História I Love You, Idiot Elf! - Uma Luz No Fim Do Túnel

- Eu sei quem é o traidor da Guarda de Eel. - anunciou num tom calmo e convicto. 

Ezarel suspirou, claramente aborrecido. Estava cansado de ouvir sempre a mesma história.

- E quem é desta vez? - a garota fingiu não perceber o sarcasmo em sua voz enquanto desviava o olhar. A máscara pareceu pesar debaixo de suas vestes alertando-a sobre suas próximas palavras. - Se vai acusar outra pessoa é melhor ficar calada. Ainda não esqueci do que você fez hoje com Ciel e Valkyon.

Lua fechou os olhos, não queria ver a expressão do elfo. As palavras secaram em sua boca antes que pudesse pronuncia-las. O que faria? Entregar Leiftan como se fosse um criminoso sem coração? A conversa com o anjo de asas negras voltava a cada instante em sua mente como se a provocasse, uma parte sua teimava em imaginar no que teria acontecido se tivesse aceitado a oferta. E se tivesse dito sim? Estaria nesse momento voando com ele descobrindo os céus de Eldarya?

Uma voz familiar a tirou de seus devaneios.

- Vai ficar muda para sempre? Ainda não respondeu minha pergunta.

- Eu....

- Senhor Ezarel! - ambos se viraram para o membro da Guarda Obsidiana que ofegava de maneira assustada. Sem pronunciar mais nenhuma palavra o rapaz entregou ao elfo um papel que continha apenas uma frase escrita na qual a faeliana não conseguiu ler, imediatamente a expressão do alquimista se tornou incrédula.

- Miiko e os outros já sabem disso? 

- A senhora Miiko já foi informada e pediu para os líderes irem vê-la imediatamente na Sala do Cristal.

Sem esperar o alquimista caminhou as pressas para o local indicado sem seguer pronunciar uma palavra para a jovem, sua postura era perturbadora. O que estava escrito no papel com certeza era de um assunto gravíssimo, reuniões não eram realizadas na madrugada sem nenhum motivo importante. Acompanhando com o olhar até que o elfo sumisse de vista junto com o guarda a mesma suspirou, estava aliviada e preocupada ao mesmo tempo. Sem vontade para fazer mais nada se dirigiu até o quarto trancando a porta logo em seguida, queria acreditar que tudo era um pesadelo, infelizmente a realidade parecia espancá-la. Retirando os objetos escondidos na roupa guardou a máscara e a adaga debaixo do guarda-roupa, contudo, permaneceu com a pena apertando-a contra o peito.

Não sentia-se mais a mesma. Era como se perdesse a própria alma... Afinal, quem era de verdade?

***

A manhã chegou depressa inundando toda Fortaleza com um dia cinzento. Lua acordou deitada no chão, não conseguiu dormir devido aos pensamentos e acabou por ficar sentada até que o cansaço a vencesse. Sua cabeça girou em uma nuvem confusa enquanto vestia uma simples roupa e prendia o cabelo num coque qualquer, não queria ver como estava sua aparência. Tinha assuntos mais importantes para resolver.

Assim que deixou o quarto percebeu a aura sombria que preenchia o QG, cochichos eram ouvidos em todos os cantos e cada membro que circulava em sua volta carregava consigo uma expressão de tormento ou incredulidade. Alguma coisa grave havia acontecido. Ignorando todos caminhou em direção a Biblioteca encontrando um Kero muito nervoso atrás de uma pilha de livros.

- O que está acontecendo com esse lugar? - perguntou para si mesma numa indagação vazia, contudo o unicórnio acabou por ouvir surpreendendo-se com a aparência fria da jovem.

- Oh desculpe, não vi você antes. Estou numa correria imensa devido ao julgamento de Leiftan. - o nome provocou uma série de espasmos perturbadores na mesma que avançou até o amigo agarrando-o pelo braço. Keroshane se assustou.

- O que você disse?

- Leiftan é o traidor da Guarda. Encontraram uma carta no quarto dele assinada confessando a verdade, uma reunião foi feita as pressas na madrugada para resolverem o assunto. Toda Fortaleza está num caos, todos chocados com a notícia. Estou correndo atrás de todos os pergaminhos sobre antigos julgamentos de traição, ele pode ser condenado a morte devido ao crime.

Um tremor gelou todos os seus ossos enquanto se afastava em alguns passos. Não. Era mentira. Não era possível. A memória da noite passada atravessou sua mente a fazendo ficar louca num turbilhão de sentimentos. Leiftan planejara tudo, ele queria levá-la consigo e contar a verdade antes que partisse. Então.... como de um dia para outro tudo virou essa confusão?

Lua correu para fora sem se importar com mais nada. Que se danasse todo mundo mas não deixaria que machucassem Leiftan. Adentrando a Sala do Cristal de modo brusco assustando todos os presentes avançou contra Miiko de punhos cerrados.

- Lua, mas o que você... - um tapa acertou em cheio sua face fazendo-a dar vários passos para trás. Gritos horrorizados foram ouvidos, não somente pelo ato violento mas também pelas chamas azuis fluorescentes que bailavam em seus olhos. Ninguém ousou se mover.

- Vocês não vão fazer nenhum mal ao Leiftan, eu não vou deixar. Ele me contou a verdade de quem eu sou e o que fez para me proteger, quanto tempo vocês pretendiam esconder a verdade de mim? QUANDO ME CONTARIAM QUE SOU UMA FADA DO CRISTAL?!

Seu grito ecoou em todo ambiente antes do silêncio mergulhar. Expressões incrédulas estampavam a face de todos, até mesmo a kitsune estava assustada. Lua por outro lado continuava fulminar a líder em sua frente, queria a verdade e não sairia dali até tê-las. 

Nem que tivesse que estapear todos da sala.

- O que ele disse a você?  - indagou Miiko se aproximando, de alguma maneira não havia raiva em sua face apenas temor. 

- A verdade. Tudo o que vocês não fizeram desde o início.

- Lua, se acalme... - Ezarel se aproximou tentando tocá-la, porém foi afastado por um tapa brusco em sua mão. A jovem estava fora de si.

- Cale a boca, você também me deve muitas explicações. Prometeu que nunca mentiria para mim, não é mesmo amor? - a acidez em suas palavras fizeram o elfo se calar, a verdade é que a albina se segurava para não soltar tudo o que sabia. Não queria acreditar que o amor que sentia era falso. Aceitava tudo menos isso. Sabia que não suportaria. - E então? Vão me contar a verdade ou tenho que brotar as minhas asinhas e voar daqui?

Miiko notou que ela perderia o controle em breve, sabia que as Cristalys mudavam drásticamente de personalidade quando estavam iradas e não suportaria ver alguém ferido por sua causa. Os líderes esperaram pela colocação da líder de modo apreensivo, todos evitavam olhar para a garota, Ezarel estava atordoado.

- Não queríamos esconder isso de você, eu sabia que seria demais colocar tanta responsabilidade encima de uma garota que acabara de chegar. Você não tem culpa de estar envolvida na profecia, meu maior medo era que você não aceitasse por isso resolvemos ocultar esse segredo. Lua, você é especial e todos dependem de seu poder, se o Cristal for restaurado toda Eldarya se erguerá em prosperidade e saúde. Ninguém mais vai morrer, a comida não será racionada, todo esse pesadelo terá fim, tudo que peço é sua misericórdia e perdão por essa mentira, mas acima de tudo eu quis te proteger.

- Como tinha tanta certeza que eu não aceitaria?

- Como você reagiria se soubesse que toda a esperança de Eldarya está em suas mãos e que você é a última Cristaly viva? Teria aceitado? - Lua ficou estática. Era a última Fada do Cristal? Seus ombros pareciam estar sobre um peso enorme, queria fugir dali e voltar para casa. Estava cansada de tudo.... Miiko tinha razão. Não teria aceitado, nem sabia se aceitava agora.

Mas algo não estava certo.

- Leiftan não é o culpado. - comentou olhando para cada um dos presentes. Seus olhos pousaram em Ezarel por alguns segundos à mais. - Ele apenas quis me proteger, me contou sobre minha vó e o preço que pagou pela minha segurança. Não posso aceitar que o machuquem, não depois de tudo o que ele fez por mim.

- Eu entendo que deve estar grata, vocês eram bons amigos. Mas ele traiu a Guarda de Eel, atacou Manzana e matou muitas pessoas. Leiftan deve pagar com a própria vida pelos crimes que cometeu.

- Não foi ele quem fez todas essas coisas, existe outros Norlans. O verdadeiro Senhor das Trevas ainda está por ai. - a moça voltou-se para Miiko até estar bem próxima de sua face. Sua voz saiu ameaçadora, num sussurro firme e feroz. - Não vou permitir que façam mal a ele, se Leiftan sofrer algum dano eu me tornarei inimiga de todos vocês. Pense bem nas suas próximas ações.

O silêncio preencheu novamente a sala, Lua não esperou mais nenhum pronunciamento. Estava cansada. Muito cansada. Se mostrava forte mais queria apenas chorar e fugir, não sabia mais quem era nem o que faria. De algum modo as coisas perderam o sentido. A kitsune voltou a falar, desta vez com suavidade.

- A Lua Cheia chegara em quatro dias, o feitiço só podera ser realizado por você. Decida o que vai fazer e independente de sua escolha eu aceitarei. Assim como todos aqui.

Nevra, Valkyon e Ezarel não se moveram. Cada um sofria internamente, fosse pela situação da amiga, a mentira ou a perda de Leiftan. Até mesmo Ciel que estava presente divagava em pensamentos.

- Não sei se consigo, me desculpem. - baixando a cabeça a jovem se encaminhou para fora em passos lentos. Antes que chegasse a porta sentiu alguém agarrar seu braço com gentileza, ao virar-se notou o olhar abatido de Ezarel. Ele não olhava em seus olhos mas parecia querer dizer algo. - Eu preciso ficar sozinha...

Desfazendo-se de seu aperto caminhou para longe dali. Queria sentir paz nem que fosse por poucos segundos. 

Longe de todos. Longe de si mesma.

***

A cerejeira parecia fúnebre sobre o céu cinzento, as cores pareciam perder a vida sobre sua visão. Faerys voltavam para a casa devido a tempestade que se formava esvaziando completamente as ruas, contudo, a garota de cabelos brancos permanecia imóvel. Nem sabia quanto tempo estava ali observando as pétalas rosadas que voavam com o vento, deitada com a cabeça escostada em Ártemis parecia fazer parte da paisagem. Surpreendentemente ninguém viera lhe incomodar, talvez fosse melhor assim. Ficar sozinha a fazia refletir.

- Por que a minha avó não me disse a verdade? Se ela tivesse me contado eu teria me preparado bem antes... Será que devo arriscar a minha vida para salvá-los?

- Se seu coração desejar isso. - a faeliana olhou para o lado notando Chrome a observando. O garoto tinha um sorriso nos lábios, como se lutasse para não provocá-la. A moça permaneceu inexpressiva.

- Pensei que era Karenn que gostava de observar os outros. 

- Eu só faço isso com meus amigos. Considere uma honra. - percebendo o silêncio da mesma o garoto suspirou, antes de acariciar o focinho da Danalasm. - Eu posso lhe fazer companhia? - Lua assentiu, permitindo que ele se deitasse ao seu lado. Ártemis relaxou, não estava acostumada com outras pessoas lhe tocando. - Eu soube de tudo. Como você está?

- Me sentindo sozinha. Quero desaparecer, apenas voltar para casa.

- Aqui é sua casa. - sorriu o lobo, embora sentisse tristeza por ela.

- Pensei que fosse, mas acho que estou mudando de idéia. Não sei mais o que é verdade nem o que é mentira. Não sei mais em quem acreditar, nem sei quem eu sou realmente.

- Sabe o que eu acho? - ela virou-se olhando em seus olhos alaranjados. - Você é uma garota muito legal, decidida, bondosa, bonita e cheia de sonhos. Se sentir que deve ficar então fique, se desejar partir então parta. Ninguém é dono de você.

- Chrome... Estou com medo... - lágrimas deslizaram sobre sua face antes que pudesse segurá-las. Mesmo sendo tão jovem o garoto sabia o que dizer, era tudo o que precisava ouvir antes de soltar toda a mágoa que sentia. O mesmo observou as orbes azuis que brilhavam turvadas de lágrimas antes de beijar sua testa. A garota ficou surpresa.

- Não importa o que aconteça eu continuarei sendo seu amigo, está bem?

- Não entendo. O que... - não houve tempo para terminar a frase, uma figura alta e esbelta se aproximou timidamente. - Ciel?

- Desculpe atrapalhar a conversa, mas eu precisava falar com você. - a moça sentou-se limpando os vestígios de lágrimas restantes. Chrome se levantou rapidamente, limpando as roupas.

- Eu vou deixá-los, preciso mesmo falar com Karenn. - o menino caminhou em passos rápidos desaparecendo tão depressa quanto chegara. Lua ajeitou uma mecha atrás da orelha esperando que o soldado começasse a falar.

- Imagino pelo que esteja passando. Tudo o que você sofreu e fez, tudo foi para descobrir a verdade. Se eu soubesse da sua história eu contaria, infelizmente sou apenas um subordinado da Obsidiana. - o rapaz se ajoelhou diante dela pegando em suas mãos. - Sinto muito.

- Você não fez nada, eu que acusei você sem motivo e o ataquei. Me desculpe, deveria ter falado contigo antes.

- Mas tudo valeu a pena, não? Você descobriu algo que ninguém nunca saberia. Quem diria que o traidor estava bem debaixo do nosso nariz? Leiftan foi esperto e sagaz, as pessoas sabem fingir o que não são. - Lua se assustou quando o soldado a beijou perigosamente perto dos lábios, um arrepio gélido percorreu todo o seu corpo. - Faça sempre o que deve ser feito.

Ciel sorriu gentilmente antes de se afastar, sabia que ela precisava de um momento sozinha. Despedindo-se a deixou sem antes perceber a Danalasm inquieta com sua aproximação. Seu sorriso se desfez.

Atordoada com tudo que ouvira, Lua permaneceu sentada levando ambas as mãos até a cabeça. A última frase de Ciel ecoava em sua mente.

Sabia o que deveria ser feito.

(***)

Quatro dias depois...

Toda a Fortaleza de Eel estava num alvoroço completo, a Lua Cheia finalmente chegara e com ela a decisão da Cristaly em realizar o feitiço de Encantia. Durante os quatro dias que passaram a faeliana quase não foi vista, a verdade é que evitava a todos principalmente Ezarel, que quase não saiu do Laboratório. No final a mesma revelara sua decisão em realizar o feitiço causando um verdadeiro caos, Miiko deu instruções de como manejar a pedra, contudo, o lado "perigoso" foi totalmente oculto.

Lua sabia dos riscos que correria. Faria isso por eles, pois seu coração jamais deixaria de ser misericordioso.

Ainda sim, era notável que a alegria não era mais uma companhia frequente em sua vida. Sua expressão era sempre melancólica, era difícil ver um sorriso em seus lábios. A verdade é que não havia muitos motivos para se alegrar, grande parte das pessoas que considerava "amigas" haviam se afastado, incluindo Nevra e Valkyon que nunca se aproximavam. Havia também a dor de perder Leiftan, a decisão que o conselho tomara era que se o mesmo pisasse novamente no QG seria preso e condenado. Já Ezarel? Não o via desde aquele dia na Sala do Cristal, ambos se evitavam ao máximo. Muitos cochichavam que o amor deles estava morrendo.

Isso se existisse de verdade.

A jovem olhou-se novamente no espelho ajeitando os últimos detalhes, estava vestindo um lindo traje de véus brancos que a decoravam em graça e delicadeza. Os cabelos enfeitados com lírios e rosas brancas permaneciam comportados no penteado trabalhado que Madame Purriry fizera. Realmente estava linda. A imagem perfeita de uma fada bondosa e de coração nobre. Pelo menos era a imagem que passava aos outros...

Uma batida na porta a tirou de seus pensamentos, ao abrir a porta do quarto foi tomada pela surpresa.

- Ezarel? - murmurou de olhos arregalados. O elfo a olhou de cima a baixo encantado com sua formosura, estava perfeita ao seus olhos.

- Queria vê-la antes de começar o ritual. E também... trazer isso. - a jovem abriu a boca sem nada dizer ao vê-lo retirar do bolso um simples anel de prata. - Não estou te pedindo em casamento ainda, mas gostaria que ficasse como lembrete de minhas reais intenções. Quando tudo isso acabar podemos partir se desejar, morar em outro lugar, construir uma família do tamanho que quiser. Mais por favor, eu desejo que não passe de três filhos. 

Um sorriso foi solto por ele que logo o desfez ao ver que a moça estava muda e sem esboçar qualquer reação. Ezarel tocou gentilmente em seu rosto, antes de arrumar uma flor do seu cabelo. O silêncio estava o torturando.

- Pelo amor do Oráculo, diz algo antes que eu...

O alquimista de cabelos azuis foi interrompido de maneira súbita ao ser puxado contra a albina que o calou num beijo surpreendente. Ezarel ficou estático ao sentir as mãos trêmulas dela apertarem sua jaqueta. Antes que tivesse tempo de sequer raciocinar a mesma se afastou o encarando profundamente, a intensidade das orbes azuis era assustador.

- Ezarel, eu te amo. Você é o único no qual eu já amei, por favor nunca se esqueça disso.

O elfo não compreendeu o desespero que ela demonstrava, muito menos quando a mesma o deixou para trás caminhando em direção ao local da realização do feitiço em passos rápidos. Não compreendia nem mesmo o real significado dessas palavras.

O anel solitário continuou cintilando em sua mão. 

***

O local indicado era o Quiosque Central, todos os moradores da Fortaleza estavam presentes. Era notável a inquietação de cada um, Miiko e os líderes mantinham a ordem e a segurança da pedra Europa que descansava suavimente encima de uma coluna cinza do tamanho de uma criança de cinco anos a espera da Escolhida. Murmúrios começaram a se espalhar quando a figura encantadora de Lua se aproximou, banhada de formosura se aproximou da coluna lembrando de tudo o que aprendera. Estava quase na hora.

- Povo de Eel! - anunciou Miiko atraindo a atenção de todos. - Como todos sabem a ameaça do Senhor das Trevas voltou a nos assombrar, a terrível guerra que tirou a vida de tantos companheiros está novamente a nossa espera. Mas hoje, de acordo com a profecia, a última Fada do Cristal decidiu realizar o feitiço que nos protegera dessa ameaça. Uma barreira mágica capaz de aguentar os mais fortes ataques. Lua por si mesma aceitou nos proteger, devemos nossas vidas a ela. 

Aplausos foram dados juntos com gritos de aprovação. Lua se aproximou da pedra sem modificar a expressão desprovida de qualquer sentimento. Era impossível saber o que se passava em sua cabeça. O astro noturno alcançou o ponto mais alto do céu e no mesmo instante uma luz avermelhada tomou conta de Europa como fogo vivo. 

Chegara a hora.

Levando ambas as mãos até a pedra a jovem murmurou algumas palavras percebendo que Ezarel estava logo a sua frente com um olhar desesperado. Sabia o motivo. Leiftan lhe avisara, se falhasse, morreria. Imediatamente uma aura azul envolveu seu corpo fazendo os véus brancos esvoaçarem, seus olhos esbranquiçaram completamente tanto como íris e escleróticas assustando muitos faerys. Chamas bailaram em círculo em tons vermelhos, azuis e brancos num movimento sobrenatural que a cercava.

Lua se concentrou profundamente na pedra liberando todo o poder que continha. Seu corpo começou a tremer em espasmos perturbadores e logo não conseguia mais ouvir nenhum som. Sua mente começou a perder a noção antes de uma dor laciva se alastrar em cada pedaço de pele. Era como se cada veia de seu corpo estivesse sendo rasgada ao meio.

Lua gritou. Era horrível. Cem vezes pior do que passara no lago Pandora.

Do lado de fora do círculo todos estavam apreensivos. Não dava para destinguir a imagem da moça devido as chamas bailantes, muito menos ouvir os gritos da mesma. Ezarel estava quase entrando em estado de loucura, a preocupação era sufocante. Miiko o olhou de soslaio franzindo a testa. Esperava ao menos que ela sobrevivesse.

A garota gritou o mais alto que pode quando sentiu uma quantidade absurda de energia deixar seu corpo indo em direção a pedra que começou a esquentar de maneira rápida. Era como se sugassem cada gota de vida. As palmas de suas mãos começaram a doer devido ao calor de Europa que agora queimava como fogo. Seus dedos doiam em disputa com seu corpo, onde cada veia brilhava em um tom azul despertando todo o poder do maana interior. A garota desejou até mesmo morrer apenas para acabar com todo o sofrimento que sentia.

Estava fazendo por eles. Estava fazendo por eles.

As pessoas sabem fingir o que não são.

Sua mente clareou de repente num turbilhão de emoções fazendo a dor diminuir. Essa frase, essa voz. Mais como? 

Quem diria que o traidor estava bem debaixo do nosso nariz?

Seu coração disparou dentro do peito. O azul de seus olhos voltou ao normal apenas para se arregalar em espanto. A dor sumira completamente. Não era possível. Não podia ser.

A verdade estava diante de si o tempo todo.

Tudo o que passara retornou em sua mente como um filme. Cada detalhe não analisado, cada encontro, cada palavra dita. Como não percebera? O culpado estava ao seu lado o tempo todo fingindo ser outro alguém.

Sua mente paralisou ao ver a multidão de faerys diante de si. Conseguia ver todos. Menos ele. O único que faltava. O verdadeiro traidor da guarda.

As chamas coloridas se apagaram desfazendo o círculo brilhante. Uma luz vermelha inundou Europa fazendo a jovem retirar as mãos dela imediatamente, em questões de segundos a pedra explodiu em milhões de pedaços fazendo todos se protegerem das minúsculas partes que se espalhavam furiosamente antes de sumirem numa fumaça perfurmada. 

Tudo ficou em silêncio até Miiko avançar contra Lua agarrando-a violentamente pelos ombros.

- O QUE VOCÊ FEZ?!

A faeliana não respondeu. Empurrando-a para longe de si correu para o QG rasgando os véus que a adornavam. Faerys abriam espaço a medida que corria na multição. Todos estavam em estado de choque. Ezarel gritou seu nome.

Ao alcançar o Quartel que permanecia vazio a moça correu até as Forjas notando a escuridão que banhava quase todo o ambiente. A porta se fechou num estrondo. Lua estava ofegante mas tomada por uma fúria assassina. Ele estava ali. Conseguia sentir.

- Você realmente é esperta, não é mesmo minha adorada dama? Pena que percebeu tão tarde. - a voz debochada irritou-a ainda mais fazendo-na cerrar os punhos. Seu corpo estava em chamas.

- Eu fui uma idiota em não perceber que o traidor estava diante de mim o tempo todo, ocultado pela própria mentira. Mas as pessoas sabem fingir o que não são, não é mesmo Senhor das Trevas? Ou será que devo dizer... Ciel?

A figura sorridente do soldado saiu da escuridão trajado na conhecida armadura preta e vermelha. A única diferença era que os olhos estavam banhados em sangue em vez de castanhos. Lua não se moveu.

Agora eram apenas ele e ela.