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História It's all about magic - Chapter 3


Escrita por: velarisbrdgrton

Notas do Autor


Demorei, mas o capitulo tá imenso.
Estou me divertindo muito escrevendo essa história, mas gostaria que vcs me apoiassem tbm, ok?
comentem e favoritem, bjao

Capítulo 4 - Chapter 3


"Há dois adultos,um homem e uma mulher, discutindo na cozinha. Estou sentada no tapete da sala, na frente da porta de onde eles podem me ver. Faço carinho em um filhote de cachorro, ele é quase do meu tamanho e seu pelo é todo negro. Pego o prato de bolo que estava ao meu lado e mordo um pedaço, a massa é de baunilha e o recheio é de leite condensado e morangos. Meu favorito. Levanto os olhos para a faixa enorme que atravessa a sala e diz "Feliz Aniversário". De alguma forma sei que é minha festa de 6 anos. Observo os adultos na cozinha e tento focar em seus rostos, mas de perfil não sei dizer quem são. Então a mulher se vira e me espanto. É Lydia, não, é minha mãe. Uma versão mais nova dela, no fim dos 20 anos. Ela me olha preocupada, o homem se aproxima de mim e se ajoelha à minha frente pegando minha mão. Não consigo distinguir seus traços, apenas seus olhos; que brilham estranhamente em um tom violeta."

Acordo gritando e agarro a primeira coisa que vejo. Aurea resmunga por tê-la acordado, mas lambe minha mão e volta a dormir enrolada como uma bolinha em cima da minha barriga. O que foi aquele sonho? Parecia que eu estava vendo tudo através da Lotus de 6 anos mas com a minha consciência. Por que mamãe parecia preocupada? Quem era o homem? E o cachorro?

E como um estalo, seu nome vem em minha cabeça. Rex. Como eu sei o nome dele? Ou como o visualizei em meu sonho se nunca o vi?

Tento me lembrar do meu aniversário de 6 anos, mas tudo é um borrão. Uma festa em casa, Logan e Lydia implicando comigo, Rodrick me dando uma boneca de presente, mamãe irritada porque papai havia saído para buscar o bolo e não tinha voltado ainda. Não havia nada em minha memória sobre o cachorro - Rex - ou o homem de olhos violeta.

Percebo que estou com o coração acelerado e tento me acalmar. O sonho foi só um sonho, não uma memória esquisita. Suspiro e faço carinho em Aurea. Rex não existe, nem o homem. Foram tudo imaginação.

Mas enquanto me levanto e me dirijo ao banheiro para lavar o rosto me pergunto: "Se eles foram imaginação, como sei o nome do cachorro e como a memória do toque do homem foi tão real e familiar?"

...

- Está tudo bem, querida? - minha mãe pergunta assim que entro na cozinha.

- Claro, por que não estaria? - perguntou cautelosa. Luke disse que ela é uma bruxa, não posso dizer nada, pois provavelmente também sou, mas ela teria me dito algo, certo?

- Pensei ter ouvido você gritar - fala e mexe a xícara de chá.

- Aurea me acordou e assustei - digo sorrindo o mais convincente possível. Mamãe ri. Não tenho coragem de perguntar sobre magia ou seres sobrenaturais, não agora. - Vou caminhar com Aurea, comprar comida e coisas necessárias pra um filhote.

- Rodrick só nos dá prejuízo - ela ri novamente, mas o sorriso não chega a seus olhos.

- Está tudo bem, mamãe?

- Claro, querida. - responde. Pego uma garrafa d'água na geladeira e antes de sair da cozinha ela me chama:

 - Lotus, o que aconteceu com sua mão?

- Quebrei um copo ontem e me cortei, desculpe.

- Sem problemas. Mas você está bem? Não precisa de pontos? - indaga e acho o interrogatório estranho. Papai é quem faz isso.

- Estou bem, mamãe. Obrigada pela preocupação. Volto rápido.

- Ótimo, querida - fala e volta à atenção aos papéis em cima da ilha.

Saio da cozinha e grito Aurea da sala. A pequena bolinha de pelos branca desce as escadas correndo e dou risada.

- Venha, Aurea. Vamos gastar todo o meu dinheiro com você. - digo e ela late como se tivesse entendido. A pego no colo e abro a porta da sala levando um susto com uma garota parada na frente de casa.

Ela é bonita. Uma beleza delicada e suave. Cabelos castanhos claros, olhos da mesma cor, um rosto delicado em formato de coração e uma boca rosada e cheinha. A garota parece um anjo.

- Posso ajudar? - pergunto ao perceber que a estou encarando a um tempo. Ela não parece ser mais velha que eu.

- Lotus? - pergunta meio espantada.

- Sou eu - respondo cautelosa - Mas quem é você?

- Ah, me desculpe - ela fala e solta uma risadinha. Um som infantil e fofo demais. - Sou Madison Portman.

- Você veio ver minha mãe, a doutora Louisa Clines? - pergunto. Às vezes, como psicóloga minha mãe atendia casos urgentes em casa.

- Claro - ela responde e sorri.

- Pode entrar, eu já estava saindo. - falo e saio da frente a deixando entrar.

- Foi ótimo te ver, Lotus. - ela diz e me dá as costas entrando no escritório.

Analiso suas palavras. A garota disse "foi ótimo te ver", não "foi ótimo te conhecer"; o que seria o correto já que eu nunca a havia visto na vida. E como um eco de sua voz uma palavra me vem a cabeça : Maddie. Sem saber como, sei que é o apelido dela.

Encaro a casa vazia e dou as costas fechando a porta atrás de mim. O que está acontecendo comigo?

...

- Obrigada - agradeço ao senhor que me vendeu a casquinha de sorvete. Ele assente e sorri. Me viro e volto ao banco a alguns passos dali onde deixei Aurea amarrada.

Já havia comprado a coleira, uma cama para ela, ração o suficiente para dois meses e brinquedos. Não sobrou nada do dinheiro que eu havia ganhado dos meus pais de aniversário.

- É bom que você se comporte, pois todo o meu dinheiro foi gasto com você, coisinha. - digo passando a mão em sua pequena cabeça, ela late e deita ao lado dos meus pés.

Como o sorvete de morango enquanto olho para o parque. Não há crianças hoje, apenas alguns adultos correndo ou passeando com cachorros. Um garoto bonito está correndo e não consigo desviar meus olhos dele. O sol reflete em seus cabelos loiros e na pele pálida. Quando ele se vira, meu coração dá um pulo, é Luke. Ele sorri e acena, mas antes que eu acene de volta alguém senta do meu lado no banco e desvio minha atenção do loiro.

- Oi, melhor amiga - Rodrick fala e me dá um beijo na bochecha. Levo um susto tão grande que aperto a casquinha de sorvete, que cai no chão e Aurea aproveita para lamber os restos.

- Oi - gaguejo ainda assustada. De onde ele surgiu? Me viro, mas Luke já sumiu. Droga.

- O que foi? Está procurando por quem? - Rodrick pergunta sorrindo e é tão lindo que esqueço de Luke.

- Por ninguém - respondo sorrindo de volta. Aurea já perdeu o interesse no sorvete e está pulando nas pernas dele.

- O que é essa sacola imensa aí? - pergunta apontando com o queixo para a sacola branca com a logo do petshop ao lado do banco no chão.

- O prejuízo que o seu presente de aniversário me deu. - respondo sorrindo de verdade.

- Ah, meu Deus, Lotus. - fala fazendo uma cara preocupada e me seguro para não beijá-lo - Eu pago todo o prejuízo se precisar; comida, veterinário.

- Ai, Rodrick, até parece - digo revirando os olhos e rindo.

- Por que você está toda feliz hoje, hein? - pergunta e o encaro ainda sorrindo.

- Porque você está aqui, oras - digo e ele pega minha mão.

- Essa é a declaração de amor mais bonita que já fizeram pra mim - fala e ri, sua risada reverbera pelo meu corpo e me dá arrepios.

- Mentiroso - falo ao pensar no quanto Nina o ama e demonstra na frente de todo mundo.

- É sério - diz rindo e rio junto.

- "Quando aprender a mentir, me procure." - o imito e ele ri mais.

- Você é a melhor coisa do meu dia, sabia? - pergunta e o encaro. Seus olhos castanhos brilham de felicidade e por um momento eu quase acredito.

- Pare de mentir - digo séria agora e sua expressão muda, confusa.

- Oi? O que aconteceu, Lottie?

- Pare de mentir pra mim assim. Eu não sou a melhor coisa do seu dia. Nina é. Ela é sua namorada, eu sou apenas sua melhor amiga. - respondo desviando o olhar para o ponto onde Luke parou e acenou para mim.

- Lotus - diz firme e não consigo olhá-lo - Lotus, olhe aqui.

- Oi. - falo me virando e tenho certeza que há lágrimas em meus olhos.

- Ela pode ser minha namorada, eu posso amá-la, mas não dá pra saber se vai durar, se iremos casar; você é minha melhor amiga. Caramba, Lotus a gente está junto desde o primário, por favor, faz mais de 10 anos, você acha que nossa amizade vai terminar algum dia? Ou que o meu amor por você vai acabar?

- Não - respondo meio engasgada com as lágrimas.

- Vem aqui - fala e me puxa para seu peito. Seu cheiro invade meu nariz e suspiro. Perfume masculino e lavanda.

- Eu te amo, flor - fala e as borboletas em meu estômago ficam frenéticas.

- Também te amo - resmungo e o som sai abafado pela sua camiseta. Ele pega meu queixo e me faz encará-lo; ele sorri, eu sorrio.

- Agora, deixa eu te pagar outro sorvete já que você estava tão concentrada na paisagem - fala sorrindo e se levanta indo até o carrinho de sorvete.

- Claro - digo. Gostaria de saber se ele pagaria outro sorvete pra mim se soubesse que a paisagem na qual eu estava concentrada era Luke.

...

- Entregue - Rodrick fala e me dá um beijo na testa. Após comermos os sorvetes passeamos pela cidade com Aurea, almoçamos e ele me trouxe em casa.

- Obrigada, Rodrick - agradeço sorrindo, ele sorri e se vira indo embora. Abro a porta e solto a cadelinha da coleira, o borrão branco desaperece pela porta cozinha.

Escuto vozes elevadas no escritório de minha mãe e fecho a porta com cuidado atrás de mim. Sento na sala e ligo a televisão. Onde está Thomas? Antes que o procure, um garoto sai do escritório.

Espio e o reconheço. É Felix, o amigo de Tamara da boate, o que ele faz aqui?

- Felix? - pergunto espantada e ele sorri sem jeito passando a mão pelos cabelos escuros. Ele é tão lindo quanto me lembro.

- Ah, oi, Lotus. Eu já estava de saída. - fala se dirigindo a porta da sala.

- Mas...

- Lotus - minha mãe aparece no corredor - Felix tem que ir.

Não falo mais nada enquanto ele vai embora.

- O que ele estava fazendo aqui?

- Ele é um paciente - ela responde dando as costas.

- Ele não parece o tipo de cara que precisa de uma psicóloga.

- Lotus - ela me repreende e me calo. - Não questione sobre os pacientes ou seus problemas.

- Como quiser, mamãe - balbucio e foco na televisão. Escuto apenas o barulho da porta do escritório se fechando.

Minha relação com minha mãe anda estranha desde meu aniversário. Preciso saber a verdade sobre mim, sobre nós. Ou tudo vai acabar em desastre.

Vou até a cozinha e abro a geladeira, fico alguns segundos escolhendo o que pegar e escolho um iogurte de morango. Ao fechar a porta da geladeira contenho um grito já que Luke Hemmings me encara sorrindo malicioso.

- Droga, Hemmings - chio e coloco o iogurte em cima da ilha.

- Oi, Lottie - novamente o apelido soa mais debochado do que deveria vindo dele.

- Oi - falo sem acreditar que ele entrou sem fazer barulho e ficou esperando eu fechar a porta pra levar um susto. - Thomas dedurou você para Rodrick.

- Tenho que me preocupar com meu querido primo, então? - pergunta e se senta em um dos bancos do outro lado da ilha. Me sento de frente pra ele.

- Não, ele é apenas meu melhor amigo e tem um senso de superproteção ridículo.

- Ele só te ilude - gargalha e olho com raiva abrindo o iogurte com as unhas.

- O que quer dizer com isso?

- "Ela pode ser minha namorada, eu posso amá-la, mas não dá pra saber se vai durar, se iremos casar; você é minha melhor amiga. Caramba, Lotus a gente está junto desde o primário, por favor, faz mais de 10 anos, você acha que nossa amizade vai terminar algum dia? Ou que o meu amor por você vai acabar?" - repete o mesmo que Rodrick falou.

- Como você ouviu isso e como decorou cada palavra, seu babaca? - resmungo e ele sorri. Seu sorriso, ao contrário do de Rodrick, me faz querer socar seu rosto.

- Super-audição lupina. Privilégios de ser um lobisomem. - fala e cuspo o pouco de iogurte que tinha colocado na boca.

- Você está de brincadeira - digo limpando a boca e tenho certeza que fiquei vermelha pelo mico.

- O que?

- Sobre ser um lobisomem, oras. - respondo.

- Achei que você já soubesse. - fala dando de ombros e exibindo um sorriso lupino.

- Argh, Hemmings - murmuro - Não quer dizer que possa escutar a conversa dos outros, seu estúpido.

- Amo quando você me chama assim. - fala sorrindo e reviro os olhos.

- De que? De estúpido?

- De Hemmings - diz e morde o lábio. Levanto do banco e jogo o iogurte na pia; lavo o pote em silêncio e Luke não se manifesta também. Me viro e quase grito ao ver que ele está parado a dois passos de mim.

- Puta merda, Luke. 

- Hemmings é melhor, Lottie.

- Não faça isso.

- O quê? - pergunta e o encaro irritada.

- Debochar do meu apelido. Você me chama de Lottie como se fosse uma piada. - rebato e ele ri.

- Não é deboche. É porque seu nome, Lotus, é tão bonito que é impensável chama-la de Lottie; como se seu nome fosse Charlotte. - fala me olhando nos olhos. Os olhos dele são azuis demais, como uma piscina.

- Idiota - falo rindo e ele sorri. - Me explique sobre esse lance de lobisomem.

Ele abre a boca para responder, mas uma voz grita da porta da sala.

- Lottie! - é Rodrick.

- Merda, Luke. Se ele te ver aqui vai surtar. - cicio e ele sorri, o sorriso mais sarcástico que eu já vi.

- Ótimo - responde e se senta.

- Odeio você. - o xingo e saio da cozinha, fechando a porta de correr e esperando que Luke fique quieto.

- Oi - Rodrick diz quando o olho - Esqueci de falar Nina nos convidou pra uma festa hoje, ela disse que você pode chamar Gwen e Tam.

- Não posso ir, desculpe.

- Por que? - ele parece chateado

- Tenho que cuidar de Thomas. - pode ser uma mentira dependendo do que Lydia decidir.

- Mas Thomas nem está aqui. - ele rebate e fico confusa.

- Oi?

- Thomas não está aqui, porque se estivesse já estaria pulando em mim. - fala e se aproxima de mim.

- Depois, oras - me enrolo e ele percebe.

- Você está mesmo mentindo pra mim? - pergunta e recuo dois passos quase encostando na porta da cozinha fechada atrás de mim.

- N-não...

- Lotus - fala, mas antes que eu enrole ou minta a porta se abre e Luke aparece.

- Oi, Rodrick - o loiro fala e congelo. O que ele está fazendo?

- Lotus? - a cara de Rodrick é uma interrogação.

- Eu posso explicar - balbucio. E depois lembro que não preciso explicar nada a ele, somos melhores amigos, não namorados.

- É, explique, Lottie - Luke fala, um arrepio percorre meu corpo, e dá um passo a frente. Sua mão envolve minha cintura e ele beija o topo da minha cabeça. Quase grito e o estapeio, mas Rodrick está perplexo demais e não sei o que fazer.

- Que merda é essa, Lotus?! - ele grita e estou assustada demais para responder - Se você mente pra mim porque não quer sair, beleza. Mas mentir porque quer ficar em casa com esse idiota já é demais.

- Não grite com ela, Rodrick - Luke fala, tão firme quanto a mão em minha cintura. Seu toque é quente contra minha pele, já que o cropped não cobre minha barriga.

- Quem é você pra mandar em mim, hein? - Rodrick diz e consigo ver a raiva em seus olhos.

- Pare com isso - falo mas minha voz sai fraca.

- Por que eu deveria parar, Lotus? - pergunta para mim e não consigo conter as lágrimas ao ver sua mágoa.

- Porque ele é tão meu amigo quanto você e porque eu não te devo satisfação de nada que eu faço, Rodrick! - grito e ele se assusta - E eu não sou a sonsa da Nina pra você gritar comigo desse jeito!

- Não coloque ela na briga! - grita e aponta um dedo na minha cara. A mão de Luke ainda está firme em minha cintura e tenho certeza que ele está sorrindo.

- Saia daqui! - grito e Rodrick para. - Saia!

- O quê? - pergunta espantado. Eu nunca o expulsei de casa.

- Saia daqui! - grito enquanto as lágrimas quentes escorrem pelas minhas bochechas. Rodrick me olha magoado, como eu nunca o vi e sai batendo a porta.

Meus soluços estão altos e abraço Luke.

- Desculpe - diz baixinho e o encaro. Ele é tão alto que tem que abaixar a visão pra me olhar.

- Pelo quê? - minha voz sai estranha e mal o enxergo entre as últimas lágrimas que ainda estão aqui.

- Por não ter ficado lá dentro e vindo aqui na sala só pra provocar Rodrick - diz e eu gargalho.

- Ah, pelo amor. Ele é um idiota comigo, eu tinha que falar aquelas coisas. Você me ajudou, Hemmings - falo e me solto dele. Quando me viro, vejo minha mãe encostada perto do corrimão da escada.

- O que exatamente foi esse show? Porque eu não entendi. - resmunga. Ela nunca pareceu tão jovem e perigosa. - E o que esse garoto está fazendo aqui? De novo?

- Ele ganhou o posto de Rodrick, de melhor amigo. - falo e ela suspira.

- Lotus, Lotus - fala antes de subir as escadas e me deixar sozinha na sala com Luke.

- Então eu sou seu novo melhor amigo? - pergunta e dou risada.

- Aham - respondo mordendo o lábio.

- Não faça isso. - ele responde sorrindo e faço novamente. - Idiota.

- É você. - digo - Agora me explique esse lance de lobisomem.

- Ah, é legal - responde e gargalho.

- É legal? Só isso que tem pra me dizer? Você é um lobisomem.

- E você é uma bruxa - rebate e fecho a cara.

- Shh.

- As paredes têm ouvidos, Lotus?

- Talvez - dou de ombros e me viro indo para o sofá. Dou um grito quando sou erguida do chão. Luke passou os braços por baixo dos meus joelhos e está me carregando no colo. - Mas o quê?

- Benefícios de ser um lobisomem. Ter super-força. - fala e nós rimos. Sentamos no sofá e me solto dele, encostando numa ponta com as pernas dobradas no peito.

- Continue, Hemmings.

- Hmm, tem super-audição também, visão aguçada no escuro, presas e garras. - diz me encarando, ainda há um vestígio de sorriso em seu rosto.

- Que máximo.

- Ás vezes; quando me transformei eram muitos sons, muita bagunça.

- Então você não nasceu assim?

- Não, Lotus. - responde e sua expressão muda como se lembrasse de algo. Ficamos em silêncio por um tempo e tenho uma ideia.

- Me ajude a controlar meus poderes. Estourei um copo ontem porque fiquei nervosa ou irritada, não sei. - digo e levanto a mão com o curativo.

- Não sei se posso fazer direito. É tudo muito diferente. - diz passando a mão pelos cabelos. O gesto me lembra de Rodrick e afasto o pensamento da cabeça.

- Mas me ajude a controlar, por favor. - sussurro baixinho abraçando os joelhos - Eu estou com tanto medo, Luke.

- Ei, calma. - fala e põe a mão sobre as minhas. - Eu estou aqui.

- Então vai me ajudar? - pergunto e ele sorri assentindo.

...

- Estou em casa! - Luke grita quando chegamos em sua casa. Ele mora com os outros meninos; Ashton, Calum e Michael, se me lembro bem.

- Já estava na hora! Como foi com a bruxinha gost...? - o moreno, Calum, pergunta saindo de onde imagino ser a cozinha. Luke o fuzila com o olhar e posso jurar que ele se encolheu - Ah, oi, desculpe. Sou Calum.

- Eu sei - respondo e ele sorri.

- Não sorria pra ela assim - Luke chia e ele sorri mais, ainda com uma expressão inocente estampada no rosto.

- Assim como? - pergunta, se fazendo de desentendido.

- Como se quisesse devorá-la. - responde o loiro, nunca vi Luke tão sério.

- Machos são ridículos, não acha? - me assusto quando uma garota sai de uma porta no corredor à nossa esquerda. - Sendo territoriais até mesmo quando não somos deles.

- Não enche, Kendra - Calum fala e ela revira os olhos verde claro. Ela tem uma beleza incomum; pele cor de canela, feições exóticas e um cabelo liso negro comprido que escorre por suas costas como petróleo.

- Quem é você, hein, bonitinha? - fala se debruçando sobre Calum. Ele resmunga, mas não a afasta.

- Lotus Clines - respondo e ela sorri, um sorriso tão lupino quanto os de Luke. Passei a estranhar em pensar sorriso lupino já que eles são mesmos lobos.

- Como se ajudasse - diz. Ela usa apenas uma regata comprida que bate no meio das coxas, a blusa é cavada deixando a mostra o sutiã de renda lilás.

- A bruxinha gostosa da qual Luke estava falando desde a festa que prendemos os vampiros - Michael fala surgindo de outro quarto.

- Os gêmeos eram vampiros? - pergunto sem pensar. Luke assente, Calum e Kendra sorriem. - Parem de falar de mim como se eu não estivesse aqui e parem de me chamar de "bruxinha gostosa" é rude.

- Seria rude se fosse mentira - Calum fala e Luke o soca no ombro. - Doeu, seu canalha.

- O que está acontecendo?- Um Ashton sonolento surge nas escadas.

- Luke trouxe a brux...a Lotus aqui - Michael grita e Ashton me olha.

- Ela sabe?

- Óbvio, Ashton. Não a traria aqui se ela não soubesse. Kendra tem a mania de não manter a boca fechada mesmo - Luke fala e ele termina de descer as escadas. Agora Ashton, Calum, Kendra e Michael estão parados a minha frente, apenas Luke ao meu lado me impede de gritar e sair correndo por estar cercada de lobisomens.

- Você é uma deles? - pergunto pra Kendra e ela sorri. O que aceito como um sim.

- Há muitos de vocês na cidade? No mundo? Como eu não sabia da existência de vocês, como ninguém sabe? - as perguntas saem antes que me dê conta.

- Muita informação - Michal dá de ombros e some dentro da cozinha.

- É complicado - Calum responde.

- Ótimo, descomplique. - falo firme e Kendra gargalha vindo pra meu lado. Luto contra o ímpeto de recuar.

- Essa é das minhas. - diz e entrelaça o braço no meu.

- Kendra - todos os meninos dizem juntos e os olho sem entender.

- O que foi? - eu e ela perguntamos juntas, furiosas, e eles recuam.

- Lotus - Luke fala e o encaro confusa.

- O quê, Hemmings?

- Seus olhos - responde meio espantado e ainda fico sem entender. Kendra me solta e fica de frente pra mim.

- Ah, meu Deus. Que lindos. - diz e sai correndo. Ela volta trazendo um espelho de mão. - Olhe.

Quando olho meu reflexo, arfo de surpresa. Meus olhos estão brilhando, violeta. Como o do homem em meu sonho. Será que têm alguma relação com ele?

- O que eu perdi? - Michael volta e arregala os olhos ao me ver - Luke se deu bem dessa vez.

- Cala a boca - eu e ele respondemos juntos, o encaro e sorrimos.

- Vocês são tão melosos e fofos ao mesmo tempo - Kendra diz e coloca o espelho numa estante.

- Não estamos juntos - falo.

- Ela está apaixonada pelo meu querido primo, Rodrick. - Luke gargalha e se joga em um dos sofás de couro preto. Calum pula no outro sofá e Ashton se estende no tapete.

- Rodrick Tantum? - Kendra pergunta e ele assente - "Sou o capitão do time de lacrosse do colégio e namoro Nina Cantieri, blá blá blá"?

- Ele mesmo - respondo e ela me olha de maneira engraçada.

- Ele é tão babaca - ela fala e dessa vez tenho que concordar.

- Ele é meu melhor amigo.

- Correção. Ele era, agora eu sou - Luke fala e sorrio.

- Hmm - a garota fala e cutuca minha barriga.

- Kendra, deixe a pobre garota em paz - Ashton resmunga e Kendra enruga o nariz.

- Cala a boca, Ash. - ela diz e ele revira os olhos.

- Luke? - o chamo e ele me olha na hora. Ele entende o que quero dizer e se levanta.

- Eu e a querida Lotus vamos estar no quintal dos fundos, não nos interrompam - ele fala e todos soltam risadinha.

- Tentem não deixar os vizinhos verem vocês - Calum provoca.

- Ou ouvirem - Kendra fala maliciosa, sentada onde Luke estava, e faz barulhos de gemidos.

Solto um barulho estranho de nojo.

- Kendra! - Luke fala e ela gargalha.

- Estou brincando.

- Venha, Lotus - Luke diz e me puxa pela cozinha até a porta dos fundos. Saímos para o quintal, sinto calor mesmo estando com um cropped de alças finas e shorts.

Me sento em uma das cadeiras de balanço e Luke senta ao meu lado.

- Por onde quer começar? - ele me pergunta.

- Estou aqui para que você me ensine, não sei por onde começar.

- Ótimo. Levante. Vamos tentar apagar seus olhos. - fala e me levanto.

- Isso é possível?

- Claro. Tive que aprender a controlar os meus.

- Os seus também mudam? - pergunto e ele assente. - Posso ver?

Antes que eu me prepare, seus olhos azuis e calmos como piscina começam a brilhar como se tivessem luz própria num azul intenso.

- É maravilhoso.

- Obrigado - diz piscando - Agora tente você.

- Como?

- Sabe quando tem uma coceira no olho? - pergunta e assinto - Há uma sensação parecida, mas parece mais como se algo estivesse pressionando seus olhos. Ache isso e puxe de volta.

- Como se fosse fácil - quase rosno e seu sorrisinho sarcástico volta.

- Você fica linda brava - Luke diz.

- Rodrick diz o contrário - rebato antes que possa pensar duas vezes.

- Pare de falar nele e apague os olhos - agora é ele que quase rosna.

- Babaca.

- Mimada - diz em resposta e se joga em uma das cadeiras novamente.

Me concentro em encontrar a sensação e após inúmeras tentativas a acho, como se estivesse puxando uma corda ou uma alavanca, vou com cuidado e sinto como se um interruptor tivesse sido desligado.

- Consegui! - grito e abro os olhos. Luke sumiu. Estava tão concentrada que não o ouvi levantando. Ou ser sorrateiro é outra das inúmeras vantagens de ser um lobisomem. - Luke?

Ninguém responde. Chamo de novo e nada novamente.

- Babaca - sussurro ao nada. Escuto um farfalhar de folhas atrás de mim e me viro rapidamente, mas não há nada.

Grito quando algo grande e impossivelmente pesado se joga em mim de lado. O pelo escuro da criatura é grosso e uma das patas imensas - que têm garras imensas - está sobre meu peito me pressionando ao chão. É um lobo? É Luke? Se for, me decepcionei. Sempre achei que ele seria um lobo branco.

Outro lobo se junta ao primeiro; sua pelagem é caramelo e os olhos são de um castanho escuro, ele é familiar. Tento conter o pânico ao constatar que nenhum deles é Luke. O que está em cima de mim tem olhos verdes bonitos, mas em contradição tem presas enormes que podem arrancar meu braço com uma mordida.

Empurro o peito e a pata do lobo com a mão que não está imobilizada pela outra pata e me esforço pra sair, mas não sou forte o suficiente e a criatura rosna e força mais. Grito e esparneio mas o animal não solta. Onde diabos está Luke? E quem são esses lobos?

No desespero, sinto um puxão dentro do peito e percebo que o vazio familiar que eu sentia ao fazer dezoito anos foi embora. De alguma maneira sei que foi preenchido pela magia que estava bloqueada de algum jeito.

Tentando não perder a ligação com a magia, puxo mais e penso no que lobos não gostam e quando a palavra fogo me vem a mente, minha mão direita - a que felizmente está livre - irrompe em chamas e queima a pelagem e a carne do lobo. Ele uiva e sai de perto de mim, me levanto o mais rápido possível e invoco uma bola de fogo na mão. Não faço ideia de como sei controla-la mas é algo natural.

- Quem são vocês? - pergunto e sei que meus olhos estão brilhando. Sinto o poder percorrendo meu corpo e dou um sorrisinho de canto. A chama brilha e rodopia em minha mão.

O lobo escuro solta um ganido e começa a se tranformar; é estranho no começo com tudo encolhendo e depois perdendo as camadas de pelo e músculo. É uma garota de longos cabelos escuros, Kendra, e ela tem uma marca de mão acima dos seios. Ela está nu e seu corpo é todo curvilíneo. O lobo caramelo se aproxima dela, percebo o quanto ele é imenso agora que estou de pé e ela está a seu lado.

- Desculpe - o som sai estrangulado. Puxo toda a sensação formigante que se espalha em meu corpo e a chama se apaga, assim como meus olhos.

Kendra começa a gargalhar alto e o lobo rosna.

- Você é muita boa nisso. Luke disse que você não sabia nem ativar sua magia então como conjurou essa bola de fogo do nada?

- Não sei, de verdade.

- Ótimo, ótimo - ela bate palmas e sai andando, seus quadris são largos e a cintura é fina, na minha frente. O grande lobo a segue com o olhar e bufa.

- Oi pra você também, Calum - resmungo e ele se transforma também. O único dos garotos que tem olhos escuros é Calum Hood. Tento manter os olhos em seu rosto e ele percebe, pois abre um sorrisisinho malicioso. - Onde está Luke?

- Lá dentro, conversando com a ex-namorada. - fala e dá um passo em minha direção. Recuo um passo e franzo a testa. - Ciúmes, pequena Lotus?

- Cale a boca, Calum - digo e dou as costas, ele está próximo demais agora pois consigo senti-lo à minhas costas.

- O que foi, bruxinha? Tem algum problema com homens nus? - pergunta e me viro. 

- Se afaste - digo e me impressiono com a firmeza na minha voz.

- E se eu não quiser?

- Eu farei por você.

- Duvi...- antes que ele completasse a palavra fiz ele voar longe com um gesto da mão direita.

- Antes de duvidar de mim, lembre que apesar de ser uma bruxa que não sabia nem a própria origem eu ainda sou muito, mas muito poderosa. - digo e entro na casa.

Enquanto atravesso a cozinha escuto vozes acaloradas na sala e passo pela porta da cozinha.

- Lotus - Luke disse como uma advertência e li em seus olhos "fique longe". Levantei uma sobrancelha como se dissesse "sei cuidar de mim mesma" e ele provavelmente entendeu, pois bufou.

Olhei para a garota morena que discutia com ele.

A pele dela era mais clara que a de Kendra, num tom de oliva bonito demais, e perfeita. Rosto fino, olhos da cor de mel - mais amarelos que castanhos - e do tamanho certo ao seu rosto emoldurados por cílios tão escuros quanto seus cabelos. Os cabelos eram lindos, nem totalmente lisos nem ondulados, mas uma mistura perfeita que a deixava mais bonita ainda; tinham um corte um pouco abaixo dos ombros e estavam soltos.

Ela usava uma roupa inteira de couro, calças altas grudadas que emolduravam a cintura e as coxas, um top de couro que cobria apenas os seios fartos e botas baixas com pontas de ferro.

Ela era uma guerreira e não era preciso nem mesmo olhar para as armas penduradas em seu cinto para saber disso.

- Quem é você? - aquilo sim era um rosnado.

- Lotus Clines.

- Essa é a tal de Lotus que Madison não cala a boca sobre? - a garota se dirigiu a Luke como se eu não estivesse ali.

- Quem convive com Maddie é você, Lorelai. - Kendra disse passando atrás da garota, agora vestida de shorts jeans e regata.

- Não falei com você, mestiça - a tal de Lorelai cuspiu e Kendra se encolheu.

- Não fale com ela assim - falei por impulso. Os olhos amarelos se cravaram em mim e me esforçei pra não tremer. Ou vomitar.

- Quem você acha que é pra falar comigo assim? - ela disse e uma bola de fogo azul apareceu em sua mão. Fiz a mesma coisa, mas meu fogo brilhava vermelho, laranja e amarelo como uma pintura de outono.

- Garotas - Luke disse e me encarou sério. Como se dissesse que eu era racional o suficiente para não entrar nessa briga.

- Lorelai - alguém avisou da porta da sala. Reconheci a voz, Madison.

- Maddie - sussurrei sem querer e Lorelai cravou os olhos em mim.

- De onde a conhece? - perguntou para Madison.

- Sou cliente da mãe dela - Madison responde e entra na casa parando perto de nós.

- Não seria paciente? - pergunto sem jeito.

- Fofinha - Lorelai fala com um tom pejorativo e deixa a bola de fogo flutuar pelo ar perto de sua cabeça. - Sua mãe não é psicóloga, ela é vidente e vende ervas para os seres mágicos.

- E é uma das melhores bruxas da idade dela. - Madison acrescentou.

- Da idade dela? - engasgo com a pergunta.

- Sua mãe tem uns 400 anos, Lotus - Kendra disse gargalhando e o fogo em minha mão se tornou uma chama alta, quase encostando no teto, que Lorelai apagou com uma onda de água fria que ela convocou do nada após suspirar desapontada ou irritada.

- Kendra, menos - Luke chiou e ela gargalhou mais.

- Lotus é tão boazinha, não implique com ela, Lorelai. Sua bruxa. - ela disse gargalhando. Com um movimento de mão Lorelai fez ela voar do sofá ao chão, mas antes que Kendra caísse eu levantei a mão e uma corrente de ar fez com que ela ficasse suspensa um pouco antes de pousar no chão sentada. Ela gargalhou mais e Lorelai me encarou.

- Tem quanto tempo de treinamento? - ela parecia surpresa e admirada.

- Talvez uma meia hora - respondo e ela pisca.

- Impossível.

- O quê? - pergunto e ela rosna.

- Controlar os elementos fácil assim exige tempo e treinamento. A própria Morgana me ensinou e demorei bons dez anos. Dizem que fui umas das mais rápidas.

- Não sabia que era uma bruxa até ontem, nunca mexi com magia. Vim pra cá hoje e queimei Kendra quando ela e Calum me atacaram no quintal.

- Vocês atacaram Lotus? - Luke indagou e Calum revirou os olhos.

- Não atacamos, apenas queríamos dar um sustinho e ver como ela reagiria. E ganhei essa marca bonitinha aqui - Kendra falou e apontou a marca de mão que já quase sumia.

- Quem é seu pai? Sabemos que sua mãe é extremamente poderosa, mas seu pai teria que ser muito mais muito poderoso pra você conseguir esse controle - juro que havia um pouco de inveja na voz de Lorelai.

- Paul Clines, escritor e editor de livros. Duvido que haja algum traço de magia na linhagem dele. - Madison respondeu revirando os olhos. O que me espantou, pois ela parecia delicada pra esse tipo de coisa.

- Os olhos da Lotus são roxos - Kendra comentou.

- O quê? - Lorelai exclamou e olhou estranho pra Madison que devolveu o mesmo olhar.

- Ah é. - falei e fiz os olhos brilharem.

O mais estranho era que eu sentia a pressão que Luke falou quando meus olhos "normais" apareciam, já com os olhos roxos parecia normal, natural.

Madison suspirou e passou por nós entrando na cozinha.

- Onde estão Kayla e Olive? - Lorelai grita pra ela e Luke bufa.

- Pare de gritar que a porcaria da casa não é sua, Lorelai. - ele fala e a morena exibe um sorriso de escárnio.

- Está irritadinho por quê? Só por que resolvi aparecer justo quando sua namoradinha está aqui?

- Eu não sou namorada dele.

- Quem liga, bruxinha? - ela rebateu mostrando os dentes.

- Lorelai - uma voz feminina disse entrando na casa. Me virei e vi a garota. Ela era ruiva e tinha a pele bronzeada, como se fosse meio dourada. Outra menina a acompanhava, uma loira de olhos verdes imensos e felinos.

- O que foi, Kayla?

- Menos - a ruiva disse torcendo o nariz e Lorelai rosnou pra ela. Um rosnado de verdade.

- Olive! - Kendra gritou e pulou na loira. A garota deu risada e jogou os longos cabelos para trás.

- Oi, Kenna - Olive disse rindo.

- Oi, Kay - Ash disse descendo as escadas e a ruiva piscou pra ele. Os olhos dela eram pretos e pequenos, nariz meio arrebitado, rosto fino, já a boca parecia estar sempre com os cantos erguidos num sorriso de escárnio. Seu corpo era magro e baixo, mas dava pra ver que ela era forte .

Já a loira tinha um rosto em formato de coração, bochechas rosadas, dentes brancos demais e uma boca cheia e vermelha. Ela parecia uma adolescente de quinze anos que havia acabado de chegar na Disney de tanto que sorria. Era mais baixa que eu, mais alta que a ruiva.

- Se alguém arranjar encrenca com a bruxinha, vou sugar o ar do encrenqueiro por uns bons segundos - Madison gritou da cozinha.

- Entendido, comandante Madison - Olive gritou e Kendra riu.

- Lotus! - Ashton me chamou e pulei de susto.

- O quê?

- Gwendolyn é solteira?

- Até onde sei, sim, Ashton - respondo e ele franze a testa.

- Me chame de Ash.

- Tudo bem, Ashton.

- Se ela não namora, por que nunca está em casa? - perguntou e uma interrogação foi estampada em meu rosto.

- Em primeiro lugar: como sabe onde ela mora? Em segundo: por que quer saber? E em terceiro: você é algum tipo de stalker?

- Levamos ela embora no dia do seu aniversário, lembra? - diz e assinto - Quero saber porque ela é bonita demais e não, eu não sou um stalker. Pode me responder agora?

- Gwen trabalha na biblioteca, vai pra casa só dormir, às vezes, dorme sobre uma pilha de livros ou uma mesa no trabalho mesmo. Ela simplesmente ama ficar no meio dos exemplares. É mais o lar dela do que a própria casa.

- Os pais dela não liguam? - ele pergunta curioso.

- São dois religiosos católicos que querem apenas que ela não engravide antes de casar ou se envolva com bebida e drogas. A irmã mais nova dela, Gwyneth, é uma mini ditadora desde que aprendeu a falar. E bem...Gwen prefere livros à pessoas.

- Mas...

- Já te contei coisa demais. Gwendolyn odeia que falem sobre ela, nem mesmo gosta de falar sobre si mesma. Se quiser saber algo, pergunte pra ela. Com sorte, minha querida amiga só vai fechar a cara e começar a balbuciar citações de livros antes de te dar as costas - falei sorrindo de canto e ele arremessou uma almofada em mim.

- Babaca - ele resmungou quando ergui a mão e a almofada flutuou a minha frente como se estivesse presa num fio invísivel.

Dei uma risadinha e soltei a almofada que caiu no chão com um barulho suave.

- Lotus - Luke chamou e me virei de frente pra ele.

- Oi?

- Você está pálida. - respondeu e pegou minha mão.

- Não estou não. - falei e tentei soltar a mão, mas uma tontura e uma dor de cabeça me deixaram sem ar de tão fortes e cambaleei pra frente. Luke me segurou e me apoiei no antebraço dele com as duas mãos.

- Você está bem? - perguntou e assenti. Minha língua parecia papel de tão seca e minha visão embaçou. - Lotus?

Ouvi alguém gritar antes de tudo ficar escuro. A única coisa que senti antes de apagar foram braços muscolosos me erguendo e me segurando.

...

- Lottie? - a voz de Lydia me acordou. O que Lydia faz na casa dos meninos?

- Hm - resmunguei e ouvi um suspiro aliviado.

- Tia? - Thomas perguntou e senti sua mãozinha quente sobre a minha, que estava gelada.

- Oi, meu amorzinho - respondi meio rouca. O que diabos aconteceu comigo? Lembro de Luke dizendo que eu estava pálida, depois da tontura, mas por que diabos adoeci de uma hora para a outra?

E como cheguei em casa? Me perguntei ao olhar ao redor e ver as paredes do meu quarto.

Lydia estava sentada na beira da cama e Thomas estava em pé ao meu lado.

- Onde está Luke? - perguntei e logo depois alguém pigarreou do meu lado esquerdo. Antes mesmo de me virar sabia que era Rodrick.

- Eu te acho desacordada na porta da sua casa e a primeira coisa que você pergunta é onde aquele babaca está. - diz, reviro os olhos o que gera uma dor em minha nuca e me faz encolher.

- Já cansei disso hoje, Rodrick. - cuspi as palavras e em seu rosto havia uma expressão arrependida.

- Desculpe, Lottie. Por favor... - continuou a soltar palavras atrás de palavras e somente parou quando levantei a mão esquerda.

- Chega. Saia daqui, converso com você depois. Estou esgotada demais e nem sei o por quê. - seu rosto foi de arrependido para magoado e ele se levantou indo embora.

- O que está acontecendo? - Lydia perguntou com um sorriso de divertimento no rosto.

- Nada.

- Lotus - insistiu como se quisesse realmente saber.

- Quando saí na véspera do meu aniversário, vampiros gêmeos tentaram sequestrar Tamara e depois eu. Lobisomens adolescentes salvaram a noite e o meu pescoço, literalmente. Descobri que o lobisomem loiro bonito é primo de Rodrick e eles se odeiam. O bonitinho revelou que eu sou uma bruxa, nossa mãe também. Estava na casa dos lobisomens antes de desmaiar e não lembro de nada - respondi de uma vez e Lydia parecia um peixe, fechando e abrindo a boca; antes de gargalhar alto o suficiente para o quarteirão inteiro ouvir.

- Essa é a melhor história que você já inventou em seus dezoito anos de vida, maninha - falou ainda gargalhando e saiu do quarto. Thomas me encarava.

- O que foi, pestinha? Vai rir também?

- Não, tia. Eu acredito em você. É que, às vezes, eu juro que vejo um lobo olhando pra mim da rua quando olho na janela. Ele é muito grande, parece ter o pelo escuro porque não enxergo muito bem quando a rua está escura. Mas sempre é o mesmo, o reconheço por causa dos olhos azuis.

- Como assim? Um lobo te vigia? - pergunto e perçebo o quão louca pareço falando de lobisomens com um garoto de cinco anos.

- Eu juro, tia. Ele nem sempre está lá, mas quando aparece fica a noite inteira olhando do outro lado da rua e toda vez que olho na janela ele ainda está lá, parado olhando diretamente pra mim. No meu aniversário ele apareceu e uivou.

- Thomas...- comecei sem saber o que dizer - Tem certeza de que não era um cachorro de rua?

- Tia Lotus - diz como se eu fosse a criança ali, ele sobe na cama sentando nas minhas coxas e colocando as mãos nos meus ombros - Era um lobo, daqueles do Animal Planet, imensos.

- Tom - começo, mas minha mãe entra no quarto.

- Thomas, querido. Aurea está chorando lá embaixo, vá brincar com ela - ela diz e ele pula da cama ao ouvir o nome da cadelinha. Minha mãe fecha a porta assim que ele sai e se vira pra mim.

- O que aconteceu, querida?

- Aconteceu que eu descobri que sou uma bruxa - respondi e invoquei uma pequena bola de fogo laranja dançante na mão.

- Lotus...- ela disse e sua voz vacilou.

- Por que nunca me contou? - perguntei e ela se mostrou espantada.

- Os poderes voltaram, mas você não se lembra?

- Lembro do quê?

- De tudo. Suas memórias verdadeiras. Você sabia que era uma bruxa até os dez anos, quando simplesmente incendiou o sofá porque Lydia tomou sua boneca. - respondeu e sentou na cama de frente pra mim mas perto o suficiente pra tocar minhas mãos.

- Eu me lembro...- respondi. Eu lembrava; tinha ganhado uma boneca nova, a Lotus de dez anos era birrenta ao extremo, a Lydia de quatorze pegou a boneca e ficou balançando no ar fora do meu alcance. Lembro da raiva e de como queria incendiar algo, mas depois mamãe e papai vieram e me entregaram a boneca.

- Suas lembranças foram modificadas, querida. Assim como as de Lydia, Logan e papai.

- Mas ele não é bruxo?

- Não, por que?

- Lorelai disse que meu pai teria que ser poderoso para que eu tivesse um poder desse.

- Você conheceu Lorelai Wolff? - perguntou e pressionou os lábios.

- Sim, esta tarde. Ela é ex-namorada de Luke.

- Isso explica de onde o reconheço - falou estalando os dedos.

- Mãe?

- Sim?

- Como pode estar tão tranquila? Descobri que mentiu pra mim a vida toda, que sou uma bruxa e que você tem 400 anos.

- 367 - falou em tom de repreensão.

- Não ajuda muito.

- Ah, querida. Fingir era muito desgastante. - falou e pareceu reconsiderar - Mas estaríamos consideravelmente mais seguras se você não soubesse. E se não houvesse tantos seres mágicos aqui em Sydney.

- Lorelai disse que demorou dez anos para controlar os elementos. Como eu que tenho um total de 0 por cento de treinamento os controlo nesse nível? - perguntou e minha mãe sorri de leve.

- Sua magia, seu corpo e sua mente lembram do treinamento que você teve quando pequena. Nós treínavámos muito com você.

- Ah - digo baixinho. É estranho ter finalmente confrontado ela, e mais estranho ainda mamãe agir com tal naturalidade.

- Lydia e Logan são bruxos também?

- Não, infelizmente, apenas você é privilegiada com minha linhagem - disse animada.

Contei a história da Royal para ela e da casa dos meninos.

- Você desmaiou por causa do bloqueio mágico, mesmo a magia estando "livre", se podemos dizer assim, o bloqueio ainda procura impedi-la de outro jeito.

- E esse outro jeito é me apagando. - concluí e ela concordou com a cabeça. Um pensamento me vem e solto a pergunta - Quem é Rex?

- Desculpe? O quê? - pergunta estranha e me ajeito na cama.

- Quem é Rex? O cachorro de pelo negro e olhos dourados que estava rolando no tapete em meu aniversário de seis anos?

- Que cachorro, querida? Apesar de tudo o que está acontecendo, isto deve ter apenas aparecido no sonho, você inventou.

Lembro de algo que Gwendolyn adora falar quando o assunto é sonhos bizarros.

Quando um suposto desconhecido aparece em seu sonho, ele não é de todo desconhecido pelo seu subconsciente, já que você deve ter visto a pessoa pelo menos uma vez na vida para reproduzi-la no sonho, o subconsciente não consegue produzir rostos ou pessoas.

- O subconsciente não consegue criar coisas. Devo tê-lo visto ao menos uma vez - digo e ela se levanta.

- Até parece. Eu me lembraria de um cachorro desses - ela disse fazendo um gesto com as mãos e me dando as costas no intuito de sair do quarto.

- Mamãe - falo e ela se vira. - Me conte tudo. Por favor. Estou cansada de ficar confusa e apavorada. - mamãe suspira e se senta na minha cama novamente. - Por que não me lembro de nada?

- Por causa do bloqueio.

- Quis dizer, por que bloquear minhas memórias e minha magia? - pergunto e ela junta os lábios formando uma linha fina.

- Sabe a queimadura que Lydia tem na panturrilha dela? - perguntou e assenti.

- Sim, quando ela entrou na cozinha enquanto você fritava peixe e o óleo explodiu.

- Bem, não foi isso. Você incendiou o sofá por causa da boneca, Lydia estava perto, e as chamas foram altas e fortes o suficiente para queimá-la. Se eu houvesse usado magia da terra na época, ela não teria a cicatriz, mas seu pai quis que levássemos sua irmã ao hospital e bem...eles não fazem mágica.

"Quando chegamos em casa, coloquei seu pai e vocês três para dormir; o feitiço era bom o suficiente por isso nunca mais me importei. Viver em segredo todos esses anos e sem usar minha mágica me desgastou, mas foi pelo bem de vocês."

- Por que meu poder é tão grande?

- Porque você tem a minha linhagem, querida. - falou e apertou meu nariz entre os dedos.

- Isso é bom? - perguntei incerta.

- Claro, meu amor. Só tenho que começar a te treinar, logo. Antes que se descontrole e seja um perigo a si mesma e os outros.

- Por que o meu bloqueio enfraqueceu, mas Lydia, Logan e papai não lembram de nada?

- Faz muito tempo desde o feitiço, Lottie. Você é uma bruxa e agora que atingiu os dezoito anos, está no ápice do seu poder. Por isso o bloqueio caiu. Seu pai e seus irmãos são humanos, nada nunca mudará para eles. Depois conversamos mais, tente não incendiar ou congelar alguém até lá. Te amo, filha - diz e dá um beijo em minha testa; tão casual como se estivessemos falando sobre escola e garotos.

- Também te amo, mãe. - falo e observo suas costas enquanto ela se afasta.

- E, Lotus? - pergunta se virando um pouco.

- Sim?

- Primeira regra do clube das bruxas: não fale sobre o clube das bruxas. Entendeu? - seus olhos brilhavam como se fosse...magia.

- Perfeitamente, mãe - digo sorrindo. Não consigo parar de questionar em quais partes ela me disse a verdade ou em quais outras omitiu ou mentiu.

Meu celular vibra no criado-mudo e o pego. Há uma 1 nova mensagem de um número desconhecido, não há foto de perfil.

"Você está bem?"

"Quem é?" pergunto e após alguns segundos a pessoa responde.

"Luke Hemmings, seu melhor amigo, senhorita Lotus"

"Tô bem"

"Não vai nem perguntar como chegou na sua casa?"

"Como cheguei em casa?"

"Chata. Depois que a senhorita desmaiou, Lorelai surtou porque não conseguia te acordar, berrou e fez colocarmos você no carro e levarmos você carro. Eu levei no caso."

"Sua ex-namorada é tão maluca."

"Ela ia adorar ser chamada de maluca."

"Provavelmente ela me atiraria bolas de fogo, certo?"

"Provavelmente." "Você está bem mesmo?"

"Assustada, mas bem."

"Por que está assustada?"

"Bloquearam minha magia por ser uma pequena bruxinha psicopata. Eu incendiei um sofá quando tinha 10 anos."

"Wow."

"E queimei Lydia ainda por cima."

"E o que te assusta?"

"O fato de ser poderosa o suficiente pra incendiar algo com dez anos e o poder estar no ápice,e maior, agora com dezoito (?)"

"Ah"

"Tenho que ir. Depois falo com você?"

"Quando quiser estou aqui, Lotus."

"Obrigada." respondo e jogo o celular ao meu lado na cama. Saio da cama, coloco os chinelos e me dirijo ao espelho. Quase grito ao ver meu reflexo.

Minha pele está numa cor pálida doentia e tenho bolsas escuras enormes sob os olhos. Meu cabelo é uma massa confusa de ondas ao redor do rosto e minha boca está meio roxa.

Suspiro e saio do quarto, desço as escadas e entro direto na cozinha. Nunca tive tanta fome.

Escuto um gritinho e tento acordar um pouco. Joanna e Logan estão agarrados sobre a ilha, ele estava com a mão debaixo da blusa dela quando entrei.

- Ew - resmungo e viro as costas pra eles abrindo a geladeira.

- O que aconteceu com você? - Logan pergunta e Joanna se endireita. Não respondo enquanto pego manteiga de amendoim e geléia. Alcanço o pão na bancada e monto um sanduíche rapidamente.

- Usei minha magia, o bloqueio mágico me apagou. - falo e mordo o sanduíche.

- Você tá drogada? - Joanna pergunta. Os cabelos loiros lisos estão impecáveis e os olhos castanhos escuros como grãos de café me encaram preocupados.

- Quem dera estivesse. - digo e enfio o resto do pão na boca. Ela torce o nariz e até mesmo Logan faz cara de nojo.

- Ogra. - ele diz e a puxa pra fora da cozinha.

Monto outros dois sanduíches e preparo um copo de suco de laranja. Me sento na sala e engulo tudo com voracidade. Ligo a televisão e fico lutando para não cair no sono.

- Tia Lottie! - a voz de Thomas me disperta e me sento no sofá. Ele entra correndo pela cozinha e pula em mim. Um borrão branco se joga atrás dele e eu gargalho.

- Sai, Aurea! - grito, ela pula pro chão e senta me encarando. Thomas sentou ao meu lado e está ofegante. - O que estavam fazendo?

- Mamãe nos levou pra passear, aí achamos tio Rodrick no caminho e como ela tinha que ir resolver algo deixou ele nos trazer de volta pra casa. - responde.

- Onde Rodrick está?

- Lá fora, deitado na grama. - Thomas responde e perde o interesse em mim quando Aurea o lambe.

Passo pela cozinha e estremeço de frio quando uma brisa gelada entra já que a porta dos fundos está aberta e ainda estou com a mesma roupa de cedo.

O quintal dos fundos não é enorme, mas há espaço o suficiente para uma churrasqueira, uma mesa com seis cadeiras sob o toldo e o retângulo de grama, onde Rodrick está deitado.

- Oi - sussurro e me sento ao seu lado abraçando os joelhos.

- Oi - responde baixinho e um calor se espalha em meu peito ao ouvir sua voz.

Ainda não o encarei, e nem sei se terei coragem o suficiente para fazê-lo. Levanto o olhar para as estrelas e suspiro. 

- Você está com Luke?

- Ahn?

- Vocês estão juntos? - pergunta e eu nego com a cabeça. - Por que ele estava aqui?

- Veio me provocar; apareceu na cozinha e logo depois você voltou. Ele fez tudo pra te provocar também, eu nem o conheço direito.

- Ah - diz e quase sinto o olhar dele em minhas costas.

- Desculpe - dizemos juntos.

- Você não tem que me pedir desculpas. - fala e coloca a mão em minhas costas.

- Tenho sim. Por ter te expulsado. - falo - Duas vezes.

Ele ri baixinho e me deito ao seu lado com a cabeça encostada em seu peito.

Ficamos em silêncio por uns minutos apenas olhando as estrelas.

- Lottie? - ele me chama e olho em seus olhos.

- Sim?

- Eu te amo. - diz e não consigo conter o choro.

- Eu também te amo - as palavras saem engasgadas através dos soluços.

- O que foi, flor? - pergunta e limpa as lágrimas com o polegar. Encaro o céu escuro pontilhado de estrelas.

- Eu te amo mais do que deveria , Rodrick.

- Como assim? - pergunta e bufo irritada.

- Eu te amo mais do que deveria. Eu te conheço desde a porcaria dos meus cinco anos, não é comum encontrar uma amizade que dure desde o jardim de infância. Eu nem sei quando comecei a me apaixonar e sinceramente nunca sequer houve outra pessoa aqui no meu coração além de você. Eu te amo muito. E dói vê-lo com Nina, dói demais. Sempre doeu. - solto tudo de uma vez e não ouso olhá-lo. Ele ainda está em silêncio e volto a chorar. - Eu sei que isso é estúpido porque você ama ela, mas eu tinha que te contar isso. Desculpe, por favor, me desculpa.

- Lotus - ele me chama e o encaro. Rodrick se senta e sento de frente pra ele de pernas cruzadas.

- Me desculpe - digo novamente e as lágrimas escorrem pela minha face. Não consigo decifrar sua expressão mas ele parece pensativo ou chateado - Me desc...

Antes que eu termine a frase sua boca está grudada na minha. Uma de suas mãos está em minhas costas e me mantém próxima a ele, a outra está em minha coxa. Já havia beijado alguns garotos, beijos rápidos ou beijos de uma noite só em boates, mas essa é uma sensação que eu nunca havia sentido. Como se o beija-flor em meu peito estivesse cantando e as borboletas batendo mais e mais as asas. A boca dele era mais macia do que eu jamais poderia imaginar.

Quando nos separamos, vejo que seus olhos brilham. O encaro confusa.

- Você não calava a boca - disse sorrindo. - Eu amo você, Lotus. Mais do que como minha melhor amiga e demorei demais pra perceber isso. Até hoje, quando vi Luke com você. Foi como se algo houvesse explodido dentro de mim e eu só queria socá-lo por estar com a minha garota. Com você.

- Mas e Nina? - pergunto tentando conter o sorriso que ousa crescer em meu rosto.

- Minha paixão por ela acabou há um tempo. - diz e encosta nossas testas. - Mas a nossa paixão vai durar pra sempre, em todos os dias de nossa vida.

- Está me pedindo em casamento? - tenho certeza que franzi o nariz.

- Não - fala rindo. - Estou pedindo em namoro mesmo.

- Amo você. - digo e o beijo.

- Também te amo, flor.

Nos jogamos abraçados na grama novamente e sorrio para as estrelas. O sorriso não deixa meu rosto, nem mesmo quando penso ouvir um uivo furioso na rua.

...

Acordo com o sol no rosto. Rolo pro lado e encosto em algo firme e quente. Abro os olhos devagar e tento focar a visão na pessoa ao meu lado.

- Rodrick?

- Só mais cinco minutos, mãe - diz e gargalho, me enrolando ao lado de seu corpo novamente. Ele acorda devagar e abre um sorriso lento que faz meu coração disparar.

- Oi - digo meio empolgada.

- Oi - responde e me dá um selinho.

- O que é isso? - alguém diz e me sento rapidamente olhando para a porta da cozinha. Identifico Tamara pelos cabelos ruivos e pela pele pálida antes do que pela voz.

- Oi, Tam - Rodrick fala com uma expressão totalmente diferente da de antes.

- Me expliquem, antes que eu grite pelo quarteirão - fala e depois olha para Rodrick - e ligue para a sua namorada.

- Ei, vamos com calma - Rodrick fala e se senta também.

- Tamara - começo e ela levanta a mão me fazendo ficar quieta.

- Primeiro, Lotus Caroline, você vai tomar um banho porque está com cara de doente. - fala firme e me levanto. Rodrick bufa e revira os olhos se deitando na grama novamente. - E você, Rodrick Tantum, não saia daqui antes que eu volte pra lhe dar uma surra.

- Odeio você - ele resmunga pra ela.

- O sentimento é mútuo, seu babaca - ela solta e suspiro.

- Parem os dois, por favor.

Tamara me arrasta pela minha casa e me enfia dentro do banheiro dizendo que vai escolher as roupas.

Lavo os cabelos, mas não me demoro no banho e logo já estou enrolada na toalha indo pro meu quarto.

- Tamara? - pergunto e ela surge de debaixo da cama. - O que você estava fazendo?

- Procurando aquele sua sapatilha rosa.

- Credo - falo e torço o nariz - Não vou ficar de sapatilha dentro de casa, Tam.

- Quem disse que você vai ficar dentro de casa? - pergunta se sentando na minha cama.

- Hein?

- Luke e os meninos nos chamaram pra um churrasco na casa deles.

- Não podemos ir - solto de uma vez.

- Por que?

- Porque...- tento arranjar uma desculpa boa sem querer dizer "eles são lobisomens", mas não encontro nenhuma.

- Viu? Nem há motivo. Se vista - fala e joga as roupas em mim. Quase que as paro no ar com minha magia e esqueço que ninguém pode saber, mas as roupas acertam meu rosto e meus braços e bufo.

- Ai. Sem educação.

- Cala a boca e coloca essa roupa.

Reviro os olhos e visto as roupas íntimas, depois coloco o short jeans cintura baixa de lavagem clara e a regata cinza com um sol prateado. O sol tem um rosto que me dá arrepios e por isso nunca usei essa blusa.

- Seca esse cabelo, pelo amor. - manda sem tirar os olhos do celular.

Seco o cabelo rapidamente e aplico um pouco de rímel. Pego os brincos dourados de argola na cômoda e os coloco. Calço os tênis pretos e me viro para a ruiva.

- Pronto, princesa? - Tamara diz já de pé. Ela usa uma regata verde musgo, shorts brancos e uma sapatilha preta

- Pronto.

- Ótimo, vamos conversar com o idiota do seu melhor amigo e depois vamos pro churrasco.

- E se Rodrick não deixar eu ir? - pergunto enquanto descemos as escadas.

- Aah...e só porque agora os dois trocaram uns beijinhos ele manda em você? - rebate parando na escada de frente pra mim e levanta uma sobrancelha.

- Não.

- Foi o que pensei.

Ficamos em silêncio até chegar no quintal.

- Venha, Rodrick - ela chama-o pra dentro da cozinha e me sento em um dos bancos. Tamara se senta ao meu lado e Rodrick fica em pé do outro lado da ilha. - Podem me explicar.

- Ontem eu e Rodrick almoçamos juntos, depois de um tempo Luke apareceu aqui em casa e Rodrick voltou, Luke o provocou, todo mundo gritou. Enfim, depois eu desmaiei e Rodrick me achou na porta de casa, aí eu mandei ele ir embora quando acordei. Depois de noite, Rodrick voltou e pedimos desculpas um pro outro. Me declarei pra ele, ele pra mim, nos beijamos e dormimos sem querer lá fora. - respondi.

- Rodrick é apaixonado por você?

- Sim - respondemos juntos.

- E Nina?

- O que tem ela, Tamara? - Rodrick pergunta.

- Você ainda namora ela, certo? - a ruiva pergunta e ele para.

- Pra todo mundo sim, mas não estava dando certo.

- Duvido - Tamara sibila e ele a olha com raiva - Enfim, irei levar nossa pequena Lotus a um churrasco e nem tente nos impedir ou dizer algo contraditório.

- Que churrasco? Onde?

- Na casa dos meninos - fala com o sorriso mais malicioso e perverso que eu já vi.

- Tamara.

- Desculpa, Lottie - fala e dá uma risadinha.

- Lotus? - ele se vira para mim.

- Eu vou - respondo dando de ombros e não consigo entender sua expressão.

- Sério?

- Sério, por que? - digo mais desafiadora do que queria parecer.

- Por nada - responde meio derrotado. - Tenho que ir também.

- Ótimo.

- Ótimo.- fala e sai da cozinha. Escuto a porta da sala bater e logo depois a risadinha de Tamara.

- Isso foi ótimo. Vamos? - pergunta me oferecendo o braço, dou risada, engancho meu braço no dela e seguimos rindo até seu carro.

...

Quando estamos quase chegando na casa de Luke lembro de algo.

- Tam, não avisei meus pais ou Lydia que saíria.

- Relaxa que eu avisei todo mundo e pedi permissão de sua mãe pra te tirar de casa.

- Quem é a melhor amiga do mundo?

- Eu mesma - ela dá um gritinho e dou risada. Tamara tem dois lados. O lado mandão e desafiador perto de gente que ela não gosta, como Rodrick. E o lado risonho e mais calmo que mostra quando está comigo, as meninas e os meninos.

- Ah meu Deus! Me esqueci completamente de Aurea! - agora sou eu que dou um gritinho - Ela vai morrer de fome, precisamos voltar.

- Cuidei disso também. Ela já está na casa dos meninos.

- Hein?

- Cheguei as oito da manhã na sua casa. Sua mãe estava louca com Thomas e Aurea na cabeça dela, aí Lydia chegou levou Thomas e Aurea continuou seguindo-a, como dona Louisa precisava sair me ofereci pra levar a sua pequena fera pra casa dos meninos. - diz e para no semáforo, seus dedos batucam o volante num tique que ela tem toda hora - Aí fiquei um pouco com o pessoal, voltei pra te buscar e vi aquela cena grotesca de você beijando aquele idiota. - seu nariz se enruga agora e reviro os olhos.

- Eu gosto de verdade dele - digo e ela assente sem me olhar.

- Eu sei disso, Lottie. Só não acho que ele sente o mesmo. - responde.

- Por que?

- Por que ele ficaria com Nina todos esses anos, se você sempre esteve ao lado dele?

- Por que ele estava apaixonado por ela, não está mais e percebeu que eu sou a garota da vida dele?

- Ficar rebatendo perguntas com perguntas é ridículo - ela diz por fim e dou de ombros.

- Ficar com ele é tudo que eu sempre quis, Tam.

- Eu sei, amiga, eu sei.

Antes que eu me dê conta já estamos na frente da casa dos meninos e Tam estaciona o carro.

Descemos e entramos no jardim, damos a volta pelo corredor externo e já saímos nos fundos. Não havia prestado tanta atenção ontem, mas o quintal deles é consideravelmente maior que o de minha casa, assim como a própria casa.

- Enfim chegaram! - Calum diz alto e vem sorrindo até nós. Ele segura dois copos de vidro com líquido cor de rosa dentro e nos entrega.

- O que é isso? - pergunto.

- Limonada rosa. Receita especial da casa - responde e vira o próprio copo; Tamara faz o mesmo.

Experimento um pouco e o gosto de alcoól se espalha em minha língua.

- Isso é puro alcoól. - digo e afasto o copo, Tamara o pega e vira também.

- Essa é a melhor coisa dessa bebida - Calum diz com uma piscadinha e se vira. Michael está fazendo o churrasco, Kendra está deitada no banco de bambu, com assentos de almofada, e acena pra gente.

- Cadê Ash e Luke? - pergunto me sentando em uma das cadeiras de balanço.

- Ashton foi tentar tirar Gwendolyn da biblioteca e Luke saiu pra passear com Aurea - Calum me responde.

- Gwendolyn vai xingá-lo muito.

- Nós sabemos - Tamara falou com um sorrisinho.

...

"Gwendolyn"

A biblioteca estava uma bagunça, com metade dos funcionários de férias e menos que isso de voluntários não havia gente o suficiente para recolher, anotar e entregar os livros. Eu estava que nem louca catalogando um novo carregamento e fazendo o triplo do meu serviço.

Graças a Deus o lugar não estava cheio hoje. Parei pra respirar e sentei em uma das mesas do segundo andar, onde estava vazio, peguei um dos livros novos que havia me chamado a atenção. Era pesado e a capa era toda elaborada com floreios e formas ao redor do título: "Seres mágicos".

Estranhei o fato de não haver o nome do autor ou a data de publicação.

Folheei algumas páginas e fiquei encantada com a qualidade das ilustrações. O livro era antigo e as páginas estavam amareladas, mas a escrita era refinada e em letra cursiva.

Parei em uma página que mostrava o desenho de uma sereia de cima a baixo. A cauda era comprida e com duas barbatanas translúcidas no final; as escamas eram em tons de roxo variados, desde violeta a lilás e sua pele era bronzeada. Os seios fartos estavam a mostra, a cintura era fina e o quadril largo; as últimas e esparsas escamas se localizavam abaixo do umbigo.

Os cabelos dela eram maravilhosos, ondas escuras como ébano ao redor do rosto, que desciam até o quadril. E o rosto era de tirar o folêgo; olhos grandes e azuis, uma boca perfeita com lábios cheios, mas não exagerados, já o nariz era pequeno e se encaixava perfeitamente no rosto, maçãs do rosto altas e com um contorno natural.

A sereia exibia uma expressão presunçosa no rosto e parecia real demais, como se pudesse pular do papel. Ela estava sentada de lado sobre uma rocha enorme que fazia parte de uma cadeia de rochas no meio do oceano; atrás era possível ver carcaças de navios presos entre as pedras enormes e negras.

Apesar de serem deslumbrantes, sereias são assassinas. São como se existissem. Passo os olhos para a próxima págima e foco na escrita.

"De todos os seres que conheci até agora, as sereias foram os que mais me amedrontaram. Nem os lobisomens selvagens da Tribo Jerimo ou as bruxas do deserto me fizeram tremer como elas. São de longe, também, as criaturas mais belas, pelo menos até te levarem para debaixo d'agua quando mostram as presas e o verdadeiro rosto demoníaco"

Havia uma ilustração abaixo, era mais um esboço do que uma arte completa como a sereia anterior, de uma criatura humanóide esquisita; lembrava o rosto humano, mas era recoberto de escamas prateadas, os olhos eram fendas totalmente pretas e na boca havia dentes finos e afiados como os de uma piranha; barbatanas finas e transparentes brotavam das têmporas da criatura.

Com assombro percebi que aquilo também era uma sereia, mas na forma verdadeira.

"O canto das sereias hipnotiza homens levando-os a abandonar navios e pular na água para encontrar a estonteante mulher, apenas para ser arrastado para o fundo e ser devorado."

No rodapé da página havia perguntas rabiscadas, como se alguém as tivesse feito poucos segundos antes de sair. Eram anotações frenéticas e diferentes do modo clássico e organizado do livro.

"Sereias podem assumir forma humana total?" "Elas podem caminhar entre nós?" "Sua voz também pode curvar outros à sua vontade?"

Estremeci e virei a página. Quem rabiscou as palavras estava realmente preocupado.

A nova página indicava um novo capítulo, intitulado: Bruxas. Virei mais uma página e essa exibia a anatomia de uma garota normal. Normal vista de fora. A outra página conjunta era composta inteira por texto.

"Bruxas são seres difíceis de lidar, nem totalmente malignas como as sereias, mas nem totalmente boas como as fadas. Sua parte humana pode se sobressair à parte mágica, assim em vice-versa."

"O poder vem da hereditariedade, quanto mais poderosa a mãe, mais poderosa sua filha é. Se o pai for um bruxo a cria pode ser extremamente poderosa."

"Diferente das feiticeiras, as bruxas precisam de feitiços prontos (algumas conseguem faze-los mentalmente) como receitas que precisam ser ditas à sua magia."

"A maioria das bruxas não tem o poder tão forte, já que a linhagem se perdeu em algum ponto da história, por isso bruxas elementais são importantes e veneradas. Bruxas elementais são aquelas que podem mexer com o ar, a terra, o fogo e água, apenas com o poder da mente; como se fizessem parte deles ou estivessem ligadas diretamente."

"As feiticeiras geralmente são filhas de uma bruxa poderosa com um bruxo ainda mais poderoso. A criança nasce com tal poder que não pode ser contido. Feiticeiras são raras, pois a maioria das mães são mortas pelo Conselho para que uma coisa tão poderosa não venha ao mundo."

Suspiro de terror, como podem matar mulheres grávidas apenas porque suas filhas são poderosas?

Fico me repreendendo por estar sentida, já que o livro é um conto de fadas, uma obra de fantasia. Até parece que criaturas mágicas existem.

Há rabiscos nessas páginas também.

"A Escolhida irá sobreviver." "O Conselho mata todas as supostas feiticeiras para que Ela não chegue nem mesmo a nascer, mas é tudo em vão."

Quem diabos era esse maluco? E por que tudo isso? Apenas para deixar o livro mais misterioso?

Grito quando uma mão enorme se apoia em meu ombro, pulo da cadeira e encaro a pessoa.

- Oi - Ashton fala e tudo que eu quero é socá-lo.

- Que susto - digo colocando a mão no peito.

- Desculpe - diz dando de ombros e foca sua atenção no enorme livro aberto à mesa. - O que está lendo?

Pulo de onde estou até onde está ficando entre a mesa e ele.

- Nada - falo e abro o melhor sorriso sedutor que consigo. Lotus, Tamara e Cleo me obrigaram a aprendê-lo. - O que faz aqui?

- Vim te chamar pra um churrasco, suas amigas já estão lá em casa.

- Não posso ir, desculpe - falo e passo por ele descendo as escadas rapidamente.

- Gwen, por favor, me escuta. - diz e me segura pelo cotovelo. Como ele me alcançou tão rápido? Paramos no meio das escadas e estamos próximo demais.

- Você tem um minuto antes que eu volte ao serviço.

- Olha, Lotus disse que você faria isso, de rebater e virar as costas, mas eu queria mesmo que você viesse.

- Por quê?

- Por que eu não ia querer que você viesse? - pergunta e abro o sorrisinho sarcástico de sempre, pelo menos esse sorriso ganha do de Tamara ou de Lotus.

- Olhe pra mim - falo revirando os olhos e me solto dele terminando de descer as escadas. Antes que eu dê outro passo ele já está grudado em mim de novo e me irrito. - Vai embora, Ashton.

- Por favor, Gwen. Eu gostei de você de verdade. - fala o discurso que sempre escuto.

- Você gostou do meu rosto, não de mim de verdade. Ash, a gente nem conversou de verdade, você não me conhece.

- Gwen...- começa e ergo a mão.

- Eu não quero ir, sério. - digo e vou pra trás do balcão. Tiro o crachá e o coloco em cima de uns papéis, antes que possa impedir, Ashton pega o pedaço de plástico. Solto um gritinho e tento arrancar de sua mão puxando pela cordinha. - Devolva.

- Por quê? - diz com um sorrisinho. Encaro seus olhos e vejo como são bonitos, como ele é bonito.

Puxo o cartão mais uma vez, sem sucesso.

- Ashton - falo e ele sorri mais. - Devolva, por favor.

- Devolvo se você concordar em vir. - o sorriso dele é travesso e lindo. Ele tem covinhas e paro por um momento. Afasto esses pensamentos e puxo novamente.

- Não.

- Então não vou devolver - fala e com um puxão leve tira a corrente da minha mão. Fico espantada com a facilidade com a qual ele tirou da minha mão.

- Idiota. Me devolva - estamos pertos demais e ele segura o crachá acima de sua cabeça. Ele é alto demais para eu alcançar com os meus 1,60 de altura.

- Baixinha - fala e piso no pé dele irritada.

- Ai! - reclama.

- Devolva.

- Venha comigo. Está todo mundo te esperando. - diz e segura minha mão com a mão livre. A mão dele é enorme perto da minha.

- Ash...- suspiro e ele sorri vendo que ganhou. Entrega o crachá pra mim e suspiro mais uma vez.

- Por que não quer que eu veja?

- Porque tem a foto de registro e é de quando eu tinha 14 anos. - resmungo dando as costas a ele e indo pra trás do balcão. Sem olhar para Ash organizo os papéis e desligo o computador.

- Até que não era tão ruim - ele diz quando o encaro, sem entender olho pra sua mão e vejo o crachá.

- Como você peg...? - pergunto pondo a mão no bolso. Meu coração quase sai pela boca. Ele viu a porcaria da foto. Passo por ele e arranco o crachá de sua mão, pego minha mochila e enfio o pedaço de plástico, com a pior foto da minha vida, no fundo.

Saio da biblioteca sem olhar para trás, sem saber se Ash está me seguindo. Quando escuto seus passos parando atrás de mim me viro para ele com os braços cruzados.

- Por que você está toda brava?

- Porque eu não gosto daquela foto.

- Nem estava tão ruim. 

- Cale a boca.

- Gwen - diz e reviro os olhos.

- Vamos, já me tirou do serviço, agora vamos - digo e ele não faz nada. - Antes que eu desista e te deixe sozinho aqui, panaca.

- Aham - gagueja e vai na frente. O sigo até o carro com um sorriso no rosto por fazê-lo gaguejar.

...

- Vou matar vocês. - digo a Lotus e Tamara quando chego. As duas estão sentadas em um banco de bambu, preto com almofadas, rindo com uma garota morena que desconheço.

- Desculpe por te tirar do seu habitat natural, Gwen - Tamara fala sorrindo.

- Ela também me arrastou hoje, amiga - Lotus fala rindo.

- O que seria mais importante do que um churrasco na casa dos meninos e conosco? - arqueio a sobrancelha ao perguntar.

- Rodrick - Tamara responde torcendo o nariz.

- O que tem ele? - indago.

- Tem que Lotus ficou se agarrando com ele a noite toda na grama - me assusto quando Luke fala, atravessando a porta de vidro que liga a sala à área. Aurea vem saltitando atrás dele.

- Como sabe disso? - Lotus pergunta meio irritada. Aurea pula em seu colo e a lambe.

- Por que depois que você me dispensou por mensagem, eu como o amigo ótimo que sou fui fazer uma visita à você pra ver se estava bem mesmo. Vi você beijando ele e fui embora - responde dando de ombros e todas ficamos quietas, até a garota morena bonita soltar a gargalhada mais alta que eu já ouvi. A encaro meio irritada.

- Isso é ótimo! - ela grita quando recupera o fôlego. - Nem preciso mais atualizar minhas séries ou ler algum livro. A vida de vocês é ótima.

- Kendra - Calum diz vindo atrás de Luke e a morena revira os olhos.

- O que foi?

- Menos - agora Michael está aqui também.

- Idiotas - diz.

Ashton senta ao meu lado e não olho pra ele, ainda estou irritada por ter visto a minha foto.

Luke senta em uma das cadeiras de balanço ao lado de Kendra e não dirige mais o olhar a Lotus, que ao contrário, o encara como se quisesse matá-lo.

- O que, exatamente, você fez para ela Ashton? - Tamara corta o silêncio e Ash congela.

- Hein?

- Gwendolyn. Ela não está te encarando. - diz com uma expressão meio mortal no rosto - O.que.você.fez.pra.ela?

Quando Tam fala pausadamente assim quer dizer que está muito curiosa e perigosa.

- Nada. - responde dando de ombros.

- Ah, eu aposto que ele foi na biblioteca, pegou o crachá dela, tentou chantagear Gwen com isso e conseguiu, mas mesmo assim ele resolveu ver a foto e ela está super brava com ele. - Lotus fala rindo.

Ashton e eu congelamos.

- Como sabe disso? - perguntamos juntos e o lanço um olhar raivoso.

- Conheço você, Gwendolyn. - responde e brinca com Aurea.

- Você é um idiota - Tamara cospe pra ele - Se ela disse que não queria que você visse a foto, não era pra você ver.

- Tam, não precisa disso.

- Precisa sim, se ele não sabe te respeitar nisso, no que ele vai te respeitar?

- Tamara - Lotus diz em aviso e ela revira os olhos.

Antes que eu abra a boca pra dizer que não foi nada, ouvimos vozes na sala e todos focam a atenção na porta de vidro. Quatro garotas bonitas atravessam a sala até nós e atrás delas vem um cachorro gigante.

Kendra fica de pé e dá as costas para as meninas indo até a churrasqueira junto com Mike.

- Oi pra você também, Kendra. - a morena que vinha frente solta e Kendra rosna em resposta, literamente, ela solta um rosnado e acho engraçado como ela reproduziu o som estritamente.

- Oi, Lotus - uma das meninas cumprimenta e Lottie dá um sorriso meio indeciso. A garota tem cabelos castanhos e um rosto angelical.

As outras duas ficam quietas e se sentam nos banquinhos de madeira. O enorme cachorro fica sentado e parado de frente para Lotus e ela o olha curiosa, já Aurea rosna pra ele.

Lotus fica abrindo e fechando a boca como um peixe, como se estivesse considerando em falar algo e desistisse logo depois. Até que ela toma coragem e diz uma única palavra.

- Rex? - o som sai incerto, mas o cachorro surta e pula em cima dela. Aurea gani e pula para o chão vindo pro meu lado. Tamara grita porque o cachorro é muito grande e está em cima dela também.

O cachorro, Rex pelo jeito, lambe e arfa para Lotus.

- Rex! - a garota de cabelos castanhos diz em tom de ordem e o cão sai de cima de Lotus, mas continua sentado em sua frente balançando o rabo.

- O que você fez? - a morena perguntou furiosa e por um momento achei que seus olhos mel, ainda mais claros que os meus, brilharam.

- Lorelai - a ruiva disse.

- Não me interrompa, Kayla.

- Eu não te interrompi, pelo que sei você já havia terminado de falar - chiou a ruiva.

- Cale a boca então. - sibilou a tal de Lorelai. - Responda, Lotus.

- E-eu não sei - Lottie gaguejou meio amedontrada. Uma raiva subiu pelas minhas veias pela garota estar fazendo Lotus se sentir assim. - Eu me lembro...

- Se lembra do quê? - Lorelai agora estava de pé na frente de Lotus e parecia  prestes a pular em seu pescoço, Aurea e Rex rosnaram e Lorelai rosnou de volta; os cachorros estranhamente sentaram e ficaram a encarando.

Olhei para Tamara e vi a mesma raiva refletida em seu rosto. Levantei e ela fez o mesmo, paramos entre Lorelai e Lotus.

- O que é isso? - a garota perguntou.

- Saia de perto dela - falamos como uma só.

- Vocês são o quê? Guarda-costas da pequena Lotus? - Lorelai debochou e fez um biquinho.

- Lorelai - Luke estava de pé atrás dela, junto com as outras garotas. Kayla exibia uma expressão de tédio como se estivesse acostumada com isso, a loira mordia o lábio nervosa e a garota-anjo parecia prester a fazer algo.

- Fique fora disso, Luke - ela disse e Lotus se levantou.

- Pare - Lotus disse firme e Lorelai sorriu, eu mesma queria correr ao ver o perigo naquele sorriso.

Calum, Mike e Ashton estavam de braços cruzados ao lado e não faziam menção de se intrometer.

- Eu não faço ideia de como ele me reconheceu. Sei que eu tive um sonho com um cachorro parecido com ele e quando o vi sabia quem era. Agora não entendi o porquê desse show todo, Lorelai - Lotus falou e a expressão de Lorelai mudou para algo impassível.

- Você realmente veio aqui apenas pra implicar com Lotus? - Kendra perguntou vindo para o meu lado. O fato dela não gostar de Lorelai me fez gostar mais dela.

- Não, eu vim porque Luke me chamou - ela falou e piscou provocativa para Lotus.

Kayla colocou a mão no ombro dela e a garota se desvencilhou indo para dentro da casa.

- Por que você chamou ela? - Kendra indagou para Luke.

- Porque eu posso e porque eu quis. - ele respondeu seco e seguiu a morena pra dentro da casa.

Lotus sentou no banco de novo e Aurea se aconchegou no colo dela, Rex deitou ao seu lado e colocou a cabeça no colo dela sem encostar em Aurea.

- Por que o cachorro da Madison gosta de Lotus? - Mike perguntou. A garota de cabelos castanhos sorriu e respondeu.

- Porque ele também é dela.

- Oi? - Lotus, eu, Tamara, Kayla, a garota loira e os meninos perguntamos juntos.

- Rex é dela também. Como ele se lembra após todos esses anos? Eu não faço ideia.

- Então o sonho não foi sonho? - Lotus pergunta e Madison sorri negando. - Mas e o cara de olhos roxos do sonho?

A garota pensa um pouco e responde.

- Ele é nosso pai. - ela diz e Lotus começa a rir. Todos ficamos em silêncio até ela parar para recuperar o fôlego e perceber que é sério.

- Isso é impossível. Meu pai é Paul Clines. - ela diz, mas seus olhos tem um medo estranho. Como se ela desconfiasse de algo. - Você mesma disse.

- Não, Lotus - Madison fala com carinho e sorri - Eu sou sua irmã, por parte de pai.

- Nós não somos nem parecidas - Lotus solta como se estivesse tentando se convencer para que aquilo não fosse verdade.

- Ah, nós somos. Pode acreditar - Madison diz com um sorriso irônico de canto que transforma seu rosto em algo malicoso e ela não parece mais um anjo. A garota fecha os olhos e suas feições se transformam de verdade. O cabelo fica comprido e ondulado batendo no meio das costas, o rosto vai de redondo e fofo para anguloso como o de Lotus e quando ela abre os olhos, todos prendem a respiração, eles são roxos.

- Ela poderia ser sua gêmea ou você daqui a alguns anos - Kendra diz curiosa ao meu lado.

- Como...? - Lotus parece perdida e eu não entendo mais nada.

- Isso é impossível. Como fez isso?Parece mágica. - gaguejo nervosa.

Olho para Tamara e ela dá de ombros como se soubesse de tudo.

- Não só parece mágica, Gwen. Isso é mágica. - Madison diz e abre a mão. Uma bola de fogo flutua sobre sua palma e me sinto tonta.

- Magia não existe - minha voz sai histérica e me dá vontade de chorar por esse traço meu de quando tinha quatorze anos ter voltado.

- Gwen, se acalme. Eu ia contar para você e Tam, mas achei cedo demais. - Lotus fala.

- Contar o quê? - solto e me encolho de dor, minha voz saiu mais aguda dessa vez. Os meninos parecem ter sentido também, Kayla recua junto com a loira cujo nome ainda não sei.

- Que eu sou uma bruxa - Lotus responde e faz a mesma coisa que Madison fez.

- Desculpa, eu achei que suas amigas sabiam - Madison diz pra ela com cara de culpada. Não consigo mais enxergar a pessoa fofa que ela aparentava ser antes. Ao ver meu olhar para ela, Ashton resolve abrir a boca.

- Nós também assustamos quando Maddie se transformou pela primeira vez - ele sorri, mas meu estômago está enjoado demais para me importar.

Me viro para Tamara que está relaxada.

- Como pode estar tão calma?

- Eu sou uma deles - responde dando de ombros.

- Oi?

- Sou uma deles - responde me encarando - Um ser sobrenatural.

- Impossível - a loira finalmente abre a boca, sua voz é doce e baixa - Você não tem cheiro.

- Achou mesmo que eu ia deixar meu cheiro livre por aí, sua pequena besta selvagem? - Tamara solta ácida e a garota mostra os dentes.

- O que você é? - Kayla fica na frente da loira.

- Sereia - Tamara responde e todos ali, mesmo inconscientemente, dão um passo para longe dela. Com um sorriso perverso ela estala os dedos.

- Sinto seu cheiro agora - Calum diz e seu nariz treme um pouquinho, acho engraçado ele farejando.

- Espera - digo e todos se voltam para mim - O que vocês, meninos, são?

- Lobisomens - Mike dá de ombros.

- Lotus - digo nervosa.

- Desculpe te arrastar pro meio de tudo isso. - ela diz sincera.

- Então eu sou a única humana aqui? - pergunto enjoada.

- É - Tamara responde. Mesmo todos se afastando dela como se fosse perigosa, e provavelmente é, ela ainda é minha amiga.

- O que eu perdi? - Lorelai volta e olha para o meu rosto, depois olha para Madison daquele jeito e seu rosto muda. - Me digam que não se revelaram para a humana.

- Bem...- a loira começa.

- Olive - Lorelai diz e ela fica quieta. A morena se vira bruscamente para o lado de Tamara e anda até ficar a um palmo de distância da ruiva. - Sereia, é?

Tamara responde com o sorriso de canto que faz com que as pessoas queiram socar seu rosto.

- Gente? - Luke aparece e vê o rosto de todos. - O que aconteceu?

- Lotus é irmã de Maddie, Gwendolyn é a única humana aqui e não sabia de nada.

- Como assim? - ele pergunta estranho e encara Tamara - Você é hum... - ele para como se sentisse algo. - Sereia.

- Sim, eu sou uma sereia. Agora parem de me olhar como se eu fosse devorar vocês. - ela diz fazendo um gesto com a mão.

- Lotus é a irmã perdida de Madison?

- Encontrada agora, eu acho - Lotus diz e ele a encara indo até ela.

 - Você está bem com tudo isso? - ele pergunta.

- Não - ela responde com os olhos marejados e ele pega a mão dela. Lorelai revira os olhos e percebo uma pontada de ciúmes vindo dela.

Kendra sorri encostada na parede junto com Calum. Ashton vem para o meu lado e sua presença de algum jeito é reconfortante. Mike assiste tudo ao lado de Kayla e os dois tem expressões gêmeas de tédio.

- Eu acho que Madison e Lotus têm que conversar - Tamara diz e se joga em uma das cadeiras de balanço.

- Eu também acho - Lotus diz e encara a suposta irmã.

- Ótimo - Madison fala e vai pra sala. Luke solta relutante a mão de Lotus e ela segue a outra garota.

Kendra senta em um dos bancos e Rex rosna pra ela, ela rosna de volta e ele gane. Gargalhando, a morena oferece um pedaço de hamburguer e o cachorro pula de bom grado ao seu lado. Aurea late como se quisesse atenção e a pego no colo. Sento na grama e Ash senta ao meu lado, encosto a cabeça em seu ombro.

- Eu não acredito que você está comendo com tudo isso acontecendo. A humana parece prestes a colocar as tripas para fora - Lorelai fala para Kendra e me lança um olhar de desprezo e nojo.

- Me olhe assim de novo e juro que vou colocar as suas tripas para fora - grunho, a garota sorri e invoca uma bola de fogo azul. - Outra bruxa. Achei que você fosse uma lobisomem.

- Eu sou também - ela fala e os olhos brilham amarelos.

- Isso é possível?

- Pra mim é - fala e apaga a bola de fogo. Fecho os olhos, cansada demais. Ainda estou envergonhada de ter descontrolado a voz.

- Quer que eu ponha comida pra você? - Ash sussurra depois de um tempo e assinto. Ele se levanta e quase digo para que fique pois me sentir sozinha ali no meio de todos os seres é assustador.

- Obrigada - digo quando ele volta. Percebo que todos estão comendo e nenhum sinal de Lotus ou Madison.

Como devagar e a comida está deliciosa.

- Não sei quem fez a comida, mas está muito boa - digo de boca cheia. Ash ri, Calum e Mike agradecem e Olive torce o nariz. Lorelai não tira os olhos da comida, e Tamara mexe no celular com tédio. Kayla está dormindo estirada na grama e acho graça.

- Quero ir pra casa, Ash - falo pra ele e ele me dá a mão me ajudando a levantar - Obrigada.

- Vamos - fala e me puxa para fora da casa.

...

"Lotus"

Ainda estou trêmula. Coloquei Gwendolyn no meio de tudo isso e Tamara é uma sereia.

Me sento no sofá de couro preto e Maddie senta ao meu lado.

- Me conte tudo, por favor. - digo pegando sua mão - Minha mãe apenas me enrolou.

- Ok, vamos lá - diz e respira fundo. - Nós duas somos muito, muito poderosas; porque nosso pai é muito poderoso, assim como nossas mães. Eu tinha apenas dois anos quando minha mãe morreu, papai ficou arrasado sem saber o que fazer. Eis que um dia sua mãe apareceu em Londres pra visitar sua avó.

- Minha avó Yrene?

- Ela mesma, aliás ela é uma super bruxa também. - diz e estou meio paralisada para falar. - Enfim, sua mãe foi até lá porque estava brigando muito com Paul. Lydia tinha 3 anos e meio e Logan tinha 1, acho.

"Nosso pai a encontrou num bar e eles tiveram esse caso de uma semana. Sua mãe voltou para a Austrália grávida e disse para Paul que não ia se separar dele, pois os dois teriam outro bebê. Yrene ficou furiosa e proibiu sua mãe de te ter. Papai secretamente ajudou Louisa a tê-la e queria te levar embora, mas sua mãe ficou com dó de fazer isso com Paul e pediu pra que deixasse você com eles."

"O problema é que seu poder é muito grande e assim que fez cinco anos sua magia começou a se manifestar. Sua mãe tentou impedir, mas nada funcionou. No seu aniversário de seis anos, ela chamou papai e eu, viemos te ver e você era tão linda com os pequenos olhos roxos. Paul ao ver papai soube na hora que você era filha dele e ameaçou largar sua mãe, ela o convenceu a ficar, mas ele nunca mais foi próximo de você."

- Disso eu me lembro - a interrompo - Papai sendo distante comigo depois da festa de seis anos até que em uma época tudo voltou a normal.

- Foi quando sua mãe modificou a memória de sua família e bloqueou a sua magia temporariamente. - respondeu torcendo o lábio e me reconheci naquele gesto.

- Nosso pai concordou com isso?

- Você tinha machucado sua irmã humana, Lottie - ela disse e colocou a mão em minha perna.

- Se eu sou poderosa assim, não é perigoso ficar com minha magia? Não seria melhor bloquea-la?

- Lotus, você é maravilhosa. Talvez uma das bruxas mais fortes que já existiu, não há nada de errado se for treinada corretamente. E tanto poder assim é impossível de bloquear.

- E as minhas memórias?

- Apenas a bruxa que fez o feitiço pode devolvê-las.

- Minha mãe?

- Acho que não - diz pensativa - Ela deve ter pedido para outra pessoa fazer para que não se sentisse tentada a devolvê-las a você.

- Minha avó sabe onde estou?

- Não. Eu não sabia onde você estava, fiquei sabendo quando descobri o endereço de sua mãe. Ela colocou feitiços para que você não fosse localizada.

- Papai sabe que estou bem?

- Sabe, mas ele prometeu não vir atrás de você.

- Por que?

- Sua avó desconfiaria se em uma data específica ele ficasse vindo pra cá.

- Meu aniversário.

- Sim, viemos em todos até o de dez anos. Rex também. - ela falou sorrindo e me assustei, pois vi amor se verdade em seus olhos.

- Você e papai sentem minha falta? - pergunto com a voz trêmula. Me referir à um desconhecido como "papai" é menos estranho do que eu imaginei, pois parece o certo a fazer como se o eco de uma lembrança confirmasse.

- Mais do que você imagina. Mais até do que eu imaginei, Lottie. - ela fala e me abraça. As lágrimas que eu estava contendo vêm a tona e começo a soluçar.

- Eu posso conhecê-lo? - pergunto depois que ela me solta e a encaro entre as lágrimas.

- Só sua mãe pode autorizar isso - ela fala nervosa.

- Acho melhor voltarmos. - falo me levantando.

- E Lottie, você sempre foi minha irmã, não importa o quão longe estávamos uma da outra. - ela diz e sorri, eu sorrio junto.

...

Tamara adormeceu no sofá da sala. Lorelai e as meninas foram embora há algumas horas. Ashton voltou meio estranho e se trancou no quarto. Mike e Cal estão jogando video game na sala e se o barulho dos tiros está me perturbando aqui fora, me pergunto como a ruiva consegue dormir ao lado. Kendra está estirada no tapete ao lado dos meninos brincando com Aurea.

Ficamos a tarde inteira conversando e inventando jogos.

Estou olhando as estrelas agora, sozinha, sentada na grama.

- Oi - alguém diz e se senta ao meu lado. Sei que é Luke, o cheiro de perfume é inconfundível.

- Oi. - não o encaro.

- Eu não ia chamar Lorelai, sério - sua voz vem em tom de desculpas.

- Você não precisa pedir desculpas pra mim, Hemmings - digo suave e é verdade.

- Preciso sim, Lotus. Eu fiquei com ciúmes por você e Rodrick e sei que não tenho direito nenhum de fazer isso.

- Não tem mesmo - digo e viro o rosto para ele, sorrindo - Mas você ainda é meu amigo.

- Ótimo - ele fala sorrindo e encosto minha cabeça em seu ombro.

- Por que todos assustaram com Tamara?

- Sereias são temidas - ele sussurra como se ela pudesse escutá-lo - Ninguém consegue saber suas reais intenções até que seja tarde demais.

- Sereias são más?

- A maioria - ele responde e suspiro.

- Tam é boa.

- Talvez, Lotus.

- É culpa minha Gwen estar no meio disso tudo.

- Não é. - ele diz. Ficamos em silêncio um tempo.

- Luke.

- Sim?

- Como você sente o cheiro dos outros?

- Oi?

- Como você identifica as pessoas? Tipo, eu tenho qual cheiro?

Ele sorri e olha as estrelas.

- Você tem cheiro de morangos silvestres e limão. É um cheiro ácido e particular que nunca senti. É um dos melhores.

- Humanos não sentem, certo?

- Certo.

- Qual o seu cheiro? - pergunto a Luke. Uma outra pergunta que está martelando em minha a cabeça a dias vêm a tona.

- Não sei - ele acha engraçado. Me levanto com o coração quase saindo pela boca. - Lotus, o que foi? O que está acontecendo?

- Kendra! - a grito e a morena abre um sorriso que me lembra o Gato Risonho do País das Maravilhas.

- Eu mesma - ela responde, Aurea corre até mim e se senta em minha frente.

- Me responda uma coisa que tenho certeza que você saberá.

- Sim?

- Qual o cheiro de Luke? - Mike e Cal abrem sorrisinhos, mas os ignoro.

- Terra molhada e hortelã - ela responde prontamente - Por que?

- Merda, merda. - sussurro e passo a mão no cabelo.

- Lotus? - Luke me chama e coloca a mão em meu braço.

- Thomas disse que não gostou de você porque você fedia a terra e hortelã.

- É impossível ele ter sentido, a menos...

- A menos que ele seja um lobisomem - completo a frase e o peso do mundo parece cair sobre meus ombros.

- Quem é Thomas? - Kendra está encostada no batente da porta e continuo me surpreendendo com o fato dela parecer sensual a qualquer hora do dia, mesmo estando de shorts de moletom e uma blusa de alças finas preta.

- Meu sobrinho. Cujo pai ninguém conhece.

- Puta merda - Luke fala e passa a mão nos cabelos.

- O que foi?

- O cheiro de Thomas. Aquele dia na sua casa, eu recuei quando ele falou comigo daquele jeito porque algo emanou dele. Um cheiro diferente.

- E?

- Eu sei quem é o pai dele. - ele responde e congelo.

- Me diga que o pai dele não tem olhos azuis.

- Como sabe disso?

- Meu sobrinho também disse que um lobo enorme e negro o observa da rua, o animal tinha olhos azuis na descrição dele. No aniversário de Thomas, ele jurou que o lobo uivou quando o viu.

- Sua irmã teve um caso com um lobisomem, ótimo - Kendra parece indiferente.

- Não é qualquer lobisomem, Kendra - Luke diz a ela e sua cara vira uma interrogação.

- Quem é o pai do garoto?

- Gavriel. - Luke responde e o semblante de Kendra muda para algo assustado.

- Por que você parece tão assustada?

- Gavriel é o mesmo lobisomem que tentou me matar algum tempo atrás - ela diz amargurada e levanta a blusa que veste. Há uma cicatriz irregular e enorme de suas costelas até perto do umbigo. - Ele quase arrancou minhas tripas, com a garra.

- Ele é o alfa dos Jerimo, Lotus. E não é nada bom ele estar aqui em Sydney, precisamente rondando Surry Hills.

- O que são os Jerimo?

- A alcatéia mais mortal e violenta de todas, conhecida como a Tribo Jerimo. Eles caçam filhos de humanos com lobos, é como se seguissem o próprio código extremista deles. - Kendra responde e há uma sombra em seus olhos.

- Por isso Lorelai te chamou de mestiça?

- Esse é um termo ofensivo, bruxinha - ela diz entredentes e os olhos brilham.

- Desculpe - balbucio e percebo que me aproximei de Luke.

- Enfim, seu sobrinho é um pequeno lobisomem, filho de uma humana com um lobo. Gavriel é o maior defensor de matar crias misturadas, não sei se defenderia o próprio filho, acho melhor ficar de olho em Thomas - Kendra diz e há preocupação em seus olhos.

- Irei, pode deixar - assinto e ela volta pra dentro da casa. Sinto a mão quente de Luke envolvendo a minha.

- Quer ir pra casa? - ele pergunta e o encaro.

- Sim - respondo baixinho e ele me puxa para dentro da casa. Cal e Mike nos olham de canto e abrem um sorrisinho. Resolvo brincar com magia um pouco e invoco uma pequena rajada de vento que levanta uma almofada do chão e vai parar na cabeça de Tamara. Kendra sumiu de vista.

- Mas que merda? - ela acorda alerta.

- Estou indo embora - falo e ela aperta os olhos.

- Vou ficar por aqui, estou cansada demais pra dirigir - fala dando de ombros.

- Venho aqui amanhã cedo te ver então. - digo, ela boceja e deita de novo.

Lanço um olhar pra Calum e Michael.

- O que foi?

- Façam algo com ela e eu mato vocês sufocados - digo e Mike revira os olhos.

- Diga isso pra Tam, a sereia é ela - Calum fala com um sorrisinho maldoso.

Tamara grunhe do sofá e ele fica pálido. Solto uma risadinha e vou até Luke que já pegou as chaves do carro e me espera perto da porta. Aurea me segue de perto e a pego no colo.

- Vamos? - pergunta e assinto.

Quando entro no carro e encosto no vidro, adormeço com a pequena bola de pelo enrolada no meu colo.

...

- Chegamos, Lotus - Luke me acorda gentilmente.

- Obrigada - digo meio grogue e desço do carro com Aurea no colo. Meu celular está no meu bolso e quase cai. Entro em casa e está tudo escuro, quase acendo uma chama e lembro que ninguém pode saber então não arrisco de Logan ou Lydia verem. Ou Thomas. Tranco a porta atrás de mim e escuto o carro de Luke indo embora. Coloco Aurea no chão e ela some no escuro escada a cima.

Suspiro e começo a subir as escadas devagar. Escuto um barulho no piso de madeira da sala, como se alguém houvesse pisado em um tábua solta, congelo no meio das escadas. Dou mais um passo vacilante após não escutar mais nada.

- Mãe? - arrisco e ninguém responde. Arrisco um olhar para baixo, mas está tudo escuro. Tudo é apenas sombra e borrão. Invoco uma chama na mão e vejo um brilho de olhos verdes felinos e pele pálida.

- Olá, pequena Lotus - Wesley dá um sorriso e estremeço ao ver suas presas expostas. - Parece que descobriu o que você é afinal.

- O que faz aqui? E onde está Rita? - com um gesto da outra mão, acendo o interruptor de luz com um pouco de vento e o vejo claramente agora.

Ele usa preto da cabeça aos pés. Apenas a pele do rosto está a mostra e os cabelos pretos como piche não destacam das roupas.

- Rita preferiu descansar em nossa casa. - diz sorrindo e tremo. Rezo para que Aurea fique no quarto e ninguém acorde.

- Achei que Luke havia prendido vocês.

- Nós fugimos - diz dando de ombros. Se o perigo não emanasse dele e eu quisesse gritar a cada vez que sorri, eu o acharia lindo.

- O que você quer? - minha voz sai trêmula quando ele dá um passo em minha direção. Há apenas alguns degraus nos separando.

- Você - responde e antes que eu reaja ele está atrás de mim com as presas, tão afiadas como adagas, em meu pescoço.

E depois disso só sinto dor, dor e mais dor, enquanto ele suga o liquído quente de minhas veias. Não consigo fazer nada e tudo fica escuro.





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