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História Invictus - Im gonna tell you a secret.


Escrita por: cyprian

Notas do Autor


=D

Capítulo 9 - Im gonna tell you a secret.


25 de julho, quarta-feira.

ANSE ROYALE, ILHA MAHÉ,

SEYCHELLES

Pegamos uma conexão até Kankan em Guiné, e após isso até Anse Royale, e um dia e meio depois estávamos do outro lado do mundo.

O avião parou em um pequeno aeroporto no centro de uma cidade, longe da ilha do qual temos que ir. Já se passava das seis horas da noite, então tivemos que comprar uma viagem de barco que acontece a cada uma hora a partir das nove horas da manhã. 

A viagem até a ilha demorava mais ou menos uma hora, então não demoramos muito a chegar até lá. Assim que aconteceu fomos achar um lugar para dormimos e por sorte não precisamos procurar muito. O barco se atracava a uma balsa gigante que aparentemente dá um centro comercial, observei muitas fachadas de loja estendendo-se através da rua asfaltada, mas o que mais me chamava a atenção era a placa gigante indicando o vilarejo a dentro. É lá que a Nia está, porém, no momento...

— Não temos quartos sobrando — a mulher falou, e eu olhei-a indignada. Seychelles tem três línguas oficiais, porém, definitivamente, essa senhora asiática não é daqui, pois seu inglês é arrastado, bem carregado e eu tenho a sensação que ela acha que sou idiota.

— Você acabou de dizer que tem quartos disponíveis — repliquei, fincando os dentes no meu lábio inferior.

— Solteiro não — ela balançou as mãos em frente do corpo, gritando em coreano por cima do ombro, aonde tem um homem.

— Então? — Indaguei, e ela apontou na direção da tela do computador.

— Casal. Quarto espaçoso. Suíte, hã? — Ela indicou o queixo o Justin e eu respirei fundo. Eu não falo coreano, mas tenho certeza que o que ela gritou anteriormente foi algo como “Só estou vendendo um quarto mais caro para uns turistas idiotas, se vire aí.”

— Não somos um casal. — Digo, tentando novamente. — Por favor, você pode ver novamente se tem dois quartos de solteiro disponíveis?

— No, no, no. Não tem. Só suíte. — Eu olhei para o Justin, que parecia mais interessado em um vendedor de peixes do lado de fora do que em qualquer outra coisa, e respirei profundamente.

— Você tem certeza?

— Sim, sim, sim. — Pesei minhas opções, à medida que ela está me enrolando. Podemos tentar procurar outro lugar, mas está tão tarde e eu honestamente só quero dormir, no entanto, suítes e principalmente aqui, tão perto da balsa são caras, mas, provavelmente o Justin ficará completamente consternado em dividir o quarto, e eu não quero passar por uma situação constrangedora. Mas não tenho escolha.

— Ok. Me dá a suíte — cedo, derrotada. — E olha, naneun hangug-eoleul moshabnida, mas sei que está me enrolando.

A bruxa me deu um sorrisinho cínico, e me entregou a chave do quarto.

Balancei na direção do Justin para que ele viesse, e ele assim o fez.

— Péssima notícia, fui claramente enganada e teremos que dividir o mesmo quarto, porém se quiser reclamar, vai lá. — Falei, colocando a chave em sua mão, enquanto adentrava o elevador.

Mas o Justin, não, o Justin não foi discutir, o que ocasionou em nós dois subirmos para a suíte, e pelo menos, ela valia o preço que cobravam.       

— Olha, eu vou... — Eu me virei imediatamente para ele, negando, à medida que retirava os óculos e jogava a bolsa no chão.

— Você não precisa, a não ser que queira muito. — Falei, vendo o seu juntar de sobrancelhas. Esfreguei minhas têmporas, essa é exatamente a situação que eu queria evitar.

— Aslo...

— Justin, eu entendo um não — gesticulo com as mãos, nervosa. — E vou respeitar o que você pediu, eu juro.

Juntei minhas mãos em frente ao corpo, olhando o chão.

— Eu... eu tenho dificuldade em confrontar as pessoas, entende? Mesmo que seja sobre algo que eu quero. — Apertei os meus olhos, tentando inutilmente me concentrar.  — Então não se preocupe, não é não.

Por mais frustrante que isso seja para mim.

E está sendo.

Trinco os dentes.

Subo o meu olhar, e vejo-o balançando a cabeça, pois ele também não me encara.

— Ok, mas eu posso dormir no sofá — dou uma risada nervosa.

— A cama é definitivamente melhor, porém faça o que quiser. — Digo, quero desesperadamente sair dessa situação. — Agora, quer tirar no jokenpô quem vai tomar banho primeiro?

— Não, porque você sempre rouba.

— Como isso é possível? — Ele apontou para mim.

— Eu vou primeiro.

Lhe dei um sorriso, e concordei.

Arrastei as malas para o canto do quarto, e em seguida a isso liguei a televisão, deixando que o barulho repercutisse pelo cômodo. Após isso segui para a varanda, olhando a rua movimentada, o mar que se estende longamente a frente, e as palmeiras que circundam a ilha. Eu nem indaguei ao Brazen, porém será que a casa que a Nia está é de sua família?

Olhei para baixo, observando um vendedor de peixe, o mesmo que o Justin falava anteriormente, ele parece assistir algo em uma pequena tela, enquanto limpa um peixe. Multitarefas. O mesmo sobe o olhar rapidamente, olhando para os lados, em seguida olha novamente para tela, sinalizando com a cabeça. Acompanho o movimento, fitando um homem do outro lado da rua; um dos responsáveis por tirar e trazer pessoas da ilha, um dos condutores dos barcos, que também concorda com a cabeça. Não sei se é um cumprimento, contudo fico observando esses movimentos que parecerem se repetir durante toda a rua, como se fossem vigias, porém de que exatamente?

Neguei com a cabeça, e puxei a janela, junto com as cortinas, é melhor eu pedir o jantar, está incluso no pacote. Por ventura, Justin demorou bastante no banho, então eu já estava comendo quando ele saiu. O mesmo parece exausto, e com certeza deve estar, foi uma viagem bem longa até aqui. Justin se arrastou até mim, enquanto secava os fios loiros com uma toalha.

— Você pode dormir na cama, é bem mais confortável — proclamei o óbvio, e ele soltou uma risada afetada, sentando-se ao meu lado.

— Aslo, vou ceder só uma vez, mas não se acostuma. — Empurrei o carrinho de comida para ele, e saltei da cama. — O que temos?

— Uma comida local, saudável... — Digo, sorrindo.

— Você odiou, não é? O que é? — O mesmo abriu, olhando. — Hmm, parece bom, é molho de peixe. Você não gosta?

Dei um sorriso.

— Divirta-se! — Desejei, e corri para o banheiro.

Tomei um banho breve, à medida que estava cansada, então logo saí, apagando as luzes pelo caminho, embora, Justin ainda estivesse bem acordado, assistindo qualquer coisa na televisão que não prestei atenção. Deitei-me ao seu lado na cama, puxando os cobertores até mim.

— Bona nit, Justin.

Ouvi-lo recitar a saudação baixinho, antes de adormecer.

Acordei no outro dia tarde, muito tarde, concluí isso assim que abri os olhos e vi um recadinho do Justin no criado-mudo, dizendo “Não quis te acordar, respire fundo e tome um bom café, vamos ter uma conversa com nossos irmãos mais tarde. Te encontro na balsa, xoxo.” Respirei fundo, depois fiquei com raiva, enquanto ia tomar um banho, porém, segui o conselho, fui tomar um café reforçado e por favor, sem gordura. Adentrei uma cafeteria próximo da pousada, e fiquei feliz por encontrar pães e cafés para começar.

Após isso fui para a balsa, aguardar o Justin, meu celular está totalmente fora de cobertura nessa ilha, e notei que nesse lugar é aparentemente remoto a tecnologia, eles ainda têm lan houses, e algo parecido para telefonemas para outros países. Que tipo de ilha Anse Royale, é? Falei a mim mesma que descobriria quando terminasse o meu assunto pertinente antes.

Justin me encontrou minutos depois, tocando minha cintura e me girando.

— Contratei um carro, tudo bem? — Concordei. — Está pronta?

Dei-lhe um sorriso irritado.

Não precisamos andar muito para achar a locadora, e depois adentramos o carro rapidamente, partindo para o vilarejo. Coloquei o endereço no GPS, no entanto, o aparelho parecia ter dificuldade em nos ajudar, porque não conseguia encontrar. Isso deu um nó no meu estômago, e respirei profundamente, tentando conter. À medida que mais nos afastávamos do centro, encontrávamos pessoas e grandes propriedades eram vistas, e pequenos comércios também. Perguntamos a cada pessoa que podíamos como chegar no endereço, e o que me pareceu duas horas depois, finalmente um senhor deu um caminho concreto. Avistamos uma longa ladeira, muitas árvores e uma propriedade gigante, assim como alguns comércios, que pareciam ter em abundância por aqui. Concluímos que era uma pequena comunidade afastada do centro. Porém no fim, a busca terminou, e paramos em frente a um grande portão branco, os muros são baixos, então tudo é visível, as muitas árvores ao redor da casa, que parece dar a uma floresta, o mar que fica na frente da casa, e um tipo de casa na árvore, bem estilo americana.

Descemos do carro, pois o portão parece estar trancado.

— O que fazemos? — Suspirei.

— Pulamos. — Falei, indo até o muro, e me içando para cima.

— Aslo, querida, isso é uma péssima ideia, invasão a domicilio, e somos turistas... — Deixei-o falando para trás e pulei para o outro lado. A grama é verde, bem verde.

Caminhei rapidamente em direção a porta de entrada, e apertei a campainha que funciona. Apertei, apertei, apertei, com força e com raiva, sentindo minha ansiedade me esmagar. Precisei puxar o ar com força, sentindo minha garganta fechada.

Atende.

Rosnei entre dentes, até que algo aconteceu.

A porta se abriu. Nia apareceu.

Seus olhos arregalaram rapidamente, e com minhas mãos eu quis enforcá-la, contudo, contive-me, observando-a melhor.

Ela está tão magrela como sempre, os grandes olhos azuis estão arregalados, e um pano de prato está no ombro, ela parece diferente, brilhante, alegre, definitivamente assustada, mas alegre.

— Penn, o que está fazendo aqui? — Ela parece surpresa.

Eu ergo minhas mãos, agora posso esganá-la.

— Oh, você não resolve as coisas com violência! — Ela disse, assim que segurei o seu pescoço.

— Vou abrir uma exceção para você! — Rangi com raiva.

— Penn! — Segurei a pele fina do seu pescoço, porém Justin me pegou por trás, puxando-me para longe.

— Calma, violência não resolve — ele disse, enquanto eu rosnava como um cachorro.

— Eu deveria te quebrar inteira! Você sabe o que eu tive que passar? Sabe como me senti quando sua amiga ligou dizendo que tinha desaparecido? Não, não é? Porque você não pensa em nada, é uma irresponsável, Nívia! E é a pior irmã do mundo, como pode?

— Olha, eu sei que está chateada, mas não tem o direito de...

— Me deixou sozinha com ela! Literalmente, você desapareceu, me deixou. Eu tenho todo o direito.  Confiei em você a vida toda achando que era minha amiga, mas você só estava sendo o bode expiatório da mamãe. — Ladrei, furiosa. — Você sabia que eu era adotada, não sabia?

Indaguei a pergunta que pulsava dentro de mim, ruidosamente.

— Diga! — Exigi.

Ela concordou, acanhada.

— Eu sempre soube, Penn. — Respirei fundo, apertando o meu rosto. — E antes de mais nada, entrem. Vamos conversar.

Ah, definitivamente vamos.

Justin me soltou, e me perguntei, se ele notou as batidas enlouquecidas do meu coração.

Nia foi a frente, guiando o caminho, por ventura, acabou batendo contra uma cômoda que estava no hall, levando ao chão um vaso grande e feio, do qual ela xingou ao vê-lo se espatifar.

— Argh! Vassoura e pá! — A mesma disse, como se falasse consigo mesma, desaparecendo entre os corredores, enquanto eu olhava ao redor, ainda estamos no hall, e por ventura, ele é bem extenso.

Dou alguns passos, fitando uma sala de estar, tem uma TV antiga; de tubo em cima de uma cômoda, um sofá verde-água estende-se em L através da sala, e um canto esquerdo tem uma lareira também antiga, construída em pedras. Fito o chão; de madeira polida. Alguns metros para o lado tem uma porta dupla, as cortinas esvoaçam para trás, à medida que tem um mar a frente.

Eu atravesso a sala, puxando as cortinas para o lado, enquanto observo. Vejo um balanço entre as árvores, um caminho de pedra, uma areia branca e um mar azulado, a grama é tão verde... e o sol brilha forte no céu.

Eu volto para o corredor, fitando em silêncio o Justin que me encara. Não sei dizer o que ele pensa, disse muitas coisas sobre mim para ele, no entanto, não sobre minha paternidade; não é algo que gosto de pensar muito, muito menos contar as pessoas sobre isso.

Nia aparece logo depois, trazendo junto consigo os utensílios para limpar sua própria bagunça.

Ela nos dá um sorriso encorajador enquanto pede que nós acompanhemos para a cozinha.

— Muito bem, vamos começar de novo? Eu sou Nívia, prazer. — A mesma estende a mão na direção do Justin que a pega.

— Justin Bieber.

— Justin, ah... — Ela o olha como se tivesse tido um estralo. — O irmão que estava preso do Nox?

Nossa. Se ela pudesse ver minha expressão, veria meu desagrado.

— Esse mesmo. Sou eu — Justin sorriu simpaticamente, fitando-a. — E falando nele, aonde está?

— No trabalho... Ele só chega às seis, então teremos tempo.

Ela disse animada.

— Sentem-se, vou preparar um café.

Embora eu saiba que meu manjar na cozinha não seja bom, o da minha irmã é deplorável. Tento não fazer careta em beber o seu café amargo, mas não consigo. Justin nem parece notar.

Por via, a mesma começa a se explicar logo, o que me impede de insultá-la do que se trata a suas habilidades culinárias.

Nia começa do princípio, de como conheceu Nox, partindo da parte desesperadora do qual já sabemos; ela engravidou, o que me fez lembrar de olhá-la, nenhuma barriga, o bebê nasceu há dois meses aqui na ilha. Ela acelerou para o que já sabíamos; Knox começou a vender drogas para Chuck a fim de juntar dinheiro para o bebê, mas acabou perdendo uma quantia considerável em uma batida policial e eles resolveram fugir. Eles realmente perambularam atrás do estado, até que o dinheiro se esgotou e eles se viram encurralados, até que Nia teve uma ideia; pedir ajuda a Brazen. Não a mim, não a sua família e sim a um completo desconhecido.  Tive que interrompê-la em determinado momento porque estava com ódio. Como pode ser tão inconsequente? E ela me deu uma resposta malcriada dizendo que é uma adulta e que faz o que bem entende da vida dela.

— Além disso, você não nasceu grudada comigo, não é? — Resmungou raivosamente.

Deixei essa passar. Não entrei no critério que ela está errada, porque ela está, porém considerando que ela fugiu de casa numa noite e me mandou uma carta do outro lado do mundo quinze dias depois, não me surpreende. Nia por mais gentil que seja tem seus momentos egoístas como qualquer outro, e esse é um deles. Não a culpo totalmente, sair de casa não é uma escolha fácil, porém eu só lamento da forma que tudo aconteceu. 

Mas ela não, parecia radiante, enquanto eu perfurava sua cabeça oca com mil e trezentas perguntas sobre o agora.

— E quanto a vacinação?

— Ela tomou. Estamos em uma ilha, não no fim do mundo. — Eu olho para a tela do meu celular, fitando a barra vazia de sinal.

— Pois o fim do mundo é exatamente como parece — digo, me levantando. A casa está extremamente quente. — Aqui não tem ar-condicionado?

— Ter tem, mas a fiação dessa casa é toda estranha, o Nox não conseguiu consertar.

— Legal, mas e agora, Nívia?

— E agora nada, Penelope. Estamos bem, todos bem, e estamos felizes aqui.

— Felizes? Nesse fim de mundo? Sozinhos? Não pode estar falando sério!

— Penn! Aqui é um paraíso, as pessoas vêm aqui para descansar, sabia?

— Você largou a faculdade! Uma vida estável! — A mesma juntou as sobrancelhas, me fazendo um bico.

— É do seu conhecimento que eu nunca quis fazer faculdade de verdade, fiz por pressão.

— Não, idiota, você fez porque precisa ter uma profissão. Você por acaso pretende ficar aqui a vida toda? Sendo dona de casa?

— E que mal há nisso?

— Não há mal algum! Mas não é o futuro que eu imaginei para você! — Eu levo a mão ao pescoço, meu Deus, estou falando como a minha mãe.

— Penn, eu estou feliz agora. — Neguei com a cabeça. — E mesmo que não tenha ocorrido tudo como o planejado, estou bem. Todo mundo está. Aqui é maravilhoso, tranquilo, e tem um hospital e é de graça! E tem uma escola também e...

— Eu não quero saber, Nia. Posso até concordar em você não estudar mais, contudo, você não vai ficar nessa ilha.

Ela estreitou os olhos azuis, me fitando com rebeldia.

— Não vou?

— Não vai — cruzei os meus braços, sentindo o meu rosto ruborizar. Ela me olha como minha mãe; me sinto desconfortável. — Vai voltar comigo para a América ou vai direto para Incles.

Ela riu ruidosamente.

— Isso não vai acontecer, Aslo. — Trinquei os dentes. — Você não manda em mim!

— Essa não é a questão. Sua filha, você, e o Knox não podem ficar aqui, nesse lugar, como se fossem fugitivos, longe de tudo e todos... Nia, eu e o Justin já resolvemos as coisas com o Chuck, então vocês podem voltar e fazer tudo certo.

— Isso não vai acontecer! Não vamos a lugar algum. Estamos bem aqui, entendeu? —  Eu apertei os olhos com força, massageando minhas têmporas, à medida que sentia aquela partezinha minha querendo se encolher.

Quero dizer tudo bem, Nia, faça o que achar melhor, porém não posso.

— Olha, a situação vai ser o seguinte, Nívia, ou volta comigo por bem, ou vai ser por mal. Pessoalmente não me importo, a questão é que você vai. — Me recostei contra o balcão, olhando-a.

Eu não sou do tipo de pessoa violenta; prefiro resolver os meus problemas com conversa, mas minha irmã mais velha não é assim, ela é um pouco temperamental, e por muitas vezes, já me deu uns bons tapas; nunca saímos aos socos; até porque eu só apanhava, mas quando a briga ficava feia a esse nível, eu sabia. E o olhar que ela me dá agora é exatamente esse; um que quer esfregar o meu rosto contra o chão.

— Escuta aqui, Aslo!

— Meninas, meninas, meninas, calma. — Justin se pôs a frente quando ela avançou, a mesma olhou injuriada para ele. — Por favor. Vamos conversar. Cadê o Nox? Todos temos que conversar. Não é viável que vocês fiquem nessa ilha por qualquer motivo que seja. Vocês precisam estar aonde suas famílias estão, principalmente agora que são pais. Além disso, eu não sei o que você pretende fazer com sua vida, mas eu fiz muita coisa para que meu irmão entrasse na faculdade e vou garantir que ele termine, está suficientemente claro?

Ótimo, que bom. Justin ficou quieto até agora, mas que bom que abriu a boca agora estando do lado certo da história.

Nia olhou para ele desacreditada.

— O Nox não vai ouvir você. — Ela murmurou, acanhada.

— Assim veremos. Aonde está? — Nia passou o endereço a ele e Justin disse que voltava logo com seu irmão, pois assim como eu, ele está ansioso para ter uma conversa.

Justin nem tinha atravessado a porta antes dela vir até mim e me derrubar no chão.

— Aí!!!

— Quem você pensa que é para falar assim comigo, hein? — A mesma enlaça o braço ao redor do meu pescoço, com a outra mão dando beliscos em minha cintura. Eu sinto cócegas mais do que qualquer outra coisa.

— Ei, Nia, não, não, não! — Tento me desvencilhar, puxando o seu cabelo, mas o aperto em meu pescoço intensifica e de repente não consigo sair quando ela prende os dois braços. — Aiiii!

Ela puxa os meus fios de cabelo, e meus óculos vai ao chão caindo em um baque oco.

— Aí, aí, desculpa!

— Qual é a sua, hein?

— A minha é ser responsável, já que você não é! Agora me solta! Você está errada!

— Não estou, não! Vai pra casa!

— Eu vou com você. Nia, me solta!!!

— Não, eu não posso ir! A mamãe vai me matar!

— Ela vai fazer isso de qualquer maneira, pois já sabe de tudo. Liguei pra vovó antes de vim para cá para ela dar as notícias!

— ASLOOO!

Porra.

Sinto meu couro cabeludo esquentar e lhe dou cotoveladas na barriga a fim que ela me solte, e ela o faz, por pouco.

— Quer me deixar careca, sua magrela? — Perguntei, me arrastando para longe, enquanto procurava os meus óculos.

— Eu deveria! Sou sua irmã mais velha!

— Então aja como tal! — Disse, fazendo um bico. — Por favor, Nia, vamos embora.

Ela desviou o olhar. Eu suspirei, me sentando contra o chão.

— Você não é tão velha também — a lembro, franzindo o cenho. — E também não é minha irmã de verdade.

— Penn... — Ela me olhou de súbito, os olhos arregalados e eu neguei com a cabeça.

— Você não é. Mas eu quero, eu quero o melhor para você, Nia. Não tem ideia de como foi difícil ficar em casa sem você — dou uma risada, sentindo os meus olhos marejarem.  — Chorei duas semanas inteiras até que me conformasse com sua ida. Foi tudo tão difícil... Senti como se a mamãe tivesse tirado todo o ar da minha bolha e me lacrado com fita isolante. Não conseguia respirar, não conseguia pensar, achei... achei que surtaria.

Apertei bem os olhos, deixando que as lágrimas caíssem.

 — A mamãe me colocou em uma vigilância constante, retirou a porta do meu quarto no primeiro mês da sua fuga, confiscou meus celulares, computadores, tablets... droga! Ela estava no alto da paranoia e eu me sentia tão sozinha, tão solitária, como se nada pudesse aplacar essa sensação.

Sempre me senti solitária em minha própria pele; sozinha na minha mente, mas a Nia, a Nia aplacava isso. Para ela eu não era alguém a ser cuidado, eu era uma âncora, era útil para ouvir seus problemas, para ajudar a resolvê-los.

 — Penn, eu sinto muito... Eu não... Eu não...

— Não, eu não quero desculpas. Eu sei porque você fez isso, eu entendo, eu só... — Respiro fundo tentando limpar minha voz embargada.

— Eu só quero dizer que senti sua falta. Senti muito a sua falta, e não quero ter que me despedir de novo. — Quando noto, seus braços estão ao redor de mim, me apertando.

— Uma pergunta. Greta?

— Tentei compensar as coisas com ela, mas não tem rendição para mim. Ela me odeia, me odeia tanto... Eu não sei como consertar.

— Ela disse que podia?

— Ela disse que eu era a pior irmã do mundo, e que iria morrer afogada em meu próprio ego, e que se isso não me matasse, minha solidão o faria. Ela me fez chorar, e me fez perceber também que eu estava perdendo tempo tentando ser algo que não sou. Não nasci para terminar em uma cidadezinha no meio do nada e ser dona de casa, eu cresci para fazer coisas grandiosas, Nia. Eu tenho algo... algo que pode ajudar as pessoas, e eu quero tentar. Sei que não sou invencível, mas eu preciso tentar.

— A Greta continua cruel como sempre, pelo visto. — Dou uma risada.

— Sim, como sempre. — A mesma beijou minhas bochechas e limpou as minhas lágrimas.

— Como você descobriu? Da adoção?

— Tia Karen — Nia rolou os olhos.

— Intrometida. — Dei de ombros.

— Como você descobriu? — Ela me contou que por acaso, quando assistia uns vídeos de casamento da tia May, e me explicou também que falou com a mamãe e Antonella pediu que ela não contasse e assim ela o fez.

— Me desculpa por te chamar de péssima irmã.

— Desculpada.

— Ótimo — resmunguei, e a mesma se levantou.

— Vem, quero te amostrar uma coisa.

Eu concordei, e abaixei para pegar os meus óculos, notando um fio debaixo do armário, esticando-se através da parede até entrar um pequeno buraco na parede.

Ergui uma sobrancelha, e Nia esticou-me a mão, do qual aceitei.

Subimos escada acima, em direção ao um corredor do qual sei que tem muitos quartos, mas paramos em um do lado esquerdo, com uma plaquinha infantil na porta. Nia abriu a porta e nos adentramos, e assim que andei um pouco, a madeira rangeu, eu olhei para baixo, inspecionando a madeira momentaneamente.

Nia chamou a frente e eu caminhei em direção ao berço, olhando o bebê dormindo lá. Agnes. Minha sobrinha.

— Oi, bebê — saldei, tocando de leve sua barriga. Ela é um bebê bem gorducho, tem bochechas gordas e rosadas, seus braços tem dobras salientes, e o seu rosto me lembra da Nia, não vejo seus olhos, mas sei que ela puxou a mãe. — Nasceu com quantos quilos?

— Quatro e seiscentos — dei uma risada.

— Parabéns — ela me deu língua.

Olhei para a camiseta do bebê, lendo o enunciado. É de um programa infantil dos anos oitenta.

— Nia, aonde conseguiu as roupas de bebê?

— As mulheres aqui da Vila me deram, mas aqui nessa casa tinha caixas cheias de roupas de bebê, de crianças também — desviei o olhar da Agnes para ela.

— E você só pegou?

— Bem, sim. Ninguém está usando, a casa é da propriedade dos Prescott. Além disso, quando chegamos tudo estava aqui, a televisão, a geladeira, roupas nos armários, tinha até comidas enlatadas de uns vinte anos atrás.

— E o por que isso?

— Não sei muito bem dizer, Brazen não explicou, só disse que poderíamos ficar aqui já que queríamos privacidade, e o pessoal da Vila também não sabe o que aconteceu.

— Com as pessoas que moravam aqui?

— Sim, elas só dizem que eles foram embora de uma hora para outra.

— Por que? — Nia dá de ombros.

— Ninguém sabe, ou não quer dizer, eles sempre desconversam quando perguntamos.

— Isso me parece assustador, para você não?

— O Brazen é meu amigo, jamais me colocaria em risco. — Resmungo algo em contesto e ela suspira. — Ainda estou chocada que ele tenha me dedurado.

Rolei os olhos.

— Não fique. — Sussurrei, tocando na mãozinha da bebê. Rodei o móbile  em cima do berço, ouvindo um tilintar de uma canção.

Olhei para cima, fitando o móbile, as estrelas, os planetas, as pequenas esferas de luz. Uma brisa baixa passa pela janela aberta, e as estrelas salpicam o céu; é noite, mas não aqui, não agora com a Agnes.

Minha visão pisca em preto. Eu vejo o móbile, rodando e rodando em cima de mim, mas não consigo alcançá-lo, e a música continua a tilintar e tilintar, sem parar.

— Você quer? Você quer a estrelinha... — Ele diz um nome, o garotinho de franja, de voz doce e melodiosa, qual é o nome? Ele aponta para o móbile tentando chamar minha atenção que desvia para o chão quando uma mulher se aproxima, a madeira continua rangendo. Ainda rangendo.

— Não é Aslo?

— Sim? — Pisquei, distraída, fitando-a.

— Você parecia fora de órbita.

— E estava, desculpe. Sobre o que falava?

— Sobre essa casa. Eles dizem que os moradores foram embora, mas sabe, está tudo aqui. O berço, o móbile, e até brinquedos! Quem é que vai embora deixando tudo para trás? — Dou de ombros, tentando conter minha curiosidade, porém, não consigo.

— Eles têm um sótão, certo? — Ela concordou, quase que imediatamente. — Vamos vê-lo — pedi, como se não quisesse nada.

E ela aceitou.

Nia pegou duas lanternas em uma cômoda do corredor, e caminhamos em direção a uma escada lateral que havia do lado esquerdo. A mesma subiu alguns degraus e abriu uma porta, adentrando primeiro.

A vi sumir no buraco escuro do sótão e logo uma luz fraca acendeu-se em todo ambiente, eu entrei, franzindo o nariz, tudo cheira a velho nesse lugar.

— Eu tentei dar uma limpada aqui em cima, mas esse cheiro acaba comigo, e Nox não consegue ligar o ar-condicionado desse lugar.

— Sim, o problema com a fiação — concluí o pensamento, andando através do sótão. Vejo diversas caixas, e caminho até uma delas. — Nia... Me conta sobre sua vida aqui.

Ela dá uma risada.

— O que você quer saber?

— Absolutamente tudo.

— Sexo?

— Olha, Nia, por mais que você me zoe, eu estava certa. O conhecimento leva a prática — a mesma parou por um momento, olhando-me de forma gozadora.

— Com quem foi?

— Não importa.

— Como foi?

— Também não importa. E eu quero saber de você — a ouvi rindo, ruidosamente, enquanto eu abria uma caixa. Pisquei lenta, vendo roupas de bebê, algumas minúsculas, outras, grandes o suficiente para caber em Agnes, pois ela é um bebê bem grande. Porém, não me prendo muito nisso, vou para outras caixas, olhando, encontro roupas infantis e adultas, eletrônicos antigos, alguns brinquedos de madeira, vinis, CDS players, DVD’S, vídeo cassete, fitas, muitas fitas, mas nada revelador. Nenhuma foto, nenhum brinquedo colorido; rosa, azul, verde, apenas madeira.

— Acho que ele era marceneiro — Nia diz, olhando um brinquedo de contador de madeira. — Tem uma garagem na frente e tem umas máquinas que servem para cortar.

Assenti, silenciosamente, ainda procurando, qualquer coisa, documentos, fotos, quadros, alguma coisa relevante, mas não encontro nada, ainda que procure levianamente, não vejo nada parecido a vista. 

— Nenhuma foto? — Perguntei, olhando uma câmera fotográfica, sem rolo. Ela é bem antiga, daquele tipo polaroid, que saí de forma instantânea.

— Não, nada. — Nia responde, suspirando alto. — A única coisa que sabemos é que era uma família, mãe, pai, algumas crianças, um bebê.

— A casa é bem grande — digo, ponderativa.

— Sim, e equipada também. O Nox encontrou muitas bugigangas espalhadas pela casa; sistema de segurança, câmeras, piso aquecidos..., mas não consegue ligar nada.

Eu olho para o teto, levando a atenção até as paredes. Me levanto do chão, e caminho até ela, batendo com os nós dos dedos na parede, estranhamente, ela é firme, em todos os pontos.

— Nada aqui suprimiu minha curiosidade — falei, endireitando minha coluna.

— Elementar minha jovem — minha irmã sorriu. — Quer ver algo realmente estranho?  

Por algum motivo, quero sim.

— Por favor. — Nia indicou para fora, e eu segui. Caminhamos de volta pelo caminho que fizemos, até pararmos na porta de um quarto, do qual adentramos, a mesma andou até um closet embutido na parede, e o abriu, dando batidinhas no fundo. Olhei curiosa, e em seguida a vi empurrar para trás, até algo destravar, e o fundo sair. Ela puxou-o para o lado, e em seguida, revelou uma abertura redonda enorme atrás. Me agacho, olhando, parece uma porta, mas não tem maçaneta, e tem algumas perfurações redondas ao seu redor, mas não parece chegar fundo; parece nem ter atravessado o metal. Deve ter muitos centímetros de espessura. Também não vejo uma dobradiça, talvez seja para dentro, ou talvez não seja uma porta, porém, por que teria algo assim atrás de um fundo falso de um guarda-roupa? Fito o quarto, olhando uma cama e um criado-mudo.

— Como se abre isso? — Indaguei, curiosa. Não tem tranca.

— Quem fez faculdade sobre engenharia aqui foi você. — Semicerro os meus olhos e a olho por um momento. Nem foi replicar.

— Supondo que seja uma porta — digo, rodando pelo quarto. — Tem um mecanismo para abrir...

Sussurrei, olhando os cantos do quarto, e vejo um fio; no canto inferior, entrando pela parede. Vou até o closet, as paredes laterais são tão grossas, eu bato nelas, tentando ouvir um eco, porém não encontro. Madeiras grossas, fundo grande, eu entro no closet, olhando ao redor. O que não estou vendo?

Um mecanismo para abrir a porta... mecanismo, maçaneta, buraco, senha, chave, alavanca, botão...

Eu olho para o chão, bato os tênis sobre a madeira, firme e forte. Subo o olhar.

— Feche a porta, Nia.

— Sério? — Consenti, e ela o fez.

As portas se fecharam, e a escuridão reinou no closet. Olhei ao redor com mais atenção, a frente, tem duas aberturas que se ligam a maçaneta, levo os dedos até lá, mas não sinto nada. Abro o closet, me inclinando sobre ele, nada. Não sei como abre, não sei nem se tem como. 

— Estranho — minha irmã falou. — E sabe o que mais? Em todos os ambientes da casa tem um igual desse.

Dou um sorriso maldoso a ela.

— Talvez estejam morando em abaixo do esgoto — pisquei sombria, mastigando a informação.

— Quer ver mais?

— Tem mais?  — Eu ergui uma sobrancelha enquanto ela concordava.

Caminhamos até a cozinha, aonde a mesma parou contra o balcão, e levou as mãos até em baixo na borda. Minha irmã me olhou com suspense e sorriu. Ouvi algo destravar e no minuto seguinte a parte de cima do balcão se abria como se fosse uma caixa. Observei o mecanismo dobrando uma das partes e vi dobradiças em um dos lados, porém o mais estranho estava dentro do balcão, claro, não havia nada, mas o veludo vermelho que obtinha tinha marcas, marcas de facas e algo que me pareceu grande demais para ser um facão.

Olhei mais de perto, as marcas, vejo o cano, o gatilho, as ondas em cima. As serrinhas da faca empurradas no veludo grosso abaixo.

— Parecem facas.

E armas.

Quis dizer, mas minha irmã assentiu.

— Bizarro, não é? — Assenti silenciosamente. Essa casa toda é. Num estralo minha irmã sorriu. — Eu estou com fome, vamos comer? Já, já a Agnes acorda.

— Certo. Eu também estou.

— Ótimo! Vou preparar a comida, e você pode cuidar da bebê!

— Ok, mas não quero sua comida! É horrível!

— Que maldade! — Ela choramingou.

A mesma deixou que eu pegasse a Agnes, e trocasse sua fralda, e embora minhas habilidades estivessem enferrujadas por causa da Greta, acho que me saí muito bem. Nia deu de mamar para ela antes de virar-se para a cozinha. Segurei a bebê contra mim e não larguei mais. Já disse que adoro bebês? Diferente dos seres humanos eles são amáveis, fofos e escutam tudo que você fala, sem retrucar, além do fato de você receber uns beijos babados em forma de afeto.

Infelizmente minha sobrinha ainda é bobinha, mas não me impediu de enchê-las de perguntas e beijos.

— Ela é a cara da Greta — concluí, olhando-a fixamente, porque ela fazia o mesmo comigo.

— Não é? — Nia ri. — Será que ela vai gostar?

— Hmm... Bem, ela vai ter outra pessoa para odiar além de mim, ou vai fazê-la se virar contra mim.

— Perspectiva animadora, Penn. — Dei de ombros. — Eles estão demorando.

Sussurrou Nia, desconfiada.

— Provavelmente estão conversando. Mas espero que o Justin tenha dado uma surra nele. — Ela fez cara feia para mim.

— Justin não é violento.

Dou uma risada.

Ela claramente não o viu indo pra cima de um traficante armado. Porém, pelo o pouco que conheço dele, o mesmo é paciente, calmo, até demais. Tem que ter uma paciência enlouquecedora para me escutar falar de física por horas a fio sem surtar.

— Pode até não ser, mas que o Nox merece uma surra, ele merece.

— Hello, somos...

— Afinal, por que estamos falando em inglês mesmo? — Perguntei, e ela virou-se para mim.

— Costume? E também o Nox só fala inglês.

— Bastardo.

Ela rolou os olhos.

— Aslo, vamos comer.

E comemos. Nia enfiou goela abaixo uma abobrinha com batata e Agnes comeu feliz.

— Pelo menos alguém gosta da minha comida — dei uma risada. Pelo visto não sou a única.

— Isso porque ela não tem paladar, e não sente gosto e nem textura.

Nia arremessou uma cenourinha em mim, do qual desviei.

— Você é a suja falando do mal lavado!

— Eu tenho muitas qualidades, não preciso saber cozinhar.

— Vai morrer de fome.

— Não se eu arranjar alguém que cozinhe para mim. — Pisquei, e uma voz e passos ecoaram ao fundo.

— Cheguei.

Knox.

Endireitei a coluna, e fitei Nia.

— Por favor, tira os óculos.

— Não — rangi imediatamente.

— Isso é falta de educação, sabia?

— Não me importo.

— Oi — ele chegou à sala de jantar, e foi até Nia, beijando-a no rosto, em seguida Agnes, que está ao seu colo. — Tudo bem?

— Veremos — Nia sussurrou, indicando-me com queixo. — Nox, essa é minha irmã mais nova, Aslo. Aslo, Knox.

Ele esticou-me a mão, seus olhos se abriram levemente; ele tem olhos claros, diferentes do irmão, é alto e magro, e seus fios loiros brilham sedosamente.

— Prazer, ouvi muito falar de você.

— Legal, porque até dois meses atrás você nem existia para mim, literalmente. — Suas bochechas coraram, e minha irmã lançou-me um olhar fuzilador. — Honestamente, Nox, você no momento não é minha pessoa preferida no mundo. Você foi inconsequente e burro, em todos os sentidos da palavra. Escolheu a pior das opções, quando obviamente obtinha melhores. Eu entendo porque Nia escolheu, você não. Nem faço ideia, mas tampouco me importo. Aconteceu. Você fez, e agora estamos aqui, e a única forma de desfazer é vocês voltarem para a América conosco. Vocês podem resistir ou ceder, porém de uma maneira ou de outra, vocês irão. O que escolhem?

Eles escolheram resistir, fortemente.

Trinquei tão forte os meus dentes, que sentia minha mandíbula doer.

— É melhor irmos. — Cortei bruscamente Knox que se defendia.

A noite já caiu sobre o céu, ainda que seja sete horas.

— Está tarde.

— Poxa, vocês podem dormir aqui, até resolverem voltar. — Nia disse, e eu olhei-a com raiva.

— Acho uma boa ideia — Justin disse, num tom calmo. — Amanhã voltamos, ok? Claramente não chegamos a um acordo.

— Não tem acordo. — Nox falou e eu suspirei.

— Vai ter quando minha mãe entrar por aquela porta e acabar com vocês dois. Vamos — disse irritada. Quero ir para a pousada, quero dormir.

Nos despedimos brevemente, ambos os lados irritados, e Knox indicou um caminho para que chegássemos mais rápido no centro. Demorou igualmente, mas chegamos.

Pedimos serviço de quarto para jantarmos, e o fizemos antes de qualquer coisa.  Logo após Justin deixou que eu tomasse banho primeiro para não ter que enfrentar minha fúria.

Me sentei contra a cama, puxando minhas pernas até o peito enquanto o esperava.

Ele não demorou muito e logo jogou-se ao meu lado, suspirante.

— Eles estão teimando.

— É claro que estão. Idiotas sempre acham que estão certos — Justin me deu um sorriso.

— É mesmo? — Suspirei e desviei o olhar. — Bem, só precisamos convencê-los que é uma péssima ideia, a parte difícil já conseguimos.

— Ugh — rosnei.

— Vai dar tudo certo — ele sussurrou baixinho, dando tapinhas em meu braço de forma reconfortante, o que fez meu corpo inteiro tencionar. Ele por acaso sabe como é ter o corpo dele tão perto do meu enquanto estamos em uma cama? Eu engulo a respiração, empurrando a queimação que ecoa em meu rosto para baixo.

— Sim, vai. É claro — Eu disse rapidamente, virando para o lado a fim de evitar o seu rosto. Mesmo com o ar-condicionado, o quarto é quente; esse lugar todo é, e não sei se meu próprio corpo ajuda.

Justin não fala nada, não se mexe, o que só dificulta mais minha concentração em ignorá-lo. O que ele está fazendo? Eu quero olhá-lo; e faço isso, girando sobre a cama, fitando-o.

O olhar em seu rosto me deixa com raiva; a frustração instalando-se em cada aspecto meu.

— Não me olhe assim. — Objetei.

— Olhe, reclame com sua mãe. — Dei uma risada, e olhei para o teto. Minha mãe. — Por que não me contou que era adotada?

— Desculpe, não entendo muito sobre interação humana, mas chegamos falando, olá, sou adotada, podemos ser amigos? — Justin crispou os lábios, e eu desviei o olhar. 

— Sempre achei que houvesse algo no relacionamento entre você e sua mãe além de todo o suprimento da liberdade, Assy... Você sente mágoa?

— Justin, não quero falar sobre isso. Nem sobre minha mãe, nem sobre nada.

— Você pode conversar comigo.

— Não é a questão. Eu só não quero pensar nas coisas que minha mãe fez que me chateiam.

— Mas isso é fugir do problema.

— Justin — eu o fito desesperadamente óbvia. — Se não notou, eu sou covarde, odeio confrontos, se você me atropelasse de propósito e depois pedisse desculpas, eu deixaria para lá, porque fui ensinada a vida inteira que minha mãe está certa sempre, sem voz, sem opinião, entende? Mesmo que eu não concorde com a situação.

Eu aperto o seu nariz, e ele segura o meu pulso.

— Se fosse ao contrário, você entenderia do porque estou fazendo isso.

— Não fale como se eu fosse ingênua, entendo seus motivos, isso não quer dizer que eu concorde. Por que precisa tornar isso tão pessoal? — O mesmo me olhou; em silêncio, e após alguns segundos, deu-me um sorriso.

— Tem como não ficar?

— Sempre tem. — Subo os ombros. — Nunca acordei perdidamente apaixonada pelo meu professor de física.

— Isso é porque ele não estava te fodendo direito.

Uau. 

Olhei-o surpresa, e apoiei minha cabeça contra a mão.

— Acha que amor e sexo andam lado a lado?

— Você não? — Ele me fitou curioso.

— Não tive muitos relacionamentos para dizer, mas... eu acho que dá para separar.

— Bom, do meu ponto de vista, não dá. — Faço um bico em sua direção.

— Oh, Justin... você é um romântico.

— Não era essa palavra que estava passando em sua cabeça. — Abro um sorriso.

— Não era mesmo. — Ele suspirou, e soltou o meu braço, afundando o rosto contra o travesseiro.

— Talvez eu seja o problema. — Sussurrou ele, fechando os olhos.

Me estiquei para apagar as luzes, e em seguida fechei os meus olhos, mas meu cérebro não desligou. Os minutos passaram, a respiração de Justin aprofundou e sem sono, eu me sentei na cama, logo levantando. Andei através do quarto, inquieta, rodando os pensamentos incessantes em minha cabeça.

Visto um casaco e os tênis e de passos calmos saio do quarto. Não tenho nada em mente, só ando.

Empurro as portas quando chego a saída. Sinto o ar frio da noite bater contra o meu rosto e encolho-me contra o casaco. Olho para os dois lados da rua e escolho um a seguir. Ainda não é totalmente de madrugada, deve ser um pouco mais das onze horas e alguns estabelecimentos ainda se encontram abertos. Olho para o celular em meu bolso, buscando um sinal, mas é inexistente, minha operadora está fora de área. Se eu quiser falar com a minha família vou ter que buscar outros meios.

Ando pela rua o que me parece alguns minutos, contemplando tudo ao redor e ainda sentindo o ar chicotear através da balsa. Até aqui o céu parece mais limpo, azulado, exatamente como o mar.

Caminho mais um pouco, e decido entrar em um bar quando vejo um. Rivotril seria incrível, mas acordar o Justin ou mexer em suas coisas para encontrá-lo não parece uma boa ideia.

Um sininho toca na porta quando adentro, mas por sorte, todos os clientes estão envolvidos demais com suas próprias vidas para que me notem.

Eu adentro. Fito logo de cara o ambiente rústico, praiano, para todo lugar que olho tem um peixe entalhado a parede. Interessante. Eu caminho até o balcão e me acomodo nele, sentindo de repente a falta dos meus óculos; os esqueci. Levei as mãos ao rosto, batendo as unhas contra ele.

Um homem se aproxima, indicando-me com o queixo.

— Posso ajudá-la?

— Sim, por favor. Me dá a coisa mais forte que tiver aí, por gentileza.

Ele ergueu uma sobrancelha e sorriu.

— Problemas no paraíso? — Dei um sorriso.

— O que? Uma pessoa não pode beber aleatoriamente pelo simples prazer?

— Não em Anse Royale. — Disse ele, enigmático, enquanto vira-se para escolher uma bebida da adega atrás de si.

— Por que diz isso?

— Você está em um paraíso tropical.

— Numa ilha isolada no meio do oceano.

— Também — ele sorriu. — Mas acontece que todo mundo que vem para Anse Royale quer apenas uma coisa: sossego. As pessoas vêm para cá para esquecerem de problemas, não os lembrar.

Ele piscou, colocando um copo a minha frente e despejando um líquido alaranjado, nem perguntei o que era, apenas tomei um gole generoso, sentindo descer queimando por minha garganta.

— Não estou com problemas — justifiquei-me, embora Nia seja um. — Só não consigo dormir.

— Insônia?

Eu nego.

— Não... só tem algo me incomodando.

Talvez seja Nia.

— Bem, se não conseguir dormir depois disso aí, não sei mais o que a fará — ele piscou.

— Obrigada.

Eu bebi calmamente, ainda que meu corpo implorasse para que o efeito chegasse mais rápido. Preciso desligar, só um pouco, só por poucas horas.

Meus olhos passeiam curiosos pelo ambiente, pelas pessoas e pelas coisas. Fito com interesse um mural de fotos e ando até lá  para olhar. Vejo fotos de pescadores com grandes peixes, mulheres e homens comendo hambúrgueres majestosos, casais sentados a mesa comemorando casamentos, aniversários e... crianças, várias crianças... eu os vejo, e minha atenção para em uma; aparentemente uma família, tem um garotinho na frente da foto, parece que ele pegou a câmera e tirou uma foto de si mesmo, pegando todo mundo que estava atrás, várias outras crianças cercadas em volta da mesa redonda, o garoto que está segurando a foto, um garotinho mais novo, tem uma garotinha sentada ao lado dele, um casal de gêmeos, um adolescente, duas outras crianças da mesma faixa etária, só que mais jovem, um bebê sentado no colo do que parece ser o mais velho, a boca suja de bolo. É um aniversário, não vejo os pais. Mas todas as crianças olham para a foto, fazendo caretas.

O que me incomoda na imagem não são as pessoas; não conheço nenhuma delas, a não ser o bebê... ou talvez não... o que está na mesa é mais importante, é o que me incomoda. Um chocalho de ferro, com espinhos retorcidos no cabo. Exatamente igual ao meu.

— Algum problema, querida? — A voz soa atrás de mim, e me assusta. — Perdão, não quis assustá-la.

Eu fito a mulher atrás de mim, ela é baixa, tem uma pele negra dourado e cabelos pretos como a noite; lisos, como o homem que me atendeu. 

— Perdão, eu estava distraída. — A mesma juntou as sobrancelhas.

— Algum problema? — Ela repetiu, e eu umedeci os meus lábios.

— Não... — Eu franzi minhas sobrancelhas. Eu parecia estar com algum? — Quem são as crianças na foto?

Indaguei, aproveitando sua súbita aparição.

Ela suspirou, inclinando-se sobre o mural.

— Ah, difícil dizer.

— Não os reconhece? — Não retiro os meus olhos do seu rosto.

— Não sei dizer, muitos clientes. — Ela não se altera, e isso me incomoda.

— É mesmo? Porque eles parecem serem moradores. — Digo, ainda a encarando, e a mesma me fita, curiosa.

— É mesmo? Por que acha isso?

— Um dos garotos, o que está sentado na frente, ao lado da garotinha gêmea, está com uma camiseta do Tribute Sox, e isso não é uma escola daqui da ilha? — Novamente, nenhuma expressão além de curiosidade.

— É, é mesmo. Talvez tenham sido moradores, não me recordo bem.

Comprimi minha boca.

Nada familiar, além do chocalho e o bebê, mas... o bebê não se parece comigo, não me vejo ali, mas o que sei? Minha mãe não tem fotos minhas antes de eu fazer um ano, ou se tem, me escondeu a vida inteira. Ela queria que eu não lembrasse, que não me visse...

— Hm... — Resmunguei, incomodada.

— Conhece alguém da foto? — Dou um sorriso a mulher.

— Não, não conheço. — Digo, dando as costas. Algo em sua presença me incomoda. — A propósito, você conhece a mansão afastada no vilarejo chamado Out Wallet? Aquela que estava desocupada até pouco tempo atrás e agora um casal jovem mora?

— Sim?

— Sabe me dizer o que aconteceu com a família que morava lá?

— Desculpe... — Ela parece confusa.  — Eu não sei.

Mordi meu lábio inferior. Queria insistir mais, no entanto, o olhar que ela me deu... me fez recuar. E até eu colocar os meus pés para fora, senti o olhar dessa mulher me acompanhando, cenho franzido, olhos concentrados, como se me estudasse, ou como estivesse tentando lembrar.

De qualquer maneira eu retirei uma foto com a câmera do celular, porque embora confie completamente na minha memória fotográfica, quero ver isso com mais detalhes, por mais estranho que pareça.

Voltei para o quarto, um pouco alta demais, deitando-me na cama, porém acredito que foi de forma ruidosa, pois o Justin acordou.

— Aonde estava? — Sua voz saiu em um sussurro, rouca e sonolento. Ele não fez questão de abrir os olhos.

— Olhando a vizinhança. — Sussurrei de volta.

— Por que?

— Não consegui dormir.

— Está preocupada com a Nia?

— Não...

— A faculdade?

— Não.

— Sua mãe?

— Não.

— Então o que é? — Ele abriu os olhos, me fitando.

Suspirei, olhando o teto.

— Eu não sei... — Sussurrei, cansada. — Só estou com uma sensação... Não sei bem o que é, mas está me incomodando.

Digo, balançando a cabeça.

— Provavelmente não é nada, só estou cansada.

Mas não é nada, porque acordei no outro dia bem descansada e a sensação continuava lá.

Fomos para a casa da Nia de novo, e Justin e eu voltamos a conversar com a minha irmã sobre a volta deles, à medida que Nox saiu para trabalhar.

— A gente não vai! — Ela teimou, enquanto colocava algumas roupas dentro da máquina de lavar. — Parem com isso!

Justin suspirou alto, resmungando que está lidando com dois jovens imaturos e inconsequentes e que não tem paciência para isso, enquanto segura Agnes. Eu falo, mas estou distante, minha cabeça rodando em uma frequência diferente da deles.

 Nia continua resmungando, e por outro lado, eu só concordo silenciosamente, ainda não tenho certeza como irei convencê-la, bem, na realidade, minha mãe é um motivo bem forte, no entanto, não acho que ela possa simplesmente largar seu trabalho e vim aqui arrancar a Nia dessa casa e colocá-la em um avião. Ela é teimosa, teimosa demais, e eu, bom, eu desisto fácil de uma briga.

Temos que convencer o Knox, ele não pode achar que esse lugar maravilhoso, afinal, ele foi criado a vida inteira em uma cidade grande, e embora aqui tenha uma paz considerável, não parece ser tão fácil.

Eu deixo Justin e Nia discutirem, enquanto vou para fora, olhando o quintal. Tão bonita a grama, suponho que não tenha sido nem minha irmã e nem o meu cunhado que tenham feito isso. Vou para a frente da casa, aonde está o mar, que coincide também com a cozinha, consigo ver Nia indo fazer o almoço enquanto Justin vai atrás.

Giro o meu rosto, olhando uma árvore grossa e alta, será que se subir até ela o sinal do meu celular fica melhor?

Nego com a cabeça, andando no caminho de pedras até descer a praia. A areia é branca e limpa, e a água tão transparente quanto pode ser. Eu ando sobre ela de um lado para o outro, até me sentar em um canto, sentindo a quentura da areia contra o meu rosto, o sol contra minha cabeça, e o barulho do mar ressoando em meus ouvidos.  Fecho os meus olhos, pegando um punhado de areia na mão.

Tento me concentrar, me agarrar aqueles flashes que aparecem vez ou outra, mas nada acontece, nada vejo, nada escuto além das batidas do meu coração. Suspiro irritada e abro os meus olhos, passando as mãos com força sobre a areia, fofa, quente, branca. Meus dedos param sobre uma superfície dura, e eu puxo, temendo ser uma pedra, mas é um colar. Eu o fito, é prateado, tem um rosa no meio, e ao seu redor é rodeado de espinhos. Como o chocalho prateado. Aquele que parece um item de colecionador, mas que é meu, ou que pertenceu a alguém da minha família. 

Eu fito fixamente, desfocando dos barulhos ao meu redor.

Eu já vi esse colar?

Eu já vi?

Em alguém? Em algum lugar?

Esse colar?

Tento me lembrar. Lembrar, lembrar, lembrar, lembrar.

Vejo uma pequena mão puxando-o de um pescoço, e uma voz repreendo-o quando o colar escapa de seu pescoço.

— Ei, não pode.

Mas a mulher coloca o bebê sobre o chão, na areia, subindo o seu olhar, algo ou alguém chama sua atenção no quintal acima de nós. Tem um garoto por detrás das pernas da mulher, montando um castelo de areia.

— Não coloque na boca — a mulher diz, impedindo que o colar chegue ao destino. — Fique de olho nela, não deixe que ela coma areia. Eu já volto.

O garoto concorda, arrastando-se até a criança.

— Aqui, oh, coloca areia aqui. — O mesmo aponta contra um potinho, incentivando, e a criança larga o colar, deixando-o cair na areia.

Eu me levanto, em um salto, voltando ao quintal, bato os pés com força sobre a grama, porque ela terrivelmente me incomoda, e paro quando a superfície parece dura demais. Tento me convencer que estou pensando demais, porém não estou, refaço de novo, e em determinada parte parece que é mais duro. Deve ser impressão, mas algo me diz que tem algo em baixo da casa, não terra, pelo menos, não completamente.

Terceira coisa estranha nessa casa.

Para a impaciência do Justin, Knox voltou para almoçar, então nos juntamos os quatro na mesa para voltar a discussão. Ou os três, pois  deixei o Justin assumir, porque minha cabeça estava rodando diferente, fitava a casa de cima abaixo, as paredes, o chão, os móveis, até a casa me parece estranha também, móveis acoplados as paredes, mesa dobrável ao meio, chão de madeira.

— Espera, quanto tempo vocês pretendem ficar? — Nia interrompeu Justin, falando entre dentes.

— Até vocês voltarem conosco — respondeu calmamente.

— Poxa, então é melhor virem logo morar conosco, porque isso não vai acontecer. — Umedeci os meus lábios, fitando-a.

— Por favor, vocês não podem estar mentalmente são. Que tipo de vida vão dar a Agnes nesse fim de mundo? — Me intrometo, trazendo as atenções até mim.

— Aqui tem uma excelente escola e...

— E nada, Knox. Não tem faculdade, e ótima é relativo. É uma ilha isolada, vocês podem vim morrer aqui, mas criar uma criança? Pelo amor de Deus.

— Aqui tem tudo, Penn, hospitais, lojas, mercados, escolas. Não somos uma tribo, é só uma ilha tropical.

— Isolada. — Acrescento, irritada. — Você vê muitos turistas por aqui? Não, não é? Porque justamente, é isolada. A Agnes e nenhum de vocês terão chances de uma vida de sucesso estando aqui. As pessoas vêm para Anse Royale para se esquecer de tudo, e não me venha com alguma história boba de vocês, porque estão sendo só estúpidos.

— Está me ofendendo.

— Perdoe-me, mas você é extremamente estúpida, os dois são! Que trabalho o Knox arrumou? De pescador? Qual é, isso de fato é realmente o que quer fazer pelo resto da sua vida? — Eu o fito. Está na hora de apertar o lado mais fraco.

— Eu... —  O mesmo olha para Nia, pois claramente, ela aperta mais na relação. — Eu estou feliz aqui.

— Mentiroso — ladro, irritada. — Você estava no MIT, Bieber, MIT. E estudou para caramba para estar lá, e vai jogar tudo para o alto porque a magricela sem futuro da minha irmã quer? Ela é estúpida.

— Ei! — Ela repreende.

— Você é! — Afirmo.

— Olha... — Ele hesita.

— Não, sem mais. Eu consigo entender porque a Nia está confusa, porém você não. Então eis aqui minha proposta, voltem para a América conosco, o Chuck não vai ser um problema.

— Não é esse o problema — sussurra ele. — Gostamos daqui.

— Você gosta ou ela gosta? — Justin implica, e Nia infla as bochechas. — Olhe, Nox, nem posso dizer o quão chocado estou por você ter sido tão burro e egoísta. Eu ia ajudar você.

— Estava na cadeia, Justin. — Replicou rapidamente. — Não ia fazer nada, e eu também não quero minha filha perto da nossa família perto.

Justin franziu o rosto; pareceu magoado. Ele deve amar muito sua família, por mais torta que seja.

— Bom, então eis aqui a solução; vão para Incles.

— Não! Não quero voltar para aquela cidade no meio do nada!

— Olá? — Gesticulo. — Você já está no meio do nada, a única diferença é que não tem ninguém aqui.

— Aslo!

— Droga, Nia. — Eu me levanto, sentindo o meu peito acelerado. Odeio confrontos, odeio confrontos, odeio confrontos. — Por favor, esqueça a mamãe por um segundo, ok? Foca em mim, em como eu vou me sentir se você ficar aqui, desprotegida, longe de mim, aonde não posso alcançá-la ou ajudá-la.

— Isso já aconteceu antes! Não entendo porque você está tão ressentida com isso agora. — Eu a olho incrédula, será que ela ouviu algo do que eu disse?

— Nia, eu sinto sua falta.

— Você tem que superar isso, somos adultas.

E você não é minha irmã.

Nunca senti um divisor de águas entre nós antes, mas hoje, agora, sinto que tem um abismo. Mas ela tem razão, somos duas pessoas adultas, necessitamos lidar com a separação uma da outra; porém isso não significa que seja fácil, sinto falta, sinto falta das provocações da Greta, da comida do papai, das minhas amigas, minha faculdade, a casa na fazenda. Sinto falta, contudo não significa que quero voltar para lá, voltar a viver no mesmo inferno pessoal e insondável.

— Eu vou, assim que você entender a situação.

— Aslo! — Ela late, irritada. Eu nego. Luto contra minha vontade de ceder, a queimação que fecha minha garganta e me faz querer encolher o corpo, preciso disso.

— Se é a mamãe que teme, vá para a América, senão, case-se com Knox e vai para Incles, ela vai dar tudo que você precisa.

— Não vou viver no mesmo teto que a mamãe de novo! Nunca mais!

— Então fique com a primeira opção, se casar com o Knox ela não vai poder interferir, e vai pagar o seu plano de saúde, o Knox arranja um emprego, volta para a faculdade, e você faz o que quiser. A mamãe vai ficar com raiva; isso é muito óbvio, mas ela vai ceder, assim que ela ver a Agnes, ela...

— Quer tornar minha filha o novo ponto de obsessão dela? — Eu a fito, e fecho minhas mãos em punho, estou tremendo. Só pare de discutir, dê o que ela quer, por favor, por favor, por favor...

Esse é o ponto, o medo dela, da mamãe voltar a controlá-la, a controlar o seu bebê, seu namoro.

— Vamos fazer um acordo — digo, alta e clara o suficiente. — Mas primeiro, Knox, você tem algum problema em se casar com a minha irmã?

Eu o fito, porque ele parece chocado desde a primeira vez que citei isso.

Nós o olhamos.

— Você tem? — Ela indaga, cruzando os braços.

— Não, claro que não. — O mesmo diz rapidamente. — Adoraria me casar com você.

Ela sorriu.

— Ótimo — prossigo. — Então, sugiro o seguinte; voltem para a América, casem o mais rápido possível em Vegas, e esperamos. A mamãe vai até vocês.

— Mas... — Nia me interrompe, porém, nego.

— Mas, obviamente, ela vai se intrometer, então vou ser a isca.

— De que forma?

— Vou dizer a ela que vou procurar minha família verdadeira, e toda a atenção dela vai se virar para mim.

Minha irmã me olha chocada por um segundo.

— Ela vai enlouquecer.

— Eu sei. E vocês ficarão livres, além disso, ela não ficará na América por muito tempo, é inviável a ela.

— Hmm... — Ela resmunga. — Sabe que se fizer isso terá que procurar de verdade, não é?

— Sim, eu sei, mas posso fingir.

— Mas..., mas você quer? — Desvio o olhar, suspirando.

Não queria até chegar aqui.

— Não, claro que não. — Digo, balançando a cabeça. — Mas enfim, o que acha?

— Vou pensar. — Rolo os meus olhos. Nia sorri.

— Tem três dias.

— O que?

— Ouviu bem. Três dias, dado esse tempo, eu vou embora e vocês farão o que quiserem, até porque vocês vão enfrentar a ira da Antonella sozinhos.

Ela torceu a boca, porém não discutiu comigo.

Por mais que quisesse explorar a casa, falar com a minha família é mais importante, então eu e Justin vamos embora mais cedo, aproveitando tudo aberto na cidade. Vou até a lan house que vi no outro dia, e descubro que a internet é mais lenta que uma lesma, então vídeo-chamada é impossível. Mandei uma mensagem em uma rede social para minha prima Gemma, pedindo que a vovó me retornasse em um número que funcionasse, de preferência um aqui da ilha, marquei hora através disso e depois apenas esperei, o que não demorou muito.

Consegui atender e repassei tudo que estava acontecendo, e não deixei de estremecer quando ela disse que estava em Incles, tentando conter minha mãe, nem imagino como deve estar sendo, ainda bem que não estou lá. Atualizei-a sobre tudo, e depois me dirigi para comer com Justin, ele está animado para comer frutos do mar.

— Vamos, anime-se um pouco. Estamos em um lugar incrível, e nossos irmãos estão bem, e ainda ganhamos uma sobrinha. — Estreitei os meus olhos em sua direção, suspirando alto. — Que tal um passeio a barco? Ou um mergulho? Eu soube que eles têm um tobogã gigante por aqui.

Dou um sorriso a ele nas suas falsas tentativas de me animar.

— Já são cinco da tarde, a única coisa que conseguiremos fazer agora é assistir os filmes da Barbie.

— Olha, vi uma locadora aqui perto, então pode ser possível... — Disse ele, ponderativamente.

E ele estava certo, tem uma locadora, e ele conseguiu encontrar os filmes da Barbie, e trouxe até nós na suíte.

O momento não poderia ser melhor, mas minha mente vagava para o bar a algumas ruas de distância, na casa aonde Nia está e no colar no bolso do short jeans. Não sei o que significa, não sei se quero descobrir, na realidade, algo me diz que não saber é exatamente o que devo fazer, porém os sinais, os sinais continuam aparecendo, embora, eu deva ignorar. Não, ignorar é o que tenho que fazer, esquecer... eu logo vou embora daqui e isso vai passar, tudo isso vai passar.

É o que vai acontecer.

Ou deveria.

Na mesma noite eu tive um sonho. Ou deveria ser um.

— Vamos, não seja chorão. — O adolescente disse, olhando para o menininho gêmeo.

— Mas eu gosto dele.

— Essa é a ideia, bobão. Coloque — o garoto exigiu, empurrando até ele uma caixa de madeira.

O garoto fez um bico enorme, mas colocou um brinquedo sobre ele, em seguida sua irmã gêmea, a garota pré-adolescente, o outro garoto na mesma faixa etária, uma garotinha de cabelos loiros e ondulados, e um garotinho menor que ela, que por algum motivo, colocou um vestido; um vestido vermelho, e, então, o adolescente girou as costas, olhando para o garoto que estava a minha frente.

— Você — ele esticou, e o garoto olhou o que estava em suas mãos antes de levar até a caixa. — Tem certeza disso? Não poderá retirar daqui.

O garoto olhou e olhou, inclinando a cabeça para o saquinho em mãos, e concordou.

— Quero me lembrar disso aqui. — Ele disse, colocando na caixa.

O adolescente virou-se finalmente para o berço, dando um sorriso largo.

— Você também. — E indicou a caixa. — Coloque algo importante, importante de verdade, entendeu? E que seja de preferência seu.

Acrescentou, e o bebê olhou através o berço com alguns brinquedos, e pegou o que mais te chamou a atenção; uma pelúcia pequena de uma estrela dourada.

— Certeza? — O bebê assentiu. — Muito bem, então é isso.

O adolescente fechou a caixa, trancando-a e logo puxou uma madeira solta do assoalho, aquela que sempre range, e colocou a caixa ali, logo, puxando de volta a madeira.

— Daqui há dezoito anos abriremos. — O mesmo disse, ficando de pé.

— Dezoito anos? É muito tempo! — O garoto gêmeo chiou, e ele riu.

— É a ideia, gênio! — O adolescente rolou os olhos, e uma voz ressoou do andar de baixo.

— Estão aprontando o que, crianças?

— Nada, mãe. — Ele respondeu. — O jantar já está pronto?

— Estaria se você me ajudasse!

O menino suspirou alto, indo até a porta, e a horda de crianças foram atrás dele, mas o garoto que estava próximo ao berço ficou. O mesmo virou-se, olhando para mim.

— Não conte a ninguém, ok? Sobre o baú. — O mesmo disse, esticando-se sobre o berço, e retirando a criança dele. — Vai ser nosso segredo.

O garoto riu, parecendo lembrar de uma piada.

— Só mais um para os milhares que já temos. 


Notas Finais




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