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História HocusPocus - Frisbee azul, olhos verdes


Escrita por: eithelx

Notas do Autor


[ NÃO REVISADO ]

ai deus...

Capítulo 1 - Frisbee azul, olhos verdes


Park Chanyeol sempre foi avisado para tomar cuidado com a vida. Seja ao andar sozinho durante a noite, pegar um trem vazio ou muito cheio, subir em árvores, brincar com os gatos dos vizinhos e andar com as crianças da família Do.

 

Os Park nunca foram preconceituosos com ninguém, mas deixavam advertido o filho mais novo, para que tomasse cuidado. Afinal, a fama dos Do não tinha das reputações, a melhor.

Apesar de tantos avisos, Chanyeol tinha a mania de não tomar qualquer tipo de cuidado. Aos seis anos foi arranhado dos pés a cabeça pela gata branca do vizinho a esquerda de sua casa. Ele deveria ter cuidado, ao tentar mexer com os filhotes recém-nascidos, perto de uma mãe felina.

Aos oito anos desceu ladeira abaixo com sua bicicleta, e no fim da rua seu rosto encontrou um muro de concreto. Dizia ele que o dente que caiu já estava mole, não importava.

Aos doze anos então, desobedeceu mais uma vez, ao não tomar nenhum cuidado com os Do na casa ao lado. Estava a jogar frisbee com seu cachorro, quando o disco azulado passou além da cerca de madeira e plantas altas, para dentro do quintal de seu vizinho. Normalmente, Chanyeol chamaria seu pai, ou irmã, ou qualquer outra pessoa. Entretanto, naquele dia ensolarado de outono, o jovem menino Park tomou coragem em seu gorducho corpo e pulou a cerca.

 

Poderia muito bem ter dado a volta e entrado pela frente da casa, pelo portão sempre entreaberto, como se esperasse para alguém entrar sorrateiramente, mas preferiu se emboscar na erva que crescia pela cerca até cair em uma pilha de folhas ressecadas, fazendo um grande estardalhaço.

Levantando-se logo após, sacudindo o máximo que podia, das folhas em seus cabelos e roupas surradas, Chanyeol olhou pelo quintal dos Do.

 

Nunca antes havia entrado naquela casa, não conhecia aquele lugar nem mesmo de sua imaginação. Seus pais apenas diziam para ter cuidado com os Do, por serem tão reservados. Aquela família era um mistério.

No quintal havia um longo caminho de grama. Era simples, sem decorações, sem nada macabro ou sinistro. Algumas árvores sem folhas, e todas estas espalhadas pelo chão. Uma pequena varanda virada para o quintal, no segundo andar da casa de três andares, com seu telhado pontiagudo e telhas cinzentas.

 

Chanyeol andou com passos calmos, pelo quintal, a procura de seu frisbee esquecido, não deveria ser tão difícil de se encontrar, entre toda aquela monocromática paisagem. O objeto azul-claro estava próximo de uma árvore de tronco largo, que produzia uma sombra consistente, apesar de estar sem folhas em seus galhos. Com mais pressa, foi até o frisbee e agarrou-o com uma das mãos, antes de ouvir galhos a quebrarem-se, debaixo do que pensou, serem pés.

 

Seu corpo congelou, ainda agachado, com uma das mãos as segurar o brinquedo, tinha os olhos arregalados por trás dos óculos redondos, mas mal podia enxergar. Seu coração apertado batia cada vez mais rápido, todo o céu parecia haver tornado-se cinza, e sentia que podia ter uma crise de asma a qualquer segundo, quando então, tão sutilmente ouviu o miado doce de um gato. E seguido do miado, as patinhas pequeninas quebravam galhos e folhas enquanto seu corpo esguio serpenteava entre suas pernas.

 

O jovem suspirou aliviado, sorrindo para o gato que olhava em sua direção com grandes olhos verdes. Era uma ainda pequenina bola de pelos pretos, que olhava para Chanyeol com curiosidade e dentes brancos a mostra sempre que soltava um de seus curtos miados.

Chanyeol ajoelhou-se no chão, e o gato não pensou duas vezes antes de subir em seu colo e aninhar o focinho contra seu pescoço. Passando as mãos através do pelo macio, sentiu o felino ronronar e poderia dizer que, depois de tantas más experiências com o gato branco do outro vizinho, havia voltado a adorar bichanos.

 

 

–Lúcifer realmente gosta de você. –A voz veio de trás de Chanyeol, e o fez saltar como um gato (ah, a ironia) assustado, caindo com a bunda primeiro no chão, e o gato ainda no colo.

 

Quando virou-se estava a espera de uma coça ou uma bronca, mas o que viu foi muito mais estranho, talvez assustador. Tinha em seu campo de visão um rapaz jovem, provavelmente bem mais novo que ele mesmo, com pele branca como papel e olheiras tão profundas como seus olhos negros. O cabelo preto sobre as sobrancelhas contrastava com a pele e os lábios eram tão pigmentados, como se ele acabasse de comer um prato de morangos.

 

Lu-Lúcifer?! –Chanyeol questionou, engolindo a seco, olhando para aquele que estava em pé a sua frente, mas que era claramente mais baixo que ele. O jovem então apontou para o gato em seu colo, que ainda parecia tão calmo.

 

–Meu gato, Lúcifer. –Kyungsoo continuou, abaixando-se em seguida. Tinha as pernas dobradas contra o corpo, sem sentar no chão. Vestia bermudas pretas, um suéter preto e meias brancas dentro dos sapatos bem lustrados. –Ele não costuma gostar de outras crianças. –Continuou, esticando sua mão frágil até tocar no pelo negro do gato que permaneceu imóvel e bem aconchegado.

 

Chanyeol olhava para o rapaz como se estivesse completamente congelado de medo. Podia jurar que via, ao passar da luz e da leve brisa de inícios de outono, que os olhos do garoto haviam brilhado rapidamente em tons alaranjados. Provavelmente, pensou, eram folhas a voarem, que refletiam na imensidão negra daquele olhar.

 

–Meu nome é Kyungsoo. –Ele disse sem ser perguntado. –E o seu é Chanyeol. –Ele respondeu sem perguntar, e antes que o outro o pudesse questionar completou seu pensamento. –As vezes, quando estou lendo no jardim, ouço sua mãe gritar seu nome. –E um pequeno sorriso se esticou nos lábios avermelhados do menino de porcelana, que ainda passava a mão em seu gato.

 

Ambos levantaram seus olhares rapidamente, na direção da cerca que separava as duas casas, ao ouvirem a tal voz que Kyungsoo prestava atenção, chamar por Chanyeol. Sua mãe havia de ter chegado em casa, e ao ver o cão, mas não o filho, claramente parecia preocupada.

 

Kyungsoo puxou do chão o frisbee azul e o estendeu na direção de Chanyeol, enquanto este estendeu o gato na direção de Kyungsoo. Trocaram meios sorrisos, antes que o mais alto corresse para longe, usando desta vez o portão sempre entreaberto.

E do outro lado o rapaz de porcelana pôde ouvir a bronca levada, mas também um falso sussurro que dizia, que a criança que vivia com os Do não parecia motivo para sua mãe se preocupar.

 

 

 

Depois de três bons dias sem poder brincar no quintal, de castigo, Chanyeol estava parado a frente da cerca de sua casa, segurando o frisbee azul, com seu cachorro sentado ao seu lado como se também pensasse muito em alguma coisa.

Resolveu atirar o brinquedo de uma vez por cima da cerca, tendo encontrado naquilo um motivo plausível para entrar na propriedade dos Do mais uma vez, e tentar ver o rapaz de grandes olhos e seu gato preto.

 

Desta vez, foi pela porta da frente, pelo caminho de pedras, entre o portão e a porta da frente, e tocou a campainha que soou um tom sinistro. Chanyeol poderia jurar que ouviu morcegos escapando pela chaminé da casa naquele momento. O cachorro esperava do lado de fora do portão, como um cão de guarda que ainda era medroso demais para guaradar Chanyeol.

Estava pronto para desistir, e ir para longe da casa, talvez escalar a cerca, quando a porta abriu-se de uma vez.

 

O que viu, quando a porta for aberta, causaria choque a qualquer um. De dentro da sinistra casa, saiu uma mulher com cabelos descoloridos em um tom vibrante de ruivo, com uma bandana colorida os enfeitando, vestido em padrões diferentes, com várias cores. Seus lábios eram idênticos aos de Kyungsoo, mas sua pele ligeiramente mais bronzeada não os fazia parecer tão assustadores.

 

–Olha pequenino, está perdido? –Ela disse, com sua voz suave e olhar gentil. Chanyeol estava perplexo.

 

–M-meu frisbee... Eu... Park... Vizinho. –Disse de forma completamente desconexa, como se houvesse uma séria falha entre seu cérebro e sua boca. A mulher parecia completamente perdida, e assim continuaria, se uma pequena mão não puxasse na barra de seu vestido, e por trás dela aparecessem os olhos curiosos de Kyungsoo.

 

–Mamãe, esse é o vizinho que eu falei. –O garoto murmurou, e a mulher olhou entre Kyungsoo e Chanyeol algumas vezes, com olhar assustado, antes de abrir mais uma vez seu sorriso. Chanyeol perguntou-se se Kyungsoo teria um sorriso igual aquele, que se transformava em um bonito coração.

 

Chanyeol viu-se sentado na sala dos Do, poucos segundos depois. Não havia nada de muito assustador, nas cores monótonas que decoravam o lugar, e sua mobília clássica. Kyungsoo estava sentado ao lado do vizinho, e ao contrário de Chanyeol, seus pés não encostavam no chão.

 

–Me desculpe pela minha mãe... –Kyungsoo murmurou, ainda sozinhos na sala, em silêncio quase completo, se não pelo ronronar de Lúcifer no colo de seu dono. –Eu não tenho amigos, e ela ficou muito animada quando eu contei sobre você. –Continuou, levantando seu olhar para o rapaz ao seu lado, que tinha sobrancelhas franzidas em dúvida.

Não deveria ser estranho imaginar que Kyungsoo não tinha amigos. Mas era. Saber que uma pessoa, ainda mais uma criança, não era capaz de desfrutar da presença de outras, e de sua amizade, era algo que sempre deixaria Chanyeol confuso.

 

–A-acho que podemos ser amigos. –O mais alto comentou, olhando para as próprias mãos e no rosto um delicado sorriso de lado. –Quantos anos você tem? –Perguntou, ao levantar seu olhar para Kyungsoo, que parecia entretido ao passar uma das mãos contra os pelos de seu gato.

 

–Tenho dez anos, faço onze anos em Janeiro. –Respondeu com calma, dando uma coçadela atrás da orelha do gato que fechou seus grandes olhos verdes, relaxado no colo de Kyungsoo.

 

–Isso é legal, eu tenho doze anos. –Chanyeol retrucou rapidamente. –Você frequenta qual escola? –Continuou, ajeitando-se para sentar sobre uma das pernas, de frente para Kyungsoo.

 

–Eu estudo em casa... Mas acho que quando eu entrar no colegial, eles vão me deixar interagir com outras pessoas na escola. –Continuou a falar, olhando para o outro. Chanyeol podia ver em seus olhos um brilho esperançoso, e sorri u para aquilo como um brinde.

 

–Espero que você venha estudar na mesma escola que eu, então. –Continuou, colocando sua mão também no gato, dando pequenas coçadelas por debaixo do pelo macio.

 

 

 

Naquela noite, Chanyeol contou para sua mãe que havia ido até a casa dos Do. Ela e seu pai ouviram atentamente, trocando olhares preocupados quando ele não percebia, animado demais para falar sobre as piadas engraçadas da mãe de seu amigo vizinho. Ao fim de tão longo discurso, sobre chá de camomila servido com jujubas para adoçar, biscoitos em formato de aranhas e o gato de estimação de Kyungsoo (cujo nome ele preferia omitir, por enquanto), seria impossível negar ao jovem Park, as visitar a casa dos Do.

 

Porém, uma condição fora imposta, e no dia seguinte a Senhora Park estava com seu filho, sentada na varanda dos Do, enquanto apreciava uma boa xícara de chá de jasmim e biscoitos da sorte (sem a sorte dentro, por motivos que a mãe de Kyungsoo preferiu não revelar), enquanto observavam Kyungsoo ler para Chanyeol um de seus muitos livros.

 

–Nós sabemos que essa vizinhança não gosta da gente. –A mulher de cabelos ruivos comentou, colocando mais chá para a convidada. –Mas fico feliz que a senhora esteja aqui. Meu pequenino se sente sempre tão sozinho, olhando as crianças passarem pela frente da casa...

 

Hyori, a mãe de Chanyeol, entendia perfeitamente o que ela queria dizer. Chanyeol já havia passado por uma fase solitária em sua vida, antes de conhecer alguns poucos, mas fiéis, amigos na escola. Sabia como era triste ver seu filho a observar as crianças nos verões passados, andando de bicicleta ou jogando bola pela rua calma.

 

–As pessoas tem a mania de julgar os outros antes de conhecerem eles de verdade. –Hyori disse, enquanto mexia o mel em seu chá. –Peço desculpas se fui uma dessas pessoas por tanto tempo. –Continuou, ganhando um sorriso doce de Mina, a mãe de Kyungsoo, como resposta.

 

 

 

Chanyeol pulou de sua cama antes mesmo do alarme despertar. Antes que sua mãe pudesse chegar em seu quarto para acordá-lo (por nunca ser capaz de levantar com o despertador), já estava de banho tomado e uniforme vestido.

Mil vezes olhava-se no espelho, enfiando e retirando a blusa social de dentro das calças, como se tentasse descobrir qual era o melhor visual para si mesmo.

 

Ele havia crescido, mais do que seus pais haviam previsto. Estava muito mais magro, mais esguio e desengonçado. Cabelos mais longos cujas pontas tocavam a base do pescoço, e postura correta (graças a constantes broncas de sua avó). Chanyeol tinha dezesseis anos, um enorme sorriso, mãos trêmulas e coração que quase saltava pela boca.

 

–Será que você pode parar de bater o pé no chão? Daqui a pouco vai acabar abrindo um buraco no assoalho. –Yura, sua irmã mais velha reclamou, ainda com cabelos bagunçados, por não precisar sair para a faculdade em mais algumas horas.

 

Chanyeol poderia tentar se controlar, mas era animação demais. Os últimos três anos de sua vida escolar naquela cidade, antes da faculdade é claro, mas não era por isso que estava animado. Durante os quatro anos em que havia cultivado uma amizade com Kyungsoo, planejaram aquele momento, aonde poderiam finalmente estudar juntos.

Sabia que Kyungsoo estava animado para aquilo, provavelmente não tanto quanto, mas sabia que estava. Apesar de o outro não saber expressar-se tão bem quanto ele, conseguia ver o mesmo brilho no olhar, quando falavam sobre aquele assunto.

 

No horário combinado, Kyungsoo tocou a campainha da casa dos Park. Foi convidado para entrar, e Hyori fez questão de dar uma pequenina garrafa de leite fermentado para o amigo de seu filho.

 

 

Kyungsoo tinha as mãos agarradas às alças de sua mochila, enquanto andava ao lado de Chanyeol até a estação de trem. Nunca havia andado sem a companhia de sua mãe por aqueles lugares, toda a experiência era completamente nova e quase forte demais para que pudesse lidar com tudo em sua cabeça.

Sabia que se não fossse pelo toque de Chanyeol em suas costas uma vez ou outra, ou por ele puxá-lo para dentro do trem cheio, protegendo seu corpo consideravelmente menor entre ele mesmo e uma das paredes do vagão, não seria capaz de fazer aquele caminho sozinho.

 

Chanyeol era seu senso de segurança exterior, aquele que o guiava para desbravar novos mundos que não conhecia tão bem quanto pensava dever.

 

 

O mais velho insistia sempre, que seria muito mais fácil começar na escola durante o colegial. Novas pessoas se encontravam em um lugar diferente. Por mais que muitos pudessem se conhecer, poderiam nem mesmo estar na mesma sala. Aquela questão, aliás, era também motivo de preocupação para os Do. Caso Kyungsoo estivesse em uma sala diferente de Chanyeol, sua adaptação seria consideravelmente mais complicada. O que levou a Hyori, ir até a escola conversar com a coordenação e dar um “jeitinho”, para que os dois ao menos frequentassem as mesmas aulas importantes.

 

O que não impedia que Kyungsoo fosse ficar longe de Chanyeol em alguns momentos. Enquanto Chanyeol teria aulas de música, Kyungsoo frequentaria grupos de literatura, e enquanto Chanyeol jogava vôlei, Kyungsoo faria judô.

 

Era simples, algumas aulas aqui e ali separados, mas sempre juntos para voltarem para casa.

 

Kyungsoo tinha medo de não saber socializar corretamente, mas assim que sentou em seu lugar, a frente de Chanyeol (que havia prometido guardar suas costas), encontrou o grande sorriso de Baekhyun que sacudia sua mão de forma agitada e dizia que mal o conhecia, mas já queria ser seu amigo. Kyungsoo gostou de seu sorriso, e aceitou aquela proposta. Logo juntaram-se a eles Jongin, amigo de Chanyeol desde o primário e Jongdae, que havia conhecido nos últimos anos do ginásio.

Manteve-se sempre quieto, na primeira semana, que desdobrou-se em um mês, em três e antes que pudesse dar-se conta do tempo, estava na metade de seu segundo ano. Kyungsoo era o melhor aluno de sua turma, superando as expectativas de que por ter apenas estudado em casa até então, seria incapaz de acompanhar seus colegas no mesmo ritmo. Todos agora viam seu potencial, e acreditavam que até o ano seguinte, Kyungsoo poderia se tornar o melhor aluno do colégio.

 

 

–Você precisa me ajudar em álgebra! –Baekhyun reclamava, enquanto de braços dados com o recém-amigo, a caminho da aula de literatura que compartilhavam. –Posso passar na sua casa? –Perguntou sem más intenções, mas Kyungsoo parou em seus calcanhares e levantou os olhos sempre tão assustados, olhando para o amigo. Baekhyun estava prestes a perguntar o que havia acontecido, quando Kyungsoo abriu a boca, e seus lábios trêmulos.

 

–N-não dá! –Disse mais alto do que pretendia. –Minha avó está visitando, e também uns primos distantes... Minha mãe não teria tempo para fazer chá e biscoitos. –Continuou, agarrado em seus livros e cadernos encapados em plástico preto.

Baekhyun não insistiu no assunto, apesar de achar que biscoitos e chá não seriam necessários para estudar álgebra.

 

Entretanto não insistir, não significava que havia esquecido a forma como Kyungsoo havia parado no meio do corredor, como se fosse tomado por uma irracional onda de medo. Aquela cena ainda repetia em sua mente, bem como as palavras trêmulas e a forma como seus dedos pálidos tornavam-se ainda mais brancos ao segurar com tanta força os cadernos.

Passou a partir daquele dia a observá-lo melhor, em silêncio, sem encarar, mas prestando mais atenção em cada toque hesitante e os constantes machucados em seus dedos. Observou também Chanyeol, de perto. Viu como o rapaz não parecia perceber os curativos nas mãos do outro, nem sequer questionar, talvez por saber de onde vinham, talvez por também nunca ter se perguntado.

 

Em um dia tranquilo, avistou Chanyeol sentado sozinho na biblioteca do colégio, e respirou fundo.

 

–Precisamos falar sobre Kyungsoo. –Ele sussurrou, enquanto sentava-se ao lado do outro, que parecia estudar para a prova de história do dia seguinte. Chanyeol não demorou mais que segundos para fechar o livro que tinha em mãos e gesticular com a cabeça para que saíssem da biblioteca.

 

Estavam sentados perto da cabana do clube de jardinagem, vazio naquele horário, um lugar quieto para se conversar, e longe de Kyungsoo (que morria de medo de abelhas).

 

–O que você quer falar sobre? –Chanyeol questionou, sentando-se no banco de concreto, olhando diretamente para o rapaz que por sua vez olhava para os cadernos coloridos sobre o colo.

 

–Você já reparou nas mãos do Kyungsoo? –Perguntou, sem levantar a voz, e olhando para as próprias mãos. –Ele tem sempre cortes, queimaduras, arroxeados... Eu até pensei que fosse pelo clube de cozinha, mas o Yixing está lá também e disse que ninguém nunca se machuca lá além dele... –Continuou, gesticulando enquanto falava, sem olhar na direção do outro.

A verdade, era que Chanyeol realmente nunca havia prestado atenção naquele detalhe.

 

–E não só. –Continuou. –O pessoal do Judô comentou que ele tem aparecido com hematomas no corpo todo. –Insistiu no assunto, e Chanyeol não respondia. Tinha as sobrancelhas franzidas como sempre que ficava confuso, e não entendia muito bem o que estava ouvindo. A família dos Do sempre pareceu extremamente agradável, apesar de apenas ter tido contato com a mãe de seu amigo, e ele nunca pareceu reclamar, ou apresentar comportamento fora do normal (do que era normal para Kyungsoo).

 

Ficaram em silêncio por alguns instantes, Chanyeol precisava analisar aquela informação, procurar em sua mente se sabia de algo que pudesse desvendar aquelas perguntas que se multiplicavam. Baekhyun olhava para ele com suavidade no olhar, como se entendesse o que ele passava naquele instante. Toda a confusão era óbvia.

Quando os dedos de Baekhyun tocaram sua perna, foram dois segundos que pareceram horas. Seu olhar levantou-se na direção do amigo que parecia perguntar se estava tudo bem, e em seguida olhava na direção da entrada do jardim, aonde seu vizinho amigo olhava para os dois com seus grandes olhos sempre tão assustados e lábios entreabertos. Sua pele quase brilhava com o toque do Sol, tão pálido ele era, e suas veias escuras eram vistas em seu pescoço.

 

Antes que Chanyeol pudesse falar qualquer coisa, saiu o rapaz de cena, em passos apressados, agarrado em sua máquina fotográfica.

 

O vizinho não foi capaz de levantar-se e ir atrás dele, mas Baekhyun saltou de seu lugar e correu pelas folhas secas de outono, mas não conseguiu alcançá-lo. Chanyeol continuou no mesmo lugar, sem entender o que o fazia querer ir atrás dele, o que o fazia querer explicar-se, nem mesmo sabia o que explicar, mas sentia essa vontade.

 

Quando foi para casa naquele dia, Kyungsoo já havia ido embora. Não correu para ver mais de perto, enquanto a senhora Do vinha buscar o filho em seu carro preto. Havia pensado em ir atrás dele, mas a mesma força que dizia para ir até ele antes, parecia dizer para ficar para trás agora.

 

 

Chegou em casa em horário normal, com o sol já baixo, e os postes de luz começando a acender aos poucos. Chanyeol caminhou sem pressa, ou perspectiva. Era estranho, voltar para casa sem Kyungsoo. Mais estranho ainda, foi passar pela frente da casa dos Do, e ver o portão fechado. Carro parado na frente, junto com uma motocicleta e uma lambreta. A casa estava fechada, e não parecia convidar ninguém para espiar, como normalmente fazia.

 

Tentou não pensar muito sobre aquela situação, ao chegar em casa. Preferiu apenas seguir para seu banho, e jantar em silêncio (o que assustou um bocado seus pais e irmã). Sentado no parapeito da janela de seu quarto, podia ver um pouco da casa dos Do. O jardim e a janela do quarto de Kyungsoo, no sótão. A luz estava apagada, e nem mesmo Lúcifer descansava em sua almofada junto da janela, como de costume.

 

–Que dia esquisito... –Sussurrou para si mesmo, ao ver o horário no relógio perto de sua cama. Era quase meia-noite, naquela noite coberta de nuvens que pareciam estar a espera de algo a mais para começarem a chover.

Havia passado a noite inteira sentado naquele mesmo lugar, a espera de ver Kyungsoo acender as luzes, mas nada acontecia. Talvez fosse melhor ir dormir, enfim, do que esperar em vão.

 

Dormir era a melhor opção, com certeza. Entretanto, se tivesse ido dormir como havia pensado, no exato momento em que havia cogitado aquela ideia, jamais teria visto escapar da chaminé que subia ao lado da casa, uma chama verde que dissipou-se em uma nuvem a topo do telhado escuro.

 

Chanyeol tinha o coração a palpitar intensamente, enquanto seu olhar surpreso seguia os pequenos resquícios de chamas verdes que caiam aos poucos. Não teve muito mais tempo em suas mãos, antes do grande barulho vindo da casa dos Do. Pareciam trovões e ventania, contidos em um pequeno espaço, como se toda a tempestade que as nuvens anunciassem, estivesse acontecendo dentro da casa de seus vizinhos.

 

Sua mãe havia dito tantas vezes, quando era mais novo, que deveria ter cuidado com os Do. Todos em sua vizinhança diziam, que não se deveria relacionar com aquelas macabras figuras que entravam e saíam da casa (exceto pela mãe de Kyungsoo, é claro). Sempre fora avisado, e sempre ignorou aqueles avisos.

Naquele dia de outono, com o cheio de tempestade e torta de abóbora, Chanyeol continuou a ignorar. Seus passos o mais silenciosos possíveis, esguiaram-se pelo próprio jardim, através da cerca entre as casas, até o jardim dos Do.

 

Como havia feito tantas outras vezes quando criança, foi ele até a varanda da casa, e pela porta da cozinha entrou. Os Do nunca lembravam-se de trancar aquela casa, não importava a ocasião.

 

Em tênis velhos, calças rasgadas, blusa preta e cabelos bagunçados, entrou pela cozinha. E já não era mais a tempestade que ouvia. Era como se de fora, ouvissem tempestade, para ocultar os sons dentro da casa.

 

A mão trêmula, na maçaneta da cozinha, joelhos fracos e garganta seca. A porta rangia, como tudo naquela casa, e Chanyeol podia ouvir. Vozes misturadas, homens e mulheres, entoando cânticos, em uma língua que parecia extremamente familiar, mas que não entendia nem um pouco.

Com o coração na garganta, empurrou a porta, sentindo-se ser tomado pela onda de aromas que faziam seu corpo ainda mais atraído, ainda mais fraco.

 

Os passos a partir daquele instante não eram mais seus, seu corpo os dava sem o comando, sua mente estava embaçada demais para pensar em andar ou não.

 

O pequeno corredor o levaria até a sala, até as vozes que pareciam chamar, sussurrando em seus ouvidos, e empurravam-no com mãos invisíveis em suas costas.

 

Arrastou-se até o portal, a sala macabra, vazia de móveis. Em seu centro uma roda de seis pessoas, cujos corpos imitavam de um lado para o outro, o movimento das ondas no mar. De um lado para o outro, uma mulher de longos cabelos brancos, e os fios ruivos de Mina. Quatro homens, todos vestidos de preto, todos com olhos fechados, mãos dadas e bocas fechadas. Mesmo assim ainda eram audíveis os cânticos, a melodia que chamava pelo corpo e alma de Chanyeol.

 

Ele que não controlava a própria existência aproximou-se ainda mais, e olhos desfocados, foram apenas capazes de captar a imagem, no centro do círculo o corpo seminu daquele que tão inocentemente olhava para si todos os dias. Kyungsoo estava de joelhos no chão, com calças pretas e colares que tocavam seu torso. Os olhos sempre assustados, tomavam o outro lado do medo, e aterrorizariam qualquer um que os pudesse ver. Brilhavam verde como o fogo que antes o outro havia visto. O peito movia-se de forma pesada, seus músculos contraíam, e as mãos, que Chanyeol nunca havia visto machucadas, criavam pelas palmas viradas para cima, chamas que não sequer o tocavam.

Nem mesmo havia percebido que tinha o corpo caído no chão, quando os olhos verdes de Kyungsoo viraram-se em sua direção. Seria, entretanto, aquele o mesmo Kyungsoo que vivia a seu lado? Que tinha medo de multidões e passava horas sozinho a ler?

 

Chanyeol sentia os olhos pesados fecharem-se aos poucos, captando os últimos segundos de Kyungsoo a olhar em sua direção, e em sua mente ecoava a melodia suave que cantavam aqueles na casa que criava tempestade.

 

Do negro fogo somos feitos, tolos não nos queimarão”


Notas Finais


NO QUE EU FUI ME METER MEU DEUS. Isso era pra ser uma One Shot, não vai ser uma One Shot.
Que meleca cara... Mas vamos que vamos, mais uma ChanSoo pra alegrar a vida de todos.

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Me desejem sorte HUEHAEU


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