1. Spirit Fanfics >
  2. It's just a trick >
  3. Why be a liar?

História It's just a trick - Why be a liar?


Escrita por: Hawtrey

Notas do Autor


Obrigada a todos que comentaram <3 <3 <3 Aqui vai mais outro!

Capítulo 3 - Why be a liar?


Fanfic / Fanfiction It's just a trick - Why be a liar?

John abriu os olhos e respirou fundo, sentindo-se cansando antes mesmo de levantar da cama. Poderia ligar para o hospital e inventar uma história sobre qualquer doença que o impedia de sair de casa, mas duvidava que sua chefa aceitasse como um motivo para faltar. Médicos não ficavam doentes, não oficialmente.

Nem tinha ideia de que se pudesse prever o futuro ou possuísse a capacidade de seu amigo para deduzir, jamais teria saído de casa, sequer saído da cama.

Mas ele o fez e tudo parecia estar estranho aos seus olhos depois de abri-los naquela manhã. O 221 B estava calmo, muito calmo, porque Sherlock estava dormindo no sofá. Hesitou em se aproximar, lembrando-se do dia anterior em que fora o alvo de sua fúria, mas se forçou a acreditar que bastava não voltar a insistir no assunto e tudo ficaria bem. Cutucou-o levemente para ter certeza de que estava dormindo e ele permaneceu na mesma posição encolhida, em sono profundo depois das oito da manhã. Mesmo com a febre, que já deveria ter cessado, John não esperava por isso. Aquilo seria o bastante para um dia, porém havia mais. Ou menos, como menos bagunça sobre a mesa e menos nuvens no céu que via pela janela. Virou-se e voltou para a cozinha, faria o café-da-manhã, com sorte aconteceria mais um milagre e Sherlock se alimentaria. Abriu o armário e sua primeira visão o fez franzir o cenho. Um pequeno frasco, escuro e limpo, chamara sua atenção, totalmente desconhecido e sem rotulo. Esperava que não fosse algum veneno ou o veneno.

Ignorou-o por enquanto e preparou chá e algumas torradas, deixando em uma bandeja na mesa mais próxima do sofá. Então, muito a contra gosto, sacudiu levemente os ombros dele para acordá-lo.

O detetive resmungou rouco e abriu ligeiramente os olhos.

― John...

― Eu fiz seu café-da-manhã, por favor, coma. E não se esqueça de tomar seus remédios. Está me escutando?

Sherlock assentiu sonolento, os olhos semiabertos. Completamente bipolar...

― Por favor, não esqueça ― John insistiu passando a mão em seus cabelos em um ato automático, aproveitando para sentir, superficialmente, sua temperatura.

Levantou-se, deixou os remédios perto dele e saiu sem comer, já estava atrasado. Sherlock ficaria bem, sempre ficava, com certeza havia um anjo da guarda ou um deus particular só para garantir isso. Eram as únicas explicações que John conseguia encontrar.

Do lado de fora o Sol não brilhava, pelo menos não sem algum impedimento, como se não estivessem no final inverno e como se fosse permanecer daquela forma por longas horas, o que jamais aconteceria em Londres. A dificuldade de conseguir um táxi parecia proposital e exagerada, como todos poderiam estar ocupados? E como se não fosse o bastante, em todo aquele tempo irritante John podia jurar que estava sendo vigiado e dessa vez não parecia ser Mycroft.

O dia transcorrera normalmente, mesmo que atarefado e agitado por causa de um pequeno surto de gripe entre as crianças. Dra. Georgie estava com os olhos grudados nele sempre que possível, provavelmente relembrando as vezes em que ele abandonara um turno para ajudar Sherlock em algum caso. John sempre erguia a cabeça e forçava um sorriso respeitoso, temendo ser demitido a qualquer hora. No meio da tarde fora chamado para fazer uma cirurgia simples e não-emergencial, mas praticamente entrou em pânico e, ainda dentro de sua sala, percebera que não conseguia segurar os utensílios cirúrgicos com precisão. Seria seu fim. Então, muito educadamente, passou para outra pessoa e lamentou a situação pelo resto do dia. Estava se tornando inútil.

Entrementes a sua correria, John tentou ignorar as desconfianças que surgiram no caminho até o hospital, mesmo que ainda se sentisse vigiado. Deveria estar paranoico, finalmente, depois de tanta convivência com Sherlock. Suspirou, fazendo sua primeira pausa no dia. Precisou de muito esforço para conter sua vontade de pegar seu celular, mandar uma mensagem ou ligar, questionando o bem estar do amigo. Era obvio que Sherlock não responderia, não se daria o trabalho. E o médico não deveria se preocupar tanto.

Esqueça John, repetiria para si mesmo pelo resto do dia.

Mesmo cansativo e movimentado, ainda seria seu dia mais calmo se, logo após sua pausa, não recebesse um paciente inesperado.

― Não olha nos olhos de seus pacientes?

Ergueu os olhos de suas anotações, completamente surpreso.

― Mycroft? O que aconteceu?

― Obviamente não sou um paciente ― ele respondeu displicente ― Mas esse é o meio mais fácil de falar com você, Doutor Watson.

― Apenas John ― o médico pediu ainda se recuperando ― Mesmo não sendo um paciente, por favor, sente-se.

Mycroft olhou ao redor com certa superioridade e enfim, cedeu, sentando-se.

― Por que esse é o único meio de falar comigo? Se bem me lembro, você gosta de usar carros para me sequestrar ― John comentou com um meio sorriso enquanto guardava sua papelada.

― Não quando não sou o único a vigiá-lo.

John parou o que estava fazendo e fitou Mycroft, questionando-se se era uma brincadeira ou mais um dos enigmas subliminares dos Holmes, porém o outro permaneceu sério e o médico conhecia aquele olhar suficientemente bem para saber que a situação possuía alguma gravidade.

― Estou sendo vigiado? Por quem?

― Ainda não sei e posso dizer que isso não é muito bom, para nós dois ― Mycroft respondeu.

― Pelo amor de Deus, você é o Governo Britânico em pessoa! ― John questionou exaltado ― Como pode não saber?

― Exatamente por isso eu disse que a situação não é boa... John.

O médico fechou os olhos por alguns segundos e tentou manter a calma. Claramente Mycroft estava odiando não saber de quem se tratava tanto quanto John estava odiando o fato de estar sendo vigiado, o que preocupava muito o mais baixo. Se pudesse escolher alguém para descobrir alguma coisa sobre qualquer um, escolheria o Holmes mais velho, especialmente pela sua mente extremamente esperta e, claro, por seu cargo no governo.

― Não se desespere ― Mycroft pediu com um leve tom irritado.

― Oh, desculpe estar desesperado depois de descobrir que estou sendo vigiado por um fantasma ― John rebateu sarcástico enquanto se levantava e guardava, de qualquer jeito rude, seus papeis no armário.

― Não é um fantasma.

― Você entendeu.

Então Mycroft suspirou, ajeitando seu terno caro com falsa naturalidade enquanto suas mãos apertavam com firmeza o cabo de sua inseparável sombrinha. John imediatamente o fitou, sabendo que havia mais.

O que a convivência com Sherlock está fazendo comigo?

― Conte de uma vez Mycroft.

― Contar o quê John?

John voltou a se sentar e franziu o cenho para o outro, quase o induzindo a contar de uma vez qualquer que fosse o real motivo de leva-lo até um consultório médico comum.

― Boatos chegaram até os meus ouvidos... relevantes e sólidos demais para serem descartados ― Mycroft começou em tom cansado ― Envolvendo Moriarty.

John arregalou os olhos e sentiu sua garganta secar, suas mãos involuntariamente se fecharam e sua mente o levou de volta para alguns anos antes, onde estava em uma piscina usando uma bomba como casaco e para logo em seguida, rever o exato momento em que Sherlock pulara do terraço de St. Bartholomew.

― Antes que pergunte ou saia correndo para procurá-lo com as próprias pernas ― Mycroft o interrompeu, ganhando um olhar nervoso ― Precisa ter conhecimento sobre algumas coisas e fazer algo por mim.

― Quer que eu fale com Sherlock? ― ele se adiantou, quase sempre era isso.

― Não, nada daqui pode chegar até meu irmão. Isso é de extrema importância.

Pensou ter escutado errado ou, novamente, se era algum tipo de brincadeira. O problema não estava em esconder tais fatos de Sherlock, o que já poderia ser extremamente difícil, mas em John – especificamente ele - esconder algo de Sherlock. Nunca conseguira antes, como poderia agora?

― Mycroft...

Tentou avisar que era impossível, que era praticamente um livro aberto para o detetive consultor, mas o olhar claro e sério o impediu. Não havia outra escolha e para enfatizar isso, Mycroft apoiou sua sombrinha na mesa e uniu as mãos sobre a mesma, inclinando-se e assumindo uma postura vista poucas vezes pelo médico e nunca direcionada a ele.

― Se for verdade, se isso estiver mesmo acontecendo e eu acho que está, temos grandes problemas John e pela primeira vez, e isso também é uma surpresa para mim, não envolve meu irmão ― revelou com um misto de seriedade e cansaço ― Se fosse Moriarty ou algum de seus homens vigiando você, eu saberia, e é realmente preocupante que não seja. Esse fantasma, como bem colocou, está um passo a minha frente. Sabe sua rotina, os locais que frequenta, sua conta bancaria e invadiu seu antigo apartamento apenas para escrever John Watson com sangue na parede da sala de estar.

― Co-como sabe... que se trata da mesma pessoa? ― John balbuciou atordoado.

― Rastro digital, é tudo o que o fantasma deixa para trás quando mexe nos sistemas de segurança. Intitulando a si mesmo como Augustus.

― Augustus?

― Isso não importa agora ― Mycroft recostou suas costas na cadeira ― O que importa é que temos que descobrir o que está acontecendo, sem a ajuda de Sherlock.

― Por que sem ele? ― John desconfiou ― Por que é tão importante ele não saber?

― Porque eu não sei mais até que ponto ele pode esconder algo de mim usando suas próprias... motivações.

John se empertigou, agora estavam tocando em um assunto delicado e internamente almejado. Talvez ali estivesse o motivo da raiva súbita de Sherlock em alguns... assuntos.

― Do que está falando?

Mycroft hesitou em responder e John estranhou isso, sua hesitação era rara.

― Irene Adler está viva. Quem você acha que a salvou?

John sabia que não deveria ficar com raiva ou magoado, não tinha nenhum direito, mas foi inevitável suas mãos tremerem quando surgiu a vontade de quebrar a mesa com suas próprias mãos. Era a confirmação de que precisava para aceitar suas próprias palavras ditas a Sherlock: o detetive realmente gostava de Adler. Não conseguia dar a certeza de um amor, era demais para suportar, mas havia uma evidente afeição e interação entre os dois, algo forte o suficiente para fazer o seu amigo ir além, ultrapassando suas sólidas e quase impenetráveis barreiras.

 E ele sentiu uma dor estranha, não só por essa conclusão, mas também pela mentira pacata de Sherlock.

― Controle seus ciúmes Doutor.

― Se fosse só isso estaria tudo bem Mycroft, porque eu sei onde não é o meu lugar! ― John exclamou a ponto de explodir ― Quero saber o motivo da mentira, apenas isso. Sherlock não tinha motivos para esconder! Não importa o que sinto, se ele me chamasse para ajudar a salvá-la, eu engoliria toda essa merda e ajudaria! Porque é o desejo dele, porque é importante para ele. Agora Adler está por aí, longe dos olhos do nosso Governo, podendo ou não estar ao lado de Moriarty que por acaso está vivo. O quanto isso é ruim?

― O suficiente para me convencer ensinar a você algumas Artes importantes.

John o fitou analítico. Sim, ele estava falando sério.

― Você não tem tempo e nem paciência para isso Mycroft.

― Mas terei ― o mais alto garantiu tirando um celular de dentro do bolso interno de seu terno, John não pôde ignorar a exata semelhança com o seu próprio aparelho ― Eu reuni toda a Inteligência Britânica para proteger esse celular, troque pelo seu e mantenha bem longe das mãos de Sherlock. Entrarei em contato.

― Mycroft... realmente não sei se vou ser útil nesse caso.

― Escute John, não vim aqui só pela sua lealdade estranha a mim e ao meu irmão, também vim pela capacidade que você tem em usar sua mente. Meu irmão o acha comum e idiota, não discordo, mas notei que você também aprende rápido e que adora surpreender. Surpreenda-nos John, porque você precisa disso para viver e eu preciso da sua ajuda.

O médico sorriu sem humor pela sinceridade daquelas palavras e principalmente pela última frase. Sherlock nunca se cansava de usar o perigo de suas aventuras contra ele, insistindo que era o que precisava para viver. A ação, o perigo e a adrenalina de cada caso o mantinham longe da muleta e sua mente em pleno movimento, mas Mycroft pedindo sua ajuda era uma bela novidade.

— Isso nos leva a Moriarty.

John o olhou com uma repentina luz de compreensão iluminando suas dúvidas, ou parte delas.

— Como ele pode estar vivo se atirou na própria cabeça na frente de Sherlock?

Mycroft fez sua típica careta de desgosto e respondeu:

— E se meu irmão, por algum motivo, mentiu?

Pela primeira vez em muito tempo John não precisou de uma explicação detalhada, entendia perfeitamente os motivos que levavam Mycroft a pensar daquela maneira e pior, concordava. Sherlock estava muito estranho, até mesmo para os próprios parâmetros, obviamente tentando esconder algo e lutando para fingir que tudo permanecia seguindo normalmente ao seu redor. Mesmo sem querer se sentiu bem por não ser o único a notar e ser afetado por isso, mas se o “Governo Britânico” estava a sua frente agora, John sabia que seus planos de se manter afastado não existiriam mais.

― Vejo que não preciso de argumentos para fazê-lo seguir minha linha de pensamento ― Mycroft comentou ― Pergunto-me se isso é bom ou ruim...

John maneou a cabeça, incerto sobre o que deveria fazer e deu de ombros:

― Sherlock anda bem estranho depois que... voltou, você sabe. Ontem ele foi um pouco mais violento que o normal quando eu insisti para que ele parasse de me esconder os fatos.

― Ele o machucou? ― Mycroft se inclinou, olhando-o descrente.

John hesitou, recordando-se do aperto de Sherlock em seu ombro, parecia mesmo ser proposital. Entretanto, preferiu não complicar mais nada no momento.

― Não de verdade, só fiquei surpreso, digo, não é do feitio dele descontar fisicamente em outras pessoas nem em seus piores dias.

Mycroft franziu o cenho e passou o dedo pelo queixo, deixando-se pensar no que ouvira. O médico entendia aquela confusão estampada em seu rosto, mas ainda tinha um fio de esperança que esta durasse pouco. Só Mycroft entendia o irmão tão a fundo, não que fosse lhe contar depois, mas tudo bem.

― Vou continuar tentando arrancar algo do meu irmão, mas ainda posso contar com você, Doutor Watson? ― Mycroft insistiu se levantando.

― Claro, Senhor Holmes ― o médico rebateu ganhando um olhar curioso.

― Se ele voltar a se violento, de qualquer forma, notifique-me imediatamente.

John concordou e em silêncio o viu sair do consultório, agarrando a sombrinha com força e os ombros tensos.

Suspirou e cobriu seu rosto com as mãos, sem conseguir entender porque todos sempre queriam afetar Sherlock. Porque era obvio que vigiá-lo, mesmo que o Holmes mais velho negasse, era simplesmente um caminho para afetar o único detetive consultor do mundo. Não tinha certeza se aquilo envolvia algum ponto fraco do amigo, mas sabia que o mesmo odiava aquela situação com todas as suas forças.

E ainda havia o próprio Sherlock para complicar tudo. Qual era o motivo das mentiras? Por que infernos ele deixaria Moriarty vivo e diria o contrário? John entendia que salvar Irene deveria ser primordial na mente lógica de Sherlock, envolvendo sentimentos ou não, ainda havia o fato gritante da Mulher ser quase tão esperta quanto ele e sua admiração por ela ser notável, mas por que Moriarty? Por que manter vivo aquele que foi um grande problema por meses e quase destruiu completamente sua reputação?

Sherlock, só há uma explicação: você finalmente está completa e absurdamente louco!

Horas mais tarde, complementando o dia estressante e faltando apenas alguns minutos para o fim do seu turno, recebeu uma mensagem de Sherlock.

“Venha até o parque o mais rápido possível. Temos um caso.

SH”

John imediatamente respondeu:

“Sherlock não saia, ainda está doente.

JW”

Sherlock não respondeu. John entendeu o recado, arrumou rapidamente suas coisas e se jogou no primeiro táxi que apareceu. A noite estava fria e Sherlock abusava da sorte novamente. Mesmo que fosse um caso importante – claro que era um! – John teria uma conversa séria com Lestrade... de novo.

Cerca de trinta minutos depois saltou do carro e se aproximou da pequena movimentação de policiais no meio da praça. Com certeza era o local que procurava. Aproximou-se de Sherlock, que estava rodeando um corpo, mas quando chegou perto o suficiente para ser ouvido falou com quem o observava.

― O que nós conversamos Greg?

Sherlock o fitou, notando sua presença, mas a atenção de John ainda estava no Inspetor que lhe lançava um sorriso sem graça.

― Desculpa John, mas...

John o calou com um último olhar raivoso e se aproximou de Sherlock que ainda o encarava com curiosidade.

― Sherlock, eu disse para não sair. Devia estar descansando!

― Eu já estava na viatura quando recebi sua mensagem e tomei todos os remédios. Estou muito melhor ― Sherlock se explicou convincente.

E quando ele não é convincente?

― Ótimo, mas isso não anula os riscos ― John rebateu retirando sua luva e colocando a mão na testa dele, em seguida segurando seu pulso, sentindo sua temperatura e os batimentos cardíacos acelerados ― Você ainda está com febre, precisa descansar.

Batimentos acelerados? É apenas o caso novo e a febre John, não se iluda.

― John...

― E onde está o seu cachecol?

Sherlock olhou para si mesmo, parecendo nem ter notado a falta da peça, então antes de qualquer outra explicação direta e convincente, John retirou o seu próprio cachecol e envolveu o pescoço do mais alto.

― Por que fez isso? ― Sherlock perguntou com o cenho franzido.

John não se deu o luxo de olhá-lo nos olhos, não perderia essa briga para os sentimentos que deveriam ser inexistentes.

― Apenas não tire até chegar em casa ― decretou com firmeza antes de se afastar  e assumir seu posto como mero assistente/espectador de suas deduções.

Mas Sherlock continuou o fitando.

― O que? ― questionou tentando soar perdido. Não gostava de estar na mira daqueles olhos tão observadores e... intensos.

― Cuidando do namoradinho Watson? ― Anderson debochou enquanto passava por perto da cena do crime.

― Por quê? Está com ciúmes? ― John rebateu acidamente.

Por acaso não havia uma placa pendurada em seu pescoço alertando sobre o seu mau-humor?

Anderson parou surpreso e voltou alguns passos para responder:

― Parece que o cãozinho está animado hoje, Doutor Watson... mas por que eu teria ciúmes de você? Pelo menos eu tenho pessoas que se importam comigo. De verdade.

― Claro, mas se está falando sobre certas pessoas que preferem armários a quartos, eu prefiro continuar sendo o cãozinho solitário mesmo ― John enfiou as mãos dentro dos bolsos do casaco e esboçou um sorriso mínimo.

― Ótimo, porque vai morrer sendo o cãozinho da aberração de fato ― Anderson devolveu energético.

― Ótimo, vai continuar falando o obvio ou está pronto pra me deixar em paz?

Três pares de olhos o fitaram com perplexidade, mas John se manteve impassível. Em qualquer outro momento coraria pela repentina atenção, mas aquele dia em especial estava sendo difícil. O peso dos acontecimentos dos dias anteriores o acompanhara durante todo o dia, as duvidas sempre maquinando em sua cabeça comum e o impedindo de se concentrar em qualquer outro assunto, e como se bastasse isso ainda havia a visita de Mycroft, trazendo-lhe noticias nada boas e planos implicitamente impossíveis.

― John...

Ele fechou os olhos, respirou fundo e lutou para esconder em um canto trancado da sua mente tudo o que ouvira de Mycroft naquele dia, antes de finalmente conseguir olhar para Sherlock que mantinha um olhar brilhante e caído. Conhecia bem aquele olhar.

― Vai me pedir desculpa? ― desacreditou sarcástico.

― Por ontem a noite ― Sherlock concordou aliviado passando por cima do corpo e se aproximando ― Eu sei que só estava querendo ajudar e eu... reagi mal... eu queria...

Sherlock era incapaz de pedir desculpa com facilidade e algumas vezes, como aquela, sequer conseguia pronunciar a palavra. John não sabia se ria ou se o socava, porque sabia que o amigo esqueceria aquele pedido constrangido se a cena do dia anterior voltasse a se repetir.

― Vá a merda Sherlock ― cortou-o antes de ser afastar.

Não tinha certeza se era o certo a se fazer, mas quase se convenceu do contrário quando Sherlock permaneceu no mesmo lugar por mais tempo que o normal. Confuso e sem se sentir culpado, voltou a se aproximar e o olhou atento, porque  não dividia o apartamento com um ser humano comum e sim com um detetive consultor que era capaz de transformar seu próprio corpo em experiência apenas em nome da ciência.

Algo estava errado.

― Sherlock, o que foi?

― O assassino ― ele sussurrou antes de sair correndo na direção em que olhava.

Pego de surpresa, John precisou de um ou dois segundos antes de compreender o que estava acontecendo, sacar sua arma e correr atrás do amigo. Não teve tempo de reparar se Lestrade havia notado a situação e nem de garantir isso, mas esperava que a súbita movimentação fosse o suficiente.

Desesperado pelo medo de ser lento demais e permitir que Sherlock fizesse alguma besteira, ordenou que seus pés se apressassem sem reclamação e continuou atrás do Detetive sem conseguir enxergar com clareza o seu alvo encapuzado, no momento só queria garantir que o outro não estivesse sozinho quando conseguisse agir como um idiota irresponsável. E foi com terror que notou o seu amigo idiota correr até a rua movimentada sem se importar com as consequências. John precisava ser mais rápido. Buscou forças em cada célula e obrigou suas pernas a continuarem, ainda não podia ceder ao cansaço.

― Sherlock!

O medo só aumentou quando Sherlock chegou à rua sem notar o movimento dos carros – ou simplesmente o ignorando por vontade própria, então as buzinas soaram estridentes nos ouvidos do médico, dando-lhe o impulso necessário para invadir a rua, lançando seu corpo para empurrar Sherlock e o tirar do caminho.

Não teve tempo de realmente notar se conseguira o que queria, seus olhos ficaram momentaneamente cegos pela luz conjunta dos faróis e em seguida sentiu a dor, um dos carros com certeza o acertara, empurrando-o para frente, seu corpo batendo violentamente no chão segundos depois.

Foi confuso e doloroso, era tudo o que sabia.

Uma voz gritou seu nome, um grito grave e assustado. Era Sherlock? Nunca ouvira aquele tom, mesmo assim quis responder, mas sua boca não se movia e seus olhos embaçados só conseguiam focar no sangue em suas mãos trépidas. De onde vinha tanto sangue? Outras mãos, limpas e frias, agarraram seu rosto com desespero tênue e novamente a voz estranha de Sherlock o chamou.

― John! John... por que fez isso? Por que?

John...

De novo o médico tentou responder, mas a escuridão o dominou e o deixou sem escolhas.

Definitivamente deveria ter requisitado seu segundo dia de folga e nunca ter saído da cama.



Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...