"Queria lutar nessa guerra sem armas
E eu queria isso, eu queria muito isso
Mas haviam tantas bandeiras vermelhas
Agora outro vai por água abaixo
Sim, vamos ser claros, não vou confiar em ninguém
Você não me quebrou
Ainda estou lutando pela paz
(X)
Andaria no fogo para salvar a minha vida
E eu quero, quero tanto a minha vida
Estou fazendo tudo o que eu posso"
(Sia - Elastic Heart)
— Você precisa ficar olhando para lá a cada segundo? Jimin e Taehyung estão bem, Jungkook.
Yoongi, que estava dirigindo, revirou os olhos quando percebeu pelo espelho que o pescoço do comandante só faltava quebrar de tanto que ele olhava para trás. Como Luhan estava no carro junto deles, sentado no banco de trás ao lado de Jungkook, eles estavam usando o dialeto dos Rebeldes para conversar, então o jovem chinês não entendia nem mesmo uma palavra.
Jungkook bufou, não convencido. No carro, estavam duas pessoas as quais ele confiava com a sua vida e, por isso, não via problema em admitir que se preocupava mais do que deveria com Jimin e Taehyung. Não era segredo nem para o soldado e nem para Yoongi que o comandante mostrava um lado completamente diferente de sua personalidade quando estava com Jimin, por isso eles sabiam que deveriam defender o ruivo com unhas e dentes. Era esse o desejo dele.
— É verdade, Jeon – Namjoon também tentou tranquilizar o outro. Deu uma olhada rápida para ele no banco de trás, despreocupado. – Coloquei uma pistola debaixo do banco do Tae. Se acontecer alguma coisa, ele sabe o que fazer.
— Mesmo assim. Não gosto da ideia de deixar o Jimin sozinho com a Yezi, não confio tanto nela.
Luhan olhou para eles assim que ouviu o nome de sua líder. Ele não era burro e, ainda que a pronúncia do dialeto fosse extremamente diferente, conseguiu ter uma ideia do que estava sendo discutido. Era notável que a desconfiança e a hesitação estavam mais do que presentes naquela aliança e isso até era um pouco justificável, afinal os dois povos nunca nem sequer tiveram um encontro próprio antes daquela semana, além de ouvirem absurdos vindos um do outro. E, de repente, na primeira reunião que fizeram, se tornaram aliados.
Ainda que as situações latentes pedissem por isso e o peso da guerra fosse sentido por todos, era de se esperar que o clima ainda fosse um pouco hostil.
Luhan franziu a testa, sem saber o que e nem como dizer.
— Achei que tínhamos combinado de não usar nossos dialetos enquanto estivéssemos em missão, comandante.
Yoongi ignorou o seu protesto.
— O que acha de sua líder, Luhan?
Parecia uma pergunta estúpida. Afinal, se ele era do Clã, certamente iria defendê-la até o fim, certo? Errado.
Os três Rebeldes presentes no carro estavam muito acostumados a lidar com as pessoas, então eles podiam reconhecer qualquer traço, o mínimo que fosse, quando o assunto era deslealdade. E uma coisa do tipo naquele momento seria extremamente valiosa, apenas para o caso de precisarem fazer um acordo por baixo dos panos mais tarde.
— Yezi é uma guerreira nata, extremamente poderosa. Ela fez muito por nós e, inclusive, foi muito misericordiosa com vocês – Luhan deu de ombros, olhando a paisagem através da janela. Yoongi, Jungkook e Namjoon trocaram olhares de deboche...Até parece que eles precisavam de uma coisa tão patética quanto a misericórdia de alguém de outro povo. – Mas não é líder por direito.
— Não?
— Não, Baekhyun deveria ser o nosso líder. Mas acho que demoramos muito para entender que armaram para o pai dele e que ele não estava morto, que ainda corria perigo, então...Acho que ele pensou que fugir seria a opção mais segura.
Namjoon mordeu o lábio inferior, como se estivesse subitamente interessado na história contada.
— Então, Luhan, supondo que Baekhyun um dia volte para o Clã, Yezi teria que sair do comando? Mesmo que ela não quisesse?
— Se Baekhyun estivesse interessado em ser o novo líder, acho que sim, mas talvez eles tivessem que lutar um contra o outro. Ainda é cedo para saber...Ter alguém como o Baek no comando seria incrível, eu não tenho dúvidas, mas é muito louco pensar em tudo isso, algo assim nunca aconteceu conosco antes – Luhan explicou, encarando os outros três homens presentes no carro. Se sentia intimidado por estar no meio dos Rebeldes, não iria mentir, afinal, se houvesse qualquer mal-entendido da parte deles sua cabeça seria decepada sem a menor cerimônia. Mas aquele sentimento não era exatamente novo para ele, visto que cresceu no Reino. – É quase a mesma situação de vocês, na real. Acho que sabem bem o que eu quero dizer.
Antes que pudessem responder, Yoongi parou o carro. Ele não sabia o que era, mas havia algo de errado naquele cenário, e Jungkook nunca duvidava dos pressentimentos do seu mestre, por isso não sentou necessidade de questionar.
— O que foi? Por que paramos? – o garoto chinês engoliu em seco, confuso.
— Tem alguém ali. Em cima da árvore, se escondendo entre os galhos – o mestre observou, os olhos semicerrados.
Estava escurecendo, por isso as luzes mais fortes que eles tinham ali eram as dos faróis dos carros. Eles estavam longe da tal pessoa, cerca de uns 20 metros, então era realmente difícil discernir a figura humana da área verde. Yoongi se esticou um pouco e alcançou a metralhadora atrás do banco, segurando a arma com firmeza.
Jungkook agradeceu mentalmente pelo carro ter todos os vidros escurecidos, ou seja, era impossível para os que estavam do lado de fora ver o que eles faziam dentro do veículo. Ele franziu a testa, estranhando a presença do homem, mas não desconsiderando um ataque.
— Franco-atirador?
— Não dá para ter certeza – Luhan tentou ver com mais clareza, mas a distância e a luz não ajudavam muito. – Acho que não, mas ele definitivamente viu que nós paramos.
Yoongi abriu a janela bem devagar, porém, antes mesmo de poder fazer alguma coisa, um clarão acompanhado de um barulho ensurdecedor invadiu o carro, estilhaçando o vidro da frente.
O mestre imediatamente olhou para trás, para se certificar de que Jungkook estava bem, mas sua preocupação mudou o foco muito rápido. Um tiro preciso havia acertado Namjoon no que parecia ser o ombro (pelo que eles podiam ver por cima da roupa) e o sangue começou a se espalhar. O soldado cerrou os dentes por causa da dor acentuada, se virando para os outros com o olhar banhado em confusão e medo.
Yoongi finalmente abriu a janela até o final e colocou metade de seu corpo para fora, por mais arriscado que isso fosse, começando a atirar na direção de onde eles viram o homem. Descobriu ter finalmente acertado seu alvo quando os galhos das copas das árvores se movimentaram violentamente, como se alguém estivesse tentando se segurar neles, mas seus esforços foram inúteis, pois logo o barulho de um corpo caindo no chão foi ouvido por eles.
Jungkook, Luhan e os outros saíram dos carros depois desse segundo tiro, se encontrando do lado de fora. Todos eles estavam extremamente confusos, a coisa toda aconteceu muito rápido, Namjoon tinha sido baleado em questão de segundos.
— Ei, você está bem? – o comandante ouviu a voz de Jimin atrás dele e se virou para encarar o ruivo. Ele tinha o cenho franzido e o lábio inferior preso entre os dentes, aparentando também estar muito apreensivo com a situação, mas depois que viu que Jeon parecia bem, sua expressão se suavizou. Talvez ele tivesse achado que o próprio Jungkook havia tomado aquele tiro.
— Sim – Jungkook respondeu rapidamente, segurando suavemente em sua mão a fim de o tranquilizar ainda mais. Hoseok veio logo atrás de Jimin, esperando por instruções. – Namjoon tomou um tiro, vocês precisam tirar a bala agora. Tem um kit de socorros no porta-malas, não é muita coisa, mas deve ajudar.
Luhan e Jimin cuidadosamente tiraram Namjoon do carro. Colocaram o soldado próximo dos faróis do primeiro carro, para que o médico pudesse trabalhar com mais espaço e também tivesse uma visibilidade maior. Se Jin estivesse ali, já teria infartado.
Jungkook encarou a floresta que começava a frente deles. Era uma área muito extensa, tinha muitas árvores e muitas opções de esconderijo no período da noite, o que dificultava muito para eles. Seus olhos atentos repararam, com certo horror, quando cinco sombras saíram dos arbustos.
Eram dois homens do Reino que, respectivamente, mantinham Lalisa e Tao como reféns. Eles os seguravam pelo pescoço, apontando armas na direção de suas cabeças. Jungkook prendeu a respiração quando viu Lisa naquela situação, e ficou extremamente furioso quando reparou que agora seu olho estava roxo. Nem imaginava como eles tinham acabado daquele jeito, afinal os dois também estavam seguindo os carros, mas naquele momento não conseguia pensar em quase nada.
Kris estava estático atrás deles, sua respiração estava completamente desregulada. Tao era o seu melhor amigo, um verdadeiro irmão, o soldado mal conseguia se manter de pé sabendo que ele estava correndo risco. Kris observou como o amigo parecia lutar para escapar, ao mesmo tempo sem querer causar a morte da mulher ao seu lado.
— Se não largarem as armas agora, os dois estão mortos! – o terceiro homem do Reino gritou, se aproximando mais. Ele era alto, seus cabelos eram grisalhos e, pelo que Jungkook pôde ver com aquela luz, carregava uma expressão orgulhosa no rosto.
Yoongi rapidamente se colocou ao lado do comandante, que agora tinha todos os olhares virados para si. Todo mundo estava esperando por uma posição sua. Deveriam se entregar para evitar a morte de duas pessoas? Depois de tudo o que fizeram?
— Me deixe atirar nele e você cuida dos outros dois – seu mestre pediu. Mesmo que tivesse o treinado, Jungkook ainda tinha a autoridade maior.
— Eles vão ser mortos...
— E daí? Lisa já cumpriu a sua função, certo? E Tao é um traidor, eles não são mais problema seu. Mostre para eles que sabe fazer escolhas difíceis.
Os inimigos se aproximaram cada vez mais, até que apenas uns míseros dez metros os afastavam. O homem que segurava Lisa ficou mais agressivo, era possível ver as veias saltadas de seus braços e o jeito que a menina se esticava para fugir de seu aperto.
Por mais que falassem baixinho, Yezi ouviu Yoongi. A líder, que parecia horrorizada com a conduta do mestre e a hesitação de Jungkook, se meteu na discussão. Ela se colocou do outro lado do comandante, também resolvendo o aconselhar do jeito que podia.
— Tao é inocente, ele não tem nada a ver com o que quer que seja isso. Eu não sei você, comandante, mas eu não abandono um dos meus assim tão facilmente – Yezi rebateu o argumento de seu mestre. Jungkook a encarou, considerando sua fala, mas a líder simplesmente ficou impaciente e se virou para o soldado do Reino. – O que querem por eles?
— O ruivo.
Jimin, que estava ajudando Hoseok a retirar a bala que atingiu a omoplata de Namjoon, estremeceu e ergueu o olhar para o comandante, pensando no que teria que fazer. Os dois trocaram olhares nervosos e Jungkook sussurrou para ele um "Fique atrás de mim"
— Só por cima do meu cadáver – foi a resposta do comandante. Se algum dia alguém realmente conseguisse matar Jimin, obviamente seria depois de enfrentar Jungkook até o seu próprio fim.
Jungkook não se importava se teria que sacrificar Lisa ou Tao, sua maior prioridade era Park Jimin e isso nunca iria mudar.
— Abaixem as armas – Yezi ordenou para os seus subordinados, praticamente se opondo a ideia de Jungkook.
Antes mesmo que eles pudessem discutir, Jimin se levantou e começou a caminhar em direção aos homens do Reino. Jungkook tentou segurar seu braço, chamou por ele, mas Yoongi voltou ao seu lado e disse que estava tudo bem, que o ruivo sabia bem o que estava fazendo. O comandante conhecia Jimin bem o suficiente para saber que isso não era verdade, provavelmente a frase "eu não faço a menor ideia do que estou fazendo" se repetia várias vezes na cabeça dele, afinal ele era extremamente impulsivo e se deixava levar pelos problemas dos outros.
Mas, por algum motivo, Jungkook sentia uma coisa inexplicável no peito. Sentia que não podia interromper o destino de Jimin, que tinha que deixá-lo fazer aquela escolha, por mais que doesse.
— É bom ver você de novo – o guarda falou, cheio de deboche, e Jimin rapidamente reconheceu a sua voz. Era ele quem tinha levado o ruivo para fora da base da última vez, quando ele foi pego pelos soldados. A lembrança o fez sentir nojo. – Senti quase tantas saudades quanto Jungkook vai sentir da vadiazinha dele agora.
— Já estou aqui, já conseguiu o que queria. Deixe o Tao e a Lisa irem embora – Jimin mais mandou do que pediu, tentando manter o tom de voz firme. Seu braço foi fortemente agarrado pelo guarda, para impedir que ele corresse e ele sentia que aquilo deixaria uma bela marca roxa, mas não estava se importando nem um pouco com a sua própria for naquele momento.
— Sou um homem de palavra.
O soldado assentiu e ordenou que seus homens soltassem o rapaz e a loira. Tao imediatamente correu para o lado de sua líder, sendo amparado por Kris. Lalisa demorou um pouco mais para chegar até seus aliados, talvez porque sua perna estivesse lesionada, e Jungkook foi um dos primeiros a lhe dar suporte. Apesar disso, toda a concentração do comandante se voltava para Jimin.
A tensão estava presente em todos os corpos. Nenhum dos lados queria perder o Park.
O soldado, que agarrava Jimin pelo braço e orgulhosamente ostentava uma medalha dourada em seu peito, se virou para os outros e ditou claramente.
— Peguem o comandante e matem o resto.
— Não! – por puro instinto, Jimin gritou e ergueu as mãos na direção dos seus aliados, como se de algum jeito isso pudesse protegê-los.
E foi o que aconteceu.
De repente, uma barreira espessa e enorme de fogo foi se colocando entre os Rebeldes e os guardas, impedindo que Jungkook visse onde o ruivo estava e também impossibilitando que os outros vissem que na verdade era ele quem controlava as chamas.
Os dois soldados tiveram seus corpos tomados pelo fogo. A luz incandescente e vermelha fazia os gritos dos homens serem ouvidos a metros de distância, as suas peles derretendo e algumas áreas se tornando completamente escuras pareciam ser uma forma de entretenimento para Yoongi, que observava tudo com os olhos brilhando.
Aproveitando o caos que tinha se tornado e o horror estampado no rosto do soldado ao seu lado, Jimin tirou uma das adagas que Jungkook lhe deu de seu coldre e cravou a lâmina enferrujada em sua jugular. O homem rapidamente caiu, seu pescoço espirrando sangue e as mãos inutilmente tentando agarrar em alguma coisa. O ruivo segurou o cabo da adaga, arracando-a de seu corpo e o chutando de volta para o chão.
Por conta do extremo calor que a "parede" de chamas causava, os Rebeldes tiveram que se afastar, por mais que quisessem ver Jimin. Era perigoso deixar o carro do comandante ali perto.
Jimin encarou os corpos que deixou por seu caminho. Dois guardas completamente incinerados e o outro, esfaqueado. Ele estava em estado completo de choque, olhava para as palmas de suas mãos e via a forma como as chamas pareciam dançar sobre elas. Via a luz bonita que cada faísca trazia consigo e arregalou os olhos, incrédulo. O fogo era inofensivo para ele, nem chegava a fazer alguma diferença em suas mãos.
A barreira de fogo havia diminuído de tamanho. O ruivo cruzou as chamas como se estivesse passando por uma simples cortina, podendo até mesmo ser comparado a uma divindade. Ele era imune a todo aquele calor, sua pele continuava intacta, mas suas roupas foram queimadas até as cinzas.
Todos os Rebeldes se curvaram quando Park Jimin apareceu, sem roupas, rodeado pelos corpos dos inimigos.
Jimin soube que tudo estava realmente acontecendo quando Jungkook também se ajoelhou, curvando-se para ele. Em todo o tempo que passou na base, nem mesmo uma vez passou pela sua cabeça que um dia veria Jungkook de joelhos para alguém, muito menos para ele. Toda aquela postura vinda do comandante fez com que o ruivo se lembrasse imediatamente da frase anterior de Yoongi, "O comandante só se curva diante daqueles que são superiores a ele"
E, de repente, enquanto via todos os Rebeldes o olhando como se ele fosse uma espécie de rei, e se lembrava de todas as palavras sobre Chayo, uma hipótese esquecida no fundo de sua mente foi completamente confirmada.
Ao passo que agora ele não tinha nada que o cobrisse, Taemin se apressou para ir ao seu encontro, chegando antes mesmo de Jungkook. O soldado tirou o casaco e a camisa, dando para o ruivo se cobrir do jeito que era possível.
— Obrigado – Jimin murmurou, sentindo as pernas fraquejarem. Ainda estava em choque, a ficha de que tinha matado mais pessoas tinha caído e agora ele se encontrava ainda mais perdido que antes.
Ele andou até o carro onde estava antes, pois sabia que o comandante havia separado algumas roupas para ele quando eles partiram para o deserto. O ruivo entrou no veículo para se trocar, a fim de evitar todos os olhares inusitados e todo o falatório sobre aquilo, e finalmente se permitiu ficar transtornado quando Jungkook também entrou no carro.
O comandante suspirou.
— Não me odeie, por favor.
Agora tudo fazia sentido. As conversas que Jimin não podia ouvir, tudo o que Baekhyun lhe disse sobre causar um transtorno em algumas pessoas do Reino, sobre todos saberem o seu nome, sobre Taemin lhe dizer que seus cabelos o lembravam fogo, a facilidade que foi para escapar do Reino com a ajuda daqueles "guardas", a proteção imediata de Jungkook...Ele era descendente de Chayo, a primeira comandante.
— Há quanto tempo você sabia? – Jimin perguntou, enquanto terminava de colocar a calça. Mal conseguia firmar o olhar para encará-lo, estava tão confuso.
As mãos de Jimin tremiam tanto que Jungkook teve que colocar a camisa nele. Delicadamente apoiou as pernas dele em seus joelhos e colocou tênis em seus pés pequenos, fazendo carinho em sua perna direita.
— Dois anos.
— Dois anos – Jimin balançou a cabeça, desacreditado. Ele percorreu as mãos pelo rosto e pelos cabelos, tentando se acalmar. – No dia que eu fugi do Reino, aqueles três homens...
— Taemin, Chanyeol e Yoongi. Aquilo foi um plano, já queríamos resgatar você desde o começo – Jungkook mordeu o lábio inferior, se sentindo culpado. – Toda aquela confusão que você causou com a rainha só tornou tudo mais fácil. Eu mandei que eles te trouxessem a salvo.
Taemin...Naquele momento, Jimin se lembrou na primeira conversa que teve com ele. Nela, o rapaz disse a seguinte frase "Eu sempre quis falar com você", e aquilo fazia muito mais sentido naquele momento. Ele provavelmente disse aquilo porque vinha observando o ruivo há muito tempo e, devido a toda a sua relação com a primeira comandante, o admirava. Isso fez Jimin repensar em todas as conversas que já teve ali.
— Você se lembra que no dia que nos conhecemos eu te mostrei a base inteira?Jimin, eu fiz isso porque aquilo tudo é seu – o comandante deu um sorriso pequeno com a lembrança e segurou a mão do ruivo, acariciando seus dedos pequenos. Jimin o encarou, seus olhos pequenos praticamente imploravam por um auxílio. – Eu sei que tenho muita coisa para te explicar, mas quando tudo isso acabar, quando deixarmos de ser libertários e virarmos um povo como qualquer outro...O que você fez hoje...Meu deus, nós precisamos de você, meu amor. Chung-Hee precisa ficar sabendo que o verdadeiro rei está aqui.
(X)
Quando voltaram para casa, Jungkook ficou impressionado ao perceber que haviam dezenas de novos rebeldes.
Depois que o anúncio de Keana correu pelos rádios do Reino, muitas pessoas decidiram seguir as suas instruções. Eram, em sua maioria, famílias que estavam cansadas da opressão e de toda a violência exercida pelo rei, que resolveram recorrer ao território rebelde. O comandante recebeu todos eles com um sorriso simples no rosto, independente de tudo que tinha acontecido na viagem de volta, e lhes deu boas vindas.
— Você é o comandante? – um garotinho lhe perguntou baixinho. Jungkook reparou que ele tinha um cicatriz feia na bochecha e o lábio cortado, como se eles tivessem passado por extremas dificuldades para chegar até ali, e de repente começou a pensar que muitas outras pessoas deveriam ter morrido tentando alcançar a base. Ele sempre teria sangue em suas mãos, independente do que fizesse.
A mãe dele o puxou para perto dela, como se estivesse o repreendendo por falar com um estranho e Jungkook franziu a testa, incomodado com o medo presente nos olhos da mulher. Era de se esperar que eles estivessem hesitantes em confiar nele, mas estava um pouco cansado de causar tanto medo em pessoas que não o conheciam realmente.
Jimin, que estava ao seu lado, tocou suavemente em seu ombro, como se o incentivasse a falar com o menininho. Jungkook se abaixou para ficar da altura dele e usou o tom de voz mais suave que conseguiu.
— Sim, eu sou o comandante, pequeno. Está precisando de alguma coisa?
O menino desviou o olhar e abaixou a cabeça.
— Você luta? Vai lutar por nós?
E, depois de ter dito que sim, Jungkook jurou nunca mais se esquecer daquela conversa.
Quando todos os recém-chegados foram decentemente instalados, eles finalmente puderam arrumar tudo para o jantar.
Jungkook e Jimin sentaram um do lado do outro na mesa do canto do pavilhão, antes mesmo de pegarem alguma coisa para comer, a fim de conseguir alguma privacidade.
— Me desculpe por não ter te contado sobre tudo – o comandante falou, o encarando com seriedade. Jimin ergueu o olhar, interessado no que ele tinha para dizer. – Eu não queria colocar você em risco, ao mesmo tempo em que não poderia adivinhar de que lado você estava, o que você podia fazer, era muito perigoso deixar que mais pessoas soubessem disso. Muitos rebeldes acreditavam que o neto de Chayo estava morto e Yoongi achou melhor deixar desse jeito até que soubéssemos do que exatamente você era capaz. Sinto muito por ter escondido a verdade sobre você, mas eu realmente só fiz isso para te proteger.
— Quem do Reino sabe?
— A maioria das pessoas da elite. Alguns soldados...Poucos, na verdade. Mas ninguém nem poderia imaginar que você consegue controlar o fogo, isso estava fora de cogitação até ontem.
Jimin se lembrou que, no dia da inspeção, a rainha havia comentado sobre a morte da sua mãe, o que acabou por tirá-lo do sério e o fez agredir a mulher. Seus pais foram tirados dele muito cedo, ele não deveria ter nem dois anos, então o ruivo tinha memórias muito pobres dela.
— Por isso mataram a minha mãe – Jimin respirou fundo, tentando juntar todos os acontecimentos de sua vida em uma linha. Jungkook confirmou. – Por quê me deixaram vivo então?
— Eu não sei. Talvez Chung-Hee tivesse planos para você, isso tudo é muito confuso. A única coisa certa agora é que todo mundo, inclusive eu, achava que esse poder era apenas uma lenda sobre ela, e, para a sua própria segurança, vamos deixar assim por enquanto.
— Isso é tão estranho – Jimin respirou fundo, apoiando a sua cabeça na mesa. Jungkook fez um carinho demorado em sua nuca, confortando-o como conseguia. – Apenas...Não me esconda mais nada, Jungkook. Por favor.
— Não vou. Nunca mais vai acontecer – ele garantiu, penteando seus cabelos para trás por pura mania.
Eles ficaram em um silêncio confortável, apenas se encarando e fazendo carinho um no outro. Se estivessem prestando atenção nas expressões faciais que as pessoas ao redor deles faziam, iriam reparar que uma grande parte dos Rebeldes já sabia da espécie do romance que eles estavam mantendo. Assim que Jimin ergueu um pouco a cabeça para encará-los, todos desviaram o olhar.
Depois de conversarem por mais algum tempo, eles foram pegar os seus pratos. Jimin falou com alguns dos rebeldes que já tinham mais intimidade, e trocou algumas palavras com Luhan (acabou por descobrir que o chinês era muito legal). O pavilhão estava uma bagunça naquele dia e as pessoas que trabalhavam na cozinha ainda estavam colocando os copos em algumas mesas, apressadas. Infelizmente, Jimin não pôde sentar com Jungkook novamente, já que o comandante fora chamado para sentar ao lado de Yezi, na ponta da mesa.
A líder do Clã carregava com ela uma garrafa de vidro, que abrigava um líquido esbranquiçado, dizendo que aquela ocasião merecia um brinde e uma festa, coisa que os Outros sabiam fazer como ninguém, por isso havia trazido uma bebida alcoólica como uma espécie de presente para o comandante e seus mais próximos aliados. A bebida foi servida e o jantar foi finalmente iniciado.
Yoongi pegou o copo de Jungkook e bebeu um pouco do líquido antes de deixar que ele experimentasse. Obviamente, um mestre tão experiente quanto ele jamais deixaria que o comandante fosse o primeiro a consumir algo vindo de um "inimigo", e isso não passou despercebido por Yezi, que lançou um olhar lascivo para o mais velho.
— Dá para fazer uma torta de climão só de ficar perto daqueles dois – comentou Taemin, que se sentou ao lado de Jimin, sempre sorridente.
Os dois rapazes já tinham se entendido depois daquela confusão do beijo, eles conversaram muito tempo sobre aquilo no dia anterior (obviamente antes do comandante levar Jimin à praia)
— Sim. Yoongi está exagerando demais, acho que Yezi já teria feito algo de ruim se realmente o quisesse – Jimin falou, comendo um pedaço da carne servida.
Taemin deu de ombros.
— Só sei que eles são muito estranhos.
Jimin achou melhor não perguntar a Taemin o porquê de ter escondido a verdade sobre ele. Queria poupar o amigo de todo aquele interrogatório, já havia entendido algumas coisas com Jungkook.
Eles passaram algum tempo conversando e discutindo aquela aliança, depois Jimin voltou a comer e pensar sobre seus próprios problemas. Estava extremamente confuso, assustado e culpado por tudo que fez. Ele sabia que tinha sido necessário, que era merecido, mas não conseguia deixar de sentir remorso pelos homens que matou na estrada. Em uma conversa em particular, Jisoo lhe disse que matar era um caminho sem volta; depois que a pessoa fazia uma vez, iria repetir uma hora ou outra, e Jimin descobriu por experiência própria que aquilo era verdade. Por um outro lado, temia ficar igual Yoongi ou Jungkook, que tinham tanto sangue em suas mãos que já nem mais se importavam se escorresse mais um pouco...Por outro, se sentia extremamente poderoso em controlar vidas.
De repente, Taemin começou tossir ao lado dele, interrompendo seus pensamentos. De início o ruivo não olhou para ele, achava se tratar apenas de um engasgo, mas quando a tosse ficou cada vez mais alta e sufocada, ele se virou para o rapaz.
O rosto do soldado começou a ficar vermelho e os olhos, lacrimejantes. As mãos dele tentavam bater em seu peito e abanar a boca, como se isso fosse ajudar em alguma coisa. O Park observou, de olhos arregalados, quando suas mãos começaram a tremer e o corpo de seu amigo ameaçou cair para trás.
O ruivo rapidamente se moveu para segurá-lo, antes que atingisse a grama debaixo deles, finalmente chamando atenção de todos do pavilhão. Os outros também estavam tão assustados quanto ele, muito surpresos com o que estava acontecendo e sem entender o problema. Alguns se colocaram de pé, ainda hesitantes em chegar perto dos dois rapazes. Os olhos pequenos de Jimin correram pela mesa, curiosos por qualquer coisa que pudesse ter causado esse efeitos no outro, mas tudo que ele tinha consumido era a bebida.
Não podia ser a bebida, afinal as outras pessoas também beberam e nada daquilo tinha acontecido. Até o próprio Jungkook havia bebido um gole.
Hoseok, Taehyung e Jisoo se levantaram para ajudá-lo a carregar o corpo de Taemin, que naquela hora sofria espamos. Os quatro fizeram um acordo silencioso de colocá-lo delicadamente no chão, um pouco afastado das mesas, já que o caminho até a enfermaria seria muito longo e Jimin não sabia se eles teriam tempo o suficiente para chegar até lá sem causar mais problemas.
O estado de Taemin parecia pior. Ele ainda estava tremendo e suas pupilas estavam dilatadas, o que assustou ainda mais os outros Rebeldes. baba escorria de sua boca e a respiração estava completamente descompensada.
— Ele precisa de espaço, se afastem. Jimin, quero que segure a cabeça dele para fazer parar de tremer e não deixar bater no chão – foram as primeiras ordens do médico. Jimin fez o que ele mandou, encarando Taemin e sentindo as mãos trêmulas do rapaz se colocaram sobre as suas. Hoseok tirou do bolso uma pequena lanterna, que geralmente usava para ver quando as gargantas das crianças ficavam inflamadas por algum motivo.
Depois de olhar o céu de sua boca, Hoseok franziu a testa e encarou Jimin, as feições banhadas em nervosismo. Só uma palavra dita pelo médico já foi o suficiente para fazer quase todos os presentes darem um passo para trás.
— Envenenamento.
Naquele momento, a grande maioria dos Rebeldes se levantou e todos apontaram as armas (brancas e de fogo) na direção dos que vieram do Clã. Yezi, Luhan, Kris, Tao e Rosé foram obrigados a subir em uma das mesas, ficando devidamente encurralados sob a mira dos que estavam embaixo. A lógica usada pelos rebeldes para definir os culpados era a seguinte: Se Taemin não tinha comido nada, só bebido, e a bebida foi trazida pelos Outros, certamente a culpa foi deles, certo?
Por mais que essa sentença estivesse em comum acordo de quase todos, os Rebeldes não fariam nada que Jungkook não
ordenasse, então apenas continuaram com as armas empunhadas. O comandante, que já assistia a cena há algum tempo, olhou na direção dos "prisioneiros" e trincou o maxilar, ato que ele repetia muito quando estava nervoso, dizendo algumas palavras no dialeto deles. Palavras essas que literalmente significavam "Nenhum deles sai daqui enquanto isso não for resolvido. Destravem as armas, estejam prontos para atirar"
— Comandante... – Jimin chamou, buscando o olhar de Jungkook como forma de apoio.
O mais novo percebeu o jeito que seu lábio inferior tremia de nervoso e preocupação, imediatamente querendo fazer qualquer coisa que pudesse melhorar toda aquela situação. Ele já tinha aceitado e assumido para si mesmo que o ruivo havia virado a sua fraqueza em todos os aspectos, era capaz de literalmente qualquer coisa para vê-lo bem, mas estava de mãos atadas naquele momento.
— Hoseok, não tem nada que dê para fazer? Pense bem – Jungkook perguntou, aflito. Era admirável que, mesmo que tivesse suas desavenças com Taemin, ele ainda tentaria com todas as forças salvar a sua vida, porque sabia que ele era um bom amigo para todos e que o seu exército perderia um excelente soldado. – E se você tentar tirar isso do corpo dele?
Hoseok semicerrou os olhos, pensando naquela hipótese. Enquanto isso, Taemin estava prestes a vomitar, como se quisesse tirar aquilo do corpo dele, mas todos ali pareciam concordar que talvez fosse tarde demais.
— Eu posso tentar, mas essa é uma substância sobre a qual não sei nada. Talvez...Talvez seja igual a da última vez, é um grande risco.
Antes de Jungkook virar comandante, os Rebeldes e o Reino estavam em um conflito tão grande que Chung-Hee teve a estúpida ideia de começar uma guerra biológica. Ele mandou para a base ratos contaminados com um vírus muito potente e letal, que, na época, exterminou quase metade da população rebelde. Felizmente, isso não foi o suficiente para obrigá-los a se render.
— Nós deveríamos matá-lo antes que essa merda se propague – um rebelde declarou, mudando a mira de Yezi para Taemin, que arregalou ainda mais os olhos.
Era interessante, ainda que assustador, pensar no porquê daquele homem ter se manifestado daquela forma. O medo mexia com a cabeça das pessoas de formas curiosas, muitas vezes as deixava agressivas e irracionais. Exatamente por isso que Jungkook confiava em pouquíssimas pessoas, afinal, todo o resto estava sujeito a mudanças causadas pelo medo e pela pressão.
Jimin não pensou duas vezes antes de se colocar entre a arma e o amigo, afinal era de seu costume mostrar altruísmo.
— Não, você não pode! Nós nem sabemos se isso pode ser espalhado e, além do mais, ele não foi único que tomou...
— Saia da minha frente ou eu atiro em você também! – o homem falou, destravando o AK-47 em direção a Jimin. Isso foi o suficiente para Jungkook intervir.
O comandante foi rápido em segurar o fuzil pelo seu cano e o empurrar para cima com força, para que atingisse o maxilar do sujeito. Com a dor causada pelo impacto e pelo empurrão, o soldado recuou alguns passos para trás e acabou perdendo a arma para ele. Jungkook já estava furioso antes, aquilo só contribuiu para deixá-lo pior, seus olhos expressivos condenavam o homem a sua frente por si só.
O rebelde estava extremamente confuso com a atitude do seu superior. Afinal, se aquele fosse o "velho Jungkook", para evitar riscos ele já teria ordenado que seus soldados matassem Taemin e torturassem todos os membros presentes do Clã da Areia.
Jungkook pegou o fuzil e o prendeu em si com a sua bandoleira, ainda fitando o homem, que agora segurava o seu maxilar dolorido.
— Nunca, sob nenhuma hipótese, aponte uma arma para ele novamente. Se mover contra ele signica se mover contra mim.
Jimin mal ouviu essa frase. Ele não conseguia prestar atenção em nada daquilo, não deixava de olhar para Taemin nem por um segundo.
— O que podemos fazer, então?
Hoseok suspirou, arrasado.
— Jimin, eu sinto muito.
— Tem que ter outra saída. Ele não pode...
— Não dá tempo – dessa fez foi Jisoo, que estava ajoelhada ao lado deles, a se manifestar. Ela estava com uma aparência horrível e seus olhos ficaram vermelhos por causa do choro recente, já que ela também era muito próxima de Taemin, os dois se conheciam desde mais novos. O ruivo a olhou, completamente sem chão. – Eu sei que você não está pronto para deixá-lo ir, Jimin, mas ele está sofrendo.
Taehyung se pôs ao lado de Jimin e colocou uma mão protetora em seu ombro, fazendo um carinho confortante. Infelizmente, aquele belo gesto não mudava o fato de que agora o Park estava completamente desolado. O mais velho o fitou, procurando no rosto de seu pequeno irmãozinho alguma resposta para dar fim à toda aquela angústia, e era óbvio que essa resposta não viria.
— Jimin, por favor... – a voz baixinha de Taemin foi ouvida. Ele esticou a mão e tocou a do ruivo, que prontamente a segurou. Os dedos finos do homem deitado seguiram uma linha que ia de seu rosto até o coldre onde guardava a sua arma, a arma que o próprio Taemin lhe deu. Os dois se olharam por um tempo e Jimin sentiu uma queimação familiar no peito, pois sabia o que ele silenciosamente pedia. – P-Por favor.
Jimin balançou a cabeça, acariciando o seu rosto.
— Não, ainda não é a sua hora. Se a gente tentar...
— Jimin, eu amo você – o outro o interrompeu. Seus olhos e suas veias estavam saltadas, o rosto ainda se mantinha vermelho e agora parecia mais difícil para respirar. Ele deveria estar sentindo muita dor se estava a ponto de implorar para ser morto. Apesar disso, ele fez um esforço enorme para se inclinar um pouco e sussurrar em seu ouvido, para que apenas ele pudesse ouvir. – N-Não se esqueça de mim.
— Eu não vou. Nunca.
E haviam mais coisas que Jimin queria ter dito. Queria ter se desculpado por não conseguir vê-lo do jeito que ele o via. Ter o abraçado por uma última vez, ou até mesmo conversado sobre futilidades, como geralmente faziam. Mas nada parecia bom o suficiente para sair de sua garganta, então apenas se calou e deixou um beijo calmo em sua bochecha.
No momento em que Taemin fechou os olhos e deixou um pequeno sorriso enfeitar o seu rosto, Jimin soube que estava na hora e sua mão dormente segurou a arma.
Quando o cano gelado do revólver foi encostado à têmpora do soldado, Jimin podia jurar que ninguém ali ousava fazer um som. E todo essa atmosfera de suspense e apreensão foi brutalmente estilhaçada pelo barulho do tiro, o clarão característico emitido por ele e o sangue aos poucos se espalhando pela grama.
Jungkook, que apenas escutava de cabeça baixa, respeitou o tempo de Jimin. As coisas que mais admirava no rapaz eram a sua força e a sua bravura, que nunca falhavam em aparecer, mas sabia que não deveria exigir demais de seu amado. Imaginava o quanto aquilo deveria estar sendo difícil para ele, já que, além de Taemin ser um de seus melhores amigos ali, também era mais uma pessoa que ele matava, então apenas resolveu deixá-lo absorver tudo aquilo, quietinho em seu canto.
Jeon se ergueu, forçando a sua melhor expressão de indiferença e voltando a encarar Yezi.
— Você tem uma reposta para mim? – o comandante andou lentamente em direção aos Outros, a qual estavam debaixo da mira de três armas rebeldes. Jungkook brincou com o fuzil em sua bandoleira, percorrendo os dedos superficialmente pelo gatilho – Um dos meus soldados morreu depois de ter tomado a bebida que você trouxe.
A mulher estreitou os olhos, encarando Jungkook firmemente.
— Com todo o respeito, comandante, mas você só pode ser muito estúpido se acha que eu iria tentar algo contra um dos seus no meio do seu território, sem nenhuma chance de fuga.
O moreno sorriu de deboche, balançando a cabeça.
— Você realmente não tem medo de morrer, tem?
Enquanto eles discutiam, Jimin, que agora carregava um olhar vago e cheio de mágoa, andou em direção a parte da mesa onde a garrafa esquecida jazia. Subiu em um dos bancos e, sem realmente pensar em nada, levou o objeto até os lábios e tomou um pouco da bebida.
No momento, todos os olhares se voltaram para ele. Jungkook, que até então estava distraído com a discussão, o encarou com os olhos arregalados e até mesmo largou a arma por puro choque. Não entendia o que estava acontecendo, não sabia o que Jimin estava fazendo, a única certeza que o comandante tinha naquela hora era que todo o mundo ao redor havia deixado de existir e ele só conseguia prestar atenção em Jimin.
— Explique-se – Yoongi ordenou, vendo que tudo o que Jimin tinha feito era uma careta por causa do álcool presente na bebida. Nada havia acontecido e só então Jungkook pôde voltar a respirar normalmente.
Jimin suspirou, direcionando o olhar para Jeon e o resto de seu povo.
— Não está na garrafa, só estava no copo dele.
— Como eu disse – Yezi encarou Jungkook ferozmente. Os outros membros do Clã da Areia também estavam furiosos, com exceção de Luhan, que não parecia entender muito bem o que estava acontecendo. Todo aquele coreano, os sotaques diferentes, as vozes...Era muito confuso para o chinês. – O seu povo foi responsável por isso. Não tente me culpar pela sua falta de controle, Jeon.
Jungkook tomou alguns segundos para pensar. Se não fizesse isso, certamente iria ter arrancado a cabeça da líder do outro povo e queimado todos os outros, só por todo aquele transtorno. Porém, como Yoongi havia lhe ensinado há sete anos, nenhuma decisão deveria ser tomada por impulso, o que fez com que o comandante respirasse fundo e encarasse Yezi com olhos mais mansos.
— Acho melhor você voltar para o deserto. Keana vai te acompanhar, quero ter certeza que um dos meus vai estar entre vocês e, assim que Baekhyun chegar aqui, nos reuniremos de novo para decidir os detalhes pendentes do plano.
Foi a decisão de Jungkook, e Yezi só conseguiu concordar, afinal não era bom começar uma briga naquela hora. Ambos os povos tinham muita coisa a perder se a aliança fosse comprometida, afinal a junção dos seus exércitos era como uma garantia de que logo se veriam livres do grande inferno que era o Reino.
— Líder, eu posso ficar aqui? – Luhan perguntou depois que sentiu a poeira abaixar um pouco. Ele conseguiu fazer a proeza de ganhar uma careta de Yezi e Jungkook ao mesmo tempo, mas isso não o impediu de continuar falando. Yoongi o encarou com uma expressão entediada. – Por favor, eu preciso ver o meu irmão. Disseram que Sehun chega em dois, talvez três dias.
Jungkook e Yezi entraram em um consenso para autorizar a manter Luhan ali, afinal os Outros já seriam evacuados para a base de qualquer jeito mais tarde.
Caso o clima de desconfiança entre os novos aliados aumentasse ainda mais e algum conflito acontecesse, o comandante achava que seria bom ter um refém deles ali, se fossem precisar de um.
Depois dos membros do Clã e a sua líder terem se retirado, alguns Rebeldes começaram a encher Jimin de perguntas, já que ele era o que estava mais próximo de Taemin na mesa. Jungkook percebeu que ele estava muito incomodado com aquilo, afinal tinham pessoas que estavam deixando implícito que eles poderiam ter salvado o soldado se o Park tivesse prestado atenção nele um pouco antes.
Conhecendo Jimin do jeito que conhecia, o comandante sabia que ele não seria capaz de mandar as pessoas o deixarem em paz, ele era doce demais para isso.
Felizmente, Jungkook não era.
— Por que estão todos parados aí? Os que não comeram ainda, tratem de comer. Os que já terminaram, queimem o corpo no cemitério – o moreno ordenou, direcionando seu olhar para os outros. O cemitério dos Rebeldes ficava um pouco afastado da base, no meio da floresta, e infelizmente ficava cada dia mais cheio (porém, não de cadáveres). Como os corpos eram queimados, não haviam túmulos, então eles costumavam colocar cruzes de madeira com os nomes dos mortos entalhados. – Agora.
Um grupo voltou para as mesas, enquanto o outro – soldados, em sua maioria, rumou para o cemitério com o cadáver.
— Você pode ir até lá se quiser – Jungkook
o deixou livre para ir. Não era sempre que deixava que o povo (que não fossem a família ou amigos) visse a queima dos corpos, mas achava que Jimin merecia.
Entretanto, Jimin não parecia nem um pouco pronto para ver o corpo de seu amigo ser incinerado, pois continuou parado, apenas observando.
Novamente, eles se comunicaram por olhares e o mais novo rapidamente entendeu que ele queria sair dali. Jungkook o pegou delicadamente pelo braço e o levou até o seu quarto, para longe de todos aqueles olhares lascivos. Os dois fizeram a caminhada em silêncio, com as cabeças abaixadas, mas discretamente o moreno o fitava para ver se estava tudo bem – dentro do possível. Quando chegaram em seus aposentos, Jimin andou até ficar parado de costas para ele, no meio do quarto.
— Eu não posso fazer isso, Jungkook, não estou pronto para ser um rei. E-Eu não sou forte como você, e todos eles sabem disso.
O coração de Jungkook se quebrou quando ouviu a voz embargada do outro. Ele chorava de verdade agora, de soluçar, e essa era a primeira vez que o mais alto o via daquele jeito. Nas últimas vezes, foram apenas murmúrios baixinhos, lágrimas nos olhos...Agora, ver Jimin todo encolhido em seu próprio corpo, chorando daquele jeito, foi capaz de fazê-lo acreditar que o seu amor por aquele garoto não conhecia nenhum limite. O comandante sentia a necessidade de protegê-lo de qualquer coisa.
— Você vai ser o melhor líder que qualquer um de nós já viu – foi tudo o que Jungkook conseguiu pensar, pois era a mais pura verdade. O que diferenciava Jimin dos outros líderes era a sua humanidade, sua gentileza e sua forma peculiar de encarar as outras pessoas. Isso, aliado com o seu dom e um pouquinho de treinamento, o faria extremamente poderoso. – Jimin, eu treinei durante a minha vida inteira para ser comandante e mesmo assim não sou nem metade do homem que você é. Eu nunca teria coragem de fazer o que você fez hoje.
— O que eu fiz hoje? Quer dizer matar mais pessoas? – Jimin balançou a cabeça, secando as lágrimas. Ele se recusava a virar para Jungkook, odiava chorar na frente dele. – Taemin me amava, Jungkook, e eu atirei nele sem nem pensar duas vezes. É isso o que acontece quando as pessoas se aproximam de mim...Elas saem machucadas.
"Ele já ia morrer de qualquer jeito", foi o que Jungkook pensou, mas sabia que não poderia ser tão insensível. Ele entendia que, diferente dele, Jimin não estava tão acostumado a lidar com a morte de pessoas próximas, então teria que ser muito paciente e empático com o ruivo.
Se fosse outra pessoa na frente dele, ele imediatamente exigiria uma postura mais equilibrada.
— Você não o matou, meu amor. Ele estava sofrendo muito e precisava de alívio, foi isso que você deu para ele. Você o libertou.
O que Jimin não percebia era que já estava se tornando tão forte emocionalmente quanto Jungkook. Ele, mesmo estando completamente confuso e culpado por conta das suas ações, se recusou a fraquejar na frente de todos, se sacrificou e ainda deu um jeito de provar seu ponto em meio a toda aquela situação deplorável. O ruivo tinha nascido para ser um líder, não um seguidor.
Jimin se virou para ele, finalmente mostrando o quanto seus olhos perdidos imploravam por alguma direção para seguir. Jungkook abriu os braços e o menor rapidamente se pôs no meio deles, descansando a cabeça no vão de seu pescoço. O mais jovem segurou firme em sua cintura e o abrigou em seu peito, fazendo ali o seu lar, sussurrando que estava tudo bem, que eles estavam juntos, que ele podia chorar por quanto tempo quisesse. Embora o ruivo não respondesse, apenas assentia.
Depois de mais algum tempo, Jimin arregalou os olhos como se uma epifania tivesse o atingido.
— Era para você ter morrido hoje.
— Como assim? – Jungkook franziu a testa, talvez interpretando errado a sua frase. O Park se afastou de seu corpo e se sentou na cama, pensativo. – O que quer dizer?
— Você estava sentado perto de mim e nós estávamos conversando, isso foi antes dos copos serem colocados nas mesas. Depois que colocamos a comida e voltamos para a mesa, você mudou de lugar, eu não, então Taemin sentou no lugar ao lado do meu, e nessa hora os copos já estavam lá. Quem quer que tenha feito isso não quis matar ele, Jungkook, essa pessoa queria matar você.
O comandante limpou a garganta, percebendo que aquele cenário fazia muito mais sentido, afinal ninguém tinha motivos suficientes para querer matar Taemin. Ele achava que toda aquela situação do natrona estava controlada, mas pelo visto estava completamente enganado.
— Menos alguns minutos e você estaria morto...
— Ei, está tudo bem – Jungkook sentou ao seu lado na cama, o tranquilizando. – Eu estou bem aqui, nada vai acontecer comigo.
— Eu preciso tanto de você, Jungkook – o ruivo confessou, segurando firmemente a sua camisa e o puxando para perto de novo. – Você tem que prometer...Prometa que eu nunca vou te perder.
Em todo o tempo que ficaram juntos, foram poucas as vezes que Jimin e Jungkook disseram "eu te amo" um para o outro. Simplesmente porque achavam que essas três palavras eram muito pouco para definir todos os sentimentos que mantiam um pelo outro. Toda a proteção que tinham um com o outro, os olhares, os carinhos, as noites de amor e todas as conversas susssurradas...Eles conseguiam dizer tudo aquilo sem precisar falar absolutamente nada.
— Eu não posso prometer que vou ficar vivo, meu amor – Jungkook fez uma pausa, enquanto os dois continuavam tentando de alguma forma transmitir força um para o outro. O comandante beijou a sua testa com carinho, descendo para a pontinha de seu nariz e em seguida deixando um selinho em seus lábios, o louvando como a obra de arte que era. – Mas eu juro que nunca, nem mesmo por um segundo, vou deixar de lutar por você.
Jungkook nunca descumpriu aquela promessa.
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