"Eu sou uma voz perdida no meio da multidão
Você pode ouvir os sons silenciosos
Enquanto eu estou gritando o mais alto que posso agora
Eu nunca fui ouvido
Ainda pendurado em cada palavra
Tem sido assim por muito tempo
[...]
Eu estive tão longe de casa
Eu fiz isso por conta própria
Perdi a esperança em tudo
Já estive fora de controle
Agora eu tenho aguentar isto
A última coisa na minha lista
Para nunca mais voltar
Uma vida da qual nunca sentirei falta
Há alguém lá fora?
Você pode me ouvir gritando?
Existe uma razão para eu estar aqui?
Porque eu nunca me senti tão perdido
Como se eu nunca tivesse tido nada
Me dê uma razão para eu estar aqui"
(Scream - Breakaway)
Atualmente
— Chanyeol! – Baekhyun correu até o tenente assim que ele abriu a porta de casa. O loiro carregava um livro nas mãos e usava um óculos que tinha uma armação grande demais para o seu rosto fino e olhos pequenos, além do enorme e velho moletom que cobria todo o seu tronco, o deixando com uma aparência fofa e desajeitada. Primeiro Chanyeol achou que algo estava errado, mas mudou de ideia assim que viu o grande sorriso que ele carregava no rosto. – Chanyeol, olha, eu consegui terminar tudo!
Ele folheou algumas páginas do livro, que estavam grifadas com a caneta. Como Chanyeol estava ensinando o mais novo a ler, ele deu um livro de poesias e versos para ele tentar começar por algum lugar – tinha uma linguagem rebuscada, mas foi tudo o que conseguiu achar, quase não existiam mais livros físicos. Desde então, o loiro ficou agarrado no livro, tentando ler novas páginas todos os dias e procurando o moreno para perguntar sobre todas as palavras que desconhecia. Baekhyun tinha déficit de atenção, então frequentemente ele tinha que marcar com a caneta para que não se perdesse na leitura, pois se distraía e esquecia muito facilmente onde havia parado.
— Não brinca! – Chanyeol exclamou, fechando a porta atrás deles. Ele pegou o namorado no colo, o girando no ar e ouvindo a sua risadinha gostosa. O carregou até o sofá, logo se sentando ao seu lado. Ele estava completamente cansado, só queria tirar a sua farda e tomar um banho quente, mas era impossível não ficar animado quando via Baekhyun no fim do dia. A alegria dele era contagiante e o seu sorriso era capaz de levantar qualquer pessoa. – Leia alguma coisa para mim, então.
— Ah, agora? Não quer tomar um banho primeiro?
Chanyeol sabia que ele estava enrolando, sempre fazia isso quando tinha que ler em voz alta pois tinha vergonha, e era muito fofo. Ele abaixou a cabeça, todo tímido, ajeitando os óculos (que, segundo Baekhyun, o ajudava a mantê-lo mais concentrado, embora o mais alto não confiasse muito nisso) com o seu dedo indicador. Ele realmente estava lindo daquele jeito, tão caseiro e simplório.
— Você é uma graça – o mais velho falou, bagunçando os seus cabelos. Baekhyun sorriu e retornou a página que tinha falado antes, mordendo os lábios. – Pode ler. Sabe que eu não vou rir.
Ele começou a recitar alguns versos e, de repente, Chanyeol não prestou atenção em mais nada. Óbvio que não fazia por mal, estava muito interessado em saber o que o seu pequeno tinha aprendido e teria que corrigir caso ele tivesse errado alguma coisa, porém, na visão do moreno, Baekhyun era mais poesia que qualquer uma das coisas escritas no livro. Parecia que o garoto tinha saído direto das páginas de um romance clássico. Ou da Bíblia, quem sabe?
— "A eternidade estava em nossos lábios e em nossos olhos" – murmurou por último, encarando Chanyeol como se esperasse por sua aprovação. Ele já estava lendo muito melhor que da última vez, o loiro realmente estava procurando evoluir. – Fui bem? Errei alguma coisa? Eu sei que da última vez você disse que eu precisava respeitar as...as vírgulas, então estou lendo com algumas pausas. Você gostou?
— Você está muito melhor. Estou orgulhoso.
Baekhyun sorriu novamente, como se estivesse ganhando um prêmio, logo fechando o livro e deixando um breve selinho nos lábios do namorado.
— Aí, você fez alguma coisa para comer?
— Então, era até sobre isso que eu ia falar... – ele coçou a nuca, constrangido. Ele começou a falar rápido demais o resto da frase, quase sem se fazer entender. – Eu tentei fazer uma das receitas que o Suho ensinou, mas eu pedi ajuda ao Sehun e ao Chen. Nós três fomos lá para cima quando terminamos de preparar, e você sabe como eu me distraio fácil com eles. Eu esqueci completamente que o peixe não deveria passar de meia hora no forno, então meio que queimou quase tudo, mas ainda dá para comer o meio dele, eu acho. E, se você quiser, eu até tento fazer alguma outra coisa...Bom, se você não tiver amor a sua vida, claro.
Chanyeol colocou a mão na própria testa, rindo da situação.
— Lembra quando você veio morar aqui e me disse aquelas palavrinhas? Acho que tinha alguma coisa a ver com "eu vou limpar a casa e cozinhar para você"...Ai, nunca fui tão iludido.
— Não é culpa minha se o seu fogão é quase uma máquina do tempo, eu nunca nem tinha visto uma coisa tão moderna. E você sabe que eu só disse aquilo para ser legal.
— Ah, é? Retire o que disse.
— Me obrigue.
Chanyeol começou a fazer cócegas no menor, o fazendo rir e se contorcer no sofá para fugir das mãos dele. Ele simplesmente não conseguia parar de rir e se tornou pior ainda quando o moreno ficou por cima dele no sofá, prendendo o seu corpo debaixo de si.
— Chanyeol, para! – ele pediu, quase sem fôlego. Seus olhinhos já tinham lágrimas e ele estava todo vermelho. – Eu retiro o que eu disse! Para!
Depois que eles pararam de brincar, Chanyeol encarou o lindo rosto de seu garoto. Baekhyun fez o mesmo, dedilhando o seu pescoço até finalmente o puxar para um beijo. Não havia malícia naquilo, afinal eles nunca fizeram nada que fosse além disso, a pedido do próprio Baekhyun. Ele sentia que não estava preparado depois de tudo que aconteceu e realmente achou que levaria muito tempo para convencer Chanyeol disso, mas se enganou, pois o maior apenas segurou a sua mão e disse que esperaria o tempo que fosse até que ele se sentisse confortável. Toda vez que se beijavam e sentiam que estavam indo longe demais, Chanyeol se obrigava a parar antes mesmo que ele pedisse, logo se afastando e indo tomar um banho frio para se "acalmar".
— Você me deixa muito confuso, sabia? – Chanyeol desabafou e Baekhyun franziu a testa, sem entender aquela frase repentina. –Com os meninos...Eu não sei, você é todo sem vergonha e até flerta com o Sehun as vezes, só que eu lembro do dia em que fomos até o lugar onde o Jimin estava preso e você foi completamente frio, até mesmo misterioso algumas vezes. Mas, quando está comigo, você mais parece uma criança, fica todo sorridente por qualquer coisa e envergonhado quando eu te faço um elogio, ou algo do tipo. Devo ficar feliz ou apenas me preocupar porque você não está querendo me mostrar alguma coisa e finge que está tudo bem?
— Faço isso porque gosto de você. Muito – Baekhyun confessou, encolhendo os ombros. Ele não aguentou o olhar que Chanyeol o direcionou e mordeu o lábio inferior, envergonhado pela sua confissão. – O suficiente para te mostrar quem eu sou de verdade...Sei lá, eu meio que tenho medo de ser eu mesmo na frente dos outros, porque todos que passaram pela minha vida já me machucaram de alguma forma e eu vivo fazendo o mesmo...M-Mas você me mostrou como é se deixar entregue nas mãos de alguém, sem ser necessariamente uma coisa ruim e abusiva, por isso é tão natural para mim agir desse jeito contigo. Eu me sinto bem quando estou com você, Chanyeol, não sei se outra pessoa poderia me dar tanta paz e tranquilidade para ser o que eu sou.
Chanyeol sorriu, deixando um beijo em sua bochecha e agradecendo a todos os deuses por ter parado o carro naquele dia chuvoso, quando encontrou Baekhyun ferido na floresta. Naquele dia, nada deu certo para ambos, os dois estavam passando por uma coisa muito ruim, e foi ali, praticamente unidos pela frieza da vida e a perda completa de esperança, que se viram tão semelhantes.
Na verdade, Baekhyun nunca gostou da ideia de ter alguém que pudesse o proteger, que precisasse cuidar dele, mas o soldado conseguiu mudar isso completamente em menos de um mês e meio. E, além disso, os dois cuidavam um do outro, não era dever de uma pessoa só. Como Chanyeol fez quando Baekhyun chegou lá, o mais baixo cuidava de seus ferimentos quando ele precisava e preparava seu banho quando ele chegava muito cansado do trabalho. Para agradecer por isso, nos finais de semana de folga, o soldado o colocava em seu carro novamente e o levava para a floresta. Eles subiam uma das montanhas mais altas e olhavam os povos de cima, se sentindo reis de lugar nenhum. O tenente odiava completamente qualquer tipo de caminhada ou trilha, mas ia só para que pudesse ver Baekhyun sorrindo todo bobo, esticando os braços para que pegasse a brisa, se sentindo livre como deveria ser.
Na primeira semana, eles sofreram um pequeno "acidente". Como todas as casas do Reino sofriam uma revista por um superior toda semana, Baekhyun tinha que se esconder no sótão escondido quando a casa de Chanyeol era verificada. O problema era que o supervisor odiava o maior e queria muito achar alguma coisa que pudesse tirá-lo dali. Em uma noite, eles decidiram que precisavam se livrar dele antes que fosse tarde demais, então Baekhyun entrou secretamente em sua casa no meio da madrugada e colocou na sua sala um rádio e algumas coisas que ligavam aos Rebeldes – que, na verdade, eram de Chanyeol. De manhã, antes que ele acordasse, Chanyeol foi até o rei e avisou sobre tudo. O supervisor foi enforcado poucas horas depois e substituído por um amigo deles, Chen, que também era um rebelde.
Faziam um belo casal, apesar de tudo.
— Vamos sair para comer, então. Você quer? – Chanyeol falou com cuidado para não causar muita empolgação nele, ainda em cima de seu corpinho. Ele sabia que Baekhyun tinha um espírito muito aventureiro e, apesar de amar aquela casa, era notável que ele se sentia preso ali dentro. De certa forma, era mesmo um prisioneiro. O mais baixo levantou a cabeça, já sorrindo. – Mas tem que usar as lentes.
— Ah, isso é injusto. Você sabe que elas incomodam os meus olhos – Baekhyun suspirou, derrotado. Eles já haviam pintado o seu cabelo, que agora estava completamente loiro, e Chanyeol tinha arrumado lentes da cor cinza para que tentasse se desviar da perseguição dos guardas. Além disso, sempre que eles iam para a floresta, ele usava uma máscara, como aquelas que as pessoas usam quando estão em época de epidemia, que só deixava os seus olhos à mostra. E, quando não podia usar isso, eles faziam uma maquiagem leve que deixava o seu rosto mais fino. Lisa havia lhe ensinado isso há um tempo.
Chanyeol se esticou para pegar uma coisa na sua bolsa. Ele tirou de lá um cartaz com o retrato falado de Baekhyun e o mostrou. Não era exatamente uma cópia perfeita dele, longe disso, mas quem prestasse muita atenção talvez pudesse reconhecer o seu rosto. Embaixo, estavam as informações de como ele se vestia, a cor de seus olhos e de seus cabelos, descreveram como a sua pele era bronzeada (por causa da exposição ao sol no Clã da Areia), além de sua altura - pelo menos quatro desses itens eles conseguiram mudar. Baekhyun passou tanto tempo trancado que sua pele voltou ao normal tom pálido.
— Isso está por toda a parte. Pedi para o Chen tirar alguns sem que ninguém soubesse, mas...Ainda é muito perigoso para você. Mesmo que todos os guardas agora estejam focados no conflitos com os Rebeldes, é melhor que tomemos cuidado.
— Não acredito que fizeram o meu rosto tão largo. Minha cara parece uma prancha – Baekhyun riu, decepcionado com a imagem. Pegou o cartaz, desacreditado com as informações. – Sério? Eles realmente escreveram "é baixo"? Isso é um absurdo, Chanyeol!
— Mas, meu amor, você é baixo. O que quer fazer? Ir até o desenhista e dizer que não vai aceitar ser visto desse jeito, logo em um cartaz de "procurado" não me parece uma boa opção – Chanyel respondeu, sorrindo. Segurou em sua cintura e deixou um beijo em sua testa. – Não tem nenhum problema com o seu tamanho, eu gosto de ser o seu grandão.
Depois de uns tapas e algumas risadas dos dois, eles tomaram um banho e se arrumaram para sair. Era um pouco difícil andar pelas ruas do bairro elegante – não só pelos motivos óbvios – sem pensar em segurar as mãos de Baekhyun ou abraçar a sua cintura. A homossexualidade, ou qualquer manifestação de afeto entre pessoas do mesmo sexo, era estritamente proibida e passível de pena de morte. Eles já tinham problemas o suficiente, podiam aguentar algum tempo até chegar em casa, não precisavam mostrar para ninguém o seu carinho um pelo o outro.
Inclusive, passaram por uma casa que estava toda queimada, deixada quase às cinzas. Nas paredes frágeis, havia apenas uma placa "homossexualismo sempre vai ser combatido aqui, essas aberrações não serão aceitas". Essa era a única casa que estava daquele jeito, pois todas as outras da rua eram grandes e majestosas, assim como a de Chanyeol. Baekhyun pensou se ali vivia uma família de dois homens, ou duas mulheres, talvez eles quisessem ter filhos... Provavelmente eles deveriam se amar muito por continuar ali, achando que mudariam o mundo ao redor deles. Começou a imaginar quantas pessoas sofreram com essa perseguição e se um dia isso poderia acontecer com eles.
Como se não bastasse todo o medo de ser perseguido, ainda tinha que evitar ao máximo ter algum contato mais íntimo com Chanyeol. Ele teria que continuar sem chamar atenção.
Eles passaram por diversas lojas de doces. Chanyeol levava Baekhyun nas lojas mais bonitas, só para que pudesse admirar o brilho nos olhos do menor quando via alguma coisa muito diferente de sua antiga realidade. Ele olhava para as vitrines como se fossem coisas sobrenaturais, então o mais velho fazia questão de comprar tudo que ele parecia querer. O Byun nunca foi de pedir nada, achava que estaria incomodando o namorado se ficasse desejando coisas caras, mas sempre ganhava presentes dele, simplesmente porque gostava de vê-lo sorrir.
Depois que comeram, Chanyeol o levou até uma loja de roupas. Como Baekhyun chegou à casa dele sem nada nas mãos, além de uma mochila com pertences pessoais e seus maços, ele acabou usando todas as roupas do maior. Eles dividiram as roupas durante todo aquele tempo e estava mais do que na hora de comprar mais, então o casal foi até o provador com um bolo de roupas nas mãos. As lojas da elite do Reino eram tão chiques que cada provador era literalmente um cômodo particular para cada cliente, então eles tinham muita privacidade.
Chanyeol estava sentado, vendo Baekhyun experimentar as roupas que ele escolheu, quando decidiu tirar uma dúvida.
— Posso te perguntar uma coisa? – o mais alto questionou, cuidadoso. Baekhyun apenas assentiu, indo para o lado dele. Se surpreendeu quando ele tocou em suas costas, por baixo da blusa, segurando em uma parte específica de seu corpo. – O que é essa cicatriz nas suas costas? Estava reparando nela há um tempo.
Baekhyun se sentou no sofá ao seu lado e suspirou, como se aquele fosse um assunto delicado.
— Como eu te falei, por eu ter me treinado sozinho, apanhei bastante até que ficasse bom de verdade. Algumas vezes eu lutava com adversários bem, bem maiores que eu...Convenhamos, não é muito difícil achar caras maiores do que eu – ele sorriu, sem graça. Esperou que Chanyeol risse como sempre, já que eram frequentes as suas piadas sobre a altura do outro, mas ele apenas continuou sério e Baekhyun sabia o porquê, ele era muito protetor. – Essa foi em uma luta com um dos antigos líderes do Clã. Eu tenho algumas cicatrizes que não me deixam esquecer certas coisas.
— Pode me mostrar? Quero dizer, se estiver tudo bem por você.
Baekhyun estremeceu.
— Tem certeza? Algumas são bem feias.
Chanyeol apenas assentiu, convencido de que nada o deixaria feio. Baekhyun, relutante, tirou as peças que cobriam seu corpo, deixando-as cair no chão e ficando apenas com a sua roupa de baixo. Óbvio que era muito complicado para ele ficar tão exposto assim para alguém por causa do que aconteceu, mas confiava tanto no outro que não teve como pensar naquilo por muito tempo.
Era a primeira vez que Chanyeol o via daquele jeito e ele estava dando o seu melhor para não acabar tendo um ataque do coração. Se ele já ficou nervoso e quase morreu quando contou para o outro que gostava dele, ele estava três vezes pior agora que o via quase sem roupas na sua frente. Era quase engraçado. Um soldado infiltrado de quase 2 metros de altura, tomava decisões que afetavam a vida de milhares de pessoas, além de ter muito sangue nas mãos, ficava simplesmente apavorado na frente de um baixinho de olhos pequenos – que já não eram mais tão vazios. Seria cômico se não fosse trágico, Jungkook o mataria se soubesse disso.
— Essas aqui foram feitas por um pedaço de madeira, eu acho – ele apontou para uma marca escura na sua coxa. Era uma das maiores, mas haviam outras da mesma vertente. Nas costas, nas coxas, espalhadas pelas pernas, estavam em todos os lugares, como ele nunca percebeu? – Meu pai...Bem, você sabe que ele acabou ficando louco com a morte da minha mãe, então ele costumava me bater muito quando eu era menor. E até que eu começasse a revidar ou sair do Clã, bem, ele conseguiu fazer um belo estrago.
Ele falava sobre as marcas até com certa naturalidade, o que só deixava Chanyeol mais caído por ele, se é que era possível.
— Falando na minha mãe, eu consegui essa aqui no dia que ela morreu. Quando o Reino fez aquele ataque que resultou em sua morte, eu era apenas uma criança, mal sabia segurar uma arma, então o meu pai pediu que eu ficasse dentro da nossa casa. Ao contrário do que ele pensou, os homens começaram a atirar na casa, em todos os lugares dela. Uma janela se quebrou na troca de tiros e os estilhaços fizeram esse corte – ele respirou fundo quando seus olhos encontraram os de Chanyeol pelo espelho. Mostrou a marca do corte grandes nas costas e, logo abaixo dele, a pele parecia ferida, como se tivesse sido queimada. – Essa debaixo foi em uma sessão de tortura quando fui pego pelos Rebeldes.
Chanyeol não conseguia dizer nada depois que ele terminou. Óbvio que ele também tinha marcas como aquelas, mas não tinham nenhuma história trágica como as dele. E, só por ser Baekhyun falando, tudo ficava muito mais difícil.
— No dia em que nos conhecemos, você disse que eu agia feito um Rebelde. Agora você pode imaginar o motivo.
— Eles tiraram tudo que era seu... - Chanyeol falou, horrorizado, ainda olhando as marcas em sua pele. Ele parou quando percebeu que na sua nuca, bem abaixo do cabelo, tinha o contorno da cabeça de um lobo. – E essa tatuagem?
— É o meu patrono. No Clã, acreditamos que eles são espíritos animais que habitam dentro de nós e nos protegem na hora de tomar decisões – ele explicou rapidamente, claramente envergonhado e querendo se cobrir. Sua voz estava falhando e sua expressão mostrava tudo de errado com ele. Ele tentou pegar a sua roupa do chão, ainda de costas para si, mas o soldado segurou os seus braços para que ele ficasse imóvel. – Chanyeol, você sabe que eu não gosto de ficar assim. Eu não deveria ter feito isso, sério, ninguém nunca me viu desse jeito e...Meu corpo é feio demais, não quero que fique me olhando como se não fosse.
O mais baixo tentou rir de si mesmo, como sempre fazia, mas acabou demonstrando o quanto queria chorar. O mais alto não respondeu, apenas o abraçou por trás, encarando a imagem de ambos no espelho. Mantinha o aperto sem machucar porque sabia o quanto ele gostava de ser tratado daquele jeitinho carinhoso, principalmente quando estava frágil. Baekhyun ainda tentava se cobrir, extremamente constrangido, mas parou assim que se deu conta do que o outro estava fazendo.
Chanyeol estava beijando as suas cicatrizes.
Dava selinhos em cada uma delas, como se quisesse mostrar que estava apaixonado por inteiro, não só por suas partes "bonitas". O mais velho o pegou no colo e o sentou na mesa que estava no meio do quarto de um jeito delicado. Baekhyun acariciou seus cabelos quando ele demorou um tempo nas marcas do cinto, fazendo carinho com os dedos logo depois, o olhando com tanta paixão quanto conseguia. Era incrível o que Chanyeol estava fazendo por ele, aliás, o que sempre fez desde o primeiro dia.
— Essas cicatrizes são desenhos, que contam uma história única de tudo o que você passou para ser quem é hoje. Todos nós que fazemos a diferença temos marcas, meu amor, esse é o presente que se ganha por não passar a vida em branco – disse em seu ouvido, voltando a abraçá-lo. Baekhyun não sabia o que fazer com toda a sua vergonha, nervosismo e, mais ainda, todo o seu amor por ele. – E eu não poderia querer que você fosse diferente em nada, porque...Foi desse jeito que eu descobri o quanto eu te amo.
Baekhyun se virou para ele na hora, ainda com os olhos marejados e uma expressão indescritível no rosto. Era como se ele estivesse confuso, triste, nervoso, feliz, tudo ao mesmo tempo. Chanyeol temia que tivesse ido longe demais e tivesse o assustado, porque sabia do problema do mais novo com esse tipo de coisa.
— Você me ama? – ele perguntou baixinho e Chanyeol assentiu devagar, com medo de receber uma resposta negativa por ser rápido demais ao dizer. Mas não conseguiu conter um sorriso gigante quando ele voltou a falar. – Achei que nunca fosse dizer.
Todo o clima de felicidade e aceitação acabou quando, a música ambiente que tocava nos auto-falantes do quarto fora substituída por barulhos altos e incômodos, como o crepitar de um microfone com defeito.
— Falo diretamente de uma vila cheia de homens desarmados, crianças e mulheres, que há alguns dias atrás sofreu um bombardeio ordenado pelo Reino – a voz de Keana se fez presente no rádio, o que fez Chanyeol e Baekhyun se entreolharem. Eles conseguiram. – Porque é isso que eles fazem, nos torturam todos os dias lentamente até que, quando perdemos a utilidade, somos descartados. Essa é uma mensagem dos Rebeldes e finalmente está chegando a hora de tomar tudo que é nosso por direito...Infelizmente, poderá ser um banho de sangue. Para que inocentes não sofram a mesma punição que os culpados, vocês tem um certo tempo para se entregar aos Rebeldes. Todos que estiverem dispostos a lutar pelos seus ideais serão bem-vindos.
Depois de terminada, a mensagem foi repetida várias vezes em vários volumes, como se o ponto de controle do Reino estivesse tentando interceptar a comunicação. De qualquer jeito, metade da população já deveria ter ouvido aquilo, pois todos tinham rádios em casa.
— Eles conseguiram, puta merda. As ruas vão ficar uma loucura – Chanyeol murmurou, sem conseguir parar de encarar Baekhyun. Juntou e entregou as roupas do garoto, apressado. – Vamos. Eu tenho que te levar para casa.
Quando conseguiram chegar em casa, tirando várias pessoas do caminho, já que havia se formado uma multidão na rua, não encontraram algo muito melhor. Suho, Chen e Sehun estavam sentados no sofá da sala, parecendo impacientes enquanto esperavam por eles.
— Vocês só podem estar loucos! Meu Deus, os Rebeldes praticamente acabaram de declarar um ataque que com certeza vai provocar uma retaliação, e tudo que vocês conseguem fazer é sair de casa para comprar doces?! As ruas estão um caos, tem guardas por todos os lados e, inclusive, nós vamos ser chamados daqui a pouco – Suho respirou fundo, se levantando do sofá e indo até o tenente. – As revistas estão cada vez mais rigorosas, Chanyeol, e o Chen não pode mais nos ajudar com isso. Não é mais seguro para o Baekhyun aqui. Já que está recuperado, ele pode voltar ao Clã da Areia.
— Eu não vou colocar os pés naquele lugar.
Baekhyun o encarou, parecendo nervoso. Só Chanyeol entendeu o verdadeiro motivo daquela frase e esticou a mão para segurar a dele, lhe dando apoio.
— Por que não? Antes de tudo, é o seu povo, eles te aceitariam de volta – Sehun deu de ombros. – Além disso, se te pegarem aqui, você vai ser torturado.
— Pois eu prefiro ser torturado até a morte do que voltar lá e ter que encarar... – ele se obrigou a parar de falar. Procurou os olhos de Chanyeol, desesperado. – Eu sei que não é só sobre mim. Sei que vocês vão pagar pelos meus erros também, mas...Mas vocês sabem que eu sou bom em me esconder.
Chen estalou a língua, incomodado.
— Não é nem sobre isso, Baekhyun, essa causa é muito maior que nós. Preciso te lembrar o que o Jungkook fez para manter o Chanyeol vivo? Não podemos jogar tudo isso no lixo.
— Eu só peço uma semana e, se nada melhorar, eu dou o meu jeito e saio daqui. Se vocês quiserem, eu não saio do sótão até todos os nervos se acalmarem. Mas, por favor, só mais uma semana – o loiro pediu e os rapazes concordaram, impacientes. Chanyeol continuava segurando a mão dele, com medo do destino incerto.
(X)
Depois que Yoongi retornou da vila, Taehyung voltou a treinar com ele. Há algumas semanas, ele foi até o mestre e pediu para que ele o ensinasse a ser um guerreiro, mesmo que tivesse algumas limitações, pois Jungkook já não tinha mais tanto tempo para ajudar. A verdade é que Tae começou a ficar apavorado com a ideia de ver tanta gente morrendo e não poder ajudar, então resolveu fazer alguma coisa. O mestre de Jungkook perguntou umas três vezes se ele queria desistir do treinamento, que era bem pesado.
Na primeira semana, Taehyung não conseguia acompanhar o ritmo do mestre na luta corpo a corpo, e sempre caía no chão antes mesmo do primeiro golpe.
— Perdão, mestre – ele tinha pedido quando caiu pela primeira vez, ainda no chão. Logo no primeiro dia com o mestre já tinha passado aquela vergonha. – Não vou errar da próxima vez.
— Você só errou agora porque me pediu desculpas. Faria isso em uma luta de verdade com um soldado inimigo? – o outro questionou, o encarando de cima e o mais novo balançou a cabeça. Yoongi tinha aquela maldita expressão neutra e nem ficou ofegante com a luta, ou cansado. Aquele cara era uma máquina e Taehyung ficava louco com isso. – Então não faça isso comigo. Se você caiu, vai usar a sua arma, a sua própria perna ou qualquer outra coisa que esteja ao seu alcance, para me derrubar e se levantar de novo, entendeu? Não é sobre cair, é sobre saber levantar e continuar a luta, aprendendo sobre a sua queda e não repetindo os atos que o fizeram errar. Vamos tentar de novo.
Com o tempo, Taehyung foi ficando cada vez melhor e aprendeu sobre diversas outras coisas. Yoongi o ensinou a atirar em alvos que se mexiam e também o fazia correr enquanto atirava, para que melhorasse a sua mira e precisão. Ele aprendeu a lançar mais de uma flecha por vez, além de saber manejar as flechas explosivas. Ele começou a enfrentar os outros aprendizes na arena, mesmo que Jimin e Hoseok achassem que era muito perigoso por causa de todo o lance com as cicatrizes, e superou quase todos, com exceção de Kyara.
Enquanto todos estavam dormindo, Taehyung treinava. Enquanto eles ficavam vadiando depois do jantar, ele tentava manejar duas espadas durante a luta e sempre acertar o centro do alvo com as flechas. A única diferença de Tae para os outros aprendizes é que ele tinha mais dedicação e disciplina, além de, por ter a doença que tinha, ele precisava se esforçar duas vezes mais para não ser atingido. E, quando chegava a hora de dormir, ele pensava várias vezes no que poderia melhorar no próximo dia de treinamento.
Agora, ele estava preso por algemas, tentando se soltar com um pedaço de arame. Podia parecer simples na teoria, mas, na prática, ele ainda tinha que desviar dos ataques que o mestre fazia. Quando finalmente conseguiu se soltar, depois de um ou dois minutos recuando, teve que pegar o seu bastão para que pudesse revidar os ataques.
Taehyung respirou fundo antes de se abaixar para que não fosse atingido, já que Yoongi não lhe dava qualquer tipo de trégua. Porém, como o mais novo já tinha percebido, o mestre tinha algumas manias e uma delas era dar um passo para trás toda vez que ia atacar, então teve que se apoiar nessa chance. O aprendiz bateu o seu bastão contra o do outro com força, o puxando para mais perto de si e logo o jogando para longe do alcance do mestre.
Como Yoongi não precisava realmente de uma arma para vencer uma luta, ele se tornou ainda mais imprevisível sem o bastão. Taehyung girou em seus calcanhares, preparado para lhe dar um chute, mas logo sua perna direita foi segurada por ele.
— Nunca deixe a sua perna na altura dos meus braços. E, se deixar, evite demorar muito para chutar – ele falou. E, antes que o mais novo pudesse perguntar o porquê, sentiu um empurrão na sua perna esquerda, a que ainda sustentava o seu corpo, não se demorando a cair no chão. – Você não está usando o seu corpo inteiro, precisa trabalhar cada parte do seu ser se quiser ter muitas opções na hora da luta.
Bastou apenas um milésimo de segundo de descuido do mestre para que Taehyung juntasse as pernas novamente e o derrubasse. Ficou por cima dele por um pouco tempo antes de ser jogado para baixo de novo e ter seu peito forçado pelo joelho do outro. O maior se levantou, ignorando o corpo em baixo de si e indo atrás de seu bastão, mas...Se Taehyung tinha mais uma coisa de diferente de todos, essa coisa era a sua velocidade. Em algumas ocasiões ele poderia ser mais rápido até que o próprio Jungkook.
Diferente do que Yoongi esperava, ele não foi atrás do outro bastão. Ele correu até o seu arco e a aljava, que estavam próximos do ponto onde eles começaram o exercício. O mestre lançou o bastão em sua direção antes que ele colocasse uma flecha no arco, mas o menor rapidamente se colocou no chão e bloqueou o ataque. Ele se afastou um pouco mais de Yoongi e finalmente apontou a flecha para o seu coração, só precisava deixar ir e acabaria com aquela luta, se ela fosse mesmo real.
— Eu não elogio com frequência, não acho que esse tipo de coisa faz bem para manter o ego controlado, e nenhum aprendiz recebe biscoitinho por fazer alguma coisa certa. Aqui, quem é ruim luta para ser bom, e quem é bom se esforça para ser o melhor – o mestre falou, sereno como sempre. Taehyung abaixou o arco e assentiu, completamente de acordo com as suas palavras. Ele nunca tinha se esforçado tanto para conseguir a aprovação de alguém, e imaginava se era assim que Jungkook se sentia quando ainda estava aprendendo a ser quem era. – Mas, Taehyung, você está indo muito bem, nunca vi uma evolução tão rápida e forte. Se continuar assim, não vai demorar muito para ser o sucessor de Jungkook.
Taehyung surtou internamente com aquelas palavras, mas por fora apenas fez uma breve reverência. Nunca tinha visto Yoongi sorrir em todo aquele tempo que ficou ali, mas podia jurar que era isso que ele tinha feito quando terminou de falar, mesmo que por um segundo. O mais novo mal podia esperar para dizer tudo aquilo para Hoseok e esfregar na cara de Jimin que ele podia ser um guerreiro também.
— Sem ofensas, mestre, mas por que o senhor não se oferece para ser o próximo comandante? Digo, com toda a sua experiência e técnica, duvido muito que alguma coisa pudesse dar errado.
Taehyung viu o corpo de Yoongi ficar tenso quando disse aquilo, e ele nunca quis tanto não ter falado alguma coisa. Fala sério, ele estragou tudo no único momento descontraído que estavam tendo. Achou que não ia ter a resposta para a sua pergunta quando Yoongi o encarou firmemente pela última vez e virou as costas, pronto para sair da arena.
— Estou velho demais para isso.
— Aposto que ninguém iria dizer isso se tentasse comandar. Você é o melhor lutador que eu já vi! Todos os aprendizes carregam uma parte de você, certo? Imagina como seria se pudéssemos contar com você por inteiro.
— Taehyung, eu já disse que não! Isso não tem o menor cabimento e nunca vai acontecer – Yoongi o repreendeu levantando a voz, o que fez Taehyung se encolher. Nunca tinha visto o mestre de Jungkook tão bravo. – Já disse que estou velho demais.
(X)
— Quem é você? – Jimin, vestindo as mesmas roupas que usava normalmente para andar na base, perguntou ao garoto no espelho, arregalando os olhos.
O garoto no espelho era completamente idêntico à ele, porém parecia mais cansado. O segundo Jimin possuía olheiras, marcas no braço como se alguém tivesse o segurado bem forte e uma expressão assustada no rosto. Além disso, as suas roupas eram mais formais, estavam passadas e até uma maquiagem leve ele usava, parecia um príncipe vestido daquele jeito. Era como se fosse uma versão dele no passado e isso o fez se arrepiar.
— Eu sou você. – o outro disse, olhando para os lados sem parar. Parecia que ele estava fugindo de algo ou... Ou de alguém. – Rápido, não temos muito tempo. Tenho que voltar antes que eles sejam mortos.
— Eles? – Jimin franziu a testa, mais confuso do que nunca. Por que tinha uma outra versão dele? Por que ele parecia tão esgotado, tão diferente de si mesmo? E de quem estava fugindo? Um arrepio percorreu sua espinha. – Quem vai ser morto?
— Todos eles – o segundo Jimin se aproximou devagar, sussurrando. – Diga ao Jungkook que o encontrarei na próxima vida.
— O quê? Próxima vida?
— A tempestade se aproxima – o segundo garoto balançou a cabeça, parecendo decepcionado. – Eles precisam de você. Convença Jungkook a se livrar de alguns laços.
— Eu não...Eu não sei do que você está falando – ele disse, realmente confuso agora. – Você não é real. Eu vou contar até 3 e você vai desaparecer.
Ele fez o que disse e, mesmo depois disso, o outro continuou ali, agora a encarando com nojo.
— Sinceramente, estou envergonhado por ter o mesmo nome que você – o outro declarou. Olhou para os lados novamente, como se tivesse ouvido algum barulho e se virou para o ruivo. – E pensar que Jungkook vai se encontrar com essa nova versão...
Antes que Jimin pudesse perguntar, a outra versão de si começou a sangrar por algum tipo de ferimento em seu peito e o seu sangue se espalhou por todo o espelho, tampando a visão completamente.
Taehyung acordou, sobressaltado.
Se debatia, como se quisesse se livrar da sensação do sangue de Jimin espirrando nele. Sentia a respiração descompensada, enquanto o peito subia e descia freneticamente à procura de ar. Nunca se sentiu tão aliviado por acordar de um sonho na vida. Tudo pareceu tão real que ele sentia a garganta seca, como se estivesse gritando durante o sono por muito tempo. Se revirou na cama, querendo sair daquele quarto sufocante. Piscou os olhos várias vezes, agarrando as suas cobertas e se encolhendo entre elas, com medo de deixar o aposento.
Esticou as mãos, ainda sem abrir os olhos, procurando pelos braços de Jimin até perceber que estava sozinho na cama. Claro, ele deveria estar dormindo com Jungkook de novo.
— Jimin? – chamou, meio trêmulo. Sua voz saiu arranhada e machucou sua garganta levemente. – Jimin!
Como não obteve uma resposta, se enrolou em um cobertor e respirou fundo, tentando manter em mente que ele estava seguro, que não precisava ter medo de nada por enquanto. Tentou imaginar que aquilo era só um sonho, que não poderia acontecer, que o passado e o futuro estavam misturados demais para ser uma visão de verdade, mas, na real, ele não tinha a menor ideia do que fazer. Não entendeu metade do sonho, a única coisa que conseguiu ter certeza foi "diga ao Jungkook que o encontrarei na próxima vida", pois já tinha entendido que os dois estavam destinados a se encontrar.
— Tae? Você está bem? Eu ouvi você gritando e... – Hoseok apareceu no batente da porta, já que, assim como Jimin e Taehyung, recebeu a ordem de começar a dormir nos aposentos do comandante. Tae não o deixou terminar a frase e correu para abraçar o seu corpo magro, se sentindo seguro só por estarem no mesmo quarto. Fechou os olhos para sentir melhor o seu cheiro e aproveitando para respirar fundo novamente, se acalmando. – O que houve, bebê? Por que essa cara?
Adorava quando o outro o chamava carinhosamente, porque mesmo depois de todo aquele tempo, os dois ainda não haviam decidido a relação que mantinham. Saíam e se divertiam como amigos, mas qualquer um que prestasse atenção nos dois via os olhares, os toques, todos os atos de carinho, que só eles mesmos não viam. Taehyung havia decidido mentalmente que eles nunca foram só amigos, mas nunca disse nada para o outro.
— Tive um pesadelo, mas está tudo bem agora – forçou um sorriso, mas estava tão apavorado com toda a situação que deve ter saído mais como uma careta. Hoseok o olhou com uma cara de puro tédio, como se dissesse "Sério? Vai mentir para mim?". – Ok...Jimin e Jungkook estão destinados a se encontrarem nas próximas vidas, mas, pelo que deu para perceber, o comandante foi o primeiro a morrer na última reencarnação, o que deve significar que Jimin vai ser o primeiro nessa, ou algo assim. Tem algo sobre nós precisarmos de Jimin, Jungkook ter que cortar laços e alguma outra coisa sobre uma tempestade. E, pelo que deu para entender...Eu tenho alguma ligação com Jungkook que não consigo ver ainda.
Taehyung realmente achava que Hoseok iria chamá-lo de maluco. Pensou que o maior fosse ficar decepcionado por perder o seu tempo com coisas tão bobas e fantasiosas, mas mudou de ideia quando viu que o moreno foi até a escrivaninha do quarto e começou a pegar algumas folhas, lápis e coisas que precisariam para escrever. Talvez ele quisesse montar algum plano que o ajudasse a entender as suas visões.
— Laços... – ele murmurou, escrevendo o nome do comandante em uma folha. Taehyung assentiu, puxando uma cadeira para sentar ao seu lado. – Precisamos escrever todas as suas visões e entender se tem alguma ligação entre elas.
Taehyung assentiu, tentando se lembrar de tudo.
— Tudo bem. Hã, acho que eu senti as primeiras coisas quando comecei a conversar com Jungkook. Logo depois, soube do bombardeio que fariam em um dos vilarejos Rebeldes... Aí comecei a ter sonhos sobre ele, Jimin e eu no passado, alguns até no futuro. Só apareço em poucos deles.
Eles começaram a montar linhas temporais, gráficos entre as suas relações, nomes de todas as pessoas que poderiam significar os laços de Jungkook, logo usando fita para manter todas as teorias na parede. Só pararam de discutir quando começou a amanhecer e, mesmo assim, chegaram a poucas conclusões.
— Eu odeio isso – o garoto falou de repente, afundando a cabeça entre as mãos e começando a chorar de tanto nervoso. – Eu não pedi para nascer assim, hyung. Por que isso foi acontecer logo comigo? Eu não tenho absolutamente nada de extraordinário, Jungkook deveria ter essas visões, não eu.
— Pessoas especiais não pedem para nascer desse jeito, pequeno, elas apenas nascem. E, se você quer saber, muita gente passa a vida inteira tentando ser importante assim e não consegue. Você deveria ser grato por ser desse jeito e poder nos ajudar tanto.
— Ver as coisas ruins que ainda vão acontecer não faz de mim especial, muito menos uma ajuda para vocês. Eu sou a porra de uma aberração.
— Você acha que é especial só por isso? Por causa das visões? – Hoseok riu de sua ingenuidade. – Não, Tae, você não é especial por ter poderes. Você é especial por ser um garoto incrível que, mesmo com todos os motivos do mundo para ser uma pessoa cruel, só ficou ainda mais doce e gentil com o tempo. Você é generoso, se importa com as pessoas de um jeito tão lindo que as vezes duvido se é real, além de estar sempre disposto a se sacrificar pelos outros. É por isso que eu...
Hoseok deu uma pausa, com medo de terminar a frase e passar de seus limites. Taehyung pareceu entender o que ele ia dizer e nunca esteve tão desesperado para ouvir duas palavras. Por favor, fala, ele pensou.
— É por isso que nós somos amigos - Hoseok completou, engolindo em seco.
— Apenas amigos?
Taehyung também nunca precisou de tanta coragem para falar uma frase na vida. E teve certeza que estava certo ao falar isso quando Hoseok desviou o olhar, respirando fundo.
— Tae, você sabe que não podemos ser mais que isso.
— E por que não?
— Eu tenho vinte e cinco anos, meu amor. Você tem o quê, doze? Treze?
— Eu tenho quinze – o corrigiu. – E daqui a poucos meses terei dezesseis. Quer dizer que eu tenho maturidade o suficiente para machucar pessoas, para ser torturado, viver sozinho na floresta, ficar dependendo de algumas seringas para sobreviver, e ver milhares de mortes antes delas acontecerem de fato, mas não tenho um pouquinho para simplesmente beijar você? Pensa um pouco, será que isso faz sentido?
— Isso é muito errado, Tae, são dez anos de diferença. Eu não quero acabar te machucando.
Taehyung não soube outra forma de reagir além de se inclinar, ainda mantendo o olhar sobre ele, logo selando os seus lábios com delicadeza. Um arrepio correu pelos corpos dos dois, quando perceberam que realmente estavam se beijando depois de tanto tempo querendo isso. O menor achava que o médico ia afastá-lo no começo, por ainda estar confuso sobre o que estavam fazendo ali, mas, ao invés disso, Hoseok só parou quando o ar lhe faltou. Não era o primeiro beijo do mais velho, e certamente não seria o último, mas aquela foi uma das raras vezes em que se sentiu em paz ao lado de alguém.
— Isso parece errado para você?
Hoseok simplesmente balançou a cabeça, segurando Taehyung como se ele fosse desaparecer se não o fizesse.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.