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História Gone With The Wind - Inverno


Escrita por: anastasianyko

Capítulo 1 - Inverno


Capítulo 1

 

Julieta já havia se revirado na cama pela milésima vez segundo suas contas. Sempre fora uma pessoa que ao encostar a cabeça no travesseiro já conseguia encontrar a paz do sono. Só que hoje estava sendo diferente e não entendia a razão. Aliás, entendia mas não admitia. A razão tinha nome e sobrenome: Aurélio Cavalcante.

Esse homem que vinha perturbando seus pensamentos durante o dia, aparentemente agora também tomava conta de suas noites. Julieta admitia que já não o desprezava como antes e não o odiava apesar de sua petulância e atrevimento em tê-la beijado duas vezes. Sendo sincera com ela mesma, podia até dizer que havia começado a sentir uma certa afeição pelo homem em questão. Gratidão e amizade. Apenas isso. 

Afinal de contas, ele a estava ajudando, vinha se mostrando um verdadeiro cavalheiro para com ela. Era apenas normal que se sentisse tocada e lisonjeada. Só que não era só isso. 

O problema era que Julieta quando pensava em Aurélio não focava apenas em suas atitudes fraternais, mas atitudes mais profundas e desconcertantes.

Seus olhares, seus risos de aprovação e admiração e principalmente de seus toques. 

 

.

 

Considerando as condições do primeiro beijo e sua reação descontrolada (seria nesse dia que havia começado a abandonar a posse absoluta de suas emoções?), não houve muita margem para ela considerar ou analisar seu toque. Lembrava sim, do toque de sua boca macia, seu hálito quente, seu abraço firme que mesmo com o mundo girando em sua volta, a fazia se sentir protegida e amparada. Mas sua indignação naquela noite foi tanta, que já não conseguia lembrar com tanta clareza de tudo que gostaria. Apenas de sentir. O quê exatamente não sabia. Apenas que seu coração e seu corpo pareciam haver despertado após estarem adormecidos por muito tempo. Ou seria pela vida toda?

 

Já no segundo beijo, esse era outra história. Quando Aurélio a abordou na casa do Almirante, solicitando um encontro com a Rainha do Café, Julieta se fez de desentendida, em uma atitude desesperada de afastá-lo. Sabia que o assunto deles há muito (desde a festa de Camilo especificamente) havia deixado de ser sobre as negociações da fazenda, mas precisava manter essa ilusão a fim de manter sua sanidade que já começava a se esvair desde o primeiro beijo. 

Quando Aurélio a abordou na casa do Almirante, Julieta se chocou com a aceleração das batidas de seu coração e o ritmo de sua respiração. Mentiu para si mesma, e declarou em seu coração ser apenas por ódio e irritação pela petulância do filho do barão em abordá-la. Mas no fundo sabia que não era só isso. Sabia porque seu coração doeu ao ver em seus olhos o desapontamento ao achar que ela estava acompanhada de Olegário. O imbecil! Sempre aparecia em horas inoportunas, mas naquela noite havia escolhido a maior de todas. Não lhe devia satisfações, mas ao ver a decepção nos olhos de Aurélio, não queria nada além de enxotar Olegário dali e dizer ao filho do Barão que não estava acompanhada. Não por achar que lhe devesse algo, mas apenas para reafirmar o que já havia dito no calor da briga que antecedeu ao primeiro beijo: que não era mulher que se dava a esse tipo de desfrute. Sim. Era apenas por isso. Não porque quisesse ouvir sua voz e ter seu olhar direcionado a ela, não porque quisesse se sentir viva denovo com os sentimentos conflitantes que ele a fazia sentir e nem porque talvez ele tentasse beija-la denovo. Era apenas para colocá-lo em seu lugar. Isso. Fingiu que era isso.

Também não admitiu que depois de deixar Olegário e chegar em sua casa, ansiou à noite toda para que chegasse o amanhã que ela havia marcado para ele procurá-la. Afirmou a si mesma que era apenas o desejo de terminar as negociações e se livrar dele de uma vez. Outra mentira. 

Outra mentira que se confirmou no dia seguinte. Quando havia se tornado tão mentirosa, tão enganadora de si mesma?!

 

Ao chegar na fazenda Ouro Verde no dia seguinte, já havia decidido que adotaria a postura de desprezo e indiferença para com o filho do Barão. Não tinham mais nada que conversar. Ele era seu devedor, e ela sua credora. Apenas isso. Não podia deixar isso ir mais longe do que já havia ido. Nas negociações com o Barão e Lorde Williamson, podia sentir seu rosto (ou seria um sintoma causado pela inquietude de seu coração?) queimar constantemente. Queimava com o calor do olhar de Aurélio que se mantinha calado, mas com o olhar fixo nela. Como se ele estivesse esperando alguma coisa dela, algum sinal, alguma reação. Ela o odiava por isso. Falava com o Barão e o Lorde mas seu pensamento estava no outro ocupante da sala que se mantinha calado e observante. Não entendia como um homem que a princípio parecia ser tão passivo, a olhava com olhos tão atrevidos e intimidantes. Olhos que queimavam. Que pareciam possuir o poder de despi-la mesmo ela estando completamente vestida. Pois seus olhos não desnudavam seu corpo, e sim sua alma e seu coração. E ela o odiou ainda mais por isso. O odiou também, porque de repente ele deixou a sala e ela sentiu-se como se uma nuvem tivesse coberto o sol que a estava aquecendo. Ele a irritava, mas o queria ali, para que soubesse que ela conseguia se controlar e não olhá-lo e nem lhe dirigir a palavra. Sim, era dona absoluta de suas emoções. Sempre foi. 

Não admitiu, mas estava desapontada ao perceber que no final das negociações, ele não viria nem se despedir dela. Não que ela quisesse fazer alguma cortesia, mas apenas para que ela tivesse a chance de deixar claro uma vez mais que o único assunto que tinham era a fazenda e nada mais. 

Preparando-se para ir embora, teve seu desejo materializado em sua frente. Seu coração saltava. Ele não só estava ali, como lhe exigia satisfações de quem era Olegário, o motivo do malandro estar com ela na noite anterior. Já fazia muito que não se sentia como tal, mas naquele momento Julieta se sentiu mulher. Mulher porque ele demonstrava ciúmes, interesse e principalmente a tratava como se ela já fosse dele e de mais ninguém. E por mais absurdo que fosse, isso aqueceu seu coração. Era querida e desejada. Era de alguém. Sua mente não admitia, mas seu coração já havia aceitado que sim. 

E ouvi-lo declarar que ela não saia de sua cabeça assim como ele não saia da dela, só aumentou sua satisfação interna e secreta. Ele não poderia saber jamais o quanto ela havia gostado de ouvir suas palavras e sentir seu olhar dominante. 

Lutou bravamente com todas as suas forças para afastá-lo e tirar dele a certeza que ele mexia com seus sentimentos. Declarar pena por ele foi sua primeira tentativa. Insultá-lo a segunda. E mentir sobre seus pensamentos a terceira. Mas não adiantava. Aquele maldito homem parecia não se atingir com nada. Ele se mantinha calmo e sereno, como se já tivesse a certeza que ela era dele independente do que ela falasse ou sentisse. Como se já soubesse o que se passava dentro do coração dela e que apenas a estava esperando admitir. Se render. Como o odiava ainda mais por isso. O odiava porque sabia que ele não desistiria dela. Que a perseguiria e continuaria tirando sua paz. E principalmente porque não sabia quanto tempo resistiria a ele se ele o fizesse.

E não resistiu. 

 

Quando sentiu ele tocar suas mãos que transpiravam, foi como se uma corrente elétrica estivesse percorrendo todo seu corpo. Tentou se manter impassível, mas seu corpo não a obedecia. Seus dedos ao sentirem as mãos de Aurélio, se fecharam involuntariamente em volta dos dele, como se segura-los fosse a única coisa que pudesse fazer para não ser levada pelo furacão que sentia a sua volta. 

Ela o sentia se aproximar e apesar de sua cabeça gritar “saia”, seu coração apenas dizia resignado “fique”. E ela ficou. 

Quanto mais ele se aproximava, mais perdida Julieta se sentia. Sentia a perda de tudo que construiu para se blindar. Sentia suas muralhas se derrubarem, o gelo em volta de seu coração derreter. 

Isso até ela encontrar os olhos azuis de Aurélio. A Rainha do Café não podia deixar de admitir que já havia notado que o filho do Barão era um homem bonito e atraente mas nunca havia se fixado nesses detalhes. A beleza era uma coisa que já não importava em sua vida onde tudo havia se transformado em negro e frio. 

Entretanto, ao olhar os olhos de Aurélio, pareceu encontrar neles toda a beleza e calor da vida em um só lugar. Os olhos dele pareciam ter o poder de enxergar sua alma e seu coração. Pareciam a solução de um problema que ela nem sequer sabia da existência.

Por isso não se afastou. Deixou ele se aproximar e rendida aceitou seu beijo. 

E ela esperava tudo dos próximos momentos, menos o que sentiu. A delicadeza dele ao tocar seus lábios e sua hesitação, como se estivesse pedindo permissão para toca-la e amá-la, foi sua perdição. Aurélio a beijava com devoção e ardor. Como se ela fosse algo precioso, que requeresse o maior cuidado de todos. E foi assim, que ao sentir a língua de Aurélio tocando seus lábios, como se ele estivesse pedindo permissão para beber de uma água que ele tanto desejava, ela permitiu. 

No primeiro beijo, as coisas não haviam chegado a esse ponto. Naquela fatídica noite em seu escritório, ao sentir Aurélio tentando entreabrir seus lábios, Julieta se afastou como se tivesse sido queimada. 

Mas naquela tarde na sala da fazenda Ouro Verde, não conseguiria ter feito o mesmo nem se sua vida dependesse disso. 

Ao sentir o toque hesitante e caloroso da língua de Aurélio, foi como se algo se abrisse dentro dela. Confessava que já não lembrava mais da sensação e até mesmo como era beijar alguém. Mas ao beijar Aurélio, parecia que já haviam se beijado uma vida inteira, que ela estava retornando a um lugar que lhe foi familiar pela vida toda.

Ao sentir o toque quente de sua língua, Julieta retornou o gesto timidamente, encostando fugazmente a sua na dele. Mas o que começou como algo tímido por ela, foi imediatamente correspondido por ele com volúpia. Ao fazê-lo, sentiu seus braços fortes se fecharem como aço por cima de seus ombros e ele aprofundar o beijo.  Ela correspondeu então à altura, como se o estivesse desafiando a continuar, a ter coragem de ir mais longe. Não o tocou e retribuiu seu abraço não por falta de vontade, mas sim pelo excesso de desejo que a consumiu a tal ponto que não sabia como reagir. Nunca havia experimentado tal sensação. Deixou-se apenas ser abraçada e levada pelo momento.

Mas sua razão logo reassumiu o comando e se sentiu então presa. Presa em uma armadilha da qual não desejava se soltar e onde ela mesmo havia se jogado. Sua mente e seu coração travavam uma batalha naquele momento. O coração, corajoso e sedento de amor desejava ficar. A mente, medrosa e blindada a sentimentos desejava correr. Acostumada então em ouvir a razão, deixou que tal falasse mais alto como sempre e relutantemente se desvencilhou do calor do abraço. 

Não acreditava. Não acreditava que havia se deixado levar, não acreditava que ele havia ousado tamanha desfaçatez e principalmente não acreditava que tinha gostado. E sabe Deus onde teria deixado as coisas chegaram se sua razão não houvesse se pronunciado a tempo.

Como ele constatou antes do beijo, ela vibrou com tudo aquilo. Com seu beijo, seu abraço, seu cheiro e seu calor. Ela que há tanto tempo vivia o inverno do corpo e da alma finalmente encontrou o verão naquele homem que nublava sua mente e confundia seus pensamentos. 

Ao se afastar ainda sentia os resquícios de todos as sensações. Sua boca ainda sentia o gosto dele, e seu corpo parecia reclamar a abrupta interrupção da alegria que estava tendo depois de tanto tempo. Se não talvez pela primeira vez na vida. 

E ao olhar nos olhos de Aurélio, se aterrorizou ao constatar que ele parecia ver e compartilhar de todo seu tormento. Viu ali refletidos sentimentos como supresa, satisfação, desejo e paixão. Seus olhos de mar, que agora haviam atingido um tom mais escuro e penetrante, pareciam enxergar o que havia dentro de seu coração. Ela então não suportou. Teve que fugir. 

E teve também a certeza que na sala da fazendo Ouro Verde havia perdido definitivamente duas coisas: sua sanidade e seu coração. 

Ambos haviam ficado ali, com Aurélio Cavalcante. Seu algoz e salvador; sua maior e mais nova antítese. 

 

 

 

 



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