Prólogo
"Minha luxúria de consumi-los, foi uma experiência, eu as via como objetos, estranhos. É difícil acreditar que um ser humano fez o que fiz."
13 de outubro de 2017, Seattle, Washington
O AR SAI PESADO. A garota solta um rastro de fumaça branca quando respira, que a tenta a apertar o casaco contra seus braços. O cabelo cai, ondulado, quando corre os dedos pelos fios gelados e abaixa o capuz. Observa a rua; os olhos acinzentados tentando captar qualquer movimento do ônibus que atrasara.
Escolhera um dia particularmente nublado para cumprir suas horas pendentes na lanchonete, aborrecida pela ideia de ficar em casa debaixo das cobertas. Checa o horário no celular e trinca as bochechas, contendo o incômodo do tecido áspero do uniforme de garçonete contra sua pele. Suspira, vaiando o motorista silenciosamente por estar quase vinte minutos retrasado.
A loira espera, ansiosa, enquanto olha para a rua vazia nervosamente — nunca gostou de estar sozinha, muito menos em uma rua deserta à noite. Reza para o teto verde do automóvel aparecer ao longe, mas, ao invés, ouve passos distantes. Alarmada, procura por pés humanos na escuridão, mas nada encontra.
Por fim, ouve as rodas gigantes do transporte no fim da rua, mas é incapaz de se virar para ter certeza quando os passos aceleram, em tom de corrida, e ela afasta-se do ponto onde estava, ofegando. Não é nada demais, repete para si, e geme quando o desconhecido para, muito perto, permitindo-lhe ver sua silhueta a pouco menos de cinquenta metros de distância, parado embaixo de uma árvore. A garota solta um grito estridente, protegendo sua bolsa enquanto atravessa a rua, e corre para o barulho de pneus girando. É lenta demais: seu braço é puxado com uma força brutal que a faz gemer e girar, incapaz de se defender de ser arrastada pela calçada vazia do beco escuro.
Os gritos ecoam na escuridão, e as unhas fincadas em sua pele fazem a dor chicotear por todo o corpo, mesclando-se com a adrenalina e pavor. Grita, pede misericórdia, mas de nada adianta. Tenta esquivar-se ou girar o corpo para ver o rosto por baixo do capuz, porém, a postura baixa do agressor camufla sua força, que fazia a garota ralar os joelhos no chão e cair sobre seu corpo, parada pelo choque, em meio á escuridão.
— Por favor — choraminga, arrastando as pernas machucadas para longe. Ouve uma risada seca, cruel, que faz um calafrio percorrer sua espinha até o pescoço.
O desconhecido agarra-a pelo cabelo, jogando a cabeça para trás até colidir com um latão de lixo. Ela leva a mão á nuca, sentindo o líquido gelado queimar sua pele, e choraminga. Os olhos úmidos turvam sua vista, impedindo-a de reconhecer tal pessoa quando abaixa o capuz, revelando os longos cabelos castanhos.
— Não chore, Anastasia. Está chorando como uma garotinha mimada — a gargalhada estremece sua cúpula: o medo de ouvir seu nome da boca de um estranho.
— Por que está fazendo isto? — Anastasia chora, seu corpo dolorido chora consigo.
Seu estômago revira-se em ânsia, e a única resposta que recebe é o silêncio. As botas negras da garota aproximam-se, e, assustada, a loira se curva para o lado e expele o que comera no trabalho. A agressora faz um som de asco e volta a puxar os cabelos claros bem cuidados, emaranhando-os em seus dedos finos. Saca algo que brilha na escuridão, refletindo a pouca luz que entrava no beco e o rosto da garota apavorada.
Com um corte rápido e fundo, cala a adolescente. A mulher de olhos fascinantes sorri quando o corpo, agora sem vida, para de se debater em seus braços.
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