Eu sabia que o Armando implicaria com o Germano. Até porque eles nunca se suportaram. Mas eu não achei que ele iria tão longe assim.
— Que história é essa, Armando? - Germano questiona sem a menor paciência.
— Ué, Liliane? - Eu automaticamente reviro os olhos. - Você não contou a ele sobre o nosso romance?
— É O QUÊ? - Germano pergunta e quase me deixa surda.
— Isso mesmo que você escutou. Deve ser horrível ser o último a saber, né?
Novamente eu tento me pronunciar, mas Germano me atropela.
— Liliane é mulher demais você, Armando. Você nunca teve a menor chance.
O sorriso que Armando tinha no rosto se desfez e ele não teve nem a oportunidade de uma tréplica, já que Germano me puxou para o lado oposto da enorme sala.
— Eu já quero ir embora. Esse babaca acabou com a minha noite! - Ele diz e tosse contidamente.
— Eu criei um monstro ciumento.
— Eu sempre senti ciúme. Sempre me achei pouco para você! Mas eu sou mais discreto. É só isso!
— Que bobagem! Você é o número perfeito para mim! - Eu digo e deixo um beijo em sua bochecha.
— Não é o que a high society carioca pensa, né?
— A gente nunca se importou com isso antes. Algo mudou? - Eu entrelaço as nossas mãos.
— Não! - Ele me encara. - Rolou algo entre vocês?
— Bom…
— Você teve o dia todo para me contar, mas deixou que esse otário tirasse onda com a minha cara.
— Germano…
— Logo com ele?
— Posso falar, Germano?
— Eu não gosto nem de imaginar com quantas pessoas você se relacionou nesse tempo em que estivemos separados.
— Não imagina mesmo, não. Porque a lista é extensa. - Eu gargalho da cara de indignado que ele faz, mas logo paro.
Germano não está chateado. Ele está sentido. Acredite! Isso é bem pior.
Para amenizar um pouco a situação, eu o abraço e escondo o meu rosto na curva do seu pescoço. Ele automaticamente começa um afago nas minhas costas com a mão livre.
Espero que ele valorize a minha atitude porque eu sou extremamente reservada em público.
— Um beijo.
— O quê? - Ele levanta o meu rosto a fim de me encarar.
— Foi só um beijo. E eu nem me lembro. A Natasha que joga isso na minha cara sempre que pode.
— Explique melhor, por favor! - Ele diz ansioso.
— Deve ter uns dois anos isso. Ele me beijou em uma festa. Mas eu já tinha bebido demais. Eu realmente não me lembro. Se a Natasha não tivesse me contado, eu não acreditaria. Ela diz que eu devo todos os favores do mundo a ela por ter me livrado dele.
— Com certeza ele se aproveitou da situação… de novo! Eu vou matá-lo! - Germano aumenta o tom de voz sem perceber.
— Hey! Pode dar uma segurada aí. Você não vai fazer absolutamente nada. Já passou!
— Promete que você vai se manter longe dele? Ele é perigoso.
— Meio aproveitador? Com certeza. Mas perigoso, não. E eu sei me defender.
— Sabe, sim. Sabe muito! - Diz com uma dose exagerada de ironia que me faz revirar os olhos.
— Vamos socializar. Vem? - Ele sorri e me acompanha.
Eu e o Germano nos enturmamos com um casal de amigos dos anfitriões. Embora a conversa tenha seguido para longe de nossos interesses, foi até divertida. O jantar foi servido no deck e tudo está aparentemente calmo, exceto pelo olhar insistente do meu pai. Logo já estávamos na sala novamente.
— Acho que já podemos nos despedir. Estou me sentindo muito cansado. - Germano sussurra no meu ouvido.
— Sim, podemos. Vou só ao toalete. Na volta nos despedimos e vamos. Você me espera?
— O tempo que for preciso. - Ele pisca para mim.
Eu me direciono para o toalete e sou observado pelo Germano, pelo meu pai e pelo Armando. Esse último me olha de um jeito que me deixou arrepiada de um modo negativo.
Logo que saio do banheiro, eu sou abordada pelo Armando.
— Eu sabia que você tentaria uma aproximação. Tão previsível!
— Não gostei nenhum pouquinho da forma como o teu macho falou comigo!
— E eu com isso? Você deveria reclamar com ele e não comigo!
— Vocês voltaram?
— Por que todo mundo acha que pode me cobrar explicações da minha própria vida? - Digo e tento sair pelo corredor, mas ele me cerca.
— Você não vai ficar com ele!
— Ah! Não? E é você quem vai me impedir?
— Ele nunca foi homem para você!
— Quem determina isso sou eu. Agora se você me der licença.
— Eu não vou desistir de você!
— Olha! Quando éramos crianças, isso era fofo. Na adolescência, era aceitável. Mas agora você está passando dos limites.
Armando me segura pelos meus dois braços com força, mas não ao ponto de me machucar. Ele me empurra até me encostar em uma parede. Se a intenção era me ajustar ou que eu me sentisse acuada, ele falhou.
— Eu não te dei liberdade para me tocar dessa forma. - Digo rude.
— Eu amo você!
— Não ama! Você ama a ideia de me ter por sei lá qual razão. E acredite! Existe um abismo de diferença entre elas. - Eu aumento um pouco o meu tom de voz porque estou perdendo a paciência.
— Escuta bem o que eu vou te dizer agora. - Ele aumenta a intensidade do aperto no meu braço. - Você vai ser minha de qualquer modo. Querendo ou não. Fica a seu cargo o jeito que vai ser.
O Armando está enlouquecendo! A forma como ele está falando e me olhando estão me deixando bem assustada.
— Primeiramente, solta ela AGORA! E segundo, eu quero que você repita o que acabou de dizer olhando na minha cara.
Ao ouvir a voz do Germano, Armando me soltou e se virou para ele. Eu rapidamente me aproximo do Germano e ele me coloca atrás dele como forma de proteção.
— Vamos embora, Germano!
— Não, não! Calma aí! Eu quero bater um papo com o Armandinho!
— Germano, meu amor, por favor. - Ele vira a cabeça para trás e me sorri. - Vamos embora!
— Isso! Obedece ela que é melhor para todo mundo! - Armando diz debochado.
— Você cresce a beça quando fala com mulher. Quero ver se você é homem para repetir tudo que disse a ela na minha cara.
— Germano… - Eu sussurro.
— Não se mete, Liliane!
— Você sabia que eu sempre quis devolver o soco que você me deu? - Armando provoca.
— Não cai nessa, Germano. - Eu digo e tento puxar o Germano para que ele se afaste do Armando.
— Acho que sua oportunidade chegou. Por que não tenta a sorte? - Ele vira pra mim e coloca as duas mãos no meu rosto. - Eu tentei do seu jeito, agora deixa eu resolver da minha maneira. - Eu assenti e ele me deu um selinho.
Logo que Germano se afasta de mim é atingido em cheio com um soco no rosto. O impacto foi forte e tão inesperado que o Germano cambaleou para trás dando alguns passos e acabou caindo no chão da sala. O barulho da queda e o meu grito chamaram a atenção de todos. Eu me aproximei dele na intenção de ajudá-lo, mas ele me impediu só com o olhar.
— Você é muito covarde mesmo! - Germano diz enquanto se levanta.
Eu fico apreensiva e busco com o olhar o meu pai entre as pessoas que observam atentamente o desenrolar da cena.
— Você é louco!
— Louco? Eu que sou louco? Você que devia estar internado, seu canalha, cafajeste.
— Vem, Germano! Vem!
— Você quer apanhar, né?
Germano parte para cima do Armando. Eu fico totalmente preocupada porque ele ainda está com muita falta de ar. Eu não devia ter deixado isso começar. Eu me direciono ao meu pai e agarro um de seus braços com as minhas mãos. Eu não consigo olhar diretamente pra cena dos dois rolando no chão, mesmo sabendo que o Germano leva uma certa vantagem.
— Você sabia que isso ia acontecer. Por isso, você trouxe o Germano. Você queria que eu passasse vergonha, Liliane?
— Eu contava com as provações. Mas isso que está acontecendo, eu não previ. E não! - Eu o encaro. - Eu não trouxe o Germano para causar qualquer tipo de constrangimento ao senhor. Eu só quero ele por perto.
— Faz alguma coisa, Liliane!
— Com vários homens no recinto, eu que tenho que interromper essa briga?
— Você é a motivação!
— Agora que os palhaços entraram no picadeiro, eu quero ver o circo pegando fogo. - Eu digo e não consegui evitar a gargalhada nervosa.
— LILIANE!
— Ah! Pai, me economiza. O Armando passou de todo e qualquer limite. Deixa o Germano lavar a minha honra.
— O que o Armando fez? - Ele pergunta tão desacreditado que eu me sinto até culpada.
— Quer saber, pai? Deixa pra lá! - Digo com a voz um pouco embargada.
Eu respiro fundo e me aproximo dos dois homens que ainda estão atracados no chão.
— Germano! Chega!
Germano está por cima do Armando. Ele me direciona um olhar nada contente pela interrupção.
— Já chega! Vamos embora! - Eu digo e saio em direção aos pais do Armando.
— A sua sorte é que ela me conteve. Se não, eu ia te quebrar. - Ainda escuto ele dizer.
Eu e o Germano nos desculpamos com o Sr. Antenor e a Dona Joana pela confusão. Explicamos toda a situação e eles, aparentemente, nos entenderam. Afinal, eles conhecem o filho que tem e o histórico que temos. Nos despedimos e deixamos a casa dos Siqueira Campos.
— Para quem estava quase morrendo, você está muito bem. - Eu digo com deboche.
— Nada motiva mais o ser humano do que o ódio.
— Pensei que você fosse mais motivado pelo tesão, mas me enganei. Ou de repente o problema sou eu.
— Ei! O que houve?
— Nada! Você está machucado?
— Eu estou bem. Mas você tá chateada! - Ele me enlaça pela cintura. - Eu quebrei minha promessa. Você me desculpa? É isso que está te deixando chateada?
— Não! Tudo bem! Eu estou um pouco chateada, mas é com o meu pai. Com você é só preocupação mesmo. Também não vou criar caso por causa disso.
— Olha! Seu pai…
— Se vai defendê-lo é melhor nem começar!
— Mudando de assunto… quer ir a algum lugar? Você comeu tão mal no jantar.
— Eu só quero ir para casa!
— Sei que não me comportei bem hoje, mas será que ainda poderei dormir com você?
— Sim! Porque eu preciso de massagem e muito cafuné!
Entramos no carro e fomos em direção ao meu apartamento. Aproveitei e mandei uma mensagem para Dona Eusébia pedindo que ela arrumasse uma mesa com algumas coisas.
— Sabe o que eu acabei de lembrar?
Germano liga o som e conecta seu celular via bluetooth no meu carro. Ele está se sentindo o dono do espaço.
— Humn…
— Do dia que nos conhecemos na UFRJ.
— Não vai pela Gávea? - Pergunto assim que o vejo mudando de trajeto.
— Pensei em irmos pela orla. Você sempre gostou de apreciar o mar.
— Demora mais. Mas ok! - Pela primeira vez desde que entramos no carro, eu tiro a atenção do meu celular e olho. - O que você lembrou?
— De quanto eu te vi pela primeira vez!
— Você jura até hoje que se aproximou de mim sem intenção.
— Mas foi. - Eu gargalho. - Foi mesmo! Eu te achei linda, mas não maldei. Sério mesmo!
— Tudo bem! Se você diz, eu acredito.
— Você tem essa coisa, esse imã, que atrai todo mundo. E comigo não seria diferente! Mas eu sempre fui respeitoso com você!
— Até deixar de ser, né?
— Lili…
— Eu estou brincando. Relaxa! - Eu levo minha mão até a nuca dele e início um carinho.
— Você usava o cabelo mais claro naquela época. Eu te vi assim que você pisou no campus.
— Eu já agradeci por você ter me tirado do trote?
— Nunca agradeceu! Mas eu sei como você pode pagar essa ingratidão.
— Sabe?
— Sei!
— Como?
— Você vai descobrir!
— Eu vou aguardar AN-SI-O-SA-MEN-TE!
O resto do caminho foi em um silêncio confortável que eu amo.
Assim que chegamos no apartamento, eu guio Germano pela mão até a cozinha. Dona Eusébia preparou uma super mesa com tudo que o doutor gosta.
— Pedi Dona Eusébia para preparar essa mesa porque eu estou com fome e imagino que você também.
— Quer beber um vinho?
— Você não pode beber, Germano.
— Posso, sim. Mas moderadamente.
— Vamos evitar, né? Você também não está muito bem.
— Tudo bem! Você venceu.
Comemos muito! Muito mesmo! Dona Eusébia, para variar, está de parabéns. A gente arruma, lava e guarda tudo porque eu não quero ouvir reclamação amanhã.
— Acho que agora só banho e cama, né?
—Está cansada?
— Ainda não me recuperei de ontem! E você? Tá sentindo alguma coisa? Eu acho que seu olho vai ficar um pouco roxo.
— Eu estou bem! Fica tranquila. Eu só queria conversar uma coisinha com você.
— É coisa séria? - Germano senta no sofá e puxa para o seu colo.
— Sim! Muita séria!
— Então fala sem rodeios, por favor.
— Sem interrupções?
— Sem interrupções!
— Vai me ouvir calada? - Eu reviro os olhos.
— Fala logo!
— Você é a mulher da minha vida! Sempre foi! Eu não pretendo deixá-la escapar de novo. Desde que nos reencontramos que eu quero te devolver algo que é seu e eu carrego diariamente comigo.
Germano mexe no bolso da calça e retira uma caixinha pequena de veludo preto que eu conheço bem.
— Esse anel… - Meus olhos já se enchem de lágrimas.
Germano me pediu em namoro com esse anel que era de sua avó. É a única lembrança física que ele tem dela. Ele costumava dizer que ela era a mulher da vida dele até me conhecer.
— Você me devolveu, mas ele não poderia ser de ninguém além de você!
— Esse anel é deslumbrante! - E eu sou apaixonado por ele. Não pela beleza ou valor, mas pelo significado que ele tem para o Germano.
— Não! Deslumbrante é você! O anel é apenas um acessório. Emocionalmente valioso, mas não como você!
Eu fico extremamente emocionada e não consigo evitar as lágrimas.
— Tudo que passamos juntos e separados provou o que eu já sabia… que eu não consigo viver sem você!
— Nem eu sem você… - Eu sussurro.
— Você é minha parceira… meu oxigênio! Esse anel é feito o meu amor por você… vai durar para sempre!
Não deu! Eu tive que beijá-lo. Se ele pretendia dizer mais alguma coisa não será dessa vez.
Encerramos o beijo por falta de ar, mas iniciamos outro e depois outro. Esse último foi interrompido por uma crise de tosse.
— Vamos ao médico amanhã e ponto final.
—Tudo bem! Eu quero te fazer uma pergunta.
— Faça…- Digo sem muita segurança.
— Lili… você quer namorar comigo?
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