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História Itália, prisão de cristal - Vínculos de confiança


Escrita por: MrsReddington

Notas do Autor


Olá meus bebês, tudo bem? Com saudade de mim?
Estou compensando a falta e o perdido que dei em vocês com mais de 18 mil palavras de capítulo! Pela amor de Deus, eu passei o dia hoje pra revisar e me deixei levar pela ansiedade pra postar ele logo pra vocês. Logo, perdoem os erros!
Espero que realmente gostem desse capítulo, ele é importante pra história, muito mesmo! Não me deixem por aqui sozinha e dividam comigo as opiniões e expectativas de vocês!
Beijos, fiquem com Deus e nos vemos lá nas notas finais!

Capítulo 27 - Vínculos de confiança


Bruxelas, Bélgica. 19h08min da noite.

Fórum de economia do banco mundial.

Tudo já estava para se encerrar e os políticos do mundo inteiro se dispersavam do salão para o último jantar do evento. A mesa estava posta e as risadas descontraídas eram ouvidas.  Ao seu lado estavam os vices primeiros- ministros, Anne di Domenico – ministra de economia e finanças e Enzo Marchetti – ministro de interiores. Giuseppe Adami, o ministro da indústria e inovação, também os acompanhava e discreto como era já ria escandalosamente alto de algo que o secretário americano do tesouro dizia na mesa ao lado.

Anne bocejava constantemente, um cansaço múltiplo que Giuliano não conseguia imaginar se era pelo fórum e pessoas presentes, preocupação com os filhos que deixou em casa, ou se era com o bebê caçula em seu próprio ventre.  A descoberta era recente e ainda desconhecida para maioria.

Giuliano não era essa maioria, foi ele quem notou boa parte dos sintomas, antes dela mesma pensar na possibilidade, e com a descoberta, discretamente a estava apoiando em seus momentos complicados.

— Eu te disse que poderia jantar no quarto, Anne... — Sussurrou enquanto ajustava o guardanapo de pano sobre as pernas. — Precisa dormir. Esse ambiente não é bom pra você.

— Não pretendo te deixar com esse homem discreto ao seu lado. Giuseppe me causa estresse a cada risada histérica. O que há com ele que ri tão alto? — Resmungava.

— Primeiros meses são difíceis... E eu vou considerar seu mau-humor fruto dos hormônios.

Ela suavizou a expressão do rosto, surgindo quase um sorriso bobo na face de Anne.

— Não tenho mais idade para outros bebês. Uma gravidez aos 37 anos não estava bem nos meus planos... Imaginar outra criança com a cara do Nino correndo pela casa me afaga o coração. Obrigada pelo apoio. Só você para sair de uma reunião para me acudir nas minhas crises de tonturas. Emília não brincou quando disse que te criou para ser um príncipe.

Giuliano conteve o riso e cochichou no ouvido dela.

— Há quem discorde que eu seja um cavalheiro.

Anne apertou os olhos, com um ar de curiosidade palpável.

— Está com alguém? Não soube de ninguém depois daquela modelo sem personalidade... — Não escondia o desprezo por Hanna. — Vi você mandando várias mensagens no evento de ontem à tarde. Era nome de mulher na conversa... — Já sabia o nome, porém preferia que ele dissesse quando estivesse bem em revelar.

— Observadora demais Anne... Estamos nos conhecendo.

— Aprendi com você. Ela é especial?

Giuliano pensou um pouco.

— A sua maneira, sim. — Giuseppe deu outra risada histérica e Anne revirou os olhos. — Deixe o homem ser feliz, não desconte esses hormônios descontrolado em cima dele.

— Não sabe o quanto quero calar a boca dele. Não o suporto mais... — Colocou um pedaço de carne na boca e o mastigou com rispidez.

Conhecia Anne desde a universidade e também sabia sobre seu gênio intenso. Era fácil lidar com ela mesmo assim, porque ela era constante e foi à mudança descontrolada no humor dela que o sinalizou de que ela tinha algo diferente.  O algo era um bebê de sete semanas e a noticia de que a suspeita que Giuliano levantou estava certa tinha mexido com todo e qualquer neurônio que houvesse na cabeça dela e do marido. Eles não planejavam mais filhos. Foi tudo tão novo que presenciou o marido de Anne chorando e rindo ao mesmo tempo com a notícia. Planos mudados radicalmente demais. O homem durão por fora e sentimental por dentro, sequer sabia o que fazer.

— Nino parou de tremer? Pensei que ele fosse enfartar.

— Até semana passada ele ainda tinha umas crises, acredita? — Concordou com gargalhadas disfarçadas. — Não sei como conseguiremos contar para os meninos. Tenho medo que ele surte de novo.

O momento tranquilo então se dissipou quando a sombra ameaçadora de Norma pousou no corredor que circundava o salão das mesas. Ele a viu caminhar com sua comitiva imensa de ministros e secretários. Olhou por cima da cabeça de Anne e acompanhou com o olhar Norma com o marido dar a volta nas mesas cumprimentando alguns políticos enquanto os assessores procuravam alguém da organização que indicasse onde aquela comitiva tão grande sentaria.

No mesmo momento o celular vibrou e o nome de Laura apareceu na tela. Levantou fazendo Anne lhe olhar surpresa e fazer menção de ir junto. Sinalizou pra ela ficar e se levantou da cadeira deixando ela preocupada. Arrumou o botão do paletó enquanto atravessava o salão e sua caminhada altiva e expressão fechada evitou que alguém lhe saudasse ou parasse seu caminho.

Norma manteve a pose mesmo com o ar faltando quando Giuliano se aproximava. Era um desfile aos olhos, ele caminhava com confiança, consciente do próprio poder inebriante de persuasão e de sedução. Nem fazia mais tanto frio assim. Esperou que ele lhe abordasse, lhe provocasse, lhe dedicasse o mínimo olhar, porém, para sua frustração, tudo que sentiu foi só a presença dele ao ser redor quando saía do salão.

Giuliano pegou o sobretudo escuro e as luvas na chapelaria sentindo os olhos desejos de Norma sobre si. O marido dela sequer percebia pra onde ela tinha tanta atenção conversando com algum secretário.

— Nem que fosse a última mulher do universo... — Ergueu o nariz, enojado.

Retornou a ligação de Laura, receoso pelo motivo contato. Ela não tardou em lhe atender.

— Laura? — Ele estranhou se tratar dela naquele número.

— Giuliano, a Caroline te mandou alguma mensagem nas últimas horas?

A pergunta lhe pegou de surpresa e não só pelo tom urgente.

— Não. Desliguei o celular e só liguei no jantar. Não há nada dela desde — Olhou as horas — Desde as quatro da tarde. Por que a pergunta? Aconteceu alguma coisa pra você estar me ligando?

— Como não fala com ela desde cedo?! — Bufou como se fosse o maior dos absurdos. — Liga pra ela, se ela te atender, diz que me ligue, ou a mim ou a Constanza. Por favor.

— Laura, o que aconteceu?! — A impaciência já o dominava completamente e o tom foi ríspido.

— Caroline sumiu.

—Como assim ela sumiu?! Quando? Como que sumiu? — Apertou o celular com força. Laura era péssima em dar más notícias.

— A tarde ela ligou para mim e pra Constanza. A coruja velha retornou... E ela estava perturbada, estranha, nervosa. Disse que tinha sido um engano e que estava bem e depois desligou. — A voz dela já era chorosa. — Ligamos e ela não atendeu mais. Duas horas atrás, o telefone começou a dar fora de área. Tentamos tudo, fomos a todos os lugares, não a achamos Giuliano.

O homem olhou para trás, vendo se alguém prestava atenção em sua conversa e procurou olhando para o céu cheio de nuvens pesadas o que fazer.

— Em lugar nenhum?

Sabia que ela pegaria a deixa. Lugar nenhum significava que todas as possibilidades foram vistas e isso incluía Luca, os amigos do internato, Raena, e qualquer outra pessoa que tinha sua amizade.

— Lugar nenhum. — Ela confirmou.

— Vou ligar pra ela, já te ligo.

Procurou pelo contato de Caroline e a ligou, esperou ser contestado, mas não houve nada. Tentou uma, duas, três, quatro vezes. Em todas as ligações o celular estava fora de área. Pensou em qualquer possibilidade, Norma, Máximo, Roberta, qualquer coisa e em qualquer pessoa.  Ligou para Laura novamente.

— Ela te atendeu? — Laura sequer deixou que ele iniciasse a fala por telefone.

— Não.  Vou continuar tentando.

— Giuliano... Será que não aconteceu algo grave? Algo muito sério?

Giuliano a interrompeu antes que os pensamentos dela ganhassem asas que a levariam para outra crise de pânico:

— Não aconteceu nada demais Laura. Fique calma. —Se algum dos recentes inimigos de Caroline a tivesse em seu poder obviamente já estariam exibindo seu sofrimento. Não deveria ter relação com nada daquilo. Não poderiam se precipitar.  — Vou continuar tentando. Se conseguir alguma notícia me avise. Respire fundo e não saia fazendo nenhuma besteira. Ela está bem.

Colocou o celular no bolso o desligando e voltou para o salão. Norma lhe observava. Parou por alguns minutos para cumprimentar Arthur, o marido dela e sorriu simpaticamente com ela mantendo um assunto social e frívolo. Não queria pensar naquela possibilidade, mas, se remotamente algo tivesse acontecido e Norma estivesse envolvida, tudo o que menos queria era demonstrar qualquer tipo de sentimento com isso.  Deixou-os com sorrisos e abraços fingidos chamando por Magno por mensagem.  Abraçou o homem assim que ele se aproximou.

— Localize Caroline, por favor. Ela desapareceu do radar de todos em Trento.

Magno assentiu sem muito saber como iria fazer aquilo.

Giuliano continuou:

— Devagar saia daqui sem chamar atenção. Vá até o meu quarto de hotel e de lá faça o que for necessário pra descobrir onde ela se meteu. Laura está desesperada. Pensando besteira demais.

— E se eu a encontrar, o que faço?

— Ligue pra Laura, avise a ela e depois me avise... Fale com Bruna, peça pra ela me mandar o relatório sobre o roteiro de viagem daquele comboio de drogas, pergunte se ela já tem algo. Não vou mais perder tempo.

— E se tiver acontecido alguma coisa Giuliano?

Olhou para o garoto e encontrou em algum lugar dentro dele medo.

— Não aconteceu Magno. Sei que simpatiza com ela e está nervoso. Mas não há nada. Eu sei que não tem.

Aix-en-Provence, França. 19h37min da noite.

A cidade universitária nessa época não se compara ao período de aulas, em que tudo ali vibra com os alunos da universidade passando com suas bicicletas, alguns tranquilos, outros mais atrasados e correndo. Alguns andando sonolentos pelas ruas esperando desesperadamente que algum professor cancelasse a aula nem que fosse o último minuto para poder descansar um pouco.  Gostava daquela cidade, por lhe lembrar da época em que terminava medicina em Paris e era o orgulho da família, pelo menos por aqueles anos foi o orgulho da família já que nos anteriores eles somente o suportavam.

Largou o diploma numa gaveta no mesmo dia da colação.

Pierre observava tudo isso de seu apartamento enquanto bebia o café forte para amenizar a ressaca da noite anterior. Mantinha-se constantemente bêbado para evitar a ressaca, mas ali, o trabalho o chamava. Na realidade, suas dúvidas e curiosidades gritavam.

Pediu o recesso a Joseph, e ele muito solicito e ávido por lhe retirar do caso da moça da propriedade rural, lhe deu. Então, alugou aquele apartamento e tentou, em meio a lembrança de quando era um jovem mais animado e cheio de vida e alguma expectativa no futuro, pensar no que tudo significava e quem no fim estava interessado em lhe revelar tantas coisas.

E aqueles últimos dias na cidade universitária o levaram a tentar descobrir o responsável pelo site dos venenos, porém, pelo que Joseph já tinha lhe dito quando tudo começou, não seria nada fácil localizar o dono, e ainda corria sério risco fazendo aquilo. Então buscou compreender o território que cercava a morte da assistente do primeiro-ministro italiano, estudou todos os fatos, pegou todos os ângulos. Tentou estudar todo o contexto em busca de detalhes e conseguiu fatos muito relevantes.

A mulher era secretária pessoal de Giuliano Bocarelli, sendo criticada por vezes por ser vista como uma protetora, aquela que dava a ele subsídio para se livrar das ciladas e armadilhas que qualquer político italiano poderia se meter. Corrupção com certeza era uma delas e isso se explicava pelo fato dele ser considerado o melhor chefe de um governo de um país europeu nos últimos anos, e quem sabe do mundo.

O homem tinha um total quase zero de escândalos políticos, tirando alguns vários estardalhaços ideológicos da imprensa por questões partidárias. Coisa que ele lidou muito bem ignorando totalmente e trabalhando arduamente até conseguir retirar a Itália de uma das piores recessões já acontecidas no país. Tudo isso dentro de um ano e meio da nomeação até a economia se estabilizar minimamente. Depois daquilo houve poucas pessoas que não o respeitassem. Ele era inegavelmente habilidoso, inteligente e com certeza um grande administrador altamente popular, conquistando uma aprovação popular assustadoramente gigantesca.

Existiam dois pontos mais recentes que chamaram a atenção do francês e que desgastaram a boa imagem de Giuliano Bocarelli gerando algum arranhão na boa fama do homem.

Um deles era a suposta expulsão do governo da senadora Roberta di Rosa, que depois ambos os lados, tanto ele como ela, alegaram serem vítimas de uma campanha de desinformação.

Ex-ocupante da vaga de Ministra de interiores, a mulher se relacionava com figurões conhecidos por não serem os mais fiéis às leis, dentre eles Enrico Pucci, o senador vitalício de partido de ideologias contraditórias ao de Giuliano Bocarelli, com quem o premiê vivia se defendendo e trocando desaforos quase todos os dias.

A imprensa na época das nomeações entendeu ela estar ali por uma pressão do partido dele, que era o de Roberta também apesar de tudo. Ela se demitiu, mas supostamente disse a um colunista que foi obrigada a isso por ele, porém, depois de alguns dias de brigas internas e escândalos negou tudo e se afastou do governo, voltando ao seu cargo de senadora.

Pelo que averiguou, Roberta era uma ratazana da política italiana que se escondia atrás do poder para enganar quem mais necessitava e esconder seus próprios podres. Ao que tudo indicava, um lado da imprensa e população entendeu a expulsão como parte da política antidemocrática de Giuliano às opiniões diferentes as suas, porém, a maior parte suspirou aliviada por tudo aquilo ter acontecido, afinal, Roberta era um calo ao desenvolvimento de um país que tentava se limpar de escândalos.

O segundo problema foi com a liberação de uma gravação de Giuliano Bocarelli explicando em reunião fechada com algumas pessoas do governo, que não tinha opinião formada a respeito de um determinado projeto de lei. A PL da indipendenza.

O projeto polêmico fornecia mais liberdade aos estados para fazerem suas negociações econômicas da maneira que melhor acharem convenientes. Pelo que leu e entendeu, o projeto tramitava no congresso e os políticos da base governista, a maioria, não chegavam num consenso, logo estava preso. A imprensa alegava que eles esperavam uma orientação do presidente do partido a respeito.

 O presidente do partido era o mesmo Giuliano Bocarelli.  E tudo girava em torno dele novamente.

Como premiê ele jamais poderia intervir nas decisões dos legisladores, porém, indiretamente poderia inferir alguma orientação. E os políticos temiam o que fazer sem essa orientação, afinal eles foram eleitos a partir da rede de arrastro político que a onda Giuliano Bocarelli criou e, ainda eram suas bases políticas, não podiam se desorganizar.

O áudio divulgado caiu como uma verdadeira bomba para a política, a primeira por haver possibilidade de espionagem e a segunda, pois não havia qualquer indicação de Giuliano do que fazer. O que gerou, por fim, uma estagnação completa do projeto de lei e por consequência uma verdadeira corrida até o Palazzo Chigi para reuniões com Giuliano Bocarelli, todos os lados querendo convencê-lo.

A espionagem ainda estava em investigação, entretanto, o que poderia ser horrível parecia ter se tornado o escape ideal para não intervir na decisão e para o projeto parar, pelo menos por hora.

— Isso tem cara de armação... — Pierre murmurou ao ler no tablet as notícias dos políticos italianos e empresários de várias multinacionais quase que se engalfinhando para ter qualquer hora com o homem. — Ele foi o que mais ganhou e ainda parou tudo. Se isso tem dedo dele, podemos considera-lo um verdadeiro gênio. Isso é o que chamo de aula de resolução de conflitos...

Pierre apertou o botão que fechava tela do aparelho com a cabeça fervendo de ideias. O premiê italiano era um incrível estrategista se tudo se confirmasse como uma armação da parte dele, o problema era como tudo chegava naquela moça morta. Voltou-se ao computador, e a outra parte do seu enigma. Havia no trecho do vídeo do cartão SD cenas de paredes de uma mansão e dentro da imagem, vários códigos escondidos. Códigos que descobriu darem num arquivo a ser baixado.

Deu de cara com o relatório preliminar feito pelo serviço secreto para a morte de Giovana Rizzon. E ele lhe trazia mais dúvidas ainda. Esse era o seu novo enigma. Achar algo naquele laudo.

A mulher foi assassinada, sem dúvida daquilo, porém, a casa dela foi tomada por assassinos profissionais armados com armas quase impossíveis de se conseguir mesmo ilegalmente. Foi um atentado. Entretanto, as lesões que a levaram a morte não era por balas, ou facas, foi um trauma na região de tronco encefálico que gerou uma hemorragia severa no encéfalo. A perícia concluiu que o trauma veio por uma pancada com um vaso grande decorativo.

Pelo que foi entendido, Giovana atirou com uma arma de fogo em um homem, cujo corpo estava perto dela, quase que no mesmo tempo em que ele lhe desferiu o golpe.

Havia traços de marcas de luta corporal pelo corpo dela e de alguns dos invasores e alguém havia assassinado as pessoas do lado de fora, talvez os seguranças, talvez a própria Giovana Rizzon. Isso não era ainda claro, e provavelmente nunca seria.

— Dura de matar... — Pierre murmurou ao ver a quantidade de corpos dos invasores.

Giovana matou uma equipe mista de homens e mulheres de pelo menos 14 pessoas das 29 que estavam mortas pela casa. Mas poderiam ser bem mais, afinal não tinha como saber o que os seguranças dela realmente fizeram já que estavam todos mortos.

Ele ainda viu as fotos importantes nas autópsias dos corpos. As autoridades não conseguiam identifica-los, ou porque eram pessoas que já estavam documentadamente mortas anos antes ou não existiam legalmente.

O corpo gelou ao perceber a semelhança com o caso da mulher de Marselha, e as semelhanças só aumentavam ao perceber nas últimas páginas que no canto da perna de um homem havia uma tatuagem velha conhecida sua.

O escorpião.

— Não foram 29 invasores, foram 30! — Afastou-se da mesa com a adrenalina ardendo por suas artérias.

Certamente, aquela mulher escapou, depois a mataram com veneno e a jogaram no matagal.  O ciclo se fechava e já pressentia estar chegando ao fim de sua caçada. Aquela mulher nua e envenenada naquele matagal no meio do nada participara da morte do braço direito de Giuliano Bocarelli.

Trento, 22h36min da noite.

Todo mundo sabia... Todo mundo dentro de Trento, e quem sabe da Itália, falava mal de mim por causa daquela dança. Taxando-me das piores coisas sem me conhecer por causa de um comentário de um blog maldoso. — Bebeu o último gole de chá.

Giampiero observava-a penalizado e se sentido culpado por toda aquela confusão.

— Eu sinto muito que isso tenha acontecido... Eu juro que não imaginava que aquele momento causaria tanto mal.

— Você não tem culpa... É uma vítima dessa exposição. — Tentou diminuir o olhar triste do rapaz. — Quem dedica tanto tempo a infernizar a vida dos outros desse jeito?! Por que alguém faria isso?

— Falta do que fazer. E, acredite, isso não é incomum. Eu só nunca imaginei que seria logo com a gente que isso poderia acontecer. Quer dizer, faz anos que não venho a Trento e muito menos em festas, e você, você não faz parte do círculo social dessas pessoas, e ainda bem que não faz!

Ligou coincidentemente para ela na tarde que ela tomou conhecimento dos boatos depois de vários dias de consumição interna sem saber o que fazer e o que dizer pra ela. Adiou tanto o contato com receio de como ela estaria depois de tudo, mas acabou fazendo isso no momento certo. Apesar da primeira recusa na ligação, sentiu que deveria insistir e se dispôs a encontra-la. Achou-a numa rua longe do centro com uma expressão de choro e vergonha.

Era a reputação dela que estava indo para o lixo. E por mais que Caroline tentasse manter a passividade e a calma enquanto falava as lágrimas desprenderam-se dos olhos sem deixar que escondesse como estava machucada. Ele a levou até o apartamento que possuía perto do centro histórico. Ofereceu um abraço acolhedor e o sofá quente para que não corresse risco na rua.

— Eu não sabia o que fazer... Ainda não sei... E tenho que agradecer a Deus por você ter me ligado na mesma hora. Não sei como faria pra organizar minha cabeça. Hoje foi um dia difícil... — Tentou resumir, mas difícil não era bem a palavra ideal.

— Precisa avisar que está bem. Seu telefone descarregou, seus amigos devem estar desesperados.

— Vou avisar, só preciso ir pra casa e achar um carregador...  — Esticou os lábios num projeto de sorriso. — Obrigada por me ouvir.

— Não tem pelo que me agradecer. Toda essa sujeira me envolve também e eu não quero que enfrente isso tudo sozinha. Em parte é minha responsabilidade. Fui eu que insisti para dançarmos. Eu que te agradeço por me atender. E eu senti uma sensação estranha à semana inteira, que deveria conversar com você sobre isso e hoje senti coragem pra te ligar, saber como estava.  Somos amigos, apesar de recente.  Acho que Deus me alertou sobre você nesse estado, sozinha e na rua. — Ele sorriu sem jeito por vê-la com a expressão vazia.

— Deus é bom em todo tempo, em todo tempo Deus é bom... Ele sabe de tudo. Sabe que eu não saberia me acalmar sozinha largada numa rua por aí — Mordeu os lábios, envergonhada pela própria crise de ansiedade. — Eu preciso ir realmente. Já está ficando tarde.

— Deve ir mesmo. Pelas ligações, todo mundo deve estar preocupado... Eu sei que a situação com o seu orientador é complicada, mas eu sinto que vai se resolver. Pode ser algum mal entendido... Ele não me parece o tipo de professor que faria essas coisas. E independente disso, você é forte, já venceu muitas batalhas, use o aprendizado delas para vencer novamente e volte a ter esses olhos tão felizes. Não deixe que eles se apaguem, jamais. Nem te conheço há tanto tempo e já sinto falta deles.

Caroline o abraçou de volta. Giampiero era um bom homem, um bom amigo e muito diferente do meio podre que o cercava naquela festa.

— Obrigada, por tudo. Desculpe os transtornos. — Ergueu um ombro, envergonhada.

Ele segurou seus braços.

— Eu falo o que sinto Carol. Sinto isso no meu coração. Lembre-se do quanto venceu, lembre o que te trás esperança! Saiba que isso é fase e vai passar, você vai vencer de novo usando tudo o que aprendeu. Só precisa lembrar isso, relembrar como venceu e que venceu.

Sorriu pela primeira vez sinceramente desde a tarde.

— Eu vou ficar bem. Eu sei que vou!

— Posso te pedir um favor? Na verdade é um favor e dar um conselho. — Corrigiu-se.

— O que quiser Giampiero... Acho que estarei em dívida eterna por sua camisa molhada das minhas lágrimas... — Tentou ter algum humor e acabou funcionando consigo mesma, já conseguia sorrir com menos peso e isso era bom.

— O conselho: Tome cuidado com aquele homem que está apaixonada. Ele não é conhecido pelo coração sensível que tem. Cuidado para não se machucar. — O coração do garoto pesava ao ver Giuliano Bocarelli com ela, sentia uma aflição estranha ao pensar no relacionamento, via mais dor que alegria entre eles naquele momento. Não os sentia em sintonia. — E agora o pedido. Tem o número de Eliana?

Ela abriu a boca surpresa e orgulhosa apertou os ombros de Giampiero:

— Eu te passo quando chegar a casa. Não vou esquecer! Os filhos de vocês dependem de mim! — Giampiero balançou a cabeça negativamente com um sorriso envergonhado. — Sobre Giuliano... Ele é complicado, mas quem não é? Eu não sei bem como vamos ficar, mas é uma tentativa. Estarei de olho, prometo.

— Oh não, não é por nada do que pensa! Minha mãe precisa de uma equipe de garçons para o aniversário do meu irmão mais velho. Vou indicar a empresa da família dela. — Caroline tinha uma expressão descrente desconcertante que acabou o fazendo rir.  — Só cuidado. Você merece alguém que te ame e entenda sua missão, seu propósito, entende? Giuliano Bocarelli é um tanto frio demais pra alguém como você... Tão alegre.

Caroline voltou até mais perto do rapaz e sorriu de leve.

— Vou observar. Obrigada pelo conselho! E sobre Eliana, ainda não é, mas quem sabe? Dê uma chance. Quem sabe ela não é a mulher que lhe falei na festa? Quem sabe ela não é alguém que viverá o propósito de Deus com você? Quem sabe? Dê uma chance, ela é legal. E eu acho que seria bom. Sinto isso!— Deu uma piscadela.

Giampiero girou os olhos, desdenhoso.

— Não me arranje pretendentes, parece minha mãe falando assim.

— Eu até que tenho idade para ser sua mãe. Não está mais aqui quem falou então... Só sei que estou certa sobre você e Eliana. — Arrumou o casaco no corpo

— Não tem idade para ser minha mãe, Caroline... Vou aproveitar e te levar em casa.

— Não precisa! — Quase gritou com ele e o garoto parou imediatamente o que fazia. — Já cuidou de mim demais. Fique bem e durma com Deus. Não quero abusar mais da sua hospitalidade. Obrigada ficar atento ao que sentia e chegar no momento certo. Eu não sei como eu ficaria se você não tivesse chegado. E eu vou andando, me ajuda a pensar.

Giampiero assentiu mesmo inseguro por deixar Caroline ir sozinha. Abraço-a antes que saísse.

Deixou a casa do rapaz e fez a caminhada até o apartamento quase no automático, o que menos queria era pensar. Evitou o assunto para a própria mente.

Abriu o portão do hall e para sua surpresa encontrou Constanza no sofá, ela conversava com alguém no celular com as sobrancelhas juntas, os lábios franzidos e a expressão tensa. Trancou o portão, envergonhada pelo sumiço e com o barulho ela se virou despretensiosamente. Ao ver que tinha chegado, Constanza largou a ligação e lhe abraçou de imediato.

Não perguntou absolutamente nada, somente buscou contato para ter certeza que a amiga estava bem.

— Me desculpa... Eu sinto muito. Eu pensei que estavam preocupados, mas não imaginava que estava aqui esse tempo todo. Perdoe-me, Constanza.

— Prefiro que me chame de Tanza... — Caroline riu em seu ouvido. — Está tudo bem agora?

Colocou o melhor dos sorrisos, mesmo que fosse falso.

— Sim... Eu precisei pensar um pouco, fui ver um amigo que fiz na festa. Nada demais. Só queria ficar um pouco sozinha. — Soltou o abraço da amiga.

— Isso não me convence em nada...  — Passou as pontas dos polegares nas maças do rosto de Caroline. — Quer me contar o que está acontecendo? O porquê de sumir por tantas horas? Eu sei que aconteceu alguma coisa.

Constanza estava mais sensível desde que voltara da viagem surpresa que fez a Viena. Parecia mais aberta a carinhos e a proximidade, e isso incluía como cuidava dos amigos. Gostava que ela estivesse mais confiante.

— Não queria preocupar... Se quiser ir descansar tudo bem. Amanhã eu explico tudo. Já passou tanto tempo aqui, me esperando pelo meu espetáculo. Eu sinto tanto... — Sentiu-se culpada. — Sinto que estou abusando da sua amizade.

Constanza balançou a cabeça veementemente.

— Eu não conseguiria ficar bem em casa enquanto não tivesse certeza que estava segura. E eu mereço pelo menos um café não acha? Não quer me chamar para subir? — Ofereceu-se antes que Caroline fugisse do assunto.

Constanza conhecia Caroline suficientemente bem para entender quando ela queria falar sobre o assunto, ou quando ela não queria. Ali, na sua frente, entendeu que ela muito mais do que queria, ela precisava conversa com alguém. Os olhos escuros e antes cheios de vida, naquele momento demonstravam um coração perdido e cheio de dúvidas.

Ela precisava falar, muito mais até do que realmente queria.

Seguiu Caroline até o andar que ela morava e no corredor, a pequena chihuahua choramingou na porta da dona, sendo libertada para encontrar a amiga, ou sabe-se lá como Fifi entendia Caroline. A cadelinha exigiu que a porta do apartamento fosse aberta, empurrando-a enquanto Caroline girava a chave na fechadura. Fifi, primeiro que as duas mulheres, entrou no ambiente e choramingou para ocupar seu posto na cama de Caroline.

— Fifi é pequena, mas uma grande incógnita... — Constanza moveu a cabeça de um lado para o outro avaliando o processo que era Caroline conseguir colocar a cadela na cama.

Fifi rosnava para Caroline por ela estar a pegando, mesmo que ela necessitasse daquilo para chegar à cama.

— Vou fazer seu café Tanza... — Caroline massageava as mordidas que levou na mão.— Fifi é só Fifi. Às vezes eu me questiono se ela gosta de mim ou não.

Constanza a seguiu até a pequena cozinha, analisando a amiga. Caroline escondia a dor de maneira quase automática, era hábil em disfarçar até para si mesma o que realmente sentia.

— Acho que ela não confia nas pessoas. Com certeza Fifi te ama, ela não estaria que se não amasse, só precisa permitir que isso. Eu a entendo bem. Experiência pessoal...  Por isso nos entendemos desde o começo. — Sorriu sem mostrar os dentes. — Não precisava do café mesmo. Era só uma desculpa.

— Está frio. Ficou ali no Hall e a calefação não está das melhores. Precisa se esquentar.

— O frio não me incomoda. Eu sou a Elza lembra?

Pela primeira vez naqueles minutos houve algum riso saindo de Caroline. Aquele gesto aliviou o coração da austríaca.

— Peter... — Caroline murmurou um dos autores do apelido das duas.

— Peter... — Constanza respondeu forçando o entusiasmo.

Caroline entregou a ela uma xícara grande de café.

— O que há entre você e Peter?  — Não conseguia imaginar a razão da expressão desanimada de Constanza ao falar do americano. — Há um tom de animosidade na sua voz.

— Nada demais. — Respondeu de imediato. — Foi uma observação mental sobre as farras dele. Não tem ideia do álcool que ele vem ingerindo. Agora que trabalha tanto não acompanha mais os áudios do bêbado. — Caroline pareceu ter acreditado o suficiente para não perguntar mais nada. Engatou de imediato à pergunta que queria. — Por que sumiu desse jeito?

Caroline empurrou o café com dificuldade pela garganta. Não conseguiria explicar por si mesma. Pegou o celular abrindo na página e o entregou à austríaca. Esperou ansiosa por sua reação.

— Quem escreveu isso? — A voz de Constanza estava mais áspera e séria.

Caroline balançou a cabeça negativamente

— Não tenho ideia. Foi publicado no dia primeiro de janeiro. Eu só soube hoje. Eu entendi porque tantos olhares direcionados a mim. Entendi completamente. — Colocou a xícara na pia com força, quase a trincando.

— Irei descobrir.

Ergueu o rosto cabisbaixo, envergonhada por tudo que estava acontecendo e pela própria reação. Entendia o que Constanza falava por descobrir, e se tinha alguém com meio e recursos para isso era Constanza.

— Não precisa... Eu vou ignorar. Não precisa se comprometer por mim, eu sei bem que como vai tentar achar essa pessoa e sei que é por meio dos seus dons tecnológicos e de criptografia avançada.  Eu acho que exagerei com a minha reação...

Constanza colocou o celular na pia com uma expressão apática.

— O que sente não é besteira e qualquer pessoa no seu lugar teria os mesmos sentimentos. Vou descobrir quem fez isso, mas antes, quero que saiba que vou tomar providências quanto a esse blog, página, ou sei lá o que seja isso.

— Eu te agradeço. De verdade. —Abraçou a austríaca. — Mas se for pra resolver isso, quero resolver do jeito correto.

Constanza suspirou pesadamente.

— Tem certeza que não quer descobrir antes quem é o autor?

Caroline negou veementemente.

— Não quero dar um alvo para o meu ódio nesse momento. Só quero organizar minha cabeça. Os dias têm sido um pouco complicados... — Ela mexeu na xícara de café, sem conseguir terminar de toma-lo.

Caroline tentava arrumar na mente as outras coisas, mas não conseguia conceber em fala o tamanho da decepção daquela tarde. Não conseguiria olhar na cara de Luca, porém, ele era o orientador da sua dissertação de mestrado. Foram tantas coisas de uma vez que não sabia o que absorver direito.

Estava tão distraída que não percebeu quando Constanza se afastou e atendeu ao telefone, somente ouviu o fim da conversa.

— Ela está bem Luca. Estou com ela... Não. Não... Vir aqui? — Olhou de relance para Caroline.

Caroline negou com veementemente correndo na frente da austríaca para chamar a atenção dela.

— Hoje não, por favor —  Implorou.

— Luca... — Ela fez uma longa pausa e era possível o ouvir falar — Ela está cansada. Amanhã... Está tarde... — Outra pausa. Constanza mordeu os lábios, indecisa. — Ok.

Caroline mirou Constanza com receio do que ele disse a ela por telefone. Não queria ter que bater com a porta na cara dele se o homem insistisse.

— Ele disse que está no caminho pra cá.

— Não... — Murmurou irritada. Lembrou que Constanza não sabia de nada então respirou fundo e interpretou o papel de calma e tranquilidade que não tinha. — Tudo bem... Ele deve ter as razões dele não é? Pra ele querer falar comigo a meia noite depois de desaparecer pelo mundo. Deve ser muito importante! Muito importante mesmo.

Constanza franziu a testa com estranhamento com Caroline andando ao seu lado quase soltando fumaça pelas narinas.

— Acho que ele tem o dever de conseguir explicar o que está acontecendo. — Caroline a mirou, duvidosa. — Ele me disse. Eu liguei pra ele quando não consegui falar com você, afinal estava numa reunião com ele antes do desaparecimento.

— Sabe? Sabe do... — Tinha dificuldade de nomear.

— Sei e você não está disfarçando sua raiva como disfarça a tristeza. Ele me disse que você precisava desse tempo pra pensar e que depois, quem sabe, ouvir o que ele tinha a dizer. E o meu conselho é que o escute. Talvez acalme esse coração já tão ansioso. — Afagou os cabelos da morena.

— Está do lado dele? — Tentou não soar revoltada, mas estava.

— Não é uma questão de lados Carol. Ele errou, mas não como parece que foi. A culpa dele foi deixar a possibilidade em aberto.

— Acredita realmente nele?! — O tom de voz ia subindo.

— Você acha que se ele realmente tivesse te enganado todo esse tempo teria o trabalho de querer se explicar a essa hora da noite?— Sorriu para amiga, pois sabia bem a maneira como Luca estava desde aquela tarde. Desesperado e se culpando se algo acontecesse. — E ele me deu provas bem plausíveis de que tudo foi um gigantesco mal entendido.

— Nunca imaginei na minha vida que estaria defendendo a conduta de alguém Constanza...

A austríaca suspirou profundamente.

— Eu sei bem a dor de ser mal interpretada e as consequências de um mal entendido. — Conteve o tom triste e apertou as mãos de Caroline. — Eu vou ficar no corredor quando ele chegar. Vou dormir aqui hoje pra ter certeza que não vai sumir do nada. Não é um pedido. É um comunicado.

— Sabia que Luca e Anika estão juntos? — Perguntou fingindo mudar de assunto, mas só queria saber se era mesmo a última a saber.

— De onde tirou isso? Viu alguma coisa? — Constanza fez uma careta de desprezo.

Cruzou os braços forçando uma ideia de despreocupação.

— Fiquei sabendo. Em um blog desses de fofocas...

— Você mais do que ninguém não deveria acreditar em blogs de fofocas, Carol. Não sei de nada disso.

A porta foi batida e Constanza fez um sinal que poderia ser Luca e ela mesma abriu a porta. Laura entrou empurrando a porta mais ainda e sem sequer dar atenção a Constanza já foi sentando no sofá, abraçando Caroline de maneira protetora, inspecionando com os olhos cada parte do corpo dela como se buscando algum pedaço fora do lugar.

— Laura... Eu estou bem... — Caroline até riu olhando de canto para Constanza, que revirava os olhos.

—Eu é que não estou. — Ela apertou o próprio peito. — Estava apavorada, Carol!

— Não faz parte de nenhum método psicológico demonstrar mais desespero do que o sofredor. Não exagere. — Alfinetou.

— Pelo menos eu demonstro algum sentimento Constanza.

— Como descobriu que eu tinha chegado? — Caroline mudou de assunto evitando a discussão entre as duas.

— Constanza me avisou. Não faça mais isso comigo, Carol. — Advertiu com voz manhosa.

— Não faça drama... S eu soubesse que viria não tinha te avisado. — Constanza revirou os olhos.

Caroline riu e as duas voltaram às atenções a ela.

— Eu amo as duas igualmente se a razão da discussão for o ciúme. — Ergueu os ombros soberbamente. — Venham aqui meninas. — As chamou e Constanza se aproximou. Caroline apertou as duas em um abraço. — Juro que não queria preocupar vocês. Mas obrigada por estarem aqui.

A porta soou novamente e dessa vez Fifi latiu irritada por ter mais uma vez seu precioso sono interrompido.

— Abra a porta Constanza, está mais perto... — Laura desdenhou.

Constanza se levantou do sofá bufando e se levantou para abrir a porta.

Dessa vez foi Luca que entrou um pouco desconfiado e carregando uma mochila grande de viagem. Caroline não queria se virar e olhar na cara dele, mas não podia ser irracional, Luca era seu orientador de mestrado, e seja lá a explicação que ele tivesse o melhor era manter o profissionalismo e ouvir tudo para manter a paz até o término do curso.

Laura franziu o cenho de maneira irônica ao observar Luca se aproximar de Caroline. Já sabia pelo próprio Luca o que tinha acontecido naquela reunião. Anika tomou a frente de tudo e não deu espaço para que Luca falasse, criando a confusão e evitando o esclarecimento posterior. Caroline estava transtornada demais para ouvi-lo.

— Não sabe o quanto de excesso de bagagem paguei por causa dessa bolsa. — Ele tentou quebrar o gelo.

Caroline ensaiou o sorriso, mas não o completou. Faltava-lhe ânimo para isso.

— Acho que eles precisam conversar sozinhos... — Constanza puxou Laura pelo braço.

— Não mesmo. — Ela resmungou puxando o braço das mãos de Constanza. — Eu quero ouvir.

—Vamos lá para o corredor Laura! — Puxou a loira para fora e acenou para Caroline. — Estaremos aqui fora, Carol. Quando terminar é só chamar a gente.

Luca esperou Constanza trancar a porta na saída para colocar a mochila no chão. Olhou no rosto de Caroline, profundamente aliviado em vê-la bem. Aquela tarde foi um inferno.

Constanza o ligou falando que Caroline havia ligado, falado meia dúzia de coisas sem sentido, depois desligou e que havia tentando contato, mas não conseguia mais falar com ela. Explicou-a brevemente o que havia acontecido com Anika, mas a preocupação que lhe corroía era se não havia algo errado. Se Máximo ou Norma estavam envolvidos.  

A tensão estava o matando e o medo o torturava naquelas horas. Então Laura, ao perceber que Caroline não retornava as ligações procurou por Luca. Trocaram acusações e ameaças, mas nada mudaria o fato de que Caroline não dera sinal de vida pra ninguém. Evitaram chamar atenção e não avisaram a mais ninguém, porém ainda sondaram Kiara, Olívia ou Raena sobre a localização dela. Laura conversou com Giuliano, mas nem com o namorado ela entrou em contato.

Tudo feito com o coração quase escapando pela garganta.

— Não sabe o quanto fiquei preocupado. — Caroline estava silenciosa, sequer correspondendo as suas tentativas de conversa. Abriu a mochila e retirou de dentro um globo de neve. Caroline arregalou os olhos imediatamente. — Reconhece?

Ela sacudiu a cabeça positivamente pegando o globo. Havia ganhado de presente de um primo, Victor enviara de Londres no primeiro mês em que ele se mudou pra lá.

— Como? — Perguntou sem o olhar e com os olhos molhados pelas lágrimas de saudade de casa, da família, dos amigos que deixou no Brasil. — Isso estava lá em casa.

— Seus pais.

— Meus pais?... Como te mandaram isso?

— Fui a sua casa. — Disse como se fosse à coisa mais normal e óbvia do mundo.

Caroline esfregou o rosto sentindo a confusão se instalar de novo em sua cabeça.

— Você foi a minha casa?!

— Me hospedei lá. Encontrei sua mãe por um acaso, nos conhecemos. Ela me reconheceu na realidade. São do mesmo jeito que você os descreve. Sua mãe parece tanto com você!

Caroline ao ouvir que Luca estava com seus pais guardou o globo atrás das costas e a expressão voltou a ser séria mesmo com a surpresa ao rever o objeto tão familiar e significativo.

— Constanza disse que queria me explicar algo. Não entendo o que a visita aos meus pais tenha a ver com isso. — Ela piscou várias vezes impaciente. — Não precisa me explicar nada. Eu já entendi o que aconteceu, já compreendi o que fez. É um homem inteligente que somente se aproveitou do fato de que eu confiava em você para pegar de algum jeito as minhas ideias. Se você veio tentar explicar isso com discursos emocionantes e envolvendo minha família pra me penalizar, pode ir pra sua casa. — Caroline estendeu os braços indicando a porta de saída.

— Eu nunca faria isso com você ou aluno nenhum... — Começou.

Caroline não o olhava. Para ela era mais confortável ter como visão as paredes. Estava irritado, cansado, nervoso.  Queria ser ouvido, que ela lhe entendesse. Parecia que custava muito para Caroline lhe dar aquele voto de confiança.

— Eu sinceramente não estou com a cabeça pra ouvir alguma explicação nesse momento. Se quiser, amanhã conversamos.

Luca ignorou o pedido dela.

— Minha intenção no Brasil foi tentar trazer esses documentos porque sempre foi seu sonho estuda-los e eles são muito relevantes. Eu somente usei da minha influência para trazê-los até aqui. Eu contei tudo aos seus pais. Não fiz nada pra te enganar. Não sou esse tipo de professor, não sou esse tipo de ser humano!

Caroline parecia descrente de qualquer coisa, que o cansava mais ainda. O deixava desanimado antes de começar.

— Meus pais sabiam esse tempo todo que você estava lá? Eles te ajudaram nisso tudo?! — Indignou-se.

— Eles me contaram a história. Ajudaram-me a conversar até com o padre da igreja. — Bufou mexendo nos cabelos pretos de maneira impaciente. — Tem o direito de pensar assim. As circunstâncias te levam a isso, mas se eu estou aqui pra te explicar, por favor, me dê ouvidos! Eu sempre tive uma conduta profissional irretocável. Nunca fiz nada antes que pudesse te fazer pensar isso. Nunca tratei com meus alunos dessa maneira. E você não sabe o quanto me sinto mal por te fazer pensar assim, o quanto tive meu orgulho ferido com as suas acusações. Não pode agora não me dar o direito de resposta. Eu preciso falar o que aconteceu pra dormir em paz!

Os dois já gritavam um com o outro e isso tirava dos dois, o pouco que restava das forças. E ele não queria discutir com Caroline, mas desejava ela lesse as entrelinhas, que sentisse seus sentimentos de incompreensão gritando. Conteve tudo o que sentia para manter todo o plano. Mais do que nunca a queria por perto, sem mais distâncias. Já tinha tomado tempo suficiente pra se recompor. E foi essa distância que o colocou naquela situação. Foi à distância que a tirou de suas vistas e deu margem para que ela desaparecesse, desconfiasse, ficasse em risco. Não podia correr o risco de errar.

Caroline sentou no sofá novamente e respirou fundo, dando finalmente espaço para ouvir as explicações e olhando em seus olhos.

— Eu estou ouvindo.

— Eu viajei para descansar... Eu precisava desse tempo Carol. — Ao chama-la pelo apelido ela ergueu o rosto como se ofendesse. — Minha cabeça estava um turbilhão de pensamentos, eu mais do que nunca precisava pensar e arrumar minha mente. Se não o fizesse eu enlouqueceria. Tudo me sufocava.

— Não precisa entrar nesses detalhes. — Ela o olhava com certa rispidez. — Esse é um assunto pessoal seu... Não acredito que eu tenha o direito de saber disso.

— Para deixar toda a situação às claras e te dar a certeza de que não fiz nada pra te prejudicar, eu explico tudo. Você merece minhas explicações e vai ouvi-las.

Caroline mexeu a cabeça concordando sem realmente ter certeza se necessitava ouvir tudo aquilo. Sentia a tristeza e a frustração dele.

— Eu fiz algo errado, ou pelo menos pensava constantemente em fazê-lo. Eu quebrei uma regra ética e não tem nada a ver com roubar ideias. — Ele sentou na ponta do sofá com uma expressão dessa vez dolorida.

Caroline viu a verdade de que ele estava realmente triste por algo. Sentiu-se culpada por não ter visto antes, por de algum jeito não ter ajudado.

— Eu... Sinto muito... — Mordeu os lábios um pouco culpada.

— Eu me apaixonei Carol. — Ela fixou os olhos em si de maneira atônita. — Eu me apaixonei e não sabia lidar com mais nada, me afastei dos meus alunos como se a proximidade fosse o culpado pelo que eu sentia.

Caroline juntou na cabeça as informações. A maneira como se afastou dos alunos e o fato dele referir algo antiético. Havia um lado de sua mente que parecia já ter todas as respostas, se impediu de ouvi-lo, afinal que sentido aquilo faria?

— Se apaixonou por uma aluna... Foi isso que aconteceu? — Falou lentamente, esperando as reações dele.

Luca sacudiu a cabeça positivamente olhando uma Caroline que se encolhia com uma expressão assustada.

— Eu me sentia tão errado...

Ela se incomodou pelos próprios pensamentos e soltou todo o ar que guardava em seu peito se livrando do que se passava em sua cabeça. Nunca imaginou que Luca, o famoso Luca Bocarelli, sucumbisse a um amor proibido daquele jeito. Não esperava isso. Em qualquer outra circunstância jamais imaginaria ouvir aquela confissão de Luca.

Sua cabeça que já estava uma bagunça parecia ter dado outra volta de trezentos de sessenta graus.

— Luca... — Tentou formular sem saber na realidade o que queria falar. — Eu sinto muito. Estou... surpresa... eu... Meu Deus do céu...

— Eu sei. É errado. O que eu sentia... O que talvez eu ainda sinta. É uma das coisas mais erradas que alguém como eu poderia sentir. Eu sei o que acha de mim. Eu imagino o que passa na sua cabeça, o quanto... O quanto sou desprezível...

Ela queria ter uma expressão compreensiva, queria conseguir reagir, mas a surpresa a fez criar um silêncio sepulcral. Mexeu os ombros tirando de lá um peso invisível e se aproximou dele vagarosamente. Luca imediatamente ergueu os olhos azuis molhados com lágrimas de culpa.

— Tentou se afastar de todos porque culpava sua extrema proximidade com todos os alunos como causa do seu “erro”. — Fez aspas como as mãos com a voz mansa. — Isso não resolveu nada. Você meteu os pés pelas mãos, mas estava tentando se ajudar de algum jeito.

—Eu queria fugir de tudo.

— Eu imagino... Entendo o quanto deve ser difícil se apaixonar por alguém quase inalcançável... — Desejou poder tocá-lo com afeto como sempre fez com um abraço, entretanto, havia uma barreira de um misto de sentimentos que lhe impedia. — Então  decidiu ir para o Brasil?

— O Brasil foi uma das minhas paradas. — Ele sorriu com a lembrança boa e por senti-la mais próxima. — Tive alguns assuntos para resolver e lembrei o que me contou sobre os documentos. Fui até sua cidade. Um calor infernal. Conheci sua mãe um pouco por acaso, depois seu pai. Eu não queria dizer a eles a razão de estar ali para que não dissessem a você. Não queria que me interpretasse errado ou que... Enfim. — Resumiu. — Você me interpretou errado de qualquer maneira. Eu disse tudo a eles, pedi que não contassem a você, não sabia se conseguiria efetivar a parceria, entre outras coisas também. Mas quando voltei, Pepe morreu, Máximo apareceu, tanta coisa aconteceu que eu simplesmente não tive coragem nem tempo pra te dizer nada.

Havia uma Caroline ferida em sua frente e que sabia se proteger com a indiferença melhor do qualquer pessoa que conhecera e essa não tinha raiva diminuída tão facilmente.

— Tempo teve Luca, mas quando chegou cortou amizade comigo, se afastou. E isso foi horrível. — Confessou revelando que não era indiferença, era tristeza.  — Eu me importo, me preocupo, perguntei até ao Giuliano por você, e de repente, me senti descartável.  Aquilo doeu Luca. Sei que é meu orientador, meu professor, mas é meu amigo, ou eu era a sua... E de repente parece que a amizade só existiu da minha parte.

Ele concordou sabendo que havia errado, que não tinha agido a melhor maneira.

— Tive tempo. — Concordou, aceitando a culpa. — E eu ainda não estava totalmente equilibrado com os meus sentimentos. Por isso disse e fiz o que fiz.  Eu agi errado. Acabei misturando tudo e te deixei sozinha quando você precisou de mim mais uma vez.

Caroline respirou profundamente e com braveza controlou todo o desabafo que envolvia aquela amizade abalada. Ainda não era o momento de falar sobre isso, talvez nunca fosse. Engoliu os sentimentos e tentou focar em outra coisa que não lhe despertasse tristeza.

— E os documentos? Como foi isso?

— Eu consegui autorização. Porém não sou especialista nessa área. Sei o mínimo sobre o período colonial do Brasil, mas Anika sim e tem contatos que também sabem. Então pedi a ajuda dela.

— E ela resolveu a pedir a minha ajuda? — A voz já demonstrava sua indignação. — Por que você não me procurou? Porque foi ela que ligou pra mim quando eu sempre trabalhei com você? Quando te vi no meio de tudo e que foi ela quem me chamou, foi como se fosse tudo premeditado...

— Achou que fiz de propósito. Que não te considerava mais. — Complementou. — Não foi do jeito que você imagina. Existe muito mais por trás disso, Carol.

Caroline baixou o rosto, envergonhada mais uma vez. Sentia-se culpada e infantil por sentir-se traída, mas não negava para si mesmo que apesar de ter explicações necessitava de tempo para absorvê-las.

— Ela me ligou. Foi ela que me chamou, mesmo que eu não soubesse ainda do que se tratava exatamente.

— Eu mandei. — Caroline o olhou totalmente surpresa mais uma vez. —Condicionei a presença dela a sua no projeto, e a obriguei a ligar e pedir. Eu queria puni-la por ela achar que pode te humilhar e por isso te coloquei numa posição acima dela. Anika só está no projeto enquanto você estiver. Estava do lado dela quando ela te ligou. Ela fez tudo de caso pensado para te magoar.

Caroline levantou com a onda de energia percorrendo o corpo, sentou novamente por não conseguir completar o raciocínio que a trazia para a realidade. Parecia fantasioso demais.

— Isso é sério? Luca... isso é chantagem!

Luca confirmou.

— Pergunte a ela se tem dúvidas. A única coisa que fiz de tudo isso foi usar a minha influência e a de Anika para conseguir que as cartas fossem estudadas aqui. Chame do que quiser, eu chamo pagar pelos próprios atos. — Disse a última parte com frieza.

Ela começou a andar de um lado para o outro com o estômago embrulhando como se alguém tivesse lhe dado um soco nele. Luca segurou seus ombros para que parasse de andar.

—E por que não me disse isso na reunião, Luca?

— Eu não tive tempo. Anika não me deixou mais falar. E quando você acreditou que tinha entendido tudo, deixou a sala e, bem, já sabe o que aconteceu. Anika queria essa discussão para me irritar, para te irritar e te fazer sair do projeto. Ela queria retirar a punição que dei a ela. Anika é uma mimada Carol.

Caroline retornou aquela tarde e lembrou que Anika realmente o atropelou na fala.

— E por que não falou antes, lá mesmo, na hora em que ela explicava?

— Por que eu não imaginava que ela iria fazer todo esse circo. Anika me interrompeu, você surtou, tente conversar, você sumiu e ficamos loucos sem saber o que poderia ter acontecido. — Falou como se fosse óbvio. — Eu sei que dei brecha pra esse entendimento, eu sei que errei ao me afastar de você... E de todos os alunos. Sei o quanto o que pensou pode fazer sentido. Mas acredite em mim. Eu não quero roubar nenhuma ideia, nem sua e nem de ninguém. E não quero que pense mais nessa possibilidade. Confie em mim, Carol. Não quero estragar mais ainda a minha relação com você e com os meus alunos. Eu quero arrumar a bagunça dos últimos dias, começando pela mais afetada.

Caroline tomou distância dele indo até o outro lado da sala.  Acreditava em Luca, no fundo acreditava, mas também existia uma Caroline que lhe dizia que pessoas mentiam e que ele muito bem poderia rir da sua cara quando saísse dali.

— Eu preciso pensar... Você ainda é meu orientador, então... De certa forma... As coisas vão se ajeitar à medida que nós dois resolvermos os nossos problemas com os outros e com nós mesmos.

Luca balançou a cabeça para concordar, não porque estava feliz, mas porque era melhor que nada. Porém, estava aborrecido com tantas dúvidas. Afinal, com Giuliano que era quase um estranho ela andava aos beijos, mas a si que sempre esteve lá, ela não era capaz de dar um único voto de confiança. Estava sentindo a indignação crescer na terra preparada pelos ciúmes.

Umedeceu os lábios e balançou a cabeça positivamente. Estava injuriado demais para falar qualquer coisa e se focou em outra coisa.

— Eu preciso entregar as coisas que seus pais te mandaram. — Foi até a sacola e abriu mais retirando alguns livros, roupas, e um pote lacrado de um doce. — Coloquei na geladeira e resisti muito pra não comer.

— Doce de abóbora... — Caroline leu no rótulo com um sorriso bobo. — Como conseguiu passar com isso no voo?

Luca deu de ombros como se não era importante e ela continuou a mexer nas coisas que seus mais mandaram.

O clima continuava pesado e ambos sentiam isso.

— Eu sei que não tenho o direito de me meter... Mas, eu tenho uma dúvida, na realidade, várias... — Luca fez sinal para que continuasse e ela obedeceu à deixa—: Por que está com Anika se ela é tão mimada como diz? Se gosta dessa aluna, por que está com Anika?

O homem esfregou o rosto num sinal de impaciência que a fez se encolher no sofá. Sabia poder estar sendo invasiva, mas se sentia completamente confusa com relação às palavras de Luca sobre Anika e ele estar saindo com ela mesmo assim.

— Caroline... se eu acabei de te dizer que amo outra mulher, de onde tirou que eu estou com Anika?

— Eu soube. — Ela falou rápido se acusando.

— Acabei de te dizer que gosto de outra pessoa, não faz sentido que eu queira estar com Anika.

Carol anuiu. Mas ainda outra coisa lhe fervia os neurônios.

— Quem é ela? Como isso tudo aconteceu?

— A aluna? — Ganhou tempo.

— Sim... Eu sei que não é da minha conta. Se não quiser falar, tudo bem... Mas eu a conheço? Ela sabe do que você sente?  Ela sente o mesmo? O que aconteceu entre vocês... Resolveram-se? — Desandou a falar com ansiedade.

Luca sacudiu a cabeça positivamente.

— Você a conhece sim.  — Fugiu dos olhos dela. Se Caroline lhe mirasse com tanta intensidade não teria forças para mentir. — Pelo menos eu sei que se viram. Eu não sei se ela sente o mesmo que sinto por ela, porém, acredito que ela saiba. No fundo ela sabe...  Já cheguei até a pensar se ela não quer me torturar, se já não percebeu e está brincando comigo.

— Sinto muito, Luca. Digo, por ser tudo tão complicado entre vocês. Talvez haja uma chance. E não será nem o primeiro nem muito menos o último professor que vai sentir isso... Não se culpe tanto. E se ela estiver fazendo o que diz... Ela não te merece. Nem ela, e nem Anika. — Disse com um olhar piedoso.

Luca não queria pena e muito menos ver isso nela, então deu as costas a ela fingindo ter algo interessante no teto para se ver.

— Ela é do grupo de Berlin.

Caroline largou o pote de doce do lado do sofá.

—Então faz um bom tempo... Aquele grupo é de doutorado, foi até bem antes de eu vir pra cá. Oh... Eu... Meu Deus que complicado. E Você a ama? Ama ela de verdade?

Ele fez uma careta.

— Estou sendo intrometida de novo não é?  Desculpa Luca... Desculpa, desculpa de verdade. Eu sei quanto isso é doloroso. Eu quero tentar de ajudar de algum jeito...

Com aquela frase, tom de voz e expressão parecia que Caroline retornara ao estado de sempre. Sem dor, espontânea, o raio de luz que era. Luca se acomodou no sofá com um sorriso admirado ao revê-la em suas lembranças e agora em sua frente.

— Eu amo como nunca amei mulher nenhuma na minha vida... — Ele a viu sorrir admirada e aquilo voltou a lhe aquecer a alma. Então se obrigou a voltar à realidade —: Ouvi boatos que ela está com outra pessoa. E eu não posso demonstrar nada. Ela é minha aluna, ninguém pode saber, eu tenho que esconder o que sinto até de mim às vezes e isso me sufoca profundamente. — Caroline aquiesceu. — Não deveria te dizer isso. Acho que não quer ouvir lamúrias de um professor apaixonado. É o fundo do poço.

— Eu perguntei Luca... Eu me preocupo.  Eu compreendo perfeitamente que esteja quase achando petróleo de tão fundo que está nesse poço. — Ela deitou a cabeça no ombro dele para confortá-lo, a barreira que sentia anteriormente se dissipou um pouco. — Acho que nem Samara te assusta mais de tão fundo do poço que está... — Tentou rir, mas não sabia como ele reagiria a sua maneira de tentar tirá-lo da tristeza.

O corpo dele reagiu imediatamente com um arrepio ao sentir o toque. Precisava mudar de assunto.

— Acredito que está tentando me ajudar...  Mas passei um pouco mais abaixo da Samara faz um tempo. — Sorriu naturalmente.  — Quem te disse que eu estava com Anika? — Tinha as próprias suspeitas a respeito e elas se confirmaram quando Caroline escondeu as mãos dentro do casaco nervosamente.

Ela não sabia bem o que dizer e não queria envolver Giuliano naquilo, afinal sabia que os dois primos não eram o mais querido um para o outro.

— Vi numa página dessas de fofoca... — Deu de ombros.

Luca cruzou os braços de maneira intimidadora.

— Mentirosa... — Assobiou.

— O importante é que eu soube! Ou não tão importante assim na realidade... — Murmurou, pensativa.

— Vai voltar para o projeto?  

— Sim. É o projeto dos meus sonhos... Sempre quis investigar aqueles papéis. Sempre.

— Tem toda razão, e o projeto é seu. E quanto a Anika?

— Não quero prejudica-la Luca. Por mim ela pode continuar da mesma maneira. — Deu de ombros com uma expressão culpada.

Luca admirou a bondade dela.

— E nós? Ainda somos amigos? — Esperou a resposta positiva dela imediata, mas isso não aconteceu. Caroline baixou o olhar numa negação sem palavras. — Ainda acha que eu peguei sua ideia?

— Não! — Ela assegurou. Porém deu um longo suspiro. — Eu não posso mentir pra você Luca. Não será como se nada tivesse acontecido. Eu entendo suas razões, realmente as entendo. Mas uma parte de mim... Ela sentiu muita falta de você quando se afastou e essa parte vai demorar um pouco até arrumar tudo isso. Eu sei que parece besteira, mas é assim que me sinto. Perdão.

Luca suspirou profundamente.

— Quanto tempo?

—O suficiente pra eu arrumar minha cabeça esses dias... E eu peço desculpa por não te ouvir... Por não te deixar explicar o que aconteceu e sair te acusando. Eu realmente... Realmente sinto muito que tudo isso tenha acontecido.

— Qualquer pessoa no seu lugar faria a mesma coisa, Carol... Amigos de novo?

Luca sabia que não estava tudo ainda tão normal, mas não estava tão ruim quanto suas próprias previsões.

— Senti sua falta.  Um abraço para selar a paz? — Caroline o puxou sentindo falta dele. — Aconteceu tanta coisa Luca... Tanta!

Abraçou-a com cuidado de quem já sabia ter perdido parte da intimidade. Agora lutaria para reavê-la de maneira real e sem mais interrupções. Estava com meio caminho já andando, só precisava continuar.

— Imagino... — Pensou em Giuliano e sua voz soou desanimada. — Quero que me conte tudo assim que der. Tenho uma vida de assuntos com vocês que deixei pra trás. — Afastou-se dela já preocupado. — Onde estava essas horas todas? Por que sumiu assim?

— Giampiero. Eu estava com ele. O filho do prefeito de Trento.  Uma longa história. Não quero ficar triste lembrando isso... Outra hora eu te conto. Eu só quis pensar. Me senti sufocada no meio de tanta coisa. Vou colocar as meninas para dentro agora. Acho que parei de ter vontade de gritar com você — Ela disse espontaneamente e fez menção de levantar.

— Eu vou precisar ir agora. A gente se encontra. — Pegou o casaco no sofá a vendo confirmar. — Em três dias organizaremos algumas coisas da metodologia dos estudos. Por favor, não se atrase. Eu sei que é difícil, mas não se atrase. Se marcarmos as 13hrs, é as 13hrs. Não é as 13: 10? Ok?

— Já entendi! — Falou bufando. — Já voltamos mesmo a programação normal...

Luca piscou para ela antes de sair e no caminho até as escadas encontrou Laura. Ela lhe olhou desconfiada. Ignorou-a completamente e entrou no carro com a mente lembrando quem disse a Caroline sobre Anika.

Aeroporto de Roma, 00h13min da madrugada.

Giuliano caminhava até o carro que o esperava na pista verificando as mensagens de Laura sobre o aparecimento e desaparecimento repentino de Caroline. Até àquela hora ela ainda estava com Caroline conversando e tentando entender o que aconteceu naquele período de vazio informacional, até então, o que ela sabia era que Luca havia explicado todo e qualquer mal entendido e conquistado parte da confiança de volta.

Incrível como para ele sempre seria mais fácil.  Outra enorme surpresa de mau gosto foi saber que Luca esteve com os pais dela e que ficou hospedado com eles na passagem ao Brasil.

Estava pensativo quando Magno entrou na outra porta do carro, lhe entregando uma pasta lacrada.

— Bruna mandou o roteiro que o El dominador usou para as drogas chegarem à casa de prostituição de Varna. Ainda precisa de mais tempo para assegurar tudo, talvez mais um mês.

Giuliano tirou os olhos do chão do carro e os pôs no rapaz.

— Não temos um mês. Vamos encontrar algo ou alguém que nos passe a certeza dessa rota.

Magno assentiu e se endireitou no carro.

— E Dimitri? O que faremos?

— No tempo certo indicarem o caminho para que a dona dele o encontre. Ela está como louca o caçando. Conseguiu arrancar dele algo novo sobre os hábitos de Nikolai?

— O suficiente para saber onde ele almoça e com quem sai. Precisamos conectar ele a um grande negociante de armas. Alguém em vista?

— Traficante de drogas também serve.  Máximo quer expandir aqui, necessita de armas e um fornecimento adequado. Primeiro a rota de drogas de Varna, depois o conectamos a Nikolai. Enquanto isso siga com o plano das denúncias. Com quem foi o último negócio de Nikolai? Meera achou algo?

— Izumi Abe.

— As mãos da Ho chi tau em Los Angeles... Um prodígio nos negócios o nosso garoto Nikolai — Comentou estalando a língua. — Entregue o dossiê da transação que Meera fez nas mãos de Hideki Takiomoto.

Hideki Takiomoto era um dos policiais de Seul com o qual tinha contato, um conhecido. O homem não trabalhava mais nas ruas e ficava em ações estratégicas no escritório. Porém, também agia como espião quase que triplo, entregando informações de uma máfia para outra, e quando lhe era conveniente, à polícia também.  Algumas das grandes ações realizadas em conjunto com a Interpol, pegando criminosos de máfias asiáticas tinham começado por alguma deixa de Hideki. E mais uma começaria em breve.

— Isso não vai levar a polícia ao Nikolai. Imagino que quer que as armas sejam apreendidas com a rota descoberta, mas não acredito que só isso conectará a polícia ao irmão de Dimitri.

Giuliano sorriu misterioso para Magno.

— E não vai. Não é como pensa. Não quero que Hideki entregue essas informações a polícia. Hideki está encrencado com uma das máfias, estão desconfiando dele e ele quer demonstrar lealdade. A informação do carregamento de armas será entregue a máfia opositora, provando a lealdade do Takiomoto. Com isso, haverá um ataque surpresa e uma guerra de gangues.  Aí sim teremos a polícia no meio. Não quero que elas descubram Nikolai agora, quero que elas peguem uma atividade de um novo traficante de armas. Afinal, o negócio dele não foi identificado por nenhuma polícia do mundo, meu plano é que ele tenha uma ficha nas polícias.

— Quer que ele seja pego quando negociar com Máximo... Naturalidade do processo — Constatou pensativo. — Máximo terá o negócio abalado novamente, o El dominador será ligado a mais um crime na Europa, e tudo conectará por fim... Norma, Máximo e Dimitri... Sinceramente não sei como vai conseguir isso.

— Um pouco disso... Não se preocupe garoto. Tudo ao seu tempo. — Passou uma página da pasta em que lia o roteiro das drogas de Máximo para chegar a Varna. — Observe isso, Magno. — Ele apontou para um nome no papel pacientemente. Realmente ensinando o garoto.

— Posto fiscal?

— Detalhes são sempre importantes. Como acha que a droga de Máximo passou pelo posto fiscal escondida em caminhões? Alguém desse posto sabe do esquema e é pago para fazer vista grossa. Peça que Bruna interrogue o fiscal do carimbo, descubra que tipo de caminhão é esse, qual era a carga que ele deveria estar carregando e por fim quem pagou a ele.

Magno assentiu levemente atordoado com o giro de informações em sua cabeça. Giuliano estava preparando o terreno para que Nikolai fosse preso, ao mesmo tempo em que investigava Máximo e a carga de drogas para que tudo no final se relacionasse.

— Vou repassar tudo pra ela... E Pierre?

—Ele já sabe sobre a morte de Giovana, sabe que está relacionado aos Scorpions, apesar de ainda não saber do que se trata, e o mais importante, já chegou ao site da Hera. Está a um passo de nós. — Fechou a pasta e cruzou as pernas. — Pegarei um voo pra lá em algumas horas. Veja meu voo de volta pra Roma o de Roma para Trento, por favor.

O homem tomou uma grande lufada de ar e mirou a janela voltando a pensar na única coisa que o desafiava estrategicamente falando: Qual era a razão de Luca estar no Brasil com a família de Caroline? Tinha suas hipóteses, mas ainda nada que realmente pudesse se parecer com os atos anteriores de Luca. Entretanto, sua mente estava condicionada a um padrão de ação, talvez houvesse algo novo que ainda não estava acostumado.

Virou para Magno, o olhando atentamente ao ponto do garoto levantar os ombros, desconfiado.

— O que está pensando ainda?

Giuliano balançou a cabeça com um sorriso confortador. Não queria assustá-lo.

— Magno, se fosse você na situação do Luca, o que te levaria a deixar a Caroline sozinha, e mais próxima de mim, por consequência, para ir ao Brasil e conhecer os pais dela? Eu imagino que ele foi buscar informações... Mas o que? Por quê?

Magno tentou pensar como se fosse Luca. Um homem que era apaixonado por Caroline e tentava a todo custo afugentar a presença de Giuliano da vida dela, que de repente larga tudo para ir ao Brasil e a deixar sem informações e desprotegida.

— Ganhar espaço talvez, mas não só isso... — Giuliano concordou com a fala do garoto. — Eu acredito que ele não largaria tudo aqui, se não soubesse que lá conquistaria algo mais relevante. A confiança dos pais da Caroline... Talvez, descobrir algo importante sobre o passado dela que possa ser útil para os planos dele. Acredito que ele não tenha tido uma motivação única. — Enumerou pensativo. — Houve muito mais por trás das ações dele do que somente isso. Talvez ele saiba de algo que você não saiba. E por isso não consegue entender o que ele fez.

Giuliano esfregou as mãos com os olhos focados em um ponto fixo. Havia ensinado aquilo a Magno, a ver detalhes e a vislumbrar que se alguma ação não está totalmente clara, é porque falta algum pedaço da informação.

Como em um problema matemático: Se todos os fatores relevantes para o procedimento do cálculo estão presentes, resolvê-lo é questão de tempo e interpretação. Porém, se o cálculo está incompreensível demais, é porque existe a possibilidade alguma variável, ou informação, não ser conhecida.

— Resta saber então o que Luca sabe que eu não sei...

— Com certeza a história de que se foi para pensar não é a verdade concreta, é parte dela.

— A ponta de um iceberg... — Ele mirou Magno de maneira profunda. — Um iceberg que eu vou bater e acreditar que não é nada demais, entretanto vai me afundar e me partir ao meio. Como o Titanic.

— Como o titanic. — Magno sentiu a força da expressão.

Giuliano passou a aceitar a derrota mesmo sem saber de onde ela viria.

— A arrogância precede a queda. Há algo que meu primo sabe mais do que eu, e se eu não quiser cair, terei que ser humilde e aceitar que ele está um passo a minha frente.

— Ou descobrir o que ele fez quando ninguém o viu... Quer que eu investigue isso mais a fundo? — Magno colocou as mãos nos ombros de Giuliano. — Talvez tenha mais pistas interessantes.

— Faça isso.  Por favor, localize todos os locais que ele foi, tudo o que fez e com quem conversou... Qualquer coisa pode ser útil. — confirmou. — Percebe o quanto foi fácil, mesmo com o que falei sobre Anika e a possibilidade do roubo de ideias, ele consegue conquistar a confiança dela? Essa viagem estreitou um pouco mais os vínculos da confiança, com ela, com a família... E apesar da crise, ele saiu mais forte.

— Ele tem um grande ponto a favor Giuliano. — Magno começou e Giuliano lhe ouviu com atenção. — Ele a ama e as intenções dele sempre serão mais limpas. Sempre mais sensíveis que as suas.

— É um fator que eu não me atentei: O suposto amor que ele sente por ela sempre será mais sensível. Talvez eu necessite ser mais sensível... Um pouco mais intenso e, por fim, mais preciso nas minhas ações. Porém, ele sempre será mais verdadeiro. Não se pode ter tudo, mas posso aparar minhas arestas.

Magno negou com a cabeça sabendo que os próprios pensamentos não seriam acolhidos de forma absoluta por Giuliano. Ele já compreendera que Luca estava mais a frente pelos sentimentos que tinha, e que a chave não era suas atitudes calculadas, mas as sensíveis. Todavia, o mais profundo das conclusões era que o amor que movia Luca, era o mais límpido e claro fator destrutivo para tudo que seu chefe pretendia. Luca sempre teria e queria mais dela do que Giuliano e, por conseguinte, daria mais do que ele poderia oferecer. De fato, esse era invencível.

— Pode fazer tudo, mas ele sempre será real. Você não é real... — Acabou falando por receio de que Giuliano não compreendesse totalmente onde pisava e cometesse mais erros do que o que já fazia. — Ele a ama, você não. Ele sempre será mais verdadeiro, mais confiável, mais presente, mais próximo...

Giuliano apertou os olhos e soltou um grunhido intenso de raiva.

— Luca não é como as pessoas pensam... Ninguém o conhece tanto quanto eu.

— Acha que ele não a ama de verdade?

— Pode ser verdadeiro, mas se tem alguém que Luca ama mais do que ela, é a si mesmo.

— Está querendo protege-la do Luca? Mas não é isso que ele começou fazendo com você? E pelos mesmos motivos?

Giuliano silenciou, não por falta de respostas, até porque não era uma pergunta que deveria ter respostas.

— Não é para protegê-la, Magno. Desconfio que Luca esteja a um passo a frente por saber algo dela que ninguém mais sabe. Ela pode não ser tão inocente e necessitar de proteção como a Laura gosta de acreditar. Estou protegendo quem eu realmente me importo de sofrer os danos de todo esse linho.

Aix-en-Provence, França. 04h37min da madrugada.

A cabeça de Pierre estava em parafuso. Tudo o mostrava que a morte da mulher e onde jogaram o corpo não eram uma coincidência e se juntasse a misteriosa mensagem que recebeu. Nada daquilo foi por um acaso. Alguém sequestrou a mulher, matou e a colocou na sua área de jurisdição sabendo que se interessaria pelo caso. Mordeu a isca e foi atraído por alguém relacionado à morte de Giovana Rizzon.

Aquela moça tinha participado do assassinato da assistente do primeiro-ministro e tinha sido assassinada pela mesma pessoa que criou o veneno que matou o senador. O criador dos venenos era a única peça solta e o que necessitava para chegar à conclusão de tudo. Foi provavelmente ele que levou o corpo a sua área, foi ele quem lhe colocou naquela caçada.

Bebeu mais alguns goles da vodka na garrafa pequena prateada e sem querer mais intervir tentou fechar a página da Hera. Porém, com o ato de fechar a tela, foi redirecionado a uma página. O sangue quase parou de circular e a vodka ficou presa entre o esôfago e o estômago. Hera sabia que estava tentando desistir e não queria isso.

Fechou o notebook com a respiração ofegante e dessa vez verdadeiramente assustado. O mais horripilante era  uma música de piano que saía de alguma página do notebook e para piorar, o computador não se desligou. O som mudou e agora ecoava o momento dos parabéns em uma festa de aniversário.

— Que m... — Parou de falar e seus olhos imediatamente se encheram de lágrimas.

A última festa de aniversário de Natalie duffour. A última antes de sua irmãzinha ser levada por sua culpa e por sua desatenção.

Abriu o notebook buscando ver o vídeo caseiro, mas o que encontrou foram as imagens da luz amarela de cima da mesa do galpão em que achou o cartão de memória com o primeiro vídeo. O som dos parabéns continuou soando. Em cima da mesa velha do galpão havia agora um ursinho de pelúcia, um coelhinho. Seu computador estava sendo invadido por alguém que sabia exatamente o que aquilo significava.

O coelho de pelúcia foi o que restou na calçada quando a levaram.

Bebeu mais um copo da vodka de uma vez e tonto, deitou no sofá por alguns minutos. A dor dilacerante de lembrar ela o pisoteou por aquele tempo. Lembrou como tudo aconteceu. Levantou cambaleante e com a vodka já voltando pelo esôfago fechou as janelas do apartamento.

Tudo parecia bem mais confuso do que antes com as lembranças do resto daquele dia tenebroso em que Natalie desapareceu, então tentou tomar uma atitude sensata em meio a todo álcool e nervosismo. Fechou os notebooks, retirando deles a bateria e os colocou na mochila. Pegou as roupas que estavam desarrumadas sobre a cama e as enfiou na mala de volta. Ajuntou as garrafas rapidamente e com urgência tentou limpar o apartamento.

Assim que chegou ao próprio carro na garagem seu celular vibrou. Instintivamente já sabia quem poderia ser. A pessoa que o atraiu a tudo aquilo. O nome de Joseph apareceu na tela, confirmando suas suspeitas. Deixou a ligação morrer e então recebeu uma mensagem. Abriu-a e percebeu que eram números, coordenadas do galpão. Porém, o que havia na mensagem era o que mais lhe causava medo.

“Passou no teste. As dores e culpados comuns nos uniram. Se quiser respostas me procure.”.

Junto à mensagem havia uma foto de um narciso selvagem, uma planta rara e que surgia na região do galpão em algumas épocas do ano. Imediatamente associou tudo aquilo ao site Hera.

O tom da mensagem chegava a ser sarcástico. Não sabia em que teste havia passado e menos ainda como havia passado. Tinha a primeira opção que era largar tudo e torcer para não ser procurado, ou enfrentar de frente quem havia começado tudo aquilo e porque havia feito. E o mais importante, como sabia daquilo tudo, como tudo se relacionava.

Com as mãos trêmulas com o sentimento de culpa gritante, jogou as mochilas na parte de trás do carro e apanhou algumas das armas na mala, manteve-as em seu alcance no banco ao lado.

Um pouco tonto pela bebida dirigiu por uma hora e meia até o galpão. Caminhou até ele em um luto não vivido. Uma dor de uma perda que não tinha certeza se era morte, mas chegava a doer talvez mais que ela. Velou em sua mente naquele caminhou de capim alto sua irmãzinha mais uma vez.  Lembrar-se dela sempre lhe trazia a aquele mesmo estado.

Natalie era sua irmã mais nova, seis anos de diferença. Naquela tarde quente de primavera, a mãe o orientou a largar o jogo e ir olhar Natalie enquanto ela brincava na calçada, era o momento preferido do dia dela e o pior momento do seu. Odiava largar seu jogo para ficar na calçada sem nada o que fazer.  Ficou por poucos minutos, porém, movido pelo ímpeto de jogar, voltou correndo para a sala e pegou o jogo portátil.

Não foram nem três minutos, mas foi suficiente para que alguém levasse Natalie e ela nunca mais retornasse ou vivesse outro aniversário.

Toda sua família havia se destituído a partir daquele dia por sua infantilidade de voltar para dentro de casa. Para se redimir com o mundo por seus erros e egoísmos, tentou cursar medicina, considerou-a por acreditar que a área da saúde era a mais voluntariosa existente. Mas não conseguiu exercer, engavetou o diploma e embarcou na polícia. Não tinha forças para lidar com a dor humana quando a sua própria lhe maltratava. Inconformados seus pais mais uma vez perderam as esperanças em si e para não feri-los mais, se afastou, agora completamente.

Apontou a pistola para a porta e na penumbra notou que havia um homem, na verdade um rapaz franzino, alto e até bem apessoado. Ele saiu das sombras e sorrindo se aproximou de maneira cuidadosa.

— Quer uma água Pierre? — Falou francês.

A cena não poderia ser mais bizarra. Todo o contexto o era. Primeiro a curiosidade o levou a Giovana Rizzon e agora alguém que lhe prometia respostas sobre a dor mais profunda que carregava oferecia uma água.

— Quem é você? Você é Hera?

O rapaz balançou a cabeça negativamente.

— Por que me chamaram aqui? Que palhaçada é essa? — Olhou para os lados e estranhamente se viu sozinho. Não havia sinal de armadilha ou emboscada.

— Acalme-se. Veio buscar respostas, não há nada de errado nisso.

Sentia a bile subir por seu esôfago, reflexo do álcool e nervosismo. Seu rosto suava e mirou o rapaz por alguns segundos antes de com o cotovelo prensá-lo sobre a madeira velha do galpão.

— Por que eu? Por que estou aqui? Por que minha irmã? O que sabe?!

O garoto não se afetou de absoluto, parecia compreender seu desespero e suas reações. Toda a atmosfera do ambiente era nova, não havia mais a temível escuridão, o ambiente estava claro e o céu azulado pela aurora. A única coisa igual a todos os outros dias era que sua mente estava quase voando pelos ares.

Uma voz masculina surgiu atrás de si.

— Ele não sabe de nada, Pierre.

Pensou em se virar e dar de cara com um cano metálico de uma pistola, mas a realidade é que encontrou um homem, alto e com os olhos verdes cintilantes. Ele lhe ofereceu um sorriso acolhedor, o reconheceu. O primeiro ministro italiano, Giuliano Bocarelli.

— Você é Hera?

Ele baixou o olhar por um segundo e depois negou com uma expressão relaxada demais para toda a situação.

— Não... Ela me emprestou a identidade para te trazer até aqui.

— Você matou o senador, matou essa moça... Criou tudo isso? — O medo era visível nos olhos do francês. — Você me trouxe aqui... O que quer?!

Giuliano suspirou longamente e ainda sim sorriu para o homem a sua frente. Pierre estendeu a arma, prensando o cano frio sobre seu peito. Não se intimidou.

— Eu não sou Hera e ela não foi a responsável por matar essas pessoas. Só fez o composto.

— E que importa quem puxa o gatilho? — Apertou com mais força o cano da arma nos músculos do Premiê italiano.

— A justiça e a polícia se importam... — Mexeu a cabeça com certa ironia. — Não sou Hera.  E você não quer me matar. Eu tenho as respostas de tudo isso.

—O que quer comigo?! — Gritou empunhando com mais força o cano da arma.

As lágrimas caiam de seus olhos e sentia nojo delas, nojo da própria culpa e da dor que sentia.

— Eu sei o que pode aliviar sua culpa sobre Natalie.  — Ele segurou suas mãos que tremulamente segurava a arma. — Preciso da sua ajuda para punir quem me tirou o que eu amava, da mesma maneira que eles tiraram de você.

O suor continuava escorrendo pelo rosto do francês e a convicção de Giuliano Bocarelli o fez ceder à pressão que fazia na arma. Apontou-a para o chão e viu no rosto do homem a sua frente que ele já esperava por aquilo. Giuliano pediu sua arma e a deu para o mais novo.

— O que Natalie tem a ver com Giovan Rizzon?

— Vamos entrar Pierre... — Giuliano o guiou para o galpão com paciência. — Primeiro se acalme.

Pierre se virou para o garoto de antes e ele lhe lançou um olhar de compreensão.

— Meu nome é Magno, perdão pelo mau jeito... Estava ansioso por te conhecer. Já ouvi falar coisas muito boas de você.

Pierre girou os olhos, incomodado com a calmaria daquele garoto.  Giuliano se sentou na cadeira da mesa velha e lhe ofereceu uma taça de vinho. Negou enojado, agarrado a visão do coelhinho semelhante ao da irmã. Tocou o com cuidado como se tocasse no rosto dela.

— Você sabe o que significa Iniciativa Scorpions Pierre? — Giuliano jogou alguns papeis na mesa, os entregando ao francês.

— Seu francês é horrível. Tem sotaque italiano demais... — Resmungou com Giuliano e ele cruzou os braços revirando os olhos. — Os escorpiões... Eles mataram sua assistente. — Pegou os papeis notando que eram fotos de desaparecidos. Desaparecidos do mundo inteiro. Várias crianças pequenas. — É um grupo criminoso que sequestram crianças? Nunca ouvi falar. Por que eles mataram Giovana Rizzon?

— Se ela estivesse aqui odiaria ser chamada pelo nome completo. Esse nem era o sobrenome real dela... — Sorriu com alguma memória na mente. — Eles não só sequestram crianças senhor Duffour. Eles sequestram, treinam, os transformam e assassinos sem alma, simplesmente mandados e que não possuem sequer controle de si mesmos. Assassinos controlados. Controle da mente.

— Teoria da conspiração... — Debochou com um sorriso.

— Olhe as pastas finais. — Indicou apontando para a parte final dos papeis. — Estarão crimes que não tiveram soluções, foram arquivados com respostas idiotas para não demonstrar a fraqueza das polícias em encontrar os culpados reais.

Pierre leu rapidamente os relatórios e alternou a visão entre as folhas e Giuliano.

— Isso realmente existe? — Realmente já começava a duvidar das próprias certezas. — O assassinato de...

— Existe. Não fale isso alto. — Ordenou. — É um serviço caro, difícil de encontrar e é preciso uma boa dose de influência e dinheiro para tê-lo. Pessoas comuns não conseguem. Eles foram contratados para matar Giovana. Por isso as tatuagens. Somente os líderes das operações as possuem.

— Está me dizendo que existem crianças, mulheres, homens, pessoas sendo treinadas por aí para matarem pessoas, agirem sobre o controle das outras... Para matar?  — Jogou os papéis na mesa sem saber se achava graça ou se achava trágico. Algo apitou em sua consciência.

— Não só para matar. — Esclareceu.

— O que isso tem a ver com Natalie? — Mexeu nos cabelos se sentindo enjoado mesmo que as respostas já estivessem em sua cara. Era uma pergunta quase retórica.

Giuliano se ergueu da cadeira e entregou a ele uma pasta vermelha.

— Não a abra agora. Só me escute. — Pediu com cuidado e incrivelmente ele lhe obedeceu. No fundo já sabia. No fundo o francês já sabia exatamente o que havia acontecido e as lágrimas que desceram pelo rosto dele quando lhe pediu para não abrir só deram a certeza daquilo. — Natalie, a sua irmã, foi sequestrada pelos Scorpions para ser transformada em uma guerrilheira sem mente. Eles a tiraram de você e da sua família para criar um monstro, para servir a pessoas como as que mandaram matar Giovana.

Pierre se encostou a mesa esfregou o rosto.

— Aquela moça. Era ela? — A imagem da mulher nua naquele matagal lhe encheu a mente. — Era a Natalie?

Giuliano fez que não vendo o homem desmontar-se em sua frente. Pierre se sentava no chão sujo do galpão num choro compulsivo que ele segurava há anos. As respostas destamparam a ferida mal cicatrizada que ele carregava.

— Sua irmã faleceu há cinco anos. Ela morreu num ataque a bomba num hospital em Milão. Eles a mandaram para lá. Era uma ação coordenada e ela e os colegas eram parte do contingente.

A dor de saber a possível verdade não aliviara, pelo contrário. Natalie não se recordava sequer de si mesma, sofrera dores inimagináveis por sua falha. E agora estava morta em um local qualquer longe de quem a amava, de quem a queria. Morreu sem se lembrar de ninguém e sem ter quem chorasse sua partida. A pequena saltitante de trancinhas que pulava ao seu redor surgiu em sua memória. Ela sorria tanto, era o próprio sol.

Sua garotinha se transformou num papel em branco. Uma folha vazia que servia aos propósitos de alguém que se intitulava de Scorpions.

— Como sabe de tudo isso? Soube disso e por que não salvou a vida dela?! — Empurrou Giuliano quando ele se aproximou. Sua força estava falida, pois ele mal se mexeu. — A culpa é minha... A culpa é minha!

— As coisas não são tão simples Pierre... — Apertou os ombros do homem na tentativa de passar apoio.

Pierre se afastou e se ajoelhou alguns metros depois. Seu estômago se recusava a manter todo aquele álcool dentro de si depois de tudo. Vomitou no feno e Giuliano se manteve impassível como se esperasse mais uma vez por aquilo. Ergueu-se tonto do chão e fechou os olhos, tentando afastar a pequena Natalie da mente.

— Eles funcionam pelo mundo inteiro Pierre...  E você não teve culpa. Era só uma criança. Eles com certeza já tinham tudo planejado. Se você estivesse com ela ou não, não fazia diferença. Se estivesse lá, eles poderiam ter te levado junto, ou ter te matado. Tire essa culpa de si mesmo.

— O que quer de mim? — Foi ríspido. — Quer algo, não quer?! Não finja que é uma pessoa boa, e que se compadece por mim. Só me procurou quando lhe foi conveniente. Não é diferente deles. Não é diferente desses monstros! Não tem tantas boas intenções assim Giuliano Bocarelli... É só outro egoísta que quer vingança e precisa de mim. É uma troca. Deixou minha irmã morrer, deixa várias pessoas morrerem todos os anos e só se importa com elas quando lhe é conveniente.

Giuliano olhou de soslaio para Magno dessa vez realmente surpreso por ouvir aquilo.

— Quero que me ajude. Eu sei o que sente, sei o que é perder alguém importante.

Pierre riu, realmente achando graça daquilo. Talvez Giuliano Bocarelli estivesse acostumado a fingir que era uma pessoa boa.

— Não... Não sabe. Veio aqui me contar isso, em busca de algo, então não sabe. Não sabe o quanto é egoísta! — Sentou-se em cima da mesa sentindo o estômago se revoltar novamente. — Você mandou matar aquela moça independente dela ter um irmão, uma família. Não se importou se no fundo ela não tinha culpa sobre o que fazia.

Giuliano negou com a cabeça e sentou ao lado do homem.

— Ela não era somente uma assistente. — Pierre o olhou. Parou de respirar um pouco antes de continuar de falar —: Giovana era minha mãe. Minha mãe biológica. 

Pierre arregalou os olhos e começou a piscar várias vezes, como se finalmente entendesse tudo. Existia realmente uma semelhança física entre os dois. As mesmas cores dos olhos e dos cabelos.

— Por isso ela te protegia...

Giuliano assentiu.

— Alguém contratou os Scorpions, matou Giovana pelos meus próprios erros... Pela minha falha... — Olhou sério para o francês. Os discursos se pareciam. — Eu também sei o que é sentir culpa Pierre. Sei o que é perder quem se ama, e principalmente perder uma das poucas pessoas que me via como um ser humano. É uma motivação egoísta. Mas você é quem eu preciso para punir os culpados, as pessoas que aproveitaram da minha falha. A proposta está aberta. Tem algumas horas pra pensar no que quer agora que sabe tudo.

Pierre acompanhou com o olhar o ponderado e controlado Giuliano Bocarelli se afastar carregando o casaco com a expressão pesada de dor e sentar na cadeira velha do galpão. Sabia que ele não era um anjo, muito menos tinha tão bom coração, não era ingênuo para pensar que ele somente queria lhe ajudar quando lhe trouxe respostas.

Deixou-o para trás trancando a porta do galpão com força e se abraçando a pasta vermelha chegou até a beira da estrada de terra batida.

Os narcisos nasciam coincidentemente no local onde aquela mulher estivera morta dias antes. Ela não era Natalie, mas era mais uma vida que a iniciativa Scorpions tirava. Ela não era da sua família, mas certamente tinha uma família que sentia falta dela, que a procurou. Virou-se para trás e encontrou Magno bebendo água em frente ao portão do galpão, ele o olhava esperançoso.

Aquele moleque só podia estar de brincadeira.

Abriu a porta do carro e acelerou deixando a poeira cobrir todo local. Entretanto, antes mesmo que saísse da propriedade, retornou. As intenções de Giuliano não eram boas, porém, ele buscava uma maneira de sentir menos dor, e se tivesse aquela possibilidade, certamente faria o mesmo que ele.  Era lógico que Giuliano Bocarelli não queria destruir os Scorpions, provavelmente não tivesse força pra isso também. Todavia, agora que tinha acesso a alguém que sabia de tudo aquilo, poderia tentar.

Deu ré no carro e voltou para o galpão. Desceu do carro ainda encontrando o garoto bebendo no mesmo local. Ignorou-o e empurrou a porta.

O homem sequer se assustou.

— O que quer que eu faça? — Pegou a arma que havia esquecido dentro do coldre dele em cima da mesa. — Quer que eu ache quem contratou os Scorpions para matar sua mãe? É isso?

Giuliano apoiou os cotovelos na mesa e sorriu de canto com uma ponta de satisfação dentro de si. Ele apontou a cadeira para que sentasse, mas se recusou.

— Não preciso saber os contratantes. Já os conheço. Eu quero a queda da primeira-ministra austríaca Norma Hanh e da senadora italiana Roberta di Rosa e você é a pessoa ideal pra esse trabalho.

Pierre encolheu os braços da mesa.

— O que? Por que Norma Hahn?

— Essas pessoas contrataram a iniciativa Scorpions.

Dia seguinte.

Trento, 11h10min da manhã.

Trento amanhecera fria e com o céu encoberto de nuvens novamente. A neve que caiu pela madrugada se acumulava nos cantos das calçadas e o vento gelado invadia as brechas por baixo da porta da varanda e fazia Caroline espirrar constantemente desde que acordara de um sono que não lhe trazia descanso algum.

Constanza colocou o café na mesa de centro da sala enquanto Laura colocava comida para Fifi. Tudo feito em silêncio absoluto, enquanto a tensão gritava no ouvido das três mulheres. Laura havia dormido no apartamento de Caroline dessa vez, empurrando Constanza pra casa. Acordou cedo e foi para a própria casa, mas já havia retornado com os cartões digitais de todos os advogados que conhecia. O silêncio físico era o mesmo silêncio mental que ocupava a mente de Caroline. Queria justiça, mas não queria confusão, tudo o que menos queria era mais caos na sua vida que já andava tumultuada demais.

— Não tenho dinheiro pra isso Laura... — Justificou-se com Constanza que a olhava seriamente descrente de que ouvia aquilo. Virou para ela —: Eu sei o que te disse. Que resolveria as coisas do jeito certo... Mas às vezes o melhor é que as coisas não sejam resolvidas. Tudo passa, e esses boatos também. Giuliano os ignora, e eu consigo.

Laura se apoiou no sofá apertando o estofado com força.

— Caroline, quando o vazamento de fotos da família de Giuliano aconteceu ele processou quase metade da Itália! — Apertou dessa vez uma almofada se inclinando para a amiga. — Precisa ensinar respeito a essas pessoas. Mais alguns dias e você sabe que estará na boca da imprensa por causa do seu relacionamento com ele. Quer que o que essa pessoa da página fez vire um hábito? Está ensinando a eles como te tratam, exija respeito. Se te afeta, exija que parem.

Apesar de saber que havia algo errado na insistência de Laura e na possível relação que o próprio Giuliano tinha com aqueles boatos, Constanza não poderia discordar que o certo a se fazer era processar o autor da postagem. Era ele se aproximar minimamente de Caroline para começar a destruí-la aos poucos.

— Cada um tem um limite de tolerância. O seu pode ser diferente do dele e você tem que impor o seu. Não se compare ao limite de ninguém, Carol... Você está mal, aceite o que sente e que não é uma máquina que aceita tudo em paz.

Caroline silenciou mais uma vez e esperou no celular a resposta da mãe. A resposta dela foi curta e grossa assim que a recebeu. Descobrir e responsabilizar os envolvidos. O argumento no áudio de dona Lúcia era que a pessoa havia exposto dados privados de sua vida e a humilhado publicamente. Caroline sentia que teria que haver justiça e punição, mas tinha medo do desgaste emocional que tudo aquilo causasse.

— Peça no acordo que o autor pague pelos custos do seu advogado se esse for o problema. — Laura continuou.

— Você sabe que eles pedem algum adiantamento... — Cruzou os braços. — Eu tenho medo de onde estarei pondo a mão, Laura.

— Sua mãe disse que pode te ajudar. — Constanza relembrou.

— Não quero envolver meus pais nisso...

— Caroline, você quer que os boatos parem ou não? — Laura foi incisiva e recebeu da amiga um olhar choroso.

Caroline virou o rosto para fugir da situação, estava fragilizada demais para continuar pensando e Laura percebeu aquilo. Afastou-se, pressionando-a menos.

— Eles parando ou não... Isso não vai mudar nada pra o que já causaram. — Respirou fundo sentindo-se sufocada. — Eu preciso pensar muito sobre isso. Eu agradeço que estejam dispostas a me ajudar. Eu preciso realmente respirar.

Caroline se ergueu do sofá com certa dificuldade pela tontura que já conhecia bem e apertou o casaco com mais força, se protegendo do frio para chegar até a varanda. A garganta estava seca e já não conseguia interpretar se era pela alergia ou se era pela ansiedade. Debruçou-se no parapeito de metal mesmo com o frio e tentou as técnicas de respiração que já conhecia.

As outras duas mulheres se entreolharam e no olhar de Constanza já havia um tom acusatório que Laura fingiu não ver.

— Eu acho que vou pedir para Caroline se arrumar para sairmos. Vai fazer bem pra ela almoçar fora. Ver gente. Desde a reunião que ela tem medo de sair na rua. Espero que ilumine a cabeça dela. — Laura desconversou deixando Constanza sozinha.

Constanza, desconfiada observou a loira fazer o caminho até Caroline e distraída mandou mensagem para Luca com o link da postagem para que ele visse e tomasse ciência de tudo. Ele lhe respondeu com um pedido de que se encontrassem na sala dele na universidade no dia seguinte para que não levantasse suspeitas. Guardou o celular quando Laura chegou perto avisando que descessem para que Caroline se arrumasse com calma.

Ao chegarem ao restaurante chinês, depois de certa insistência para que Caroline aceitasse sair, Laura foi fazer o próprio prato no self-service, deixando as outras duas sozinhas por tempo suficiente para que Constanza tirasse a dúvida que ainda permeava a sua mente.

— Você nunca acompanhou essas páginas de fofocas, não as daqui da Itália. Quem te contou essa história de Anika e Luca?

Caroline mordeu os lábios e depois fez um bico fingindo que a pergunta não era para si. Constanza continuou parada insistindo de forma silenciosa em uma resposta.

— Isso não é importante. — Pontuou e Constanza a pressionou mais uma vez. Caroline soprou o ar e soltou os ombros se rendendo. — Giuliano me perguntou. Ele viu em algum lugar e achou que eu pudesse ter alguma informação, por estar mais próxima... Luca me perguntou, mas eu não quero que ele saiba. Os dois já não se entendem muito bem por alguma razão. E foi só uma pergunta inocente. Luca pode entender que Giuliano estava se metendo na vida dele, não sei. Melhor nem comentar!

Constanza fez que sim e cruzou as pernas ainda interessada.

— E você e ele? O primeiro-ministro italiano...  — Fingiu animação. — Como estão?

Caroline sorriu com os olhos e Constanza entendeu o quão fundo ele já havia se infiltrado. Caroline realmente conseguia gostar dele. Algo ela viu nele suficientemente bom para deixa-lo entrar em seu coração.

— Acredita que a gente está vendo a mesma série?! — Se ajeitou na cadeira realmente animada.

— Meio adolescente isso... — Murmurou com estranhamento.

— Sim, também acho! — Riu. — E ele é tão surpreendente, Constanza! Esses dias ele me mandou um meme dele mesmo que fizeram por aí. Acredita? É o tipo de coisa que eu não imaginava que ele fizesse. Gosto de conversar com ele. E eu me sinto uma enorme idiota falando isso. — Fez uma careta olhando para os lados, tendo certeza que Laura não ouvia.

— E ele? Como ele se sente?

Analisou as expressões dela com cuidado e em algum lugar nela encontrou uma dúvida. Caroline não tinha tanta certeza do que ele sentia assim e intimamente se incomodava. Era claramente como uma ilusão em que ele dava a ela todos os artifícios para que acontecesse.

— Giuliano não é de falar como se sente. Ele é um problema matemático pra mim, às vezes. Não acho que ele dê motivos pra que eu me sinta insegura, mas eu me sinto. — Confessou. — Acho que estarmos sempre distantes, e ele ser quem é. Eu me sinto insegura.

Constanza se arrumou na cadeira interessada.

— Acho normal que se sinta insegura... E estão começando. Pisando em ovos... Deixe tudo correr por enquanto e observe. Ele deve sentir o mesmo por você, se não, não estariam juntos e ele não te faria uma proposta tão séria quanto à de um relacionamento.

— Eu não quero me magoar e nem magoar ninguém Constanza... — Falou de uma vez e com o olhar distante. — Às vezes me questiono sem motivos se não damos um passo maior que a perna. É um medo que vez ou outra aparece na minha cabeça.

Constanza segurou as mãos da amiga.

— Tente conhecer mais dele. Talvez o remédio pra esse medo seja passarem mais tempo juntos. Relacionamentos humanos necessitam de contatos reais. Quanto tempo faz que não se veem frente a frente, de verdade?

— Uns quinze dias. — Contou nos dedos. — Acho que estou sendo fatalista não é?

— Acho que está certa. Gosta dele e tem medo de estragar isso. Não vejo nada de errado.

— Me sinto uma idiota. — Repetiu a mesma frase apoiando o rosto nas mãos.

—Geralmente se apaixonar nos faz ficar como idiotas. Dê tempo ao tempo. Aproveitem para estar juntos... Converse sobre ele com as pessoas que o conhecem. Giuliano já conhece seus amigos, você ainda não sabe os dele, e é até natural por não estar a tanto tempo juntos. Não precisa ter medo de fazer as coisas normalmente só porque ele é primeiro-ministro.

Caroline assentiu e deixou o assunto ir. Já se sentia exposta falando tal alto sobre os próprios sentimentos e não queria encher Constanza com suas divagações pessoais.

— E você? Como está com Thomas? Viajou tão de repente... Pensei que tivesse ido se casar e não me convidar! Foi seguir o conselho que está me dando e foi vê-lo? — Ela sorriu animada mexendo a colher no chocolate quente.

Constanza baixou o olhar e cruzou os braços, um pouco incomodada com o rumo do assunto.

— Eu e Thomas não estamos mais juntos. — Caroline foi perdendo a expressão feliz por uma culpada. — Nós rompemos.

Quase se levantou da cadeira para abraça-la e pedir desculpas de joelhos pela displicência da pergunta.

— Eu sinto muito. Sinto muito! Eu sou uma idiota. Falando e falando e me concentrando só nos meus problemas ao ponto de não te perguntar ou perceber nada. Eu sou a pior amiga do mundo. Meu Deus do céu! Mil perdões Constanza!

— Está tudo bem Carol.  Eu estou bem. Não era para ser. Não tinha como funcionar. — Thomas jogou tudo fora sem sequer lhe ouvir, já estava consciente de que ele não suportaria mais dúvidas, não seria o parceiro que necessitava. — E uma coisa que eu te aconselho e que foi o meu aprendizado de tudo que passou. Não existe nenhum relacionamento, de tipo algum, que funciona sem confiança. Se não confia na pessoa, ou ela não confia em si está jogando seu tempo fora.

— Eu sei o valor da confiança... — Sussurrou como se para si mesma. — Perdão. De verdade. Sou uma péssima amiga. Eu sinto muito que tenha terminado de forma ruim. Se precisar de mim, qualquer coisa, eu largo toda a minha choradeira sem necessidade para te ouvir, para bater no Thomas também se quiser... Eu realmente sou uma besta pra falar uma coisa dessas assim do nada... — Esfregou o rosto querendo se bater por tanta burrice.

Constanza acabou achando graça.

— Não teve culpa. Não sabia de nada. Não te contei porque estamos todos enrolados em situações difíceis. E eu realmente estou bem. — Olhou para o lado e viu Laura se aproximar. Fez sinal para Caroline encerrar o assunto. — Não comente com a Laura sobre o Thomas.

Caroline assentiu antes que Laura chegasse à mesa.

— Eu estava querendo pegar esses rolinhos... — Laura parou de falar ao perceber o silêncio e fez uma cara de desgosto. — Estavam fofocando sem mim. Tudo bem. Eu aceito mais uma vez essa traição. Já não bastava a Kiara. E eu aqui pensando como agradar vocês duas e é assim que me pagam.

— Laura, sinceramente, já tentou algum papel na televisão? — Caroline perguntou passando as mãos pela fumaça que subia acima do chocolate querendo se esquentar.

— Sobre o que falavam sem mim? — Pegou os Hashis.

O garçom trouxe a enorme barca de Yakisoba dando a Caroline e Constanza mais tempo para pensarem.

— Amenidades sobre o intercâmbio. Falta pouco para nos formarmos.

Laura não demonstrou que sabia da mentirinha das duas e engatou uma conversa sugestionando como deveria ser a festa e quem poderia ajudar. O telefone de Caroline tocou interrompendo os comentários de Laura e a mesma maliciou com os olhos quando viu o nome de Giuliano na tela.

— Está tudo bem agora? Fiquei preocupado. — Foi à primeira coisa que ele perguntou sem qualquer cerimônia.

— Como sabe?  — O tom foi surpreso.

— Laura ligou pra mim quando você tomou o seu tempo. Deixou ela maluca. Eu imaginei que quis esse tempo pra pensar. Espero que agora queira falar.

— Estou com as meninas. Como sabe que eu precisava pensar? — Desconfiou.

Ele deu um longo suspiro na linha.

— Eu sei sobre os boatos entre você e Giampiero. Sei como deve estar se sentindo. Não quis te contar nada pra que não tivesse essa reação, ou uma reação pior. Quando Laura me disse sobre o seu desparecimento, eu imaginei que esse rumor tinha algo a ver.

— Você sabia? Sabia e não me disse nada?! — Quase gritou.

— Sabia... — Falou baixo, receoso.

Caroline bufou, indignada.

— Tenho certeza que se soubesse antes e por você seria melhor do que saber pelas pessoas na rua. Absoluta certeza! — Apoiou-se na parede do lado. — Meu Deus Giuliano, as pessoas me olhando feio todos esses dias e você sabendo e não me diz nada?!

— Certo... Eu deveria ter dito. Mas como eu poderia dizer uma coisa dessas por telefone?

— Com a boca talvez fosse o ideal! — Ironizou. — Tudo bem, tudo bem. Você não tem culpa e tinha uma intenção boa. Foi uma péssima ideia não me dizer que isso fique claro... Você e Giampiero sabiam e ficaram esperando eu descobrir por conta própria!

Giuliano murmurou um “doida”.

— E que fique claro também que você brava é linda e eu estava até sentindo falta desse seu jeito. Meio maluquinha.

— Está tentando mesmo me enrolar, Giuliano? — Virou-se para rua e por reflexo e o viu. O coração disparou quando Giuliano atravessou para o seu lado da calçada com um sorriso desconfiado de quem sabia ter feito algo errado. Ele estava o tempo todo ali lhe observando. — Meu Deus... Por que não me avisou que vinha?

Ela desligou o telefone o colocando no bolso e cruzou os braços, sisuda.

—Quer brigar mesmo com um homem cansando que chegou de Bruxelas, foi pra Roma, pra Paris e veio pra Trento em vinte quatro horas só pra te encontrar? — Ele chegou mais perto e a puxou para um abraço sem jeito. — Eu te trouxe uma coisa... É de comer. Chocolate Belga. — Falou no ouvido dela.

— Eu estou horrível Giuliano... Horrível... E você já me conhece muito bem pra saber que eu sou maluca por doce. — Ele lhe roubou um beijo, interrompendo a fala dela. — Eu tenho que te lembrar de que estamos no meio da rua e você é o primeiro-ministro desse país?

Giuliano tocou o queixo dela com certo carinho e selou os lábios dela novamente.

— Só preciso da sua autorização pra te beijar, não a do senado ou a do congresso... E eu não te conheço com outra cara que não a de cansaço. — Deu de ombros a fazendo andar de volta pra mesa. — Estavam almoçando e eu te atrapalhei?

— Você também está com uma cara péssima se quer saber — Tocou a pequena mancha de olheira dele que nem se comparava a sua própria, que era gigante. Giuliano mesmo cansado não conseguia ficar horrível. — Já almoçou?

Ele balançou a cabeça negativamente.

— Vem comer com a gente, então. — Os olhos até brilhavam por vê-lo. — Quer dizer, se você quiser comer comida chinesa... Também.

— Se quiserem me aceitar na mesa e você não comer até a mesa, tudo bem...

— Está querendo discutir mesmo? — Apoiou-se nele.

— Em todo momento que mando mensagem você fala que pode demorar pra responder por que está comendo. A que conclusão eu tenho que chegar depois disso? — Começou a andar do lado dela a puxando para o seu lado com um toque suave nos dedos dela.

Ela mordeu os lábios e depois revirou os olhos.

— Que você só quer falar comigo nas horas das refeições... — Colocou as mãos na cintura.

— Que no seu caso é toda hora? Hummm... Eu acho que entendi.

Constanza foi tomada pelo medo ao ver Giuliano pela primeira vez em sua frente depois de tantos anos. Fez um esforço enorme para fingir que estava tudo bem e que não sentia nada com a presença dele. Conteve as memórias que buscavam algum tipo de libertação e conscientemente disse a si mesma que não necessitava mais libertação de nada. Tudo o que lembrava e todos os medos represados no passado já tinham sido libertados. Não escondia mais nada de si mesma.

— É mal educado chegar na hora da comida. Mas não tive outro jeito... Posso sentar e comer com vocês?

 Ele sorria por simpatia, não por estar realmente feliz. Constanza não conseguia encontrar felicidade nele. Recobrou a realidade e habilidade em controlar os próprios sentimentos e sinalizou que tudo bem. Cada movimento dele foi analisado por ela, como um scanner, e foi construindo o engrama da personalidade de Giuliano. Altivo, inteligente, manipulador e extremamente sedutor. Convenceria qualquer pessoa do que ele bem entendesse.

— Por mim tudo bem... Vou chamar o garçom pra fazer seu pedido... — Laura levantou as mãos para um rapaz que estava perto da porta.

Constanza se organizou mentalmente e começou a perguntar falsamente despretensiosa:

— O senhor já sabe sobre o blog?

Ele olhou para Caroline de soslaio e ela aquiesceu.

— Sei. Eu soube pouco tempo depois que saio o comentário infeliz. Não quis falar nada pra Caroline. De algum jeito eu queria proteger ela desse problema. — Disse mais pra Caroline do que pra qualquer outra pessoa daquela mesa. Virou o corpo na direção. — Sinto muito. Eu realmente não achei que tomaria tamanha proporção e se te falasse por telefone as coisas poderiam ser interpretadas de forma mais dura.

Caroline não disse nada o olhando de maneira séria. Constanza continuou depois que ele fez o pedido:

—Que bom que está aqui. Acho que vai fazer bem a Carol ter o senhor por perto agora. Junto com a Laura, são os mais acostumados a lidar com a imprensa... E bem, por motivos óbvios também. — Sorriu sugestiva.

Por um milésimo de segundo sentiu nele a surpresa. Isso indicava que ele já sabia o que fazia ali e quem era. Seria o mais silenciosa possível para não chamar atenção.

— Quem sabe você não consiga convencer ela a processar essas pessoas! — Laura resmungou batendo na mesa. — Eu e Constanza tentamos de tudo.

— Pode ser uma boa alternativa... — Falou despreocupado. — Mas vai da sua disponibilidade, Caroline.

— É tudo muito desgastante. Não quero pensar nisso agora... — Esperou que ele realmente não continuasse aquele assunto. — Vamos falar de coisa boa!

— Quer falar realmente sobre mim, Caroline? — Acariciou os pulsos dela em cima da mesa.

— Falei pra falarmos de coisa boa, não de pessoas presunçosas. — Mostrou a língua pra ele como se fosse criança.

— Ok, eu mereço essa indelicadeza... — Ergueu as mãos, rendido. — Quero te levar a um lugar. Aquele que está me devendo.

— Eu te devendo? Italiano sem vergonha! — estapeou o ombro dele enquanto ele ria sem realmente sentir dor —, não importa o que eu faça sempre te devo! Qual é o lugar? — Caroline estranhou. — Tem tempo pra sair?

— O suficiente. Já foi no museu da aviação?

— Sei que ele existe, passo na frente, mas nunca entrei por falta de tempo de visitar... — Pensou um pouco. — Vai comigo?

— Serei seu guia. — Afirmou.

— Sairmos juntos? — Pensou na imprensa. — E se alguém ver? Não... Não... Não quero que a sua imagem esteja associada a minha nesse momento. O que vão pensar de você... Não. Podemos fazer outras coisas que nãos nos exponham.

Laura olhou para Constanza com uma expressão penalizada. Giuliano pareceu não saber o que dizer por alguns segundos.

— Lembra o que me disse quando estávamos na minha casa? Que não existiriam problemas. Estamos somente nós aqui, as pessoas que realmente te conhecem. Eu não me importo com nada disso e eu quero ficar com a minha namorada. — Viu um sorriso discreto aparecer no rosto dela e virou-se para as mulheres já se levantando da cadeira. — As meninas me permitem levar ela agora mesmo?

Caroline engoliu a comida a força pra poder falar.

— Aonde vai me levar? Ficou louco homem? — Ajeitou o guardanapo na mesa e buscou em Constanza e em Laura alguma resposta. A loira apenas fez que não sabia, realmente sem saber o que estava acontecendo.

— Se ela quiser ir... — Constanza deu de ombros e a olhou sugestiva.

— Te trago sã e salva. Eu prometo. — Puxou um pouco as mãos dela para que ela se levantasse. Caroline ainda mirava o próprio prato cheio de comida que quase não comeu. — E vamos comer no caminho. Juro que te mantenho alimentada.

— Giuliano... — O questionamento terminou quando ele apertou sua mão e lhe dedicou um pedido pelos olhos.  — Pra onde?

— Surpresa. Vamos?

— Certo. E o seu pedido? — Estava até desorientada depois de Giuliano.

— Cancelem pra mim, por favor, meninas? — Pediu e elas assentiram.

— Traga ela melhor do que está indo pela amor de Deus.

— Tenho certeza que ela volta. — Colocou a mão na cintura de Caroline e ela ainda o olhou de forma espantada.

Caroline pegou a bolsa um pouco tensa e se ergueu da cadeira. Giuliano agarrou sua mão, as atando mais uma vez e sem se importar se alguém poderia ver. Desceu as escadas do restaurante para a calçada com o homem um pouco mais a frente, mas ele não soltou suas mãos. E a colocou no carro do lado do passageiro e entrou do lado do motorista.

— Pra onde quer me levar?

— Surpresa. Já disse.

— De novo?!

— Se eu disser não vai querer ir. — Colocou os óculos escuros. — Tem algum compromisso amanhã cedo?

Caroline pegou o celular de forma atrapalhada na bolsa e o olhou nervosa.

— Amanhã de uma da tarde. Tenho uma reunião do grupo de pesquisa...

— Dá tempo. — Ele deu partida a interrompendo e saiu da rua. — Vamos passar na sua casa. Pegue roupas pra passar essa noite fora e roupa de academia também... Se tiver. O básico.

— Você realmente enlouqueceu Giuliano! Que academia? — Olhava para os lados.

— Vou te levar pra o museu da aviação e de lá vamos num lugar. Te trago viva, inteira e bem alimentada amanhã bem antes da sua reunião.

— Eu vou ter que ir de avião? — Ele fez que sim como se fosse à coisa mais natural do mundo. — Meu Deus! Já foi muito da última vez e quem pega alguém do nada e diz que vai levar pra sei lá onde de avião? É muito chique esse lugar?

Giuliano acabou sorrindo com a preocupação dela.

— Eu sou o tipo de homem que faz esse tipo de coisa. E se você considerar a minha casa um local chique... Então vamos.

— Ótimo. Quando eu disse que queria que alguém que dissesse “Vamos pra Roma, no caminho eu te explico” eu não falei tão sério assim! Você quer me levar pra Roma...  — Finalmente se deu conta de pra onde ia. — Você quer me levar pra Roma! Você quer me levar pra sua casa! Giuliano!

— Pare de reclamar e de gritar mulher... — Murmurou parando na frente da casa dela. — Tem 30 minutos. Ah, pegue roupa pra sair também.


Notas Finais


E aí? Surpresos? Ansiosos?
Espero que tenham gostado real oficial!
As duas músicas pra esse capítulo já estão nas últimas adicionadas na playlist de Itália: Love in the dark e Eres tú.
Link da playlist:https://www.youtube.com/playlist?list=PLZ9jFeBneJ9Fr7s7kyGJMFOomWhqadY6A
Instagram pra gente interagir quando a tia, eu mesma, tiver uns tempos aí hahahaha: @italiaoriginalfic
Fiquem com Deus <3


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