História Hansha - Pensamentos

Derrubar um cara com o dobro de sua altura, usar armas de fogo, ter alguns contatos por aí, não ser uma mera presa numa cidade cheia de feras... Higure era só um garoto, no entanto já tinha em seu "passaporte" tudo isso. Yujin se questionava, como? Sua vida até antes de encontrá-lo havia se resumido em ir à escola, passear com seu avô e os amigos dele, fazer tarefas da escola, tarefas da casa, andar de bicicleta, pescar com seu avô aos finais de semana, cuidar do jardim que ficava no fundo de sua casa e outras coisas assim, simples. Costumava olhar para o céu e apreciar um bom dia de sol ou então, um dia chuvoso e que rendia boas goteiras no telhado. Sua vida era tão comum e desprovida de regalias, que todo o resto parecia não existir. Era feliz e para todos os lados que olhava havia apenas coisas boas, coisas simples e que lhe davam alegria. 

Olhar para aqueles olhos escuros e instigantes lhe fazia perceber como havia esse tempo todo sido protegido de tudo e de todos por seu avô, olhar para eles lhe fazia perceber como agora não passava de um pivete vulnerável e perdido em um mundo que nem se quer sabia da existência. O admirava. Admirava Higure como quem admira uma bela noite repleta de estrelas, mesmo muitas vezes ele sendo um céu nublado. E devia admitir que isso fazia parecer tentadora a ideia de voltar atrás, de ficar com ele, de saber dele e aprender todas aquelas coisas com ele, mas mesmo sendo ele, não deixava de ser o que havia sido com seu avô, seria novamente protegido por alguém. Dessa vez no entanto esse alguém seria Higure. Seria protegido por ele, seria ajudado por ele, ensinado por ele e logo estaria envolvido. Envolvido a ponto de esquecer tudo o que aconteceu...

E seria justo esquecer de tudo? Seria justo esquecer o que seu avô sofreu? Seria justo esquecer que a última tentativa dele foi a de lhe salvar? Seria justo esquecer que aqueles assassinos que o trataram feito lixo ainda estavam vivos por aí? Talvez até tratando outros como lixo também? Ia simplesmente esquecer e de alguma forma ser conivente com isso? Ou iria entregá-los nas mãos de Higure para que ele se encarregasse de algo que era seu dever? 

Sabia que não seria nada fácil cumprir esse objetivo, sabia que teria de ter em seu "passaporte" todos os feitos dele, do garoto que agora era sua fonte de inspiração e sabia que ainda estava longe de consegui-los. Sabia que se Higure estivesse em seu lugar, no momento em que tudo aconteceu, no momento em que aqueles caras invadiram sua casa, certamente agora nenhum deles existiriam e seu avô ainda estaria sorrindo, provavelmente na beira de um rio qualquer, pescando com seus amigos. 

Estava longe de ser o que ele era e quando tivesse alcançado nível dele, ainda continuaria longe dele. Não precisava se sentir mal por  isso, e muito menos querer competir com ele. Precisava apenas chegar onde ele chegou, para então ter alguma chance de ir de fato atrás de seu objetivo.

E pensando em tudo isso, não havia se dado conta de que estava há uns bons segundos sustentando olhares com o garoto dos olhos escuros e pouco decifráveis, saiu de seus pensamentos sem conseguir esconder o rosto corado. Se ele ocultava muito bem os sentimentos, então era o inverso disso. Tinha dificuldades em escondê-los. Percebeu mais um sorrisinho dele, dessa vez com um ar de deboche. Higure havia notado a vergonha passar pelo semblante de Yujin e deixá-lo corado.

O garoto de cabelos longos fechou a cara e o encarou feio. Voltando novamente para o assunto principal, que era a sua partida.

Yujin: Obrigado... Vou seguir seus conselhos...

Higure: Eu espero que siga...

Respondeu ele cruzando os braços e encostando-se na mesa de estudos. Mais uma vez fitaram-se por alguns segundos, em silêncio. Em um silêncio que basicamente representava o que de fato queriam dizer, mas que por motivos diversos, não diziam.

Yujin: Tem algo que eu queria saber.... Sobre você...

Higure: ?