História Indesejada - Deixando as portas se abrirem

Um barulho na fechadura da minha porta fez com que eu acordasse, sentei enquanto observava a maçaneta se mexer. Eu tranquei a porta no dia anterior? Não me lembrava. Me coloquei de pé e fui até a porta cautelosamente, no instante em que coloquei a mão na maçaneta a porta se abriu subitamente me jogando sentada no chão.

—Elizy? – a voz familiar me chamou.

Ergui a cabeça para a voz infantil e familiar do garoto que estava parado em minha frente me olhando com preocupação.

—Eu te assustei não foi? –o garoto perguntou baixinho – Eu não sabia que já estava acordada. –ele sorriu e me colocou de pé gentilmente.

Algo estava diferente sobre aquela situação, sim, com toda certeza algo estava diferente.

—O que foi? Você parece estranha... Se machucou em algum lugar? –o garoto perguntou apalpando meus membros.

Estendi minha mão e toquei o cabelo do garoto.

—Kaius. –chamei-o.

—Hum? O que foi? –ele olhou para mim com um sorriso no rosto.

O cabelo macio do garoto fazia cócegas em meus dedos, eu sorri com a sensação. Espera. Alguma coisa estava errada. Olhei para minha mão no cabelo do garoto tentando entender o que estava me incomodando, continuava sentindo o seu cabelo macio em minha mão... Era isso! Eu estava sentindo aquilo de verdade! Olhei para minha perna que supostamente havia sido machucada no dia anterior e ela estava intacta.

—Elizy, você está me deixando preocupado de verdade.

Claro que estava estranho, eu só me lembro das coisas... Por que dessa vez estou sentindo?  Isso é uma lembrança também? Eu posso falar o que quiser? Se for isso então posso descobrir o que aconteceu.

—O que você está fazendo aqui?

—Você está chateada comigo, não é? Desculpe por não ter vindo antes, eu realmente tentei mas a porta estava trancada e é difícil abrir... Eu trouxe comida pra você. –o garoto disse tirando um monte de potes da mochila que estava usando.

—Isso tudo é pra mim?

O garoto parecia se divertir com minha reação de surpresa.

—Claro que é.

Apenas quando comecei a comer que percebi que estava faminta, parecia que não comia por dias ou talvez semanas.

—Elizy, por quanto tempo está trancada aqui?

—Trancada? –perguntei abaixando a colher e olhando em volta.

O lugar que eu estava... Era meu quarto, era o sótão da casa da minha tia.

Me sentei na cama ainda sonolenta, alguém estava batendo em minha porta, tentei me levantar imediatamente mas a dor em minha perna me impediu fazendo com que me sentasse na cama novamente. Eu estava de volta ao meu quarto na faculdade, fiz um esforço e me coloquei de pé.

—Stela. –falei abrindo a porta e vendo os olhos castanhos da garota atrás dos seus óculos.

—Me perdoe por tudo que eu fiz com você. –ela disse se ajoelhando na minha frente.

—Ei, o que você está fazendo? –perguntei tentando colocá-la de pé.

—Não, Elizy, eu sinceramente fiz coisas muito ruins com você, desculpe.

—E me ajudou também, obrigada.

—Elizy... Mesmo depois de tudo que eu fiz você me agradece?

—Você me ajudou então eu te agradeço.

A garota se colocou de pé e me abraçou.

—Obrigada Elizy, eu prometo que vou fazer de tudo para merecer sua amizade novamente, eu prometo! –ela disse com os olhos cheios de lágrimas –Ah, Kaius está te procurando, vamos, vou te ajudar.

Com a ajuda de Stela cheguei até uma sala onde Kaius já nos esperava na porta.

—Desculpe por não ir te buscar, eu tinha que manter o olho nessas garotas aqui. –ele apontou para a porta da sala.

Pelo vidro da porta vi sentadas no final da sala as três garotas que encurralaram Stela no dia anterior.

—O que você está pensando em fazer Kaius?

Ele sorriu de forma travessa.

—Fique junto com a Stela. –disse e abriu a porta da sala.

Todos olharam surpresos para Kaius, as três garotas no fundo da sala se levantaram.

—Vocês três que estavam brigando ontem, não é? –Kaius perguntou em tom severo.

—E daí? –uma delas perguntou.

—Quero falar com vocês.

As garotas se entreolharam e vieram em nossa direção, Stela se encolheu ao meu lado.

—Ah, vocês duas estão aqui. –a líder fez uma cara feia.

—Elas vieram porque vocês as humilharam e também machucaram a Elizabeth.

—E daí que fizemos isso? Vocês não podem fazer nada com a gente.

Kaius soltou uma gargalhada e olhou para as três.

—Se não fossem mulheres eu quebraria vocês bem aqui, tão irritantes... –ele passou a mão em seu queixo e sua expressão se suavizou – Mas por outro lado também são muito burras... Com quem vocês acham que mexeram?

Elas pareciam tensas, a líder forçou um sorriso e enfrentou Kaius.

—Com uma porca e uma louca. –ela apontou para Stela e para mim respectivamente.

—Vocês mexeram com a amiga da minha namorada e a minha namorada. –ele disse com firmeza.

Stela me olhou surpresa, cobri meu rosto me sentindo envergonhada.

QUANDO ENTRAMOS NESSE ACORDO DE NAMORO?

—Kaius! –alguém gritou atrás de nós.

—Matt? –olhei confusa para o garoto que vinha pelo corredor com um homem mais velho ao seu lado.

As garotas que antes forçavam um sorriso no rosto agora observavam meu amigo se aproximar com uma expressão apavorada no rosto.

—Stela, o que está acontecendo com elas?

—Acontece que aquele é o diretor. –ela disse olhando para o homem ao lado de Matt.

—É o que?

—Elizabeth! –Matt se aproximou de mim e apertou a minha bochecha.

Fiquei parada sem reação, o homem ao lado do meu amigo sorriu amigavelmente para mim.

—Essa é a sua amiga? –ele perguntou.

Matt segurou meu ombro e deu um sorriso para o diretor.

—Oh, é sim. Essa é a Elizabeth.

—Ouvi muito falar de você. –o diretor disse apertando minha mão.

—De mim?

—Ah, Elizabeth esse é meu pai. –Matt disse com um sorriso despreocupado no rosto.

Um “O QUE?” ficou preso em minha garganta enquanto olhava o homem boquiaberta.

—Então qual é o problema? –o pai de Matt perguntou se virando para ele.

—Veja bem, essas garotas andam implicando com a Elizabeth e sua amiga... Eu sei que nenhuma dessas duas procuraria confusão, pai. Ontem encurralaram a amiga dela e jogaram lama nela, em seguida cortaram o cabelo da Elizabeth e a golpearam na perna com uma tesoura.

O diretor olhou sério para as três garotas e voltou seu olhar para mim.

—Você já cuidou dessa perna? –ele me perguntou.

—Sim.

—Ótimo, não descuide da sua saúde.

—Sim, senhor.

—Vocês três, venham comigo. –ordenou.

As três garotas o seguiram cabisbaixas.

—Desculpe Elizabeth, eu devo ter te assustado. –Matt disse me ajudando a sentar em seu sofá.

Sherlock simplesmente levantou sua cabeça sem se incomodar com as visitas que haviam acabado de chegar.

—É claro, eu achava que você limpava a escola! –falei ainda chocada com a revelação de alguns minutos atrás.

—Eu tentei te dizer antes. –Matt entregou um copo de água para mim e para Stela que estava sentada ao meu lado.

—Obrigada. –a garota disse timidamente.

—Você nunca tentou me contar nada.

—Eu tentei sim mas você resolveu sair correndo feito uma louca para salvar o Sherlock.

—Esse cachorro é seu Elizy? –Stela perguntou.

—Sim. Mas você continuou aparecendo na sala todos os dias fingindo limpar lá, por que não me disse logo de cara?

—Porque eu estava gostando de conversar com você e não queria que ficasse tensa porque sou filho do diretor.

Nos encaramos sérios, se essa fosse uma cena de anime faíscas sairiam dos nossos olhos agora.

—Ér... Por acaso você gosta da Elizabeth? –minha amiga perguntou quebrando o silêncio.

—Claro que eu gosto. –Matt respondeu sem hesitar.

Soltei um soluço.

—Elizabeth é como uma irmã mais velha pra mim. –ele completou.

—Entendi.

—Ah, em falar nisso eu fiz uma coisa para você. –ele sorriu para mim e sumiu no corredor.

—Qual seu problema fazendo uma pergunta embaraçosa dessas? –perguntei empurrando Stela.

—Qual o problema? Ele apareceu feito um príncipe lá e se livrou daquelas garotas pra você, achei que ele estivesse gostando de você pra valer.

Matt apareceu novamente na sala e me ajudou a ficar de pé.

—It’s a surprise. –ele disse passando a mão sobre meus olhos para que os fechasse.

Matt me guiou até um dos quartos e então me disse para abrir os olhos. Um manequim com uma roupa maravilhosa estava em minha frente, me aproximei lentamente e toquei o tecido do colete.

—Matt você fez isso?

—Sim. –ele respondeu com um sorriso no rosto – Eu disse que faria. Você gostou?

—Lógico que eu gostei, é tão único... Eu realmente gostei das cores.

—Quer experimentar?

Me olhei no espelho e parecia totalmente diferente, a roupa valorizava o meu corpo mesmo eu não tendo muitas curvas, era delicado e ao mesmo tempo ousado.

—Elizabeth? Já vestiu? –ouvi alguém perguntar do outro lado da porta.

—Ah, sim. –respondi e a porta se abriu revelando meus dois amigos parados me observando.

—Ficou perfeito. É exatamente o meu tamanho... Espera, como você sabia o meu tamanho?

Ele sorriu e segurou meus ombros me mantendo de pé na frente do espelho.

—Fiquei muito feliz em saber que você resolveu me ouvir e cantar em público, vou te ajudar no que eu puder.

—Matt...

—Que tal se eu te arrumar para sua apresentação de hoje?

Olhei para o reflexo do meu amigo atrás de mim com um sorriso doce no rosto. Eu tinha pessoas que me apoiavam em meu sonho, me sentia segura e aquecida por todo cuidado que recebia de todos.

—Aceita logo Elizy. –minha amiga disse parando ao meu lado e sorrindo para o espelho também.

—Tudo bem, vamos fazer isso.–concordei decidida.