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História Liberté et amour - Mort-vivant


Escrita por: Yugito

Notas do Autor


esse capítulo é confuso na minha cabeça, mas talvez para vocês não? Acho que é isso o que acontece quando eu fico o dia todo escrevendo kskssjasm

Capítulo 17 - Mort-vivant


- Uau! Você toca muito bem, senpai! – Duas garotas estavam em volta de uma pessoa, a assistindo tocar o piano, da maneira mais graciosa possível. – Você poderia nos dar umas aulas de vez em quando!

- Obrigada. – Disse simplesmente, enquanto ajeitava os óculos distraidamente. A jovem não se importava com aqueles elogios ou coisas do tipo, mas também não se incomodava. Eram apenas puxa sacos, nunca se deve esperar tanto de gente assim. – Tenho que ir agora, preciso procurar a professora de inglês.

- Nós vamos vir aqui amanhã de novo, ok!? – A outra menina acenou, enquanto assistia a pianista sair pela porta do clube de música.

Agradecia mentalmente por elas terem engolido aquele desculpa tão facilmente. A situação estava ficando irritante de verdade, precisava respirar um pouco de ar puro. Desceu as escadas com pressa, tudo para chegar ao pátio daquela pequena escola, localizada bem longe do centro de Buraza, quase beirando a próxima cidade. Carregando a bolsa no ombro, ela parecia meio cansada. Resolveu então, sentar-se em um dos bancos vazios. Já era de tarde, e a maioria dos estudantes se dedicavam as atividades extracurriculares.

Os cabelos castanhos iluminados pela luz do sol até podiam realçar a beleza dela, se não fosse pela pele pálida, olheiras enormes e a expressão de desgosto que sempre carregava. As unhas estavam com várias cores diferentes ao mesmo tempo, como se a dona delas não se preocupasse em tirar o resto do esmalte antes de pintar novamente. O uniforme preto com mangas compridas só lhe dava um ar mais tenebroso. Como era a estrela do clube de música, era tolerada apenas pelo seu grande talento no piano, o que parecia o bastante para que não a expulsassem pelo seu péssimo desempenho escolar.

E apesar de tudo isso, não se considerava uma aberração social ou muito menos uma pessoa tímida, era só... um saco ter que falar com os outros, forçar interações, e ninguém lá parecia interessante... ou confiável. Agora, com seus 15 anos, nunca pode esquecer do maior trauma de sua vida: o terrível assassinato da própria mãe. Todos teimavam em dizer que não era verdade, que a mulher havia se suicidado... heh, se eles tivessem visto com os próprios olhos, não estariam falando isso. A pessoa que misteriosamente invadiu sua casa naquela manhã comum de terça-feira, tinha olhos enormes e cinzas, cabelos compridos e igualmente acinzentados, como se a vida estivesse com preguiça de fazer algo mais alegre.

Ela... ela se lembra daquilo como se fosse ontem.

                                                                                           - x -            

- Mamãe, mamãe! Olha, minha professora disse que estou melhorando! – A garotinha agarrou a mulher pela cintura e abraçou, sendo logo afagada com carinho. – Eu aprendi um monte de palavras hoje!

- Que ótimo amor! Assim que eu terminar de cortar os legumes, me conte tudo o que aconteceu hoje. Huhu, vamos ver se será capaz de me impressionar. – Provocou, logo arrancando reações exageradas da menina.

- Legumes!? Ei, calma aí! Não me sudes- sibestine... sub... subestime! – Apontou ela, fazendo a outra rir.

- Filha, se quiser ser que nem a mamãe, tem que treinar suas frases de efeito com mais paixão! Que tipo de Teikyosha não é dramático e cheio de frases guardadas para qualquer tipo de situação!? – É, aquela mulher realmente parecia ser escandalosa.

- Eu estou me esforçando! Vou pensar em algo muito bom para derrotar os legumes!

- Caham, você tem que levar as caixas de jornais de volta para o armário da sala, lembra?  – A garota apenas concordou e saiu da cozinha. Sua mãe era uma mulher de cabelos castanhos compridos, vestida com um avental branco por cima da roupa normal. Ela parecia relativamente jovem, mas já tinha seus 39 anos. Seu nome? Katsumi Teikyosha, a única das irmãs Teikyosha que ainda estava viva. Sua irmã mais nova havia sido assassinada no próprio colégio, a aclamada Akademi High. O caso nunca foi resolvido, o que fez crescer uma imensa indignação por parte da mulher, que enquanto estivesse viva, nunca deixaria a filha chegar perto daquele lugar. Por outro lado, sua outra irmã, a mais velha desta vez, havia falecido há pelo menos uma década, enquanto dava a luz a uma criança. Não é preciso dizer que Katsumi ficou devastada, o que mais faltava acontecer?

Talvez... teria que viver sabendo que o assassino de sua irmã está solto e vivendo uma vida pacífica. E o pior era saber exatamente quem foi o responsável, mas ser incapaz de levá-lo a justiça.

A assassina... era sua kouhai, uma garota que havia se juntado ao seu clube na época da Akademi. Katsumi nunca teria imaginado que aquela garota aparentemente meiga e indefesa pudesse fazer algo do tipo, mas... ao tentar se comunicar com sua irmã na cena do crime, – o banheiro feminino do terceiro andar - quando ele finalmente foi liberado, não restaram mais dúvidas. E talvez o seu pior erro tenha sido confrontar a própria assassina sozinha, depois de anos do caso. Foi tudo culpa sua... a família que formou nunca estaria segura ali, então se mudar para o outro lado da cidade foi essencial. Mesmo assim, não conseguia se convencer de que tudo daria certo.

Katsumi pensava em tudo isso enquanto cortava a cebolinha com rapidez, chegando quase a cortar o próprio dedo. Ela estava nervosa, suava muito, parecia que iria ter um ataque de pânico a qualquer instante. E isso se dava porque sabia que ela estava vindo lhe pegar. Sabia, sabia, sabia! Não importava para onde corresse, não conseguia evitá-la. Sair da cidade também nunca foi uma opção. Sua mãe estava passando por um tratamento de câncer no estômago, que custou muito caro para simplesmente abandonar a cidade às pressas. Sabia que estava brincando com o perigo, mas...

Queria que Yasushi estivesse por perto, que pudesse lidar com a situação ao seu lado. Quem sabe até fortalecer sua relação depois do que aconteceu no passado e com a perda de Kazumi... mas ele se tornou um extremo inútil, que não servia nem para cuidar da própria filha. Katsumi não o reconhecia mais, não parecia ter mais brilho no seu olhar. Além dele, mesmo que tivesse o marido, nunca tocou nesse assunto com ele. Ou contou sobre Ryoba. Ele a acharia louca? Acreditaria nela? Havia cansado de ser taxada como invejosa por causa da fama que Ryoba ganhou depois do julgamento, então simplesmente parou de tentar. A polícia não queria reabrir o caso, ninguém queria acreditar que a Aishi pudesse ter algum envolvimento nisso, então... não havia quase nenhuma esperança sobrando.

Naquele dia... havia recebido uma ligação de um número desconhecido. Ele era o seu último aviso. Ou se matava, ou iria ser morta. Não adiantava tentar fugir, não tinha para onde correr. Ainda teria que lidar com a filha, que obviamente não podia fazer parte de uma perseguição pelas ruas. Trancar a casa e esperar que aquilo fosse um blefe era a sua única alternativa, era o que pensava. Mas quando sentiu algo gelado fazendo cócegas em sua nuca, sentiu o coração parar de bater.

- Olá, Teikyosha senpai~

- R-Ryoba...? – Não precisava virar-se para descobrir quem era. A voz daquela mulher não mudou muito desde 89.

- Hihi, bom saber que a minha senpai não se esqueceu de mim, sinto-me honrada! – Sussurrou ao pé do ouvido dela, enquanto passava o dedo indicador pelo braço da mulher, que devido ao susto, largou a faca na pia.

- O-o que você quer...? O que era aquele telefonema!? Como entrou aqui!?

- Shiiiiu, fique quietinha... ou você quer que eu convide mais alguém para a nossa festinha? Sua mãe, quem sabe? Oh, o senhor Miyazaki? Tenho certeza de que ainda tem o contato dele, afinal, casou-se com a sua falecida irmã.

- ... ! – Katsumi engoliu em seco. Não havia escapatória, finalmente sua predadora a pegou.

- Vamos jogar uma coisinha então. Vai acabar logo, eu te prometo! – Ryoba brincava com a lâmina da faca, apenas a roçando na nuca da mulher, que tremia com o contato contra sua pele.

- O q-que eu tenho que f-fazer para me deixar em paz...?

- Não se preocupe, eu já preparei tudo. Vamos para a sala... – Indo para lá, Katsumi notou que uma corda enfeitava a mesa de centro, uma velha e relativamente curta. – Vamos, se enforque.

- A-ahm...? – Os olhos dela se encheram de lágrimas e instantaneamente, se distraiu e tropeçou no pé do sofá, quase caindo de cara no chão. Por sorte, havia conseguido se equilibrar no último segundo.

- Sabe Teikyosha senpai, não posso correr mais riscos, eu tenho uma filha agora. Quero dizer, ela não pode me ver sendo presa, precisa aprender tudo o que sei antes disso. - Aishi sorriu docemente, como se o assunto discutido fosse outro, um menos mórbido.  

- E-e me matar é a resposta certa...? Que tipo de demônio você é, Ryoba...?

- Hihi, não acredito em Deus ou demônios. Agora pare com esse papo patético, vamos começar de uma vez.

- E se eu n-não fizer isso?

- Então eu pessoalmente vou ter que te matar... e a sua mãe também. Posso chamá-la para cá usando o seu celular, dizendo que é uma emergência. Aquela faca da cozinha ainda deve estar repleta das suas digitais, então um assassinato seguido de suicídio pode muito bem ser feito. – Juntou as mãos a frente do corpo e sorriu ainda mais, fazendo o choro de Katsumi se agravar.

- N-Não, f-faça o que quiser comigo, mas deixe ela em paz!! – Elevou a voz, torcendo que algum vizinho a escutasse.

- Então faça o que tem que fazer. O tempo está se esgotando. – Vestindo luvas negras, Ryoba pegou a corda e a estendeu para Katsumi, que hesitante, aceitou o “presente”. O olhar doentio da mulher se agravava a cada segundo que passava, coisa que não testemunhava desde aquele fatídico dia em que havia resolvido confrontá-la. Isso... havia sido o seu maior erro. Mesmo sabendo do perigo, tudo o que queria era justiça pelo sangue inocente que havia sido derramado. Queria libertar a alma da irmã deste mundo impuro, mas... deste desejo inocente, sua vida foi ameaçada. Não queria que sua mãe se envolvesse... e sua filha poderia sofrer com as consequências de algo que ela nunca saberia ou entenderia. Não poderia fazer isso, não poderia ser egoísta. Katsumi começou aquilo, agora iria até o final.

Com a corda já amarrada, ela subiu em uma cadeira. Seus últimos pensamentos passavam correndo pela sua cabeça. Queria ter tempo de se despedir da família, dos amigos, até mesmo do jardim que tanto negligenciou. Queria escutar a filha tocando sua melodia favorita, queria vê-la crescer e ter uma vida menos miserável. Aquilo tudo, porém, eram apenas desejos. E ninguém era obrigado a tornar os desejos alheios realidade.

Ryoba assistiu à cena toda com tédio, perguntando-se quando poderia ir embora. Havia planejado tudo com antecedência, então não esperava que nada desse errado. Esperou até o dia em que desligariam a energia do bairro para concertar a fiação dos postes. E para entrar na casa, foi relativamente fácil. A fechadura da porta era simples, nada do que Ryoba não pudesse dar conta. E como aquele bairro era pequeno e afastado do grande movimento da cidade, não tinham pessoas na rua. Sem câmeras. Sem pessoas. Sem dificuldades. Conseguiu entrar pela porta da frente.

Assim que garantiu que a mulher estava morta, deu as costas a casa, saindo o mais discretamente possível. Até pensou que poderia ter mais alguém por lá, mas era de manhã, e Katsumi não morava com mais ninguém, pelo o que sabia.

Nessa hora, a porta do armário de tralhas, que ficava na própria sala se abriu. Silenciosamente, uma menina colocou a cabeça para fora. Conseguiu espiar pela fresta, o rosto de uma mulher bonita. Não sabia o que estava acontecendo, ou quem era a pessoa que estava ali, ou por que se escondeu no armário. Céus, por causa do ângulo, nem havia conseguido enxergar a mãe! Antes que pudesse fazer mais algumas perguntas, levou um grande susto. O que era aquilo!? Sua mãe nunca havia brincado de se pendurar numa corda! E por que não se segurava com as mãos?

- Ei, mamãe! O que você ‘tá fazendo? – Ela agarrou as pernas suspensas no ar, enquanto ria, achando a brincadeira estranha, mas engraçada.

Os longos segundos silenciosos faziam a garotinha começar a se preocupar um pouco mais. Ok, a mãe adorava pregar peças nela, mas não estava indo um pouco longe demais?

- Hmm, você estava brincando com uma amiga? Estão brincando de estátua? Talvez ela volte daqui a pouco para conferir se você se mexeu ou não! Hihi, né? – Sorriu, olhando para a face pálida da mãe. Seus olhos estavam fechados.

A casa nunca esteve tão quieta. Ou eram a mãe e a avó conversando ou a música que tocava do seu quarto. A garota queria compor alguma coisa para sua mãe, mas estava travada em uma parte. Queria ter certeza de que estava bom o suficiente, mesmo que a mais velha gostasse de tudo do que ela tocava.  

- Caramba, mas você é muito boa nisso! Ahhh! Eu já sei o que vai te fazer se mexer -  A menina pegou a cadeira que estava caída do lado e subiu nela, alcançando o rosto da mãe, que não mostrava mais nenhum sinal de vida. Não conseguia perceber o movimento de respiração ou nem uma tremida. Ela poderia até ser uma mestra da estátua, mas era impossível ficar paralisado assim. – Hm...? Ei! Mãe!?

Foi neste instante, que ela começou a se desesperar. Aquilo definitivamente não estava certo, alguma coisa tinha acontecido. A garota saltou da cadeira e correu para fora de casa, a procura de alguma pessoa. Não fazia ideia do que havia acontecido, mas sua mãe precisava da ajuda de alguém que realmente soubesse o que estava acontecendo. Ela gritou com todas as suas forças, atraindo os vizinhos daquele bairro pequeno. Tentou explicar com base no que havia visto, mas nunca considerou que a mãe estivesse morta. Isso só empaleceu os vizinhos, que entraram na casa, deixando a menina sozinha na rua. Passado um tempo, avistou o carro do seu pai. Era isso! Ele iria trazer alguma coisa que ajudasse a acordar Katsumi!

- Papai, papai! – Ela correu na direção dele, que apenas lhe lançou um olhar doloroso. A pegou no colo, e tentou esconder a expressão de tristeza.

- Querida... você está bem?

- Estou! Mas...  e a mamãe? Acho que ela estava brincando e acabou dormindo!

- S-sua mãe... eu vou vê-la. Me espere aqui, tudo bem? – A colocou de volta no chão, com cuidado. O homem parecia extremamente nervoso, e com razão. Como poderia dizer a uma criança de 7 anos, que a própria mãe havia se suicidado?

- Ok... – Mais uma vez sozinha, ela sentou-se na calçada e passou a encarar os próprios pés. Uma outra pessoa havia ido visita-las, não? Uma tal de Ryoba... quem era ela...? Cansada daquela longa espera e, assumindo que tudo estava bem agora, a menina se esgueirou pela porta da frente, onde todos estavam de costas.

- Nossos sentimentos, senhor Teikyosha. – Disse um dos homens. Ela viu o pai chorando em cima da mãe, algo que nunca havia acontecido antes.

- P-Por que...? O que tinha de errado? O que eu fiz de errado!? Por que ela se matou? – Ele tirou o óculos e limpou o rosto, enquanto tentava miseravelmente desviar o olhar da esposa.

- Se... matou...? – A voz fina dela ecoou pelo lugar, chamando a atenção. Sabia que morrer era uma coisa terrível. Era ver o mundo escurecer e não pertencer mais a este plano. Isso Katsumi deixava claro, mas sempre falava que só iria acontecer quando estivesse muito velha, então não tinha que se preocupar por agora. Heh, era só mais uma história para tranquilizar as crianças. – Mamãe não se matou... n-não pode ser...

- Filha, disse para esperar lá fora...! – O homem se aproximou e a puxou pela mão.

- M-mas! Mamãe não se matou! Uma mulher esteve aqui mais cedo, ela disse para a mamãe se isfror... Infu, enforcar! – Disse, enquanto permitia-se chorar desesperadamente.

- Kyo, nós conversamos sobre isso depois. Agora, fique aqui. – Já na calçada, o homem falou mais rigidamente, mas a garota só se enfurecia cada vez mais.

- NÃO! – Tentou correr para dentro, queria abraçar a mãe mais uma vez, mas não conseguia se livrar do aperto do pai.

Ele a pegou no colo e abraçou mais uma vez, querendo que aquilo se cessasse logo. A abraçou fortemente e disse coisas como: “vai ficar tudo bem”, repetidamente.

A polícia não demorou a chegar, mesmo o bairro sendo afastado. A sala foi isolada, restando apenas o pai, para que pudesse conversar com os peritos. Kyo ainda estava devastada, mas precisava fazer alguma coisa.

“O mundo dos espíritos é o melhor lugar! Lá, podemos nos encontrar com pessoas conhecidas e fazer o que quisermos! Não que eu queira ir pra lá agora, mas...!”

Sua mãe havia lhe dito isso quando perguntou sobre a vida pós-morte. Poderia encontrá-la naquele lugar? Se pudesse, não seria tão ruim ter que abandonar sua vida normal. Iria até mesmo poder tocar piano para ela mais uma vez! E eventualmente, seu pai provavelmente se juntaria a elas! Viveriam os 3 em um lugar feliz...! Definitivamente, era esse o lugar que queria ir. Agora... como chegar?

Atravessou a cena do crime por trás do sofá, onde não havia ninguém. Discretamente correu para a cozinha, ainda tentando pensar em algum jeito de ir embora deste plano. Sabia que para morrer, precisava se machucar muito antes... Sua avó tinha um câncer no estômago, não? Era para isso que estava fazendo tratamento, então aquele lugar deve ser frágil! Alcançou a faca que havia sido largada na pia... sentiu as mãos tremerem... apontou para um lugar que julgou ser o estômago. Respirou fundo e sorrindo, enfiou a faca com toda a sua força. Kyo sentiu uma dor aguda. Algo inexplicável. Não conseguiu pensar em nada, apenas que, quando abrisse novamente os olhos, estaria no mundo espiritual, com sua mãe.

Tudo daria certo...né?

- x -

- Pare de se mexer. – Com uma voz fraca, ele pediu para a outra com uma certa raiva.

- Ma-

- Estou quase acabando.

- E eu lá te dei permissão...? – A garota tentava esconder o rosto com a mão, apenas para ele agarrá-la e tirá-la da frente.

- Estou te desenhando, não tirando uma foto e colocando num pedestal para idolatrar.

- Tanto faz.... -  Ela coçou os olhos e tirou os óculos, descansando um pouco com os olhos fechados. – Vai me assistir no recital de sábado ou não?

- Sabe que não tenho interesse algum na música. – Sem tirar a atenção do bloco de folhas, o rapaz respondia calmamente.

- Nem se eu tocar a marcha fúnebre? – Pediu, com jeitinho.

- Não.

- Caramba... – Derrotada, ela suspirou e virou a cara. Aquele cara era difícil, tinha que admitir.

- Mas te desenhar tocando o piano pode ser interessante. – Adicionando os últimos detalhes naquele rascunho, ele estendeu o bloco para a garota, que relutantemente o pegou.

- Huuuh, sério, por que me desenha tanto...? É pior do que tirar foto! – Disse ela, meio brava, meio envergonhada.

- É que você está com uma cara horrível.

- Eu sei.

-  Você sempre está com uma cara horrível.

- Eu sei...

- Isso é bom, me inspira a desenhar mais.

- ... Você é estranho, Sadatoshi. – Bufou.

- Você também, Teikyosha.

- Obrigada.

-  Igualmente.

- E aí? Vai pra onde ano que vem? – Perguntou Kyo, não muito ansiosa. Ela definitivamente não tinha energia de sobra.

- Meus pais querem que eu vá para Akademi High. Parece ser um bom lugar, mesmo tendo um monte de gente de nariz em pé.

- Akademi né...

- Mas e você? Planeja tentar lá ou continuar por aqui? Seria uma pena se tivéssemos que nos separar. – Ele até podia até estar falando isso, mas sua voz não continha nenhum rastro de tristeza aparente.

-  Por que eu iria querer passar mais 3 anos na mesma turma que você...?

- A pergunta mais correta é: Por que não iria querer passar mais 3 anos comigo?

- ... Você só não quer perder a única pessoa que te aguenta e que ainda dá permissão para ficar desenhando, né?

- É.

- Hunf, era de se esperar. E para a sua tristeza, já vou adiantando que não planejo chegar perto da Akademi. Aquele lugar está envolvido por uma aura negra.

- Eu sei que já aconteceram alguns assassinatos lá, mas o que aconteceu no passado ficou no passado.

- Aah, eu sei... mas minha mãe me dizia que lá era um lugar perigoso, com gente perigosa.

- Gente perigosa...? Bom, normalmente esses lugares prestigiados costumam atrair pessoas com mentalidades duvidosas, mas... se acontecesse sempre, muitas pessoas sairiam danificadas de lá, o que não é verdade.

-  Mesmo assim, isso não ‘tá certo! Eu topo ir ‘pra qualquer colégio, menos aquele!

-  Hmm... sei não, talvez você mude de ideia... – Disse ele, tentando provocá-la.

- Sem chance... se eu um dia estudar lá, eu prometo que poso por um dia inteiro ‘pra você!

- Heh, você que ‘tá que dizendo... e eu vou cobrar. Mas sério, tente pensar seriamente sobre o seu futuro.

- Claro, claro... – Ela suspirou.

- Bem, tanto faz. Isso não nos impede de continuar se encontrando pela cidade. – Por fim, ele fechou o seu bloco de notas.

- Quando você for embora, eu vou fazer o possível para nunca mais te encontrar na rua...

- Eu sei onde você mora, isso vai ser impossível.

- Está querendo dizer que vai me perseguir...?

- Depende do dia da semana.

- ...!

- Claro que não faria isso. E eu tenho muitas fotos suas de qualquer maneira.

- Grrr, isso não é justo... como consegue tirar fotos minhas nos meus piores momentos!?

- Você é tipo uma comédia trágica.

- E você parece um daqueles caras vitorianos que gosta de vampiros...

-  Vampiros...? Prefiro esqueletos.

- Eu prefiro pessoas de carne e osso...

- Por isso que eu tenho gostos melhores do que os seus.

- Aaah... sei, sei... e você nem olhou os tipos de mangás que eu leio! Aposto que eu tenho um gosto muito melhor!
 

- Não.

- Um “não” com certeza não é uma resposta forte, Boru!

- ...Não.

- Para com isso! – Apontou para ele, irritada.

Kyo não sabia ao certo por que se dava ao trabalho de conversar com aquele garoto. Tudo bem que eram do mesmo ano, mas essa foi o único motivo para eles terem feito amizade!? Aaah, isso era um assunto muito complicado.

-x-

 O horário escolar se encerrava ali e Kyo não demorou para voltar para casa. Depois do ocorrido com a mãe, ela e o seu pai se mudaram para bem longe de lá, para abandonarem as memórias ruins. Não que tudo se resolveu com isso, mas foi bom deixar a velha residência. Não demorou muito para que chegasse ao seu destino.

- Cheguei... ah, verdade. – Deixou os sapatos para trás e entrou em casa. Estava morando sozinha há alguns meses, desde que seu pai conseguiu arranjar um trabalho no exterior. Talvez ele tenha feito isso para tentar abandonar toda aquela história, mesmo que significasse deixar a filha para trás. Kyo não queria sair do Japão, sentia que não podia abandonar o seu país de origem e claro, abandonar o espírito da mãe. Assim como ela, teve contato com o oculto desde pequena, então acreditava fortemente em fantasmas e rituais.

Quando parava para pensar no que aconteceu há 8 anos atrás, tudo o que passava pela sua cabeça era que sua mãe definitivamente não havia se suicidado. Não estava louca ou tinha desenvolvido um trauma de infância, tem certeza de que escutou a conversa de duas pessoas, duas mulheres, e uma delas era Katsumi.

“Se enforque.”

“Que tipo de demônio você é, Ryoba...?”

 

Sim, ela se lembrava. Era impossível ter se confundido, mesmo que não soubesse o que essas palavras significavam naquela época. E mesmo que sempre tentasse provar isso aos outros, nunca era levada a sério. Nem seu próprio pai acreditava nela... ninguém acreditava. Isso apenas a desmotivou. Não ser levada a sério sobre a morte da sua mãe, realmente a faziam considerar tentar se matar de novo... eram tantas coisas que flutuavam pela cabeça da jovem Teikyosha.

Se arrastou até a cozinha, que estava toda bagunçada. Não importava, deveria apenas tomar sua dose diária de remédios. Sua “cuidadora” iria começar a encher o saco se não tomasse o que lhe foi pedido, então o fez de uma vez. Essa “cuidadora” a visitava todos os dias, por volta das 18:00 P. M. Para variar, deveria ao menos poupar seus ouvidos de toda a bronca que levaria. Tinha lição de casa para fazer, mas não estava com ânimo para isso agora, queria passar o resto do dia dormindo. Quando tirou os óculos para deitar no sofá, seu celular apitou lá do outro lado da sala. Não, não iria levantar.

Então, mais algum tempo se passou até que outro barulho fosse captado. Não era sempre que recebia mensagens, mas não estava nem um pouco curiosa para descobrir quem que estava interessado em conversar com ela. Na verdade, poderia ser tanto a “cuidadora”, seu pai ou Boru. Então... tinha que dar uma olhada.

- Aaah.... se não for importante eu vou... – Pegou o aparelho e se jogou no sofá. Surpreendeu-se ao ver que era um número desconhecido. Seria um de seus colegas de sala? Não havia dado o contato para muitas pessoas, então... talvez tenha algo de errado.

??? escreveu:

Olá. Eu sei que é estranho mandar uma mensagem do nada, mas nós precisamos conversar.

Kyo escreveu:

?

Acho que você errou de número.

??? escreveu:

Você se chama Kyo Teikyosha?

A garota olhou para aquela mensagem por alguns segundos, paralisada. Ok, se isso era uma piada, não estava engraçada. Deveria ser um dos colegas tentando importuná-la, só podia ser isso...

??? escreveu:

Hey, eu sei que ainda está aí. Kyo, não precisa ter medo de mim, eu quero te ajudar.

Kyo escreveu:

Ajudar? Com o quê?

??? escreveu:

Sobre a sua mãe. Eu tenho uma ideia do que pode ter acontecido, mas preciso conversar com você para ter certeza.

- A-ahm...!? – Ela tentou jogar o sono para longe, visto que a conversa parecia estar chegando a outro nível.

Kyo escreveu:

Do que você está falando? Como poderia saber alguma coisa dela? Além disso, eu nem sei quem é você...

Se está falando sobre eu achar que não foi um suicídio, e veio aqui só para tirar com a minha cara, por favor, isso não tem graça alguma.

??? escreveu:

Eu sei que não foi um suicídio.

Quero provar exatamente o contrário.

Kyo escreveu:

 É sério, para de tirar com a minha cara!

Cansada dessa conversa idiota, ela foi tentar bloquear o número daquela pessoa estranha, sem sucesso.

- Eeh!? Por que não está dando certo!? – Isso com certeza não deveria acontecer! Mas o pior de tudo foi receber uma ligação daquele número, repentinamente. Talvez devesse tentar escutar o que ela tinha a falar, mas... não queria que fosse só mais uma esperança falsa. Como continuavam a insistir, Kyo acabou aceitando a ligação.

- A-alô...? – Seu coração batia numa velocidade fantástica. Apesar de querer xingar a pessoa, agora que estava ouvindo a voz dela, parecia que sua coragem havia evaporado.

- Alô, Kyo? – Era... uma garota, com uma voz relativamente fina. Pensou que pudesse ser um moleque passando trote, quem sabe até um psicopata! Foi uma grande surpresa.

- E-err, sim... mas e você!? Posso saber o que quer comigo!?

- Ok, vamos por partes. Eu me chamo Joho Teikyosha.

- A-ah... ahm!? Como assim!? Você... eu...? Calma, eu ‘tô confusa! – Kyo sabia que não haviam parentes em Buraza... então essa garota poderia ser de outra cidade ou estado?

- Haha, sim, eu imagino... acredito que sua mãe nunca contou sobre as irmãs dela, né?

- Oh... ela tinha irmãs!?

- Uhum. Eu sou filha de uma delas.

- ... Então... você quer me ajudar mesmo?

- Claro que sim. Eu não sabia que minha mãe tinha irmãs, até descobrir mais sobre a vida do meu pai. Aconteceram tantas coisas Kyo, mais tantas mesmo... e tudo por causa de uma única mulher. – A voz de Joho falhou por um segundo. Ela parecia estar falando sério.

- Uma mulher...

- Ryoba Aishi. Tenho certeza de que ela tem algo a ver com isso. Ainda não tenho uma prova concreta, apenas gravações que o meu pai deixou para mim. Por isso... que nós temos que nos unir. Temos que fazer o que é certo, vingar os nossos parentes.

-  Ryoba... Vingar...? É tudo o que eu mais quero na vida. Mas o que podemos fazer? Ninguém acredita que a minha mãe foi assassinada, como poderemos provar para as autoridades?

- Vamos investigar por conta própria. Se quiser esperar pelas tais autoridades, então morrerá antes. – Deu uma pausa. – Sabe... eu nunca gostei muito do meu pai. Ele sempre foi preguiçoso e irresponsável, e depois que eu descobri o que o deixou assim... só pude sentir mais raiva. Como não foi capaz de fazer a Ryoba pagar pelos os seus crimes? Como conseguiu enfurecer a nação toda? Aah, esse é outro motivo que me faz querer vingança. Vou provar que ela não é invencível.

- Uhm, Joho? M-mas nós vamos atrás de uma mulher adulta? E-eu não sei se tenho coragem o suficiente, ainda mais... sozinha.

- Por isso que eu te liguei, se não teria chegado de surpresa. Moro em outra cidade, do lado de Buraza, então não queria que a viagem fosse a toa. Quer a minha ajuda ou não?

- Eu...

- Pense com cautela, Kyo. Podemos nos ajudar, conseguir o que tanto queremos. A Ryoba finalmente vai ser pega e você não será mais caçoada. Na verdade, será a heroína que nunca desistiu da verdade.

A garota parou de falar e começou a pensar. Aquela pessoa que alegava ser sua prima lhe parecia ser um pouco assustadora, mas... era a única esperança que tinha no momento. Poderia provar a todos que não era louca, ou que havia sofrido algum trauma desde aquele dia. Era literalmente a oportunidade que a livraria de todos os pesos amarrados em seu corpo. Aquilo era.... era a sua salvação!

- J-joho! E-eu aceito! Eu quero a sua ajuda! – Eufórica, quase gritou na orelha da outra.

- Sabia que não iria recusar! Prima, nós duas seremos capazes de encerrar esse capítulo das nossas vidas. Vamos trazer paz para aqueles que não estão mais aqui... muito obrigada por me ouvir.

- Eu... eu nem sei como te agradecer. Nunca pensei que alguém tentaria me ajudar. Isso é... muito animador.

- Huhu, imagino... bom, vamos continuar nos falando então. Eu tenho que organizar umas coisas aqui em casa, podemos nos falar amanhã de novo?

- C-claro! Me ligue a qualquer hora! Ahm, menos quando eu tiver na escola...

- Haha, certo, Kyo.

- Ah! Bem... você pode me chamar pelo meu apelido, em vez de Kyo. É que as pessoas me chamam mais por ele do que pelo primeiro nome, haha!

- Oh, e qual seria?

- É uma história engraçada... o meu nome tem vários significados diferentes, e quando eu era bem nova, uma amiga estava me contando sobre eles. Mas eu não ouvi direito e acabei falando errado, haha. Kyo... pode significar damasco, mas eu falei damasu... aí ficou.

- Parece que nós tivemos infâncias bem diferentes. Não que seja uma coisa ruim... Bom, “Damasu”, nos falamos amanhã então. Boa noite!

- B-boa noite!

E... a ligação acabou ali. Ela não sabia exatamente o que pensar ou o que deveria fazer, era só uma adolescente de 15 anos afinal. Aquilo era muita informação. E mesmo que se sentisse completamente nervosa, sabia que era a melhor decisão que poderia ter tomado. Queria limpar a alma, tirar o peso das costas. Não seria ótimo se tudo desse certo? Talvez seu pai até retornasse dos Estados Unidos para vê-la! É, tinha que tentar!

E depois daquele dia, Kyo e Joho passaram a conversar todo dia, até a vez em que se encontraram pessoalmente na própria casa da mais nova. Joho tinha um plano, um grande plano calculado. Isso envolvia... muitas formas indiretas e diretas de vingança. Pegar Ryoba era o principal, mas... por que não fazê-la sofrer um pouco mais? Além disso, talvez conseguissem mais informações sobre a rotina dela, se abordassem sua filha, uma garota de 15 anos chamada Ayano Aishi.

Não foi fácil localizá-la, e quando conseguiram, Ayano já estava na Akademi. Então... Joho assumiu a identidade de Info-chan e se infiltrou na Akademi durante aquele ano para estudar o comportamento e a rotina de Ayano. Era difícil descobrir alguma coisa, já que ela não conversava com ninguém, fazendo que o trabalho de quase 1 ano fosse por água a baixo. Foi aí que o plano precisou mudar, Kyo precisava se infiltrar como aluna para descobrir mais coisas. Para ficarem na mesma turma, ela fez questão de repetir o primeiro ano de propósito. E forjar uma identidade falsa não era um problema para Joho, mas depois que conseguiram fechar negócio com outra pessoa, logo depois da morte da Amai, nenhum trabalho sujo foi necessário. Foi... bem fácil na verdade.

 Não importava quanto tempo investiriam nisso Não importava quantas pessoas iriam morrer durante esse tempo. Não importava o que precisavam fazer. Ryoba Aishi iria pagar.

 

 

 

 



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