História Karma - Escolhas

Sinto meu coração apertar ao ver a expressão desolada de Lauren pelo espelho.

Após entrarmos em casa, logo subimos as escadas e eu a coloquei debaixo do chuveiro para tomar um banho, enquanto ela se trocava e me esperava em meu quarto tomei o meu banho, logo depois penteei seu cabelo e agora secava o mesmo.

Jamais havia visto minha namorada tão triste como naquele momento, seus olhos estavam sem vida alguma e toda a sua linguagem corporal deixava claro o quanto ela estava desolada com aquela notícia triste. O pior de tudo era que eu não tinha a menor ideia do que fazer para consola-la, nada poderia ser feito.

- Venha, vou te deitar enquanto eu seco meu cabelo, depois podemos ver um filme, o que acha? – Assente roboticamente com a cabeça.

Acompanhei Lauren até a minha cama e a deitei ali, cobri seu corpo e desliguei as luzes deixando apenas a televisão ligada. Me abaixei ao lado da cama e seu olhar logo focou no meu, um pequeno bico se formou em seus lábios quando acariciei seu rosto e suspirei alto ao vê-la tão frágil daquela maneira.

- Esse é o momento de chorar tudo o que você sente vontade, Lo. – Acaricio sua bochecha – Então não tenha vergonha de mostrar o quanto isso te machuca. – Puxa o ar, tentando evitar de chorar – Você está segura aqui e será confortada, amor. – Ela começa a chorar de novo.

- Por favor, não me deixa sozinha. – Sinto meu coração apertar ao ouvir aquelas palavras.

- Nunca. – Minha namorada move seu corpo e eu deito ao seu lado – Eu estou aqui, amor.

Lauren agarrava minha blusa e chorava contra meu peito, eu acariciava seus cabelos e sentia um bolo se formar em minha garganta ao vê-la tão destruída. Notei minha mãe passar pela porta e cruzar os braços ao nos ver daquela maneira, mas também notei a pena atravessar sua expressão quando ela percebeu o quão triste Lauren estava e o quanto ela precisava ser consolada naquele momento.

Aos poucos o choro foi diminuindo, até que minha namorada ficou em silencio e então sua respiração ficou ritmada. Permaneci parada ali, fazendo carinho em seus cabelos e nuca, olhando fixamente para a televisão. Depois de alguns minutos peguei meu celular e enviei mensagem para todos os nossos amigos, informando o que havia acontecido, e então enviei uma mensagem para Taylor informando que Lauren estava comigo e que eu sentia muito pela perda dela.

Quando meu celular começou a vibrar indicando que minha sogra queria falar comigo, eu logo ajeitei Lauren cuidadosamente na cama, colocando um travesseiro para ela abraçar. Saí cuidadosamente da cama e atendi a ligação, ouvindo a voz tremula de Clara do outro lado da linha.

- Não tem problema, Clara. – Murmuro baixinho, olhando Lauren deitada em minha cama pela fresta da porta – Eu vou fazer companhia para ela, e garantir que ela fique bem, não se preocupe com isso.

- Tudo bem, Camila, eu agradeço. – Escuto seu suspiro através do telefone e mordo meu lábio inferior.

- Sinto muito pela sua perda, Clara, espero que seu coração seja confortado nesse momento difícil e se você precisar de qualquer coisa é só ligar. – Escuto um soluço da parte dela.

- Obrigada, Camila. – Escuto alguém falar com ela – Tenho que desligar, obrigada mais uma vez, nos falamos mais tarde, cuide de Lauren por mim.

- Pode deixar. – Desligamos e eu fechei a porta para garantir que nenhum barulho iria acorda-la.

Desci as escadas e encontrei toda a minha família na sala, todos me olhando ansiosamente, doidos para saberem qualquer coisa sobre Lauren e como ela estava, Sofia principalmente. Minha irmã havia ficado muito triste quando viu Lauren chorando daquela maneira. Contei sobre a ligação de Clara e, surpreendentemente, meus pais foram bem receptíveis e compreensíveis sobre o fato de Lauren dormir ali naquela noite.

Pedimos comida que “reconforta”, de acordo com o meu pai; Sofia já estava terminando um desenho para Lauren e minha mãe conversava sobre o que poderia fazer para ajudar, passei o celular de Michael para que ela pudesse checar se ele precisava de ajuda com algo, ela prontamente ligou para ele.

Após alguns minutos lá embaixo subi as escadas e entrei no quarto, vendo Lauren ainda dormindo serena, chequei as mensagens que haviam em meu celular e respondi todos os nossos amigos que estavam preocupados e dispostos a fazer o que fosse necessário para ajudar a minha namorada. Acabamos combinando de nos vermos todos pela manhã no velório e então passaríamos a tarde distraindo Lauren.

- Camz? – Prontamente deixo o celular de lado – Camz?

- Estou aqui, amor... – Me aproximo, subindo na cama – Eu desci para ver o que meus pais fariam de jantar, decidimos pedir algumas coisas para comer.

- Eu não estou com fome. – Suspiro e me aproximo – Podemos apenas ficar deitadas?

- Ei, você tem que comer, nem que seja um pouquinho. – Acaricio seus cabelos, me deitando ao seu lado – Depois podemos deitar novamente e dormir mais, ok?

- Tudo bem. – Me abraça, afundando o rosto em meu pescoço – Obrigada, por existir e por estar aqui.

- Não precisa agradecer. – Ela suspira alto – Eu amo você, Lo.

- Eu também te amo.

- Me desculpe por ter brigado com você mais cedo e não tentar entender o seu lado, você precisa de alguém que te apoie e não que julgue suas decisões, sejam elas quais forem.

- Me desculpe por não levar sua opinião em consideração. – Suspiro alto e acaricio seus cabelos – Eu agradeço você por estar aqui e por se importar comigo.

- Sempre. – Beijo sua testa.

Lauren e eu percorremos um grande caminho em nossa relação, passamos de pessoas que se abominavam para amigas, então nossa amizade ficou ainda mais forte, até que o amor falou mais alto e passamos a ter o que temos hoje. Acredito que depois de todas essas fases que passamos juntas, tínhamos muita liberdade para dizermos o que bem entendíamos uma para a outra, a única dificuldade que encontrávamos era de nos ouvirmos em situações delicadas.

Tanto minha namorada quanto eu possui personalidade forte, o que acaba tornando as coisas difíceis as vezes, mas nada que não pudéssemos resolver.

(...)

Encaro minha namorada de longe, ela conversava com Normani e Dinah, ambas diziam alguma coisa e minha namorada parecia muito séria, mais do que o normal. Notando o clima pesado entre elas acabei chamando todas elas para juntarem-se a nós no sofá, apareceram com os baldes de pipoca e ocuparam seus lugares, minha namorada logo jogou sua perna sobre a minha e começou a prestar atenção no filme.

O enterro havia sido pela manhã e nós ficamos encarregados de distrair Lauren, oferecemos companhia para seus irmãos também, mas ambos optaram por saírem com seus próprios amigos. Depois de Anne servir a comida favorita da minha namorada no horário do almoço, acabamos tomando conta da sala para fazer uma maratona de filmes.

Toda vez que olhava para Lauren notava a dor e raiva em seus olhos, o quanto ela parecia frustrada e devastada com aquela morte, e doía em cada pedaço de mim não poder fazer absolutamente nada para ajudar.

- Podemos fazer outra coisa? – A voz rouca de Lauren sobressai sobre o filme.

- O que você quer fazer? – Ally questiona interessada.

- Qualquer outra coisa, não aguento mais ver filmes. – É honesta, acaricio sua perna – Podíamos sair.

- Mas está chovendo. – Dinah geme – Vamos fazer algo que dê para ficarmos dentro de casa.

- Jogar algum jogo? – Sugiro e todos me encaram – Uno? Talvez banco imobiliário? – Harry levanta, coçando o queixo.

- Vou ver quais jogos meu padrasto tem em seu escritório.

Nós realmente acabamos jogando alguns jogos, isso conseguiu distrair a cabeça da minha namorada por alguns instantes, ela chegou até mesmo rir quando jogaram três +4 em Dinah e ela acabou ficando dividida entra matar todo mundo ou desistir do jogo logo em seguida. Ficamos na casa de Harry até tarde, Anne pediu pizza e jantamos lá, somente depois da janta que todo mundo acabou se despedindo.

Hoje seria eu a dormir na casa de Lauren, ela disse que não queria ficar em seu quarto sozinha ou ter que lidar com a sua família. Assim que entramos em sua casa pude facilmente notar o clima pesado ali, abracei meus sogros e notei que meus cunhados não estavam ali e que provavelmente ficariam na casa de seus amigos. Entramos no quarto de Lauren e logo peguei a mochila que eu havia deixado lá mais cedo, informando minha namorada que eu tomaria um banho antes de deitarmos.

Saindo do banheiro já de pijama notei Lauren guardando algumas cartas em envelopes e colocando selos logo em seguida. Abracei minha namorada por trás e beijei o topo de sua cabeça, sentindo sua caricia terna em meu braço, ela não demorou para me beijar e então levantar para tomar banho. Sem conseguir evitar observei os destinatários dos envelopes, todos eram de faculdades, ela havia tomado sua decisão e iria enviar.

Fiquei deitada vendo televisão, alguns instantes depois Clara entrou no quarto e me lançou um sorriso triste, sentando-se na beirada da cama, segurei sua mão e suspirei ao ver seus olhos marejados.

- Obrigada por ficar com ela, Camila. – Murmura – Não sei se Lauren já te disse, mas a relação dela com os avós é muito forte, ela não verbaliza muito, mas deve estar doendo nela tanto quanto está doendo em mim.

- Não precisa agradecer, Clara, eu disse para ela e digo para você, o que vocês precisarem é só me avisar. – Ela acaricia minha mão e suspira – Sinto muito pela sua perda.

- Obrigada, querida. – Suspira alto, deixando algumas lágrimas rolarem pelo seu rosto – É muito reconfortante ver que minha filha tem alguém que a ama de verdade e está disposta a ficar do lado dela nos momentos mais difíceis, e não só nos mais felizes. – Pisca para mim.

- Mãe? – Nos viramos – Está tudo bem?

Lauren era uma das pessoas com maior instinto protetor que eu já conheci em toda a minha vida, quando via alguém que ama sofrendo, ela é capaz de fazer qualquer coisa para ver aquela dor diminuindo. Naquele momento, sua dor conseguia ser dilacerante, mas Lauren tinha plena consciência que a dor de sua mãe conseguia ser pior, assim como sabia que ela poderia tentar –mesmo que sem sucesso- melhorar o humor de sua mãe.

- Está sim, querida, estou vendo se vocês precisam de mais travesseiros ou cobertores.

- Estamos bem. – Murmuro, soltando sua mão – Não é, Lo?!

- É sim. – Da a volta, sentando na cama – Não vamos demorar para dormir, amanhã temos aula cedo.

- Tudo bem, não deixem a televisão muito alta, caso forem assisti-la. – Assentimos, se levanta e dá uma última olhada pelo quarto – Durmam bem, meninas.

- Você também. – Falamos ao mesmo tempo.

Deitamos na cama e nos ajeitamos da mesma maneira de sempre, eu agarrada em Lauren enquanto ela fazia carinho ora em minhas costas ora em meu cabelo. Assistimos um episódio de Friends que passava na televisão, ou quase isso, já que nós duas estávamos mais distraídas do que tudo.

Queria encontrar uma maneira de conversar com Lauren, fazer ela expor melhor seus sentimentos, mas sabia que não teria tanto sucesso fazendo isso, ela ainda estava na fase de guardar para si como se sentia, então a melhor opção seria deixa-la em paz. Mas queria conversar com ela, sobre como ela estava se sentindo e qual havia sido sua decisão final de escolha da faculdade.

Quando discutimos sobre qual faculdade ela deveria ir, me senti uma pessoa horrível por dizer tantas coisas para ela, mas sabia que era necessário. Lauren não quer Direito, mas sua família sim. Lauren quer ter novas experiências longe de casa, mas não quer ficar longe de mim. Lauren não deve priorizar o que os outros querem, mas ela faz exatamente isso.

- Vi que você terminou de preencher os formulários das faculdades.

- Não quero discutir com você de novo, Camila. – É honesta, comprimo meus lábios.

- Isso significa que você escolheu Direito?

- Sim. – Suspiro alto.

Não queria ver ela fazendo algo que não quer, mas seria exatamente isso que iria acontecer.

- Tudo bem.

- Tudo bem? – Questiona confusa.

- É, tudo bem. – Acaricio sua cintura – É o seu futuro, quem escolhe é você. – Beijo seu ombro, sentindo um aperto em meu peito – Eu te amo e vou te apoiar em suas escolhas, sejam elas quais forem. – Mordo meu lábio inferior.

- Obrigada. – Apaga a luz do abajur – Posso desligar a televisão?

- Pode. – Me viro, vendo ela desligar a televisão, logo ela fica de lado e me puxa contra seu corpo para que possamos dormir de conchinha.

Meu coração batia muito acelerado, senti minha garganta fechar e uma vontade surreal de chorar me atingir. Sabia o quanto aquela decisão poderia vir a deixar minha namorada triste dali algum tempo, mas não iria mais interferir em suas decisões, deixariam elas do jeito que estão e mais tarde Lauren poderia vir mudar de ideia.

Após bons minutos em silencio pude sentir Lauren me puxar ainda mais contra seu corpo, seu nariz roçou em minha nuca e eu pude ouvi-la dizendo que me ama baixinho, o que me fez sorrir sozinha e apenas aumentou a minha vontade de chorar.

(...)

Acompanhei Lauren em todas as aulas daquela segunda-feira, nosso grupo se reuniu na hora do intervalo e todos garantiram de fazer Lauren sentir-se melhor. De longe pude ver Beatrice Miller nos encarar o tempo todo, qualquer um podia notar a raiva estampada em seus olhos ao ver o quanto Lauren e eu estávamos mais juntas que o normal naquele dia, mas nada que uma boa ignorada não servisse.

Após o termino da aula Lauren foi para o vestiário e eu ocupei um dos lugares na arquibancada, pegando meus cadernos para fazer minha lição de casa enquanto ela treinava. Instantes depois minha namorada apareceu ao lado de suas parceiras de time, todas elas conversavam e aqueciam juntas.

- Vocês acham que vão ficar juntas? – Automaticamente sinto meu corpo ficar em alerta, olho para o lado e vejo Beatrice de braços cruzados olhando o treino – Ela vai embora daqui, e vai te deixar sozinha, vai se esquecer de você.

- Você não sabe de nada. – Abaixo minha cabeça, focando meu olhar na matéria.

- Eu sei, isso é o que acontece com todos os casais idiotas do colegial. – Ri, dando de ombros, me encarando – Quem vai querer ficar com você, Cabello? – Passa a língua sobre os lábios – Seria muita sorte caso você conseguisse passar na mesma faculdade que ela, e duvido muito que ela queira que você a siga para qualquer lugar que ela for.

- Quem disse que eu vou ou quero ir para a mesma faculdade que ela? – Minto descaradamente.

- Você segue ela que nem um cachorrinho. – Me olha com raiva – Você é patética, fica andando com ela para cima e para baixo, como se todos fossem obrigados a ver vocês se beijando, me dá nojo. – Rosna, irritada – Duvido que não vai ser patética o suficiente para ir atrás dela onde quer que ela for.

Me sinto ofendida por ela, secretamente, saber o que nós iriamos realmente fazer. Nós tínhamos planos de ir para o mesmo lugar para que fosse possível viver nosso relacionamento mais facilmente, e não havia nada de errado em querer manter o que é bom.

- E isso diz respeito a você como? – Questiono irritada – O que Lauren e eu temos ou o que vamos ter ou fazer com nosso relacionamento daqui alguns meses diz respeito somente a ela e a mim. – Vejo que ela trinca o maxilar, irritada com a minha resposta – Você não sabe como nosso relacionamento funciona ou o que queremos para o nosso futuro, então cale a merda da sua boca.

Quando eu noto as palavras que haviam escapado de minha boca, sinto minha respiração ficar falha e me sinto mal. Eu jamais havia falado com ninguém daquele jeito.

Estava irritada e sob pressão nas últimas horas, havia guardado muitas coisas para mim e aquele havia sido o ápice, não poderia deixar Beatrice falar aquelas coisas para mim e tentar sair por cima, como se suas palavras não tivessem impacto nenhum em meu ego. Eu nunca havia sido o tipo de mulher que abdica o que quer por conta de outras pessoas, e não seria assim só porque amo alguém com tudo de mim.

- Camila? – Subo meu olhar, encarando minha namorada – Está tudo bem? – Beatrice bufa, se afastando – Ela te incomodou?

- Está tudo bem, amor. – Sorrio da melhor maneira que eu consigo – Gostei do novo uniforme.

- Gostou? – Sorri de canto, assinto – Eu também gostei. – Ajeita melhor o boné – O treino não vai demorar, ok? – Assinto, me levantando – Posso te levar comer alguma coisa depois...

- Precisamos fazer lição, hoje não. – Ela bufa e eu rio, aproximando meu rosto da grade para roubar um selinho – Bom treino, vá lá. – Acaricia minha mão, se afastando logo em seguida.

Vendo Lauren se afastar notei o quão dependente eu havia me tornado dela, não sabia mais enfrentar nenhuma batalha sem ter Lauren ao meu lado para me defender ou ‘amortecer’. Pela primeira vez em muito tempo eu havia me defendido sem a ajuda de ninguém, o que me deu um enorme alivio.

Gosto da ideia de namorar alguém que ao mesmo tempo que é tão igual a mim, consegue ser tão diferente. Aprendi tanta coisa com Lauren nos últimos tempos, coisas que vou levar para sempre na minha vida, coisas que me tornaram mais forte como pessoa e mulher, coisas que me prepararam para o futuro.

Encaro minha namorada de longe, sua bunda arrebitada enquanto ela rebate a bola e logo se vira para ver se eu havia visto seu movimento perfeito, estico meu braço e faço um positivo com a mão, arrancando um sorriso tímido dela.

Vai ver Beatrice tivesse realmente razão, Lauren e eu éramos mesmo muito grudadas, mas enquanto isso não incomodasse nós duas, não iriamos nos importar com a opinião de idiotas como ela.