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História Les Marcheé - Um dia triste


Escrita por: Marurishi

Capítulo 24 - Um dia triste


 

 

Era um dia triste em Boandis, no qual não se via sorrisos. Durante o velório e despedidas para Lorde Thon Levi, três poderosas damas, lado a lado compartilhavam as mesmas emoções de perda e saudades.

A viúva, Lady Shaliah Levi era uma mulher austera, de conduta rígida e reta. Por ser a fonte de inspiração para muitos, naquele momento ocultava seu pranto e demonstrava a força que todos precisavam no momento. Lady Benara Levi, sua nora, já viúva há vários anos, igualmente influente e notória, tida como uma mulher que pensava mais com o coração do que com a razão, preferiu que seu único filho, Shaido, agora poderoso lorde e sucessor ao governo, fosse educado pelos avós e esse fato influenciou direto nos seus sentimentos ao perder seu sogro, Lorde Thon Levi era-lhe como um pai. Entre todas as mulheres, era a que mais chorava.

Lady Nilla Protheroi, melhor amiga e confidente de Lady Benara, chorava em silêncio uma perda irreparável e lembrava-se dos seus dias passados. Pensava em como a amizade que fizera ao chegar em Boandis lhe foi importante e boa, pois muito devia à família Levi. Perder mais um ente querido lhe era tão doloroso quanto perder um membro de sua própria família.

Agora que Lorde Levi se foi, além da dor e pranto, havia apreensão por inúmeras coisas. Lady Nilla Protheroi depositava suas esperanças em Lorde Shaido e sentia um peso maior que o mundo em seu coração, pois o jovem que já tinha a ausência do pai desde a infância, agora perdera também o avô.

O casal Protheroi sentia saudades de seus filhos, queriam eles ali naquele momento. Todas as notícias que recebiam de Imperah e as cartas escritas pelos próprios filhos eram motivo de grande alegria, mas não o suficiente para acalmar a saudade de seus corações e, principalmente, suas preocupações.

Nada era mais doloroso do que estar longe. Na medida que o tempo passava, mais se convenciam que cometeram um grande erro ao terem permitido que ambos fossem terminar seus estudos na capital. Ficaram tão horrorizados com o fato de Codhe ter despertado a magia que pensaram somente na solução mais rápida e eficiente no momento. Pensavam que seus filhos concluiriam os estudos e se dedicariam ao Coirlem onde estariam seguros ocupados com a vida rotineira da corte. Ou ainda, que não teriam tanto êxito e seriam considerados fracos, não sendo aceitos na corte, retornando à Boandis para viverem em família, como sempre haviam sido.

Acreditavam que quando eles retornassem, seria fácil convencê-los a abandonarem a mágica, afinal, não era necessário tal poder em Boandis, pois tinham os Levis. Todavia, agora que os anos haviam se passado, se davam conta de que as notícias cada vez mais comprovavam o inevitável progresso dos gêmeos e que possivelmente não retornariam para Boandis, muito menos abandonariam a magia.

Além de que, Lorde Thon Levi se foi.

Poderiam estar contentes e orgulhosos por seus filhos progredirem e se tornarem tão notáveis quanto os Levis, se o grande segredo da sua raiz aliada a profecia não pesasse sobre suas cabeças.

Desde os dias antigos, após a reconstrução do Império, a família Protheroi havia sido dividida em duas raízes, sendo a primeira daqueles que jamais apoiaram a loucura do Imperador e a segunda daqueles que concordaram e foram castigados diretamente pelas Musas. Entre os Protherois da segunda raiz, havia aqueles que, por vergonha e arrependimento, juraram fidelidade às Musas e foram perdoados, mas privados de sua magia em parcialidade.

Por isso, não tinham o mérito de despertar seus poderes, por condenação das Musas que lhe permitiram continuar vivos, sem mágica e  com outras restrições — como a de morte precoce ou até de não gerarem filhos, quando manifestassem alguma tendência à mágica, já que isso era natural ocorrer devido sua descendência.

A família dos gêmeos era desta segunda raiz. De geração em geração, o despertar natural da magia estava ficando mais raro. Também a renúncia sincera era a forma de gratidão às Musas. No caso de Lady Nilla havia algo além, que lhe roubava o sono noite após noite: O medo de que os poderes despertos de seus filhos causassem a ira da Musas, como lhe foi avisado no passado através daquele sonho. Ela queria que os filhos retornassem para lhes revelar toda a verdade e assim poder, quem sabe, evitar um futuro sombrio.

Ficou decepcionada ao saber que eles não viriam a Boandis para se despedir de Lorde Levi. Achou, inclusive, ofensivo. Mas sabia que, provavelmente, havia força maior que os impedia de vir. Portanto, resignou-se e guardou para si seu pranto e medo.

 

 *****************

Passados os dias após a chegada de Lorde Shaido, Lady Shaliah Levi foi ter com o neto para tratar um assunto delicado.

— Tens feito silêncio sobre o último pedido de seu avô — falou brandamente. — Quando pretende dar início aos preparativos do casamento?

— Do que a senhora está falando? — Nitidamente Lorde Shaido não tinha ideia do que se tratava.

— Do último pedido do seu avô, ele enviou-lhe uma carta no mesmo dia em que faleceu — notou a surpresa no rosto do neto. — Não a recebeu?

— Não, do que se trata esse pedido?

— Do seu casamento com Lady Mclin.

— O quê? — levantou-se da cadeira bruscamente. — Com todo respeito minha avó, mas não é hora para brincadeiras.

— Eu não estou para brincadeiras — alterou-se. — Por que me tomas? Pensas que eu tocaria em tal assunto se não fosse urgente!?

— Por que eu deveria me casar com Lady Mclin, eu nem a conheço. Ela nem mesmo se deu ao trabalho de apresentar-se formalmente ao meu retorno, mesmo eu próprio lhe solicitando. Nem sequer veio prestar homenagens à memória de meu avô! — gritou enfurecido. — Por que eu me casaria com uma estranha, insolente e estúpida. Não teve serventia para curar meu avô, quem dirá para ser esposa!

— Seu avô nela confiava, ela não é como você diz! Foi seu último pedido antes da morte e é uma exigência feita por ele para que você possa assumir o governo em absoluto.

— Isso é ridículo! Nunca ouvi dizer que fosse exigido um casamento para assumir uma liderança de governo.

— Mostre maior respeito por Lorde Levi — falou alterada. — Não ouse chamar de ridículo os desejos de seu avô. Ele tinha uma ampla visão do futuro, ele sabe que um casamento é necessário ou o seu governo não será benéfico! Existem coisas que você ainda não pode compreender mas deve respeitar e, em absoluto, obedecer!

Lorde Shaido conteve sua indignação e percebeu que estava agindo de maneira tola e desrespeitosa. Respirou profundo e depois de acalmar seu espírito se pronunciou:

— Que seja providenciado um encontro com essa Lady Mclin, vou conhecer essa infeliz, então decidirei sobre o meu futuro.

— Hoje mesmo farei com que ela venha visitá-lo. — Retirou-se da sala, deixando Lorde Shaido com seus pensamentos turbulentos.

Ele começou a imaginar como seria a Lady Mclin, sua possível noiva. No entanto, sempre que tentava formar uma imagem ou um tipo de personalidade, a única que lhe vinha à mente era a nobre Belle, cujo esplendor e carisma não deixava seus pensamentos sequer um momento.

Belle era o parâmetro de comparação para todas as outras moças, e assim, ele não conseguia imaginar alguém que pudesse querer ter ao seu lado além de Belle. E por não querer ninguém mais que a bela bibliotecária, fazia as piores imagens possíveis de Lady Mclin.

Mesmo sem conhecê-la, muitas coisas nela o irritavam. Sabia que deveria ver com bons olhos a futura noiva escolhida por seu avô, mas não estava preparado para seguir padrões tão rígidos, como o de casamentos arranjados. Afinal, seu coração já tinha encontrado alguém e não era justo aceitar sem contestar. Tentaria, ao menos, deixar Belle saber sobre suas intenções e sentimentos.

No fim do dia, a avó e a mãe de Lorde Shaido prepararam um jantar e convidaram Lady Mclin para estar presente. A jovem não poderia recusar, mas queria muito não ir, pois estava com medo.

Temia pelo que esperar de Lorde Shaido, tantos anos se passaram sem nunca mais terem se visto, sem notícias, sem amizade, um profundo e incógnito silêncio que, de repente, é quebrado com uma promessa de casamento.

Além de que ela havia feito o nome "Loren" desaparecer de Boandis e somente Lady Mclin vivia ali. Era provável que Lorde Shaido não soubesse que se tratava da mesma pessoa e isso fazia com que seu coração disparasse em ansiedade e medo.

Sua coragem havia falhado inúmeras vezes, já não suportava mais andar nas ruas sendo apontada e julgada. Esse foi o principal motivo que preferiu não ir às despedidas de Lorde Levi. Acompanhou de longe, com seu coração entristecido e injuriado.

Agora tinha expectativas de como seria esse reencontro com Lorde Shaido, o que ela sentiria ao rever seu amor depois de tantos anos? Como ele estaria? Muito tempo passou e tudo estava diferente, eles estavam diferentes e isso era preocupante.

Vestiu seus melhores trajes, em tons de verde musgo e prata. Gostava de roupas em tons de verde, prendeu o cabelo em tranças e colocou apenas uma pluma simples, não gostava de grandes volumes ou exageros. Não queria parecer alguém que está querendo se exibir ou conquistar. Queria mostrar que era modesta mas que também era respeitável e poderosa o suficiente para ser aceita como a noiva de Lorde Shaido. No fundo, ela desejava ser a noiva, desejava que ele a aceitasse por vontade própria.

Quando Mclin chegou na cidade em sua carruagem particular, ouviu comentários maldosos, aqueles que ouvia sempre a seu respeito. Muitos a seguiam curiosos em saber onde ela ia ou o que pretendia fazer, o barulho de algo lamacento sendo jogado contra sua carruagem a fez pular de susto no assento acolchoado e pensar que deveria ter usado uma carruagem alugada que não chamasse tanta atenção. Quando chegou ao Palácio, que era a residência da família Levi, muitos se admiraram e trataram de espalhar a notícia.

Um pensamento lhe ocorreu, que se pudesse faria com que todos os que falavam injúrias tivessem suas línguas travadas para sempre, mas isso seria um pensamento extremamente maligno e trancou esse desejo nos porões escuros de seu coração, junto com tantos outros pensamentos que lhe assombravam quando ouvia tantas ofensas e injustiças.

Entrou no Palácio e foi bem recebida, exceto alguns olhares tortos de algumas veilanas que colaboraram para sua tensão aumentar. Foi conduzida até a sala principal onde era aguardada por Lorde Shaido e seus familiares. Quando foi anunciada, entrou na sala, sob os olhares atentos das matriarcas da família Levi, sabia que Lorde Shaido estava ali, diante de si, mas não conseguia olhar para ele tamanho era seu nervosismo.

Deveria ter reverenciado, deveria ter dito palavras educadas de cumprimentos, deveria ter seguido a etiqueta e todas as banalidades formais que se faz em encontros desse tipo, mas era como se o seu corpo congelasse ao saber que Shaido estava ali, e a única coisa que pôde fazer ao encontrá-lo depois de tantos e tantos anos, foi encarar o chão em absoluto desespero.

Quando Lady Mclin foi anunciada, imediatamente Lorde Shaido se levantou e caminhou em direção oposta a porta, parando defronte uma janela lateral mais afastada. Poderia ser interpretado como um gesto descortês, de fato foi espontâneo, pois estava perturbado com aquela situação e ainda muito consternado. Não que esquecesse de desempenhar seu papel ou quisesse ser rebelde, apenas não queria ter que encarar tão rapidamente aquela mulher que ele julgava e criticava.

Queria um momento para acalmar seu orgulho e ser capaz de dialogar com Lady Mclin sem preconceitos. Por isso, em momento algum a olhou e esperou que ela se pronunciasse primeiro. Porém, nenhuma palavra veio e ele estranhou.

Incomodado pelo silêncio, uma curiosidade foi se formando no seu íntimo e, mesmo relutante, virou-se e seu olhar foi em direção a Lady que estava parada no meio da sala, como uma árvore plantada.

 


Notas Finais


Um belo drama.
Obrigada a todos os amores que estão aqui! ♥


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