_____'s P.O.V.
Solucionar crimes é meu trabalho e, de vez em quando, descobrir a trama por trás de um assassinato é inevitável. É assim que a morte faz parte do meu cotidiano, mas ainda é difícil me acostumar com ela. É que a morte é um mistério de muitas faces. Para quem morre, é o último Alerta, Letal. Para quem mata, é sinônimo de Adrenalina e Volúpia. Para quem vive o luto, a morte é Sádica, Íntima.
A morte sempre é o mais Infame dos crimes, porque é o último ponto final.
A morte é dolorosa, misteriosa. E a noite em Lascívia fica muito mais escura diante dela. Luzes vermelhas e azuis giram no ritmo das sirenes acima das ambulâncias e viaturas da polícia, iluminando os gramados em torno do palácio da sociedade secreta de Alfas e Ômegas. A atmosfera sombria pesa ainda mais quando os legistas recolhem o corpo da moça que horas atrás me disse que morreria.
Que seria morta por Kim Taehyung.
Travo o maxilar, respiro fundo e tento expulsar o cansaço ao soltar o ar lentamente pela boca. Não adianta. Meu corpo inteiro ainda está dolorido e quando o tecido do vestido de gala toca minhas costas, arranha e arde na pele sensibilizada por causa da vela. Preciso de uma noite inteira de sono, mais analgésicos, uma pomada para assaduras e um hidratante contra insolação e queimaduras.
Isso não é nada. Lembro de alguns momentos que me causaram os ferimentos e sorrio. Foi a melhor parte da noite. Cada segundo e cada machucado valeram a pena. E, mesmo agora, sob efeito do inibidor que tomei antes de vir até a cena do crime, ainda sinto os vestígios da excitação que Min Yoongi deixou em mim. Não sei o que será de nós, mas eu quero um pouco mais do que ele pode oferecer.
Você sabe, Min Yoongi é bom demais para só se provar uma vez.
— Srta. Park, tem algo a dizer, inicialmente? — Um médico legista corta meus pensamentos. Assinto. Tento afastar Min Yoongi da mente. Não posso me dar ao luxo dessa distração agora. — Me disseram que a senhorita é a melhor na descrição dos estágios. — Ele segreda e eu o olho, sem sorrir.
Torço os lábios e fito o corpo sem vida de Im Nayeon sobre a maca. Analiso os detalhes em uma tentativa de descobrir a hora da morte pelo que o corpo dela tem a me dizer. Estico as mãos calçadas nas luvas e seguro a mão da moça, observando-a em silêncio.
— E então? — O legista permanece em expectativa. Quando ergo o olhar, há mais dois médicos à espera.
Eles me olham, curiosos.
— A palidez já tomou conta de toda a pele visível, ou seja, aconteceu há mais de 45 minutos. A mão ainda não é tão fria quanto a temperatura ambiente, se considerar que faz 15 graus nesse exato momento. Isso me leva a crer que ela morreu há uma hora e meia, no máximo. Não há rigor no corpo. E, apesar de ela ter me dito, três horas e meia atrás, que um homem chamado Kim Taehyung a mataria, as circunstâncias em que ela foi encontrada podem apontar automutilação. É estranho porque as manchas de sangue coagulado em pontos específicos me levam a crer que ela foi movida depois de morta, então podem haver cúmplices. A investigação vai trabalhar em duas frentes.
Os legistas gravam minha fala em seus celulares e me observam.
— Ora, já sabe quem matou a moça, Park? — Viro-me ao ouvir a voz do delegado Namjoon e sorrio. — Está muito bonita, hoje.
— Esse disfarce não foi o mais funcional, mas tenho ótimas pistas.
— E um corpo. — Ele arqueia a sobrancelha para me lembrar da falha terrível.
— Fui contratada para proteger Min Yoongi, e ele está são e salvo. — Aponto com o queixo para o Alfa parado à curta distância. Ele veste o smoking e tem os cabelos escuros caídos sobre a testa. Sr. Min conversa com alguém da grande cúpula de Lascívia, que ele chamou de Grão-mestre. Volto-me para o delegado. — Essa moça me disse que Kim Taehyung era o culpado pela morte do deputado Park Jimin. E que ele também a mataria.
— E onde está Kim Taehyung? — Namjoon pergunta com cuidado.
— Sob custódia, naquela viatura. — Aponto para um dos carros da polícia.
— O rapaz é irmão mais novo do Sr. Kim Seokjin. — O delegado arqueia a sobrancelha e eu dou de ombros.
— No que isso interfere na investigação, senhor?
— Kim Seokjin é o grão-mestre, alguém importante. Tem que existir uma real suspeita para pedir a prisão de seu irmão mais novo.
Passo a língua pelos lábios.
— Não pedi a prisão de Kim Taehyung. Eu o detive para recolher depoimento. — Falo com firmeza e o delegado assente.
— Baseada na acusação de uma mulher que não estava em seu juízo perfeito, tomava antidepressivos e pode ter cometido suicídio por vingança.
— Senhor, com todo respeito, não vou apontar a vítima como culpada e supor que ela é uma "mulher louca e ciumenta" que matou o namorado por ciúme e moldou todo um plano de vingança contra seu rival, se matando pra colocar a culpa nele, sem investigar a outra linha. — Mantenho a postura empertigada e ele sorri.
— Você e esse seu feminismo.
— O senhor e esse seu estereótipo da mulher histérica.
Kim Namjoon ri.
— Certo, se tem tanta certeza de que vale a pena seguir a linha de que Kim Taehyung matou Park Jimin por ciúme dele com Im Nayeon e depois a matou porque ela sabia demais... Tem a liberdade de fazê-lo. Mas, temos três fatos que podem derrubar sua teoria. — O delegado aponta para mim. — O resultado da autópsia vai provar se ela foi morta ou tirou a própria vida, e como aconteceu. Já estamos com todo o arquivo de imagens filmadas do baile e depois que colher o depoimento do Sr. Kim Taehyung, comprovaremos seu álibi.
— Sim, senhor.
— Se tudo se encaixar...
— Seguimos a investigação com Nayeon como principal suspeita. Mas, do contrário, eu mesma quero pedir a prisão preventiva de Kim Taehyung. — Ele sorri.
— É por isso que te coloquei à frente dessa investigação. — Kim Namjoon fala, satisfeito, e eu sorrio. — Onde está Jiu?
— Bom... Ela está vindo. Quando houve um blackout no baile, Jeon Jungkook foi atacado por alguém no escuro e ela o levou para um lugar seguro. — O delegado franze o cenho com a nova informação.
— O Sr. Jeon foi atacado?
— Sim, senhor.
— Qual é a ligação dele com Park Jimin?
— Amigos, pelo que Jiu me repassou.
— E qual a ligação dele com Im Nayeon? — Namjoon prossegue com o questionamento.
— Nenhuma, senhor.
— E com Kim Taehyung? — Essa eu não sei responder. Olho ao meu redor e suspiro com extremo alívio.
Kang Jiu e Jeon Jungkook saem por uma das portas do palácio e minha amiga corre em nossa direção. Ela veste a calça jeans com que chegamos à Lascívia, mais cedo, e uma camiseta branca muito mais larga que seu corpo. Muito provavelmente pertence a um homem. Jeon Jungkook caminha atrás dela, mais tranquilo. Ele veste a calça preta do smoking e a camisa social está amarrotada, com alguns botões abertos e as mangas dobradas até os cotovelos. Os cabelos caem desordenados sobre a testa.
— O que eu perdi?! — Jiu fala ofegante, quando está perto o suficiente.
Jungkook não segue até nós. Ele desvia o caminho até onde Yoongi conversa com Kim Seokjin e mais alguns Alfas.
— Qual é a ligação de Kim Taehyung e Jeon Jungkook? — O delegado pergunta para Jiu, que se vira para ele e ri.
— Sei lá. Por que não perguntam pra eles? O tal de Taehyung não está sob custódia? Aish. Vocês são complicados demais. Cadê o rapaz? — Ela olha ao redor, e o delegado coça a testa, impaciente. — Amiga, Jungkook me disse que a Nayeon era submissa do deputado Park e ela era tratada como um animalzinho de estimação. Era o fetiche deles. E disse que, depois que o Jimin morreu, ela ficou sem chão e só falava que nunca ia conseguir viver sem ele. — Jiu forma um bico com os lábios. — E se ela... Não tiver conseguido...
— _____ não quer confiar na hipótese de a moça ser a culpada pela morte do deputado. — O delegado atalha, mas Jiu revira os olhos.
— Sim, eu também acho que ela não é culpada. Por isso eu tenho uma tese. E se ela não suportou viver sem o amor dela e tirou a própria vida? Ela não matou o deputado, só sucumbiu à depressão. Vocês chegaram a pensar nessa hipótese?
— Mas, por que ela falaria que Kim Taehyung queria matá-la? — Tento argumentar, mas Jiu pisca para mim.
— Ela pode não ter pensado nas consequências de dizer isso, quando resolveu acabar com a vida. Suicídios costumam ser passionais, feitos em momentos de desespero e causam o falso alívio momentâneo de que a morte vai acabar com a dor. O suicida costuma pensar que a única solução pra dor é o fim da vida. Pode ser um pensamento sedutor pra alguém que está tão sozinho que não tem a quem pedir ajuda, mas é a pior forma de acabar com o sofrimento. É por isso que é tão importante buscar ajuda, pedir socorro, e ficar de olho em quem sofre com depressão. Ninguém sofre porque gosta, por preguiça ou drama. Jungkook me disse que ela estava mal e não tinha nenhuma ajuda. Ninguém que estendesse uma mão. Nem outro patrocinador ela conseguiu, depois da morte do deputado Park Jimin.
Eu e o delegado Namjoon ficamos em silêncio por um tempo e trocamos um olhar.
— Três linhas de investigação, então, senhor? — Pergunto.
Kim Namjoon assente.
— Vou falar com o Sr. Kim Seokjin. Vocês duas, cuidem do depoimento de Kim Taehyung, e não esqueçam de perguntar qual é a ligação dele com Jeon Jungkook. O Sr. Jeon pode ser o próximo alvo, se o culpado pelo assassinato do deputado não for Taehyung ou Nayeon. — Concordo com um aceno. O delegado solta um suspiro cansado e bebe um pouco do café que fumega em seu copo térmico.
É quando Jeon Jungkook se aproxima de nós.
Ele cumprimenta o delegado e se afasta dele. Vem até Jiu.
— Onde está o Tae, Jiu? — Sr. Jeon pergunta, e Jiu aponta para os carros da polícia.
— Em algum daqueles carros. — Ela me olha. — Qual, amiga?
— Aquele. — Aponto com mais precisão. — Qual é sua ligação com ele, Sr. Jeon? São amigos? — Pergunto, aproveitando o ensejo.
— Bom... Ele era muito próximo de Jimin e nós nos tornamos amigos por causa disso. Depois da morte... Hm... Tae ficou muito sozinho, e eu decidi patrociná-lo no novo ciclo. Íamos fechar o contrato depois do baile de boas-vindas. — Sr. Jeon responde, sério, e fita a viatura. — Posso falar com ele?
Jiu toca o cotovelo de Jungkook e os dois se olham.
— Tem um envolvimento amoroso com Taehyung, Jungkook? — Ela pergunta baixinho.
Os dois se olham como uma intimidade estranha.
— Não, Jiu... Nem sempre os patrocínios envolvem relações... "Românticas". Eu sei que, pra mim, se resume a isso, mas... Quis ajudar o Tae. — Sr. Jeon responde no mesmo tom sussurrado, e Jiu assente. Eles se falam como velhos conhecidos, como um casal faria. Não consigo entender, mas o que eu vejo é uma conexão. — Por quê?
— Existe a possibilidade de você ser um alvo, se o culpado não for Taehyung ou Nayeon. Já conversamos sobre isso.
Jungkook assente.
— Posso falar com ele? Eu juro que é rápido. — Ele pede com a testa franzida. Jiu assente e chama um policial que está ali por perto e escolta Jeon Jungkook até a viatura em que Kim Taehyung está isolado.
Vasculho a área ao meu redor. O lugar onde o cadáver foi encontrado está isolado por faixas amarelas, com riscos no chão. Os policiais tiram fotos de tudo ao redor e guardam qualquer evidência em sacos herméticos. Min Yoongi, Kim Seokjin, Kim Namjoon e outros Alfas conversam afastados. É uma discussão acalorada. Não quero saber do que se trata, porque não vou deixar que o poder e a influência de Kim Seokjin acabe com uma das linhas de investigação. Ouço as portas da ambulância se fecharem e olho por cima do ombro.
Os médicos legistas deixam o local e seguem com o corpo da moça para o necrotério da cidade, para começar os procedimentos de autópsia. Assim, eu e Jiu ficamos parcialmente sozinhas. Aproveito-me disso e tiro as luvas de borracha. Aproximo-me dela o suficiente e paro ao seu lado, sem olhá-la. Jiu tem o rosto focado e os olhos fixos em Jeon Jungkook, que se aproxima da viatura e entra nela para conversar com seu mais novo patrocinado.
— Certo. Pode começar a me dizer que diabos aconteceu entre vocês dois. — Exijo, baixinho, e ela solta um suspiro.
— Longa história.
— Mas, vocês passaram o quê? Duas horas juntos?
— Um pouco mais que isso. — Sua voz é mais triste, e isso me pega desprevenida. — Aliás, bem mais.
— Como assim?
Jiu pestaneja e me olha.
— Amiga, por favor, não me deixe ser trouxa. Vou te contar a história do começo, mas tem que me prometer que não vai me deixar ficar apaixonada por Jeon Jungkook.
Arqueio a sobrancelha.
— Como assim?!
— Tudo começou quando...
***
Jeon Jungkook's P.O.V.
Nem o entorpecer do novo comprimido de inibidor que tomei antes de sair do quarto com Jiu consegue diminuir a tensão extrema em minha nuca. Massageio-a enquanto sou escoltado por um policial até a viatura e tento organizar meus pensamentos, que giram em torno das informações sobre a morte de Jimin, de Nayeon e a prisão de Taehyung.
Abro a porta da viatura e entro. O cheiro de mel se espalha pelo carro. O odor dele. Ergo o olhar e encontro Taehyung sentado com as mãos algemadas. Ele ergue o olhar quieto e quando vê que sou eu, sua expressão passa pela surpresa e pelo alívio. Os cabelos escuros estão caídos sobre a testa, orelhas e nuca. Lágrimas molham seu rosto e os olhos estão inchados. A ponta do nariz está vermelha.
— O que aconteceu? — Pergunto. Ele abre a boca, mas só ofega e volta a chorar. — Ei, Tae, precisa me dizer o que aconteceu. Estou aqui porque uma amiga me permitiu, e não tenho muito tempo. Me diga. — Toco seu ombro e ele respira fundo, passa as mãos pelos olhos, pelas bochechas, e tenta se acalmar. — Você não vai ser preso. Seokjin disse que você só vai prestar um depoimento. É isso, né?
— É.
— O que aconteceu?
— Não sei. — Ele suspira, com a voz trêmula e chorosa. — Parece que eu sou suspeito de ter matado uma pessoa. Jungkook, você me conhece! Eu nunca mataria alguém! — Taehyung bate as mãos nos joelhos. — Eu tenho meus defeitos e sou até conhecido por brigar, mas eu NUNCA mataria uma pessoa! Nunca! — Ele funga e me olha de lado. — Sabe quem morreu? A Nayeon! Até parece que eu mataria aquele projeto de submissa! Nem por muito dinheiro. Aonde quer que esteja, Jiminie nunca me perdoaria por isso.
— Eu sei, Tae. Mas, você precisa provar que não tem nada a ver com isso, agora. Então, não podemos pensar em você "nunca faria isso", e sim em "onde você estava e com quem", na hora em que o crime aconteceu. — Tento desanuviar sua mente, para que ele pense com mais razão. — Se tiver um bom álibi, vai estar livre dessa acusação sem pé nem cabeça. Eu já liguei pro meu advogado e ele disse que estava a caminho do DP, pra esperar por nós. E então, onde estava?
Taehyung pigarreia e soluça. Ele desvia o olhar.
— Eu...
Ele hesita.
— Você...
— Eu...
— Anda, Taehyung. Me fala logo. — Exijo, perdendo a paciência aos poucos. — Caralho, você não tem um álibi?!
— É que... Eu estava... Com... Ahm... Eu estava... — Ele soluça e funga. Travo o maxilar e ele percebe que está me irritando. — Eu... Se eu disser, você não vai mais querer me patrocinar. — Taehyung coça o nariz e vira o rosto. — Eu te procurei por todo lado, durante o baile, mas não te achei. Aí fiquei no meu canto, só que um Alfa me chamou pra dançar e ele era muito cheiroso e nós dançamos e ele me chamou pra ir ao banheiro e nós fomos e eu... — Ele não me olha. — Nós...
— Quem era o Alfa?
— Eu não sei quem era. Estávamos de máscaras. — Taehyung aponta para o próprio rosto.
Ótimo.
Os vídeos de segurança não conseguirão encontrá-lo e ele não sabe quem era seu parceiro.
Brilhante.
— Merda. Vocês não tiraram as máscaras nem pra se beijar? — Franzo o cenho e o puxo pelo ombro, para obrigá-lo a me encarar. — Hein, Taehyung? Você não perguntou nem o nome dele?
— Ah, Jungkook, não seja moralista. Você sabe que nessas festas a gente se pega de máscara e não pergunta nome porra nenhuma. — Ele resmunga e cobre o rosto com as mãos. — Ainda não consigo acreditar que não tenho como provar onde e com quem eu estava. Como eu vou me livrar dessa? Jungkook-ah, eu não fiz isso!! — Ele insiste e eu passo a mão pela testa. — Você ainda vai querer... me patrocinar? — Taehyung volta a me olhar e eu assinto em silêncio. — Então, você acredita em mim?
— Acredito. Não acho que você tenha matado Jimin, muito menos Nayeon. Mas, fazer a polícia acreditar nisso vai ser bem mais complicado do que eu pensei. — Suspiro e massageio a têmpora. — Vocês usaram camisinha? — Olho-o de lado e ele assente. — Tem algum vestígio de DNA desse cara em você? — Tento mais uma vez e Taehyung franze o cenho.
— Não sei.
— Certo, vou te acompanhar até a delegacia. O advogado já vai estar lá. Aí a gente conversa sobre essa parte com ele e resolve da melhor forma. O importante agora é provar seu álibi e te tirar dessa encrenca. — Resolvo e encolho os ombros, sentindo a tensão tomar conta de todos os músculos. — A gente se vê lá. — Faço menção de sair da viatura, mas Taehyung ergue as mãos algemadas e toca meu braço.
— Jungkook-ah. — Viro-me de novo para Taehyung. — Muito obrigado.
— Tudo bem. Eu prometi que ia te ajudar nesse período depois da morte do Jimin e vou ajudar. — Ele sorri e assente. — Tente não se meter em mais confusão.
— Posso te dar um beijo? — Ele aponta para a própria bochecha e eu reviro os olhos. Estico-me na direção dele e Taehyung beija meu rosto. Pressiona os lábios suavemente e se afasta. — Obrigado por ser meu amigo.
— Falou. — Dou algumas batidinhas em seu ombro e sorrio. Desço da viatura.
E eu que pensei que hoje só teria a melhor noite da minha vida com a única mulher com quem já pensei em passar mais que algum tempo. Ledo engano. Agora estou enredado em um crime de merda e não sei quando vou descansar, livrar meu amigo da cadeia e acabar com a ameaça que paira sobre mim. Quem matou Jimin?
Minha cabeça lateja em dor.
***
Min Yoongi's P.O.V.
As taças de vinho já estão quase secas outra vez.
O ar se torna mais leve e a sensação de embriaguez flui por meu interior. Sorrio. Mastigo a última porção de massa que ela fez para o jantar e me encosto na cadeira, cheio e satisfeito. Observo-a. Ainda há comida em seu prato. Ela manda a quinta mensagem em três minutos, concentrada. Prende uma mecha de cabelo atrás da orelha e coloca o celular na mesa.
Ergue o olhar e me flagra.
— Problemas? — Pergunto. Engulo o que mastigava e passo a língua pelos lábios.
— Jiu acha que a prisão preventiva do Taehyung é ridícula. — Ela suspira e pega a garrafa de vinho, enchendo a taça outra vez. — Eu também acho, mas tudo foi feito de acordo com a lei. Não faço a mínima ideia do que está acontecendo, mas quem quer que tenha feito toda essa cama de gato, fez muito bem, porque eu já perdi noites e mais noites desde o baile de boas-vindas de Lascívia, e não consigo pensar em nenhuma outra solução pra esse mistério. — _____ traz a taça aos lábios e bebe mais um pouco.
— Você não acha que precisa parar de pensar nisso por um segundo? Se ficar mergulhada aí o tempo inteiro, não vai mesmo abrir a cabeça pra resolver esse caso. — Levanto-me da cadeira e recolho meu prato, os talheres e minha taça. Vou até a pia da cozinha pequena do apartamento e deixo a louça. Volto à mesa e busco seu prato. Ela também se levanta e me ajuda a colocar tudo na pia.
— Tem algo nessa história que não me cheira nada bem, e acho que usaram Nayeon e Taehyung como testa de ferro. Nayeon era a mulher histérica, depressiva e descontrolada que cometeria loucuras e depois se mataria, e Taehyung é o "gay" egoísta apaixonado que levou um pé na bunda e ficou obcecado ao ponto de detestar qualquer ser humano que se aproximasse do homem que ele amava. São estereótipos perfeitos de potenciais criminosos passionais, além de extremamente preconceituosos. Não dá pra ver que tem algo errado nisso?
Jogo os restos de comida no triturador de lixo da pia e a olho de lado.
_____ se encosta no balcão e segura sua taça meio vazia.
— É, dá pra ver.
— Só que, sempre que eu e Jiu chegamos a um certo ponto da investigação, parece que não tem escapatória e que eles dois são culpados pela morte do Jimin. E isso não parece natural, se parece muito mais com algo que foi planejado por um terceiro muito influente. Só que eu não sei quem faria isso, porque Jimin era um político e empresário famoso. Pode ser qualquer um.
— E vocês estão com medo de mexer nisso? — Abro o registro da torneira e começo a lavar os pratos.
Ela bebe o resto do vinho e coloca a taça na pia.
— Jiu recebeu um e-mail que parecia ser um Fishing. Um vírus desses que rouba as senhas salvas no computador. — Lavo um prato e o coloco no escorredor. — Que era de uma corporação fantasma. Uma dessas empresas que políticos fazem pra lavagem de dinheiro.
— E ela acha que isso pode ser alguma tentativa de criar uma ameaça pra vocês? — Encosto as mãos na pia e a olho, com os olhos estreitados. — Existe alguma possibilidade de o criminoso saber que são vocês que estão no comando da investigação?
— Sim. Aí a gente está num conflito de... Salvamos nossa pele ou continuamos a investigar, libertamos Taehyung, limpamos a memória da Nayeon e descobrimos quem matou Jimin. — Pigarreio e volto para a louça. Passo a bucha pela superfície do prato e resmungo baixinho. Não gosto da ideia de ela se expor dessa forma. — O que foi, Yoongi? — Meneio a cabeça.
— É perigoso. Só isso. — Apesar de não gostar da ideia, não posso exigir ou pedir nada. Nos conhecemos há três semanas e temos saído às vezes, desde então. Passei o cio dela em seu apartamento, mas isso não faz de mim alguém em sua vida. Um namorado.
Não sou ninguém, por isso fico quieto.
— Acha que eu devia parar?
— Acho que você deve fazer o que achar melhor pra sua consciência. — Respondo e coloco os talheres no escorredor.
— Estou pedindo sua opinião. — Ela fala mais incisiva. Puxo um pano de pratos e enxugo as mãos, com os olhos fixos nos dela. Eu sei que ela não vai acatar um pedido meu, não é do feitio dela. — Você é mais velho que eu, tem mais experiência. Pode me dar um conselho.
— Quer mesmo ouvir o que eu tenho a dizer? — Pergunto e ela confirma com um aceno. Recoloco o pano no lugar e me aproximo dela. Encosto-a na pia e ergo as mãos, toco as laterais de seu rosto e enfio os dedos em seus cabelos. Meus olhos passeiam por seus traços tão embriagados quanto os meus, e eu acaricio suas têmporas com os polegares. — Não vou te dar um conselho, então. Vou te pedir que fique em segurança. Não quero ter, eu mesmo, que matar alguém, caso algo aconteça com você.
Ela ri e revira os olhos devagar, bêbada.
— Acho que a gente bebeu demais. — Sinto suas mãos em minha cintura, subindo até o tórax. — Obrigada por ter vindo hoje.
— Você fez até comida pra mim, como eu ia negar? — Encosto a testa na dela e ela roça a lateral do nariz no meu. — O que quer fazer agora? — Prenso seu corpo contra a pia e ela resvala os lábios nos meus.
— Você ainda pergunta, Yoongi? — Rio com sua resposta e é minha vez de roçar a boca na dela, encaixando os lábios em um beijo lento. Não dura mais de alguns segundos, porque a campainha toca. Separo a boca da dela e a olho. — Quem será?
— Quer que eu atenda? — Pergunto, esquecendo de com quem estou.
Ela ri, me empurra sem força e segue descalça pela cozinha conjugada com sala de estar e jantar. Prende os cabelos em um coque e vai até a porta. Espia quem está do outro lado pelo olho mágico e se afasta, surpresa. Ela me olha por cima do ombro, com o semblante franzido, e abre a porta. É Jeon Jungkook.
Franzo o cenho e passo as mãos pelo suéter preto. Afasto-me da cozinha e caminho até a sala, sem entender a visita inusitada a essa hora da noite. Jungkook está ensopado da cabeça aos pés, e só agora percebo que chove forte lá fora. Seus cabelos pingam, o rosto está pálido e os lábios roxos de frio. Ele hesita em entrar, por conta do estado, mas _____ o puxa para dentro.
Ele pigarreia e se vira para mim.
— Hyung, eu te mandei mensagem e liguei pra avisar, mas você não me atendeu, aí...
— Você colocou um localizador no meu celular de novo, Jeon Jungkook? — Arqueio a sobrancelha.
Ele dá de ombros.
— Em minha defesa, instalei há meses, mas essa é a primeira vez que eu uso. Funciona perfeitamente bem, aliás. — Ele curva os lábios para baixo, sentindo orgulho de si mesmo, e eu reviro os olhos. Só Jeon Jungkook é capaz de me tirar do sério. — Bom, o assunto é sério, é sobre Taehyung. E ainda bem que estava na casa da _____, porque aí eu posso falar pra ela que tenho um plano pra descobrir quem matou Jimin.
A porta se fecha às costas de _____ e ela cruza os braços. Anda até o meu lado e se vira para Jungkook.
— Você acha que foi a Nayeon? — Ela pergunta.
— Não sei. Não sei nem se Taehyung fez isso, ou se foi outra pessoa. À essa altura existem apenas evidências. Mas, eu estive pensando na minha oficina, enquanto consertava um computador. E tive uma ideia. Aliás, outro suspeito. E é sobre isso que eu quero falar com vocês. — Jungkook sorri, satisfeito. Suspiro, sabendo que vou terminar a noite com uma puta dor de cabeça.
A campainha toca outra vez.
— Mais gente? — Resmungo e _____ me olha de lado.
— Nunca recebi tantas visitas na minha vida. — É a vez de ela resmungar e ir até a porta.
— Hyung, eu acho que pode ser qualquer um deles, mas... Tenho outro nome pra lista que também se encaixa bem. — A porta se abre outra vez e eu olho de relance. É a amiga de _____, Kang Jiu.
— Amiga, eu precisava vir, desculpa. Estava tomando banho, aí tive uma ideia e tive que vir correndo pro seu ap, porque...
Ao ouvir a voz dela, Jungkook se assusta e olha por cima do ombro. Jiu, por sua vez, o olha surpresa e dá um passo para trás. Os rostos de ambos ficam vermelhos como pimentões. Jiu se vira para a amiga e pigarreia.
— Não sabia que tava com visita. Desculpa... — Ela morde os lábios.
— Tudo bem, vem. Sua ideia é sobre o caso Park? — _____ pergunta e a outra assente. — Jungkook também teve uma ideia. É bom que vocês dois dizem logo de uma vez o que é e nós tentamos resolver.
As duas se aproximam de nós e Jiu acena para Jungkook, que responde com outro aceno.
Eles não falam diretamente um com o outro.
Jiu se vira para mim.
— Oi, Sr. Min. Tudo bem? — Respondo com um aceno. — Então... O que estavam falando? — Ela parece estar mais nervosa do que antes, e eu fito Jungkook, que tem os olhos fixos na moça, distraído.
— Jungkook. — Chamo-o, grave e entediado. Ele tem um sobressalto e me olha. — Conte sua ideia.
— Ah, é. Eu acho que pode ter sido a Nayeon, se ela realmente matou o Jimin por ciúme e se matou pra culpar o Taehyung. Eu acho que pode ter sido o Taehyung, se ele realmente ficou ressentido e depois matou a Nayeon pra se vingar dela. Mas... — Jungkook engole em seco e olha para mim, depois para _____ e depois para Jiu. — Kim Seokjin não gosta do fato de seu irmão mais novo ser um Ômega que se relaciona com homens. Ele também tinha uma rusga com Jimin, por causa do relacionamento que ele mantinha com Tae. E veja isso. — Jungkook ergue o celular para mim e eu leio uma manchete do Korean Times.
— "Após a trágica morte do deputado Park Jimin, o mais novo pré-candidato a governador da província de Seul é o senador Kim Seokjin".
Ergo o olhar para Jungkook, que assente.
— Era sobre isso que eu ia falar! — Jiu aponta para Jungkook. — Eu não sei como ligar os pontos, mas também acho que ele é suspeito. Só que se abriram mais possibilidades. Vocês acham que os Kim se juntaram pra matar o deputado Park e colocar a culpa na Nayeon, ou a Nayeon entrou no esquema e acabou sendo executada no fim pra não deixar vestígios, se é que o tal de Kim Seokjin faria mesmo isso. — Tomo um fôlego, sem saber o que dizer.
Baixo a cabeça e fito a manchete outra vez.
E agora? Quem matou Park Jimin?
***
Park Jimin's P.O.V.
O asfalto alagadiço reverbera as luzes alaranjadas dos postes e os letreiros luminosos da região de Gangnam. Desço o último degrau da entrada do prédio em que Taehyung mora e sigo pela calçada, até onde estacionei meu carro. Retiro as chaves do bolso e confiro algumas mensagens novas no celular, há três de Nayeon, pedindo para me encontrar e perguntando onde estou. Ignoro. Não posso respondê-la agora. Só quero descansar. Amanhã eu resolvo meu problema com ambos.
Ouço passos na calçada empoçada, mas não me importo. Paro ao lado da porta do motorista da lamborghini prateada e a destravo. Ergo a cabeça e vejo o rosto conhecido. Um sorriso confuso perpassa meu rosto e eu guardo o celular no bolso de trás da calça.
— Oi, você... — É tudo o que eu tenho tempo de dizer.
Depois...
Depois, tudo o que vejo é a pior escuridão.
FIM
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