando a mão pelo cabelo. — Vamos? Estou morrendo de fome! E você? — Sehun franze o cenho.

— Estou com fome, também...

— Então, vamos embora! — Rio e entro no carro, totalmente embaraçada.

***

Ergo os olhos para o poente e vejo dois carros deslizarem do portão pela estrada. Um deles é o Porsche de Jungkook, o outro é do meu Appa. Sento-me na varanda do quarto com a caixa de couro em meu colo. Ainda não consegui abri-la. Penso em levá-la a um chaveiro para destrancá-la sem danificar. Maquino um plano em minha cabeça. Amanhã, depois da aula, irei com Sehun até o centro da cidade para comprar um celular novo para mim, e aproveito para resolver esse mistério da caixa. É, preciso fazer isso sem demora.

Com o celular posso ligar para Jackson e perguntar sobre esse tal de Yugyeom.

E com a caixa aberta eu paro de me coçar de curiosidade.

Perpasso os dedos pelas ranhuras do couro e pelo nome costurado, lendo-o pela enésima vez. Wang Juran, o que será que você esconde dentro desse baú? Dedilho as bordas de cobre arranhado e o fecho resistente. Procuro, mais uma vez, algum indício de chave que possa me ajudar. Não sei quanto tempo passo meditando sobre isso, absorta, mas alguém me acorda, batendo na porta do quarto.

Olho para trás e vejo Jungkook. Seu semblante parece cansado, e ele ainda está com o uniforme do colégio. A gravata está mal amarrada no colarinho, e ele não veste o paletó. A camisa está solta, por fora da calça, e não usa mais os sapatos. Seus pés estão cobertos pelas meias. Traz consigo uma sacola preta e assovia para mim. Saio da varanda com minha caixa na mão, e a coloco na cama.

— Que foi? — Pergunto, colocando uma mecha de cabelo atrás da orelha.

— Toma. — Ele estende a sacola para mim, e eu me aproximo, pegando-a.

— O que é isso?

— Abre.

— Aish, que mistério. — Meneio a cabeça e abro a sacola. Há uma caixa branca dentro dela, e eu ergo o olhar com um sorriso incrédulo. — Não... — Ele enfia a mão no bolso e se encosta no armário. — É sério? — Pergunto, e tiro a caixa da sacola. É um celular igual ao que eu tinha antes. Rio, e olho para dentro da sacola. — Tem uma case também? — Corro até a cama e me sento, abrindo tudo e olhando o celular novo. Rio, colocando a capa protetora, e fito Jungkook. — Espera, não foi... você que comprou, né? Porque é caro...

— Só estou entregando. — Ele dá de ombros e eu assinto, sorrindo para ele. Ligo o celular para configurá-lo.

— Ah, que lindo. Depois vou agradecer ao Appa. — Saltito na cama. Enquanto o celular liga, uma lâmpada se acende em minha cabeça. — Jungkook. — Ele fica muito sério. Analiso seu rosto, decidindo se devo confiar nele ou não.

— Ê? — Não há nenhum indício de que ele me faria mal. Até agora ele só tem me protegido... Suspiro. Confiarei nele.

— Acho que você pode me ajudar. — Levanto-me da cama e largo o celular sobre ela, pegando a caixa para mostrar a ele.

— Que diabo é isso? — Ele se aproxima e pega a caixa, olhando-a de cima a baixo. Lê o nome, como eu fiz, e analisa o fecho. — Ah... É aquele troço que você pegou quando caiu no buraco, né? — Confirmo com a cabeça. — E no que eu posso ajudar?

— Preciso abrir pra descobrir o que tem dentro. — Faço um bico curioso e arregalo os olhos. Jungkook sorri maquiavélico. — Que foi?

— Olha, eu não consigo abrir, mas conheço a pessoa certa pra esse serviço.

— Quem?

— Jung Hoseok.

***