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História Linzsister - Solstício


Escrita por: Man-wol

Capítulo 9 - Solstício


Fanfic / Fanfiction Linzsister - Solstício

 

- Então.?! 

 

Então… 

 

Oh, céus… Dai-me paciência Deus!

 

- Silêncio - repreendo o cinismo do homem que pela enésima vez me apressa.

 

- Eu não tenho o dia todo garota, seria grato se deixasse a lerdeza cotidiana de lado. Meu tempo é precioso - a voz do homem atrás de mim salta dois oitavos me fazendo suspirar cansada de suas reclamações. Irritante.

 

- Seus bons modos são surpreendentes senhor Kim - olho o homem de soslaio - para seu bom entendimento meu nome não é "garota" e sim Lee Chin Sun, doutora Lee já está de bom tamanho para mim.

 

- Sou seu chefe e dono deste lugar a chamo como bem entender - a frieza que o Kim esbanja me faz parar por alguns segundos e olha-lo indiferente. Eu preciso ter muita paciência.

 

- Está correto - afirmo instigando sua altivez - é meu chefe, no entanto não é meu dono e muito menos alguém de fato superior. É apenas meu chefe e por tal razão deveria me tratar melhor já que sou sua última esperança. Estou equivocada senhor Kim Seokjin?

 

O silêncio branda no salão, a respiração enraivecida de Jin se propaga sobressalente e apenas o pigarrear forçado de Namjoon ao seu lado é capaz de parar o possível - novo - surto de Jin.

 

Meu sorriso se enviesa, eu giro em meu próprio eixo e volto toda minha atenção aos monitores mais uma vez. Na matriz tenho a atenção massiva dos cientistas e diretores, há uma certa euforia junto da esperança que despejam sobre meus ombros, mas o que prevalece é a negatividade que expõe perfeitamente que a grande maioria não acredita que sou capaz de solucionar seus problemas.

 

Sinto meu corpo formigar em algumas partes, há um latejar sutil em minha cabeça, minha visão ainda não está completamente normalizada e são as mãos trêmulas que me denunciam e comunicam; eu, definitivamente, não estou bem.

 

Ainda com um leve mal estar eu sigo de pé em frente aos grandes monitores que Lívia outrora me apresentou. Eu movo os controles, reviro os arquivos e dados acumulados por toda a horda de pesquisadores, separo parte dos documentos e registros das pesquisas, grifo os tópicos mais importantes e não me livro do fardo de realizar breves pesquisas na internet para tirar a prova real de minhas suposições.

 

Tudo que faço leva tempo e, se em momentos normais tempo já é algo fastidioso, agora a situação se agrava em outro patamar; ninguém nesta sala parece satisfeito com minha demora e, tampouco parecem convencidos de que o que estou separando é a resposta para seu problema.

 

Eu não os culpo, cientistas são criaturas difíceis de lidar e, para si, qualquer dado pode se tornar informação, basta que este dado seja processado e transformado. O que lhes disponho de fato são dados, porém não conexos. Já diziam meus professores em sua monotonia repetitiva, dados existem deliberadamente e eles somente não são nada, todo dado precisa ser moldado, traduzido e processado até se tornar uma informação; é nesse ponto que talvez nem mesmo o melhor dos cientistas presente seja capaz de compreender algo neste mar de informações perdidas que disponho.

 

Sinto olhares de descrença e resmungos quase inaudíveis de “isto é perda de tempo”, assim como vejo uma pequena parcela curiosa que tenta traçar meu raciocínio banhado das drogas de mais cedo - sim, os analésicos para as dores de cabeça estão fazendo um bom trabalho; no todo a resposta ainda é de que tudo que faço é impossível.

 

Lívia rói as unhas que já não tem ao pé dos controles, ela observa a tudo e a todos, me suplica silenciosamente para que eu não esteja fazendo uma grande confusão por nada e só ganha meu riso cansado como resposta, pois por mais louca que minha hipótese seja, é na sua loucura que vejo a verdade escondida de todos. Se não me internarem em um manicômio desta vez, provavelmente nunca mais farão.

 

- Senhorita Lee, eu compreendo que o que faz pode ser complexo, mas no quesito tempo estamos desgastados… - a voz tênue de Namjoon me cobra, eu compreendo o nervoso, mas o desgaste em meu corpo que não me permite ser paciente ou sequer benevolente - Se puder ser um pouco mais rápida… Seremos gratos.

 

- Está pronto.

 

A afirmação final repercute em burburios, até mesmo os desinteressados e descrentes se alvoroçam com certa apreensão e no fim o que me resta é apenas apertar o botão dos hologramas para que tudo que foi separado paire no ar ao meu entorno.

 

Minha respiração pesa descomunalmente, sinto a garganta seca e a adrenalina corre constante por minhas veias; é o fulgor da descoberta. Eureka deveria eu gritar? Não, apenas continuar a respirar já é proporcionalmente extasiante, quase eufórico. Não estou pronta e tampouco certa do que virá, mas a resposta de 1001 está a minha volta. Sim, eu tenho a resposta.

 

- Eu… Eh…

 

Minha voz falha, pigarreio desconcertada com tantos olhares, mas respiro, suspiro, me acalmo e é o acenar positivo de Lívia ao meu lado que me incentiva; vai dar tudo certo. Tem que dar certo.

 

- Todo o problema de vocês está origem desconhecida do espécime 1001 - afirmo com convicção e um sorriso cínico surge nos lábios da criatura que mais desgosto entre todos os presentes.

 

- Ah que grande novidade a mocinha nos trouxe! - o deboche goteja em cada palavra que reverbera e a risada irônica de seus cães logo se alastra. Maldito - Deveríamos documentar a nova descoberta da senhorita Lee? Quem sabe até mesmo prestigiá-la com um prêmio! Francamente menina, isto é perda de tempo, nos chamou aqui para nos dizer algo que todos já sabem?!

 

- Em primeiro lugar cale sua boca, pois eu não lhe dei o direito da palavra doutor Shinzui - dito sem temer e as risadas se travam com amargura -; em segundo lugar eu não terminei de falar então não tire conclusões precipitadas e, tampouco desfaça do conhecimento que eu tenho e o senhor não; em terceiro e último lugar: eu não aceito que absolutamente ninguém dentro desta sala desdenhe de mim, eu não fui educada tão assiduamente para ser feita de palhaça ou desmerecida. Se querem minha resposta acho bom os senhores presentes conterem todo o tipo de resposta indevida e questões infantis para si ou eu simplesmente sentarei na cadeira mais próxima e, com uma bela xícara de café assistirei de camarote a morte de seu superestimado espécime esquisito e bisonho. Dito isso…

 

Movo-me no salão a fim de ganhar espaço e organizar os hologramas esvoaçantes, coloco-os em ordem, por mais que não pareçam ter conexão e me volto aos olhos frígidos, suspiro com cansaço e com a ajuda de um laser aponto a primeira parte da cansativa explicação que terei de fazer. Agora eu já não tenho medo.

 

- Eu quero que olhem com atenção este arquivo, essa parte em específico é a origem protocolar de ROAR, como podem ver houve modificações no código genético de crianças para ocorrer uma mutação e assim gerar o que vocês chamam de híbrido, no entanto a resposta do corpo humano a alteração genética não foi positiva em um total de 525 experimentos, para só então ter seu primeiro resultado positivo, 526. Com o segundo espécime, o resultado foi semelhante ao primeiro e isso ocorreu porque o corpo humano simplesmente elimina as células híbridas como forma de autodefesa, a célula híbrida é reconhecida pelo organismo humano como uma disfunção celular e consequentemente um invasor. Automaticamente o corpo gera um grupo massivo de anticorpos para eliminar toda célula híbrida e o resultado é um deterioramento celular geral, o corpo entra em um processo infinito de regeneração e combate celular até que o indivíduo venha a óbito ou êxito.

 

- Isso é apenas celulose geral, um corpo estranho ou não identificado tem que ser eliminado, assim funciona o corpo humano - Taehyung se interpõem curioso - é questão de imunologia, mas não é cabível, o corpo humano nunca vai identificar uma célula mutada e muito menos permitirá seu alastrar ou regenerar. A menos, é claro, que essas células híbridas se comportassem como as de um tumor para formar metástase ou o próprio HIV para não permitir a destruição delas...

 

- Exatamente, seguindo a lógica da anatomia humana não existe êxito neste método doutor Kim - eu afirmo desgostosa com a resposta que eu mesma tenho - é por isso que nenhum dos seus antepassados teve êxito e o projeto se tornou obsoleto, mas vocês reativaram este processo, usaram as mesmas formas antiquadas e ainda nas primeiras tentativas vocês viram que fisiologicamente é impossível. Eu fui um pouco mais a fundo, procurei melhor entre os arquivos e achei a sua resposta nos testes, vocês mudaram as células híbridas para de um animal mais simples e juntamente disso descobriram onde estava o erro principal; não bastava mutar células e inseri-las como um vírus para que se propagasse, foi preciso ir mais a fundo e programar o corpo para não receber as células como invasores e sim um novo grupo celular para osmose. Para 526 e 739 sobreviverem foi necessário uma alteração no código genético retirando uma parte da fita genética e interpondo por partes o código animal. A maior parte foi inserida diretamente no córtex cerebral e espinha medular na intenção de ser mais assertivo e, de fato foi, ambos sobreviveram ao que eu chamei de “efeito rebote”.

 

- Efeito rebote? - Namjoon se curvou na cadeira buscando compreender meu raciocínio - Isso não consta no sistema.

 

- Consta, mas vocês deram a nomenclatura errada. Apesar da sobrevivência e adaptação do corpo humano as células híbridas, ambos os espécimes possuem deficiências no organismo em função da mutação, além disso o projeto de hibridismo buscava algo mais realístico ao originário animal, mas devido a ter somente partes do código genético de um animal o corpo humano não suporta modificações exorbitantes em sua morfologia. Além da mutação incompleta ainda houve perda significativa da proficiência humana, coisas como atraso de fala, introspecção e mudanças hormonais, tudo foi derivado da mutação em seu código genético. Eu analisei todo o desenvolvimento dos híbridos como animais e humanos, são lados opostos, à medida que cada um deles desenvolve uma função humana eles perdem a função animal e vice versa.

 

- Você quer dizer que conforme os fazemos desenvolver uma função humana ou animal ele irá perder outra? Seria um caso de eleição? - Namjoon franze o cenho perdido nas próprias palavras.

 

- Eleição não, evolução é a palavra - pontuo movendo os hologramas para o que melhor explica a situação - é dessa forma que ocorre no mundo animal, uma evolução constante que resulta na sobrevivência de um indivíduo, nós mesmos, seres humanos passamos por isso, com animais de outras espécies não é diferente e se tratando de híbridos essa função se acentuou. Para os espécimes não é meramente evolução, é uma adaptação, sua mutação os fez perder uma função de memória humana, a memória de longo prazo, dessa forma o que prevalece para eles são funções importantes apenas como a de comunicação, alimentação e higiene, eles são como criaturas simples, sem os complexos ligamentos neurais, eles pensam de forma simples e agem de forma simples, são criaturas evoluídas para serem simples, eles são o que posso chamar de mutação simples ou incompleta.

 

- Surpreendente, você não só estudou 1001, mas também os demais espécimes em tão pouco tempo… Incrível Lee… - Lívia balbuciou com os olhos esbugalhados arrancando um breve sorriso de mim.

 

- Não é bem essa a questão, se eu não descobrisse melhor o que originou tudo eu não poderia entender o que ocorre agora. Vejam isso - afirmo puxando os hologramas e os ampliando para melhor visualizarem - esses são os padrões vitais dos primeiros híbridos que fizeram e estes são dos últimos. Como podem ver há uma diferença drástica, quase absurda, desde os batimentos cardíacos até número de plaquetas e glóbulos vermelhos no sangue, tudo é completamente diferente. Juntando seus espécimes em dois grupos distintos, aqui vocês podem ver o real significado que a palavra evolução terá. Vocês podem entender perfeitamente onde quero chegar, pois 948 e 1001 foram híbridos completamente distintos, eles não sofreram mutação ainda nos primeiros anos de vida como os dois primeiros espécimes, eles nasceram híbridos, são fetos de inseminação in vitro e isso fez toda a diferença acontecer.

 

- Então você partiu do comparativo? - Namjoon se ergueu caminhando por entre os hologramas - Digo, é óbvio que os espécimes são de criações diferentes, nós não usamos nenhuma criança viva como nosso tio… A intenção ao ter crianças nascidas com o hibridismo parecia melhor dentro do contexto experimental, achamos que assim algumas falhas no código genético poderiam ser corrigidas, mas… 1001, mesmo sendo criado da mesma forma que 948, não teve nada semelhante, desde o comportamento até as funções do próprio organismo, ele é uma incógnita.

 

- Na realidade o princípio estava certo, a criação é que foi errada - resmunguei recebendo um olhar duro de sua parte - se você usar primeiro 948, verá que ele já era a resposta híbrida necessária, não havia porque criar 1001. O espécime 948 tem uma evolução muito maior que os dois primeiros espécimes, a criação é autêntica apesar de contraditória. O que ocorre em 948 é que seu corpo tem as funções mais complexas como a de um humano e, em suma, o hibridismo criou uma estrutura molecular completamente diferente da conhecida, é ela que vocês nos apresentaram ainda na seleção de quem viria a matriz. É a forma molecular usada para mutar o zigoto da inseminação - observei o holograma com as funções neurais de Jimin - ele é perfeito… - a verdade escorregou por meus lábios mais sucinta do que deveria - Não tinha porque tentar fazer essa coisa toda de novo.

 

- O espécime poderia morrer - pela primeira vez escuto a voz branda de Jin, no meu campo de visão seu rosto belo está sério, mas há traços de ressentimento, quase como uma culpa sobreposta de arrogância - não tínhamos certeza se a criança nasceria com vida, nem se iria crescer e se desenvolver corretamente, era tudo incerto, você diz que ele é perfeito, mas ninguém saberia dizer até seu nascimento e desenvolvimento.

 

- Jin hyung está certo, eu mesmo revisei os arquivos da gestação, foi bem complicada, eles fizeram um monitoramento desgastante para assegurar que tudo estava bem - Taehyung interveio antes da minha acusação - muitas ultrassonografias foram feitas e o feto em si se desenvolvia bem, mas a progenitora… O grande problema foi a gestação não completar o ciclo.

 

- Independente disso, soube que 1001 não foi criado sob ordens diretas, estou equivocada? - retruco incisiva aos irmãos que se entreolham na conversa silenciosa.

 

- Não… - Namjoon suspira com a resposta que me cede.

 

- Então não estou errada ao afirmar que a existência dessa criatura é errada e desproporcional ao que me dizem - rogo diante do silêncio gutural - sua mentira é tão ridícula que vocês se contradizem escancaradamente. - acuso sem piedade assustando alguns dos que assistem silenciosamente - Vocês alegam que temiam pela sobrevivência de seu espécime, mas tiveram tempo suficiente para saber que ele era saudável e que teria um bom tempo de vida na estimativa, não tinham nenhum motivo para criarem 1001, mas o fizeram, fizeram por ganância e egocentrismo, fizeram pelo desejo ridículo de brincar de Deus!

 

Os olhos envelhecidos de Shinzui me fuzilam, me trucidam e acusam, se pudessem me matariam da forma mais dolorosa possível, mas ele não pode. Quem nos assiste entende perfeitamente e nem mesmo os irmãos Kim ousam interferir na nossa batalha feroz, entre os Kim, eles compreendem de imediato que as ofensas proferidas por mim nem mesmo foram para si, tudo foi legitimamente ao homem estacado próximo a saída.

 

Meu maior desejo é acabar com sua farsa, por mim contaria os mais ínfimos detalhes que sei sobre o homem, delegaria-o impiedosamente para que pagasse com os restos dos seus dias o que causou a inúmeras pessoas, é uma pena de fato não poder. Seu rosto senil pouco me comove, a pose dura e ríspida não me intimida e o olhar funesto não me traz um pingo de receio de enfrentá-lo. Eu apenas sinto repulsa pela sua existência neste mundo.

 

- Se desejam mentir, façam isso melhor - articulo dando as costas ao velho repugnante - vocês podem enganar qualquer um dos cientistas aqui presentes, mas não a mim - afirmo frígida ao mover os hologramas até a parte desejada - mesmo que muitas modificações tenham sido feitas para criar 948… Não, mesmo que elas tenham sido feitas para gerar Jimin… Vocês erraram apesar de obterem certo êxito, Jimin não foi imune ao efeito rebote do hibridismo e apesar de ser um indivíduo bem mais complexo que os dois primeiros espécimes, o animal usado para seu hibridismo é conhecido de muitos anos pela deficiência em alguns aspectos e o mais predominante, obviamente, é a pele.

 

- Isso é apenas um detalhe, pelo que me informaram a questão da pele é como uma hipersensibilidade, mas nada grave - Namjoon parou ao meu lado para ler os artigos científicos que dispus para me justificar.

 

- Errado, a hipersensibilidade é congênita e progressiva, a longo prazo é propensa a desenvolvimento câncer ou, se meu palpite não for tão absurdamente improvável, LES.

 

- Ei, espere um momento, LES??! - Taehyung sobressaltou exasperado até onde Namjoon lia distraidamente - Isso é impossível!

 

- LES? - Jin seguiu o mais novo que me olhava apavorado, quase suplicando para que meus dizeres fossem uma grande mentira - O que isso significa?

 

- Lúpus Eritematoso Sistêmico - afirmei branda vendo Taehyung caminhar afoito pelo salão - é uma doença que pode surgir a qualquer momento em qualquer indivíduo, mas no caso do seu espécime a propensão é muito maior e a consequência dela no organismo dele… Sinceramente não tenho certeza se existe formas de tratar esta doença em um organismo completamente diferente. Veja bem, não tem cura atualmente, apenas tratamento, mas tratar um indivíduo completamente humano já é difícil, um híbrido… É quase improvável.

 

- Espere, espere! - Taehyung interveio agarrando-me pelos ombros - Você só pode estar brincando! Lúpus? Ele?? Não dá, você… Você sabe a que me refiro não sabe?? 

 

- Taehyung o que há com você? - Namjoon o afastou de mim e Taehyung grunhiu apavorado - Você é médico conhece a doença, é tratável, pode não ter cura, mas dá para tratar, podemos modificar os medicamentos e dosá-los de forma alternativa, não precisa de tudo isso. Além disso, é apenas uma especulação da doutora Lee, não quer dizer que vá de fato acontecer.

 

- Você não entende! - o mais novo se descontrolou o olhando com pavor - Vocês não escutaram uma vírgula do que ela disse antes??! Lúpus é uma doença autoimune, o próprio sistema imunológico passa a atacar o organismo do indivíduo, vai destruir órgãos saudáveis, vai destruir células, o sistema nervoso central, tudo, absolutamente tudo - o homem berrou gesticulando agressivamente - quando essa merda chegar nas células híbridas vai matar o gene, vai causar falhas na fita genética até matar tudo…

 

- Mas se isso acontecer… - A voz de Jin morreu sem concluir.

 

- Se isso acontecer, vocês não terão mais um híbrido - ditei incisiva e os murmúrios correram a sala com certo pavor - diferente do que se esperava, seus estudos também reconheceram que células híbridas são bem sensíveis apesar de tudo, elas carregam uma informação genética valiosa, no entanto quase defeituosa, foi por isso que o hibridismo nos primeiros experimentos foi falho, o próprio corpo vai ajudar o Lúpus a matar toda e qualquer célula estranha até não restar mais nada. Em consequência do hibridismo há leves indícios de autismo em Jimin, eles passam despercebidos graças ao hibridismo, mas sem isso vocês terão apenas um menino autista preso dentro de quatro paredes e nada mais.

 

A verdade é dura, destrói o perfeito mundo dos sonhos criado pelos homens e é entre os murmúrios que eu vejo mais um lapso nos sinais vitais de 1001. Mesmo que Jimin não fosse o enfoque neste momento, sinto que minhas palavras eram necessárias, eu precisava ser ouvida e se não fosse pelo momento oportuno sequer me dariam ouvidos ou seguiriam tão precisamente minha linha de raciocínio.

 

Lívia parece destruída, a palidez toma sua face com a percepção da verdade, minha colega tem um vinco na testa demonstrando sua confusão mental assim como Taehyung que ainda se descabela nervoso. Jin parece preocupado, mas não aflito, ele apenas tem o olhar perdido na face rígida de Shinzui. Namjoon é o mais calmo, ele parece totalmente ciente dos fatos, talvez ele seja o mais propenso a agir com coesão e não emoção.

 

- Por mais que estejam perdidos nesse momento eu preciso da sua atenção - chamo os presentes para minha posição - ainda que seja motivo de preocupação, Jimin até o momento tem sua saúde intacta, quem precisa de uma solução urgente é 1001. Preciso que prestem atenção a partir daqui, porque essa é a resposta que não tinham e nem mesmo teriam como ter.

 

Pedindo o afastamento dos irmãos eu movo mais hologramas, peço para escurecerem todo o ambiente o máximo possível e dentro da penumbra os hologramas se avivam. O cintilar vermelho permanece em alerta, os sinais vitais da criatura se embaralham confundindo até mesmo o próprio sistema e é com a síntese do que eu sou que me volto para o grupo de pessoas. Minha voz precisa ser ouvida.

 

- Por mais duro que isso que direi soe, vocês nunca iriam descobrir o que 1001 tem e nem mesmo saberiam resolvê-lo. Pode parecer ganancioso e prepotente afirmar que somente eu teria a resposta no fim, mas como alguns de vocês acreditaram, de alguma forma inusitada, eu realmente tenho a resposta - afirmei observando os dados gravados nos hologramas e suspirei cansada - para ser bem sincera, nem mesmo eu acreditei em mim, achei que era loucura e impossível, mas não é. Devo isso a você doutor Kim.

 

- Eu? - o mais novo se atordoou com os olhares confusos que recebeu.

 

- Sim, foi graças a sua piada infame e desnecessária, como eu disse: uma banana.

 

- Banana? Mas o que isso tem a ver? - as coisas ficaram sem sentido para ele e eu sorri amarga.

 

- Vejamos… A origem de 1001 é completamente desconhecida graças a um certo alguém - alfinetei o homem que causou todo o transtorno em minha vida - e analisando a estrutura corporal de 1001 pode-se entender que a sua criação é completamente diferente de qualquer outro espécime e não me surpreende que seja tão complexo entender o que ele era e como tratá-lo. Ele é algo novo e inimaginável. 1001 não é humano e tampouco é um mero animal, de tal forma que seu corpo como um todo tem especificações distintas das quais não se está habituado a lidar como médico. Por isso, um clínico geral ou um veterinário, nenhum dos dois seria capaz de entender a complexidade que é 1001. Este foi o primeiro erro grotesco dentro deste lugar - pontuei apontando o pequeno laser para o tórax do Kim mais novo - vocês quiseram manter tanto a segurança e segredo que tudo desmoronou, as pessoas que tiveram acesso foram meticulosamente selecionadas e individualmente apresentadas ao caso, não houve um debate como se está tendo agora, foi apenas pressão desmedida sobre qualquer pessoa que julgassem entender um pouco mais. Foram burros e inconsequentes.

 

A acusação é dolorosamente verdadeira, há espanto pelos cientistas e até mesmo descrença pela ousadia de minha parte ao deferir acusações a todo momento, mas a verdade é necessária. Eu reprimo as ofensas piores, mantenho-as comigo para proferi-las em um momento mais oportuno e em que eu esteja só a devanear, mas ainda assim crio notas mentais para isso.

 

Apesar da grosseria de minha parte ninguém ousa me retrucar a esta altura, nem mesmo o próprio criador do alvoroço, todos mantém um desejo contínuo para que a resposta final venha. Um suspiro cansado me foge vez ou outra, o cansaço se acumula em um peso forçoso sobre meus ombros e as pernas bambas impedem meu locomover preciso. Estou destruída, mas preciso seguir.

 

- A questão toda era que em termos precisos, um médico nunca saberia como tratar um mal que na realidade nunca existiu.

 

- Mal que nunca existiu? - Jin acaba rindo com descrença, mas não permito que prossiga em seu veneno habitual.

 

- Sim, nunca existiu - reafirmo convicta - e antes que contrarie ou venha agir com cinismo escute. 1001 não é humano, nunca foi, um médico ou até mesmo um cientista, nenhum deles tem padrões para a suas funções orgânicas, tudo nele é um complexo sistêmico novo, vocês não podiam alegar que ele tem uma arritmia cardíaca, não poderiam dizer que tem uma hipotermia ou hipotensão, e se esses padrões, por mais loucos que pareçam, são os verdadeiros padrões para ele?

 

- Espera, “e se”? Está afirmando tudo isso baseando-se simplesmente num “e se”?? - a irritação se propaga de imediato na voz de Jin - Você não entende o tamanho do nosso problema? Sabe o valor que aquele espécime tem para nós? Sabe quanto dinheiro já gastamos nessa maldita pesquisa?? Tudo isso para você afirmar convictamente meras especulações a todo momento?! Eu preciso de verdades, fatos científicos, fontes seguras, provas concretas! Não um monte de baboseira especulativa!

 

- Meu “e se” é deveras melhor do que o seu grandioso “nada” senhor Kim - pressiono as têmporas doloridas numa massagem singela - meu “e se” tem veracidades melhores do que seus anos de pesquisa perdida, assim como também custa bem menos do que o senhor desperdiçou de dinheiro. 

 

- Você..!

 

- Jin hyung, deixe-a falar - Namjoon pediu calmo apoiando uma mão sobre a perna do irmão exaltado que quase por um milagre pareceu ceder - prossiga Lee, mas por favor, evite termos imprecisos, você como cientista sabe muito bem que incertezas de fala não são bem vindas ao corpo científico.

 

- Pois bem… - resmungo captando perfeitamente o que Namjoon quis alertar-me entre linhas - 1001 desde seu nascimento foi tratado diferente, vocês não o trataram como fizeram com Jimin ou com os dois primeiros espécimes, pelo seu próprio entendimento sabiam que 1001 não era tão genuíno quanto os demais criados e, inusitadamente, vocês temeram a sua própria criação.

 

- Isso não é verdade! - Taehyung protestou - Não é assim, ele apenas era diferente comportamentalmente, desde sua estrutura corpórea, no desenvolvimento e até a comunicação, ele era absolutamente diferente.

 

- Não minta doutor Kim, vocês o temeram e temeram com razão, pois consta nos arquivos o resultado da criação errada - puxo um holograma com certo ínfimo - bem aqui, no diário de pesquisa, dia 24 de maio de 1999, 10:46 P.M, espécime 1001; reclusão por ataque, punição: 3 dias sem ração.

 

- I-isso… - vejo o pavor tornar a face de Jin em meio a penumbra - Quando isso..? Quem.?! - o homem grunhi em fúria.

 

- Quem? - o observo incrédula - Seu amado diretor de pesquisa, Doutor Shinzui - acuso sem piedade - e não foi apenas essa vez, mas isso daqui desencadeou todo o processo que vocês veem agora. Vocês o criaram como uma máquina de matar, o excluíram como um animal selvagem e desprovido de consciência, o alimentaram por um buraco sem a presença de humanos, testaram todos os tipos de químicos possíveis em seu organismo, o fizeram adoecer para tentar curar… O que pretendiam ter no futuro? Um gatinho de estimação? - ironizo apontando os resultados de infinitas experiências feitas na criatura - Eu poderia passar o resto dia jogando na cara de vocês os erros grotescos que foram cometidos, mas seria perda de tempo e desnecessário já que eu não tenho idade para ser mãe de ninguém aqui, todos sabem o que é certo e errado, e entendam de uma vez por todas, a existência de 1001 é um erro.

 

- Doutor Shinzui, pode me explicar o que significa todos esses experimentos malucos? - Namjoon ignorou minha fala se interpondo com certa raiva - Nenhum desses experimentos foram autorizados ou sequer pedidos, castigo?? Como teve coragem de manter um espécime raro como ele sem alimentação adequada?! Tem noção do risco que colocou o espécime? Tem noção do risco que nos colocou?! Você… Céus! Eu não acredito nisso…

 

- Lee, nós não sabíamos - Taehyung logo se prontificou em justificar - nunca autorizamos isso… Fazer testes químicos… Ele era só uma criança - Taehyung se choca observando as datas dos arquivos - ele está vivo por um milagre… 

 

- Milagre não - chamo a atenção dos Kim - evolução, ele foi feito para sobreviver, se mutar, se adaptar, evoluir e se tornar mais forte - explico observando os testes que foram feitos - todos os testes foram feitos muito minuciosamente, quem fez sabia exatamente o que estava fazendo, queria que o organismo absorvesse a substância e criasse uma forma de ultrapassar as próprias barreiras genéticas, isso porque… - suspirei pensando se aquele fato deveria ou não ser dito, sendo algo tão importante e ao mesmo tempo tão difícil de justificar já que não havia provas, era uma incerteza que tinha comigo desde o momento que comecei a explicar tudo, mas que agora cabia só a mim dizer ou não.

 

- Por que..? - Jin espreitou os olhos sobre minha figura duvidosa e mais um suspiro escapou-me - Você não deve ficar escondendo coisas, está no contrato, não tenho que lembrá-la, tenho?

 

- Não - afirmei desgostosa - vocês querem saber? Pois bem, então direi. 1001 não é híbrido de um único animal como os outros, 1001 adquiriu a capacidade de sobreviver a adversidades graças a mistura genética, eu não posso afirmar precisamente todos os tipos de código genético que há em seu gene agora, não sem um estudo mais elaborado em sua fita genética, mas alguns são simples de se identificar e até mesmo justificar a disfunção geral do organismo.

 

- Espera, como assim uma mistura genética? Explique melhor Lee - Namjoon pediu paciente, mas visivelmente confuso.

 

- A estrutura genética dele não é normal, não que dos outros seja - pensei melhor a respeito olhando os sinais vitais da criatura - veja bem, 526 é híbrido de gato, 739 um híbrido de leão, já Jimin é híbrido de coelho - expliquei pausadamente vendo se os presentes acompanhavam meu raciocínio - cada um deles foi projetado se baseando unicamente na genética genuína de um animal, agora observe 1001, ele é como se você pegasse as melhores condições genéticas de cada um desses animais e juntasse tudo em apenas uma criatura. Enquanto todos os 3 primeiros espécimes têm um gene animal no corpo ele tem todos os três dentro dele e, sendo mais específica ele pode ter uma infinidade absurda dentro do seu organismo, centenas e centenas de genes.

 

- Isso… É realmente possível? - Taehyung me olhou assustado me fazendo dar de ombros.

 

- Infelizmente eu não sei lhe dizer como foi possível, meu QI não me permite ir tão além, mas para sua sorte vocês têm o criador bem aqui, ele pode afirmar se estou ou não falando bobagens não é mesmo doutor Shinzui? - me neguei a dizer a verdade, mas joguei a verdade a critério dos Kim.

 

- Isso é verdade doutor Shinzui?! - Namjoon reafirmou a pergunta ao homem emburrado que bufou - Responda quando lhe dirigir a palavra Shinzui.

 

- Eu já disse que não irei falar nada a respeito do espécime - Shinzui ralhou autoritário como se fosse dono de alguma razão - se querem acreditar nas tolices dessa pirralha desvairada que façam, quando todos os espécimes tiverem morrido e o Linzsister morrer juntamente não me procurem.

 

As palavras do homem parecem venenosas, corrosivas e principalmente destrutivas a Jin que tem os olhos injetados em fúria na sua direção após uma afirmação tão sem propósito, vejo sua saída furtiva no momento que Namjoon se ergue quase raivoso, muito próximo de uma perda total de controle, mas dessa vez quem os mantém é Taehyung.

 

O silêncio acomodada-se rapidamente no salão após uma saída tão dramática do velho homem, me sinto incomodada afinal eu que lhe confrontei, mas ainda assim também me sinto, em parte, vingada. Vejo de relance Namjoon se sentar mais uma vez e muito pacientemente afagar as costas arqueadas de Jin que fita o chão dentro da penumbra, Taehyung se esquiva olhando furtivamente hologramas passados e a sua negação quase imperceptível me faz entender que o melhor é simplesmente não perguntar. Às vezes ignorar também pode ser a melhor resposta.

 

- 1001 provavelmente tem gene de anfíbios que são criaturas pecilotérmicos - especulei limpando a garganta para chamar a atenção dos presentes mais uma vez - talvez alguns genes de camaleão ou rãs também, eles são excelentes com a questão da mudança de temperatura corporal, são criaturas capazes de alterar a temperatura e a cor da pele para fugir de predadores ou para sobreviver em climas de mudanças drásticas. A frequência cardíaca arrítmica pode ser proveniente de genes de animais pequenos, geralmente animais têm frequência cardíaca inversamente proporcional ao seu tamanho, então quanto maior o animal, menor frequência cardíaca ele terá e vice-versa - expliquei recordando alguns fatos explicado por meu pai na minha juventude - no entanto as funções hormonais são mais baseadas no organismo humano - pontuei vendo olhares confusos sobre mim - Não é que ele não esteja de fato adoentado, a questão é apenas que ele não está morrendo, o organismo dele está conduzido o processo, está tudo entre encontrar o equilíbrio e manter naturezas animais… - parei um pouco pensativa já que a grande maioria estava perdida na explicação - Bem, nesse momento, estamos muito próximos de um solstício de verão, nesta época há animais que entram em um dos tipos de hibernação além de sofrerem determinadas mudanças corporais. Se meu palpite não estiver tão errado, neste exato momento 1001 está em processo de estivação.

 

- Estivação? O que é isso exatamente? - Jin franziu o cenho.

 

- É um tipo de hibernação onde o animal é capaz de acordar, se alimentar e até mesmo lutar se for necessário, mas ele passa a maior parte do tempo dormindo, sendo que durante a hibernação o organismo animal passa por um momento de hipoglicemia, mantendo o corpo nutrido com o que acumulou antes de hibernar, ao mesmo tempo que por falta de movimentação a temperatura cai agressivamente, assim o organismo age fisiologicamente estratégico; são mecanismos complexos de termorregulação, síntese e lise de lipídeos e carboidratos, além da regulação de enzimas. O organismo funciona de forma instintiva e segue basicamente os fenômenos da natureza, é assim com seres humanos e animais de qualquer outra espécie, isso é um tipo de relógio biológico perfeitamente cronometrado para permitir a sobrevivência e evolução.

 

- Isso é tão louco que me faz acreditar que pode ser verdade… - Lívia se manifestou depois de muito tempo e eu a olhei curiosa - Se isso que diz é verdade então… O organismo como um todo está tentando entrar em um equilíbrio contínuo que nós estamos interferindo - a mulher chegou ao ponto que eu queria.

 

- Exato! - me exasperei assustando algumas pessoas - Todas as vezes que estão o medicado estão interferindo no equilíbrio altamente complexo do organismo dele, ele nasceu e cresceu com todo aquele gene em seu corpo, se adaptou as próprias disfunções porque o organismo sempre vai buscar o estado de homeostasia. Se o dão medicação nunca permitem que ele chegue ao clímax do seu próprio ciclo e então a parte humana em sua genética definha.

 

- Caralho… - Taehyung crispou os lábios assim que notou a gafe cometida - Nós estávamos o matando pensando que estávamos o mantendo vivo até procurar uma solução que o próprio corpo dele já tinha… - vi o mais novo agarrar o braço de Namjoon com certa raiva - Aquele filho da puta do Shinzui..!

 

- Taehyung, menos, bem menos - o homem ditou cansado me olhando em seguida - Mas eu entendo o desconforto… Não acredito que estávamos a um passo de matar o que conseguimos com tanto custo… Mas espere, e a questão da não alimentação e da luz? Animais se alimentam mais quando vai entrar na hibernação, estou enganado?

 

- Não, está correto… - parei para pensar por alguns segundos - Mas se não me engano, em alguma parte dos arquivos eu vi que as medicações e sedativos sempre foram dados misturados à ração, não sei ao certo qual gene animal poderia ser responsável dentro da gama infinita de espécimes, mas um olfato mais aguçado perceberia perfeitamente o uso de medicações que estão fazendo mal a ele, 1001 é de certa forma inteligente, ele processa informações como qualquer outro ser humano, mas o lado racional não é muito funcional então pelo instinto animal ele pode simplesmente rejeitar aquilo que ele identificar como teoricamente "perigoso" ao seu organismo. Quanto a luz é bem simples, o organismo está se forçando a entrar na estivação devido a alguma mudança no ambiente que não é favorável - gesticulei criando milhares de hipóteses sobre minhas próprias teorias, a realidade era distinta, mas a euforia da descoberta era maior que a culpa - eu fiz uma leve pesquisa sobre o funcionamento da cúpula onde ele está e, bem, eu não entendo de mecânica nem de engenharia, no entanto o tipo de luz é a amarela e o clima artificial é tropical, essas duas coisas simultâneas dentro do período de solstício de verão podem ter criado um ambiente semelhante ao semiárido e isso se torna agressivo porque o gene predominante pode não ser compatível a este clima excessivamente seco.

 

- Mas na lógica ele está preso em um lugar que nem sequer tem contato com o mundo de fora para receber influências do clima externo, não? - Namjoon perguntou curioso me vendo negar com um leve sorriso.

 

- Não é bem assim, nosso corpo se influência não apenas visualmente, mas boa parte de nossas funções orgânicas acontecem por questões externas não visíveis, nós temos controles hormonais e até mesmo de equilíbrio apenas pela rotação da terra ou pelas microondas vindas da crosta terrestre - pontuei vendo o menino concordar ludibriado pelas informações - eu compreendo que dizem ter estudado perfeitamente aquela estrutura onde eles estão, mas sendo bem sincera não acredito que a cúpula seja capaz de impedir que nos ouçam ou nos vejam, assim como também não é capaz de impedir que eles se conectem a fenômenos naturais que regram a sua existência. Veja isto que curioso - ditei buscando entre os hologramas que restavam a planta da cúpula onde residia 1001 - bem aqui, neste canto onde ele fica sentado sem se mover, por trás da parede de metal grosso há uma passagem de ar ligada ao ar condicionado central, isso significa que mesmo que o ambiente como todo tenha uma determinada temperatura estabelecida por vocês, este canto especificamente é pelo menos cinco graus mais baixo que todo o local… Entendem o que isso significa?

 

- Ele descobriu sozinho onde era o ambiente mais frio possível para ajudar a se manter na estivação sem que isso prejudicasse mais o organismo… - Jin comentou abismado.

 

- Exato, ao mesmo tempo ele se negou a comer por um longo tempo para que não tivesse medicações no organismo interferindo em seu metabolismo e todas as outras funções orgânicas - Taehyung riu desacreditado.

 

- Mas ele também sabia que apenas se resfriar na parede mais fria não seria o suficiente para diminuir os danos no organismo então sempre danificava a luz que mantinha a temperatura mais quente, isso esfriava a cúpula e ao mesmo tempo dificultava nossa interferência em sua estivação… - Namjoon ergueu o olhar em minha direção com certa felicidade - Você conseguiu

 

Sim, eu consegui, era isso que gostaria de dizer com convicção, mas um problema residia em tudo, aliás, mais de um, o porém era como dizer-lhes isso quando todos comemoravam animadamente a descoberta. Eu tinha um pé atrás com tudo, porque sinceramente eu descobri de forma aleatória, boa parte do que havia explicado na hora era especulação e no fundo eu me mantinha duvidosa sobre cada afirmação, mas ao todo o problema maior era dizer que a solução de fato ainda não vinha a minha mente.

 

- Parabéns Lee!!! - Lívia agarrou-me de supetão em um abraço de urso - Não acredito que você conseguiu de verdade!!

 

- Ela realmente… - Jin resmungou em meio a comemoração alheia e meus olhos fugiram para o Kim mais novo que me olhava desconfiado.

 

- Tem certeza disso senhorita Lee? -  a voz do mais novo veio cortante e desafiadora, um instinto predador rondava o olhar de Taehyung e da euforia eu vi a dúvida mais uma vez me desafiar dentro daquela sala - Por que será que seu olhar me diz que tem algo a mais que deveríamos saber..?

 

Observador de uma figa.

 

- Francamente..? - olhei para si com desgosto o vendo sorrir debochado - Eu… Na verdade…

 

- Lee? - Lívia agarrou meus ombros duvidosa e eu suspirei cansada sentindo a tontura me tomar com mais vigor - Você está pálida, não se sente bem novamente? Quer um assento??

 

Não houve resposta de minha parte, apenas um aceno positivo e fraco da minha cabeça que latejava. Eu não tinha certeza sobre os acontecimentos nem mesmo sobre minha tese sobre as criaturas, mas sabia que estava colapsando mais uma vez.

 

Um certo alvoroço começou ao meu redor e um murmúrio correu a sala, ouvi passos abafados e o som de algo metálico se arrastando pelo chão, o alerta dos painéis incandesceram e a ânsia veio forte ao cume do estômago. Eu precisava mais uma vez por para fora.

 

Sentaram-me em uma cadeira qualquer e senti um afago em minhas costas, meus cabelos foram presos de forma desajeitada, um líquido amargo revirou-se em minhas entranhas e antes que eu notasse a lixeira estava a minha disposição para despejar qualquer líquido do meu corpo. Vomitar em meio a defesa de uma tese não estava em meus planos definitivamente.

 

Meus músculos relaxaram pouco depois de expelir apenas uma gosma amarelada e estupidamente amarga, senti minha mucosa banhada pelo gosto incomum e suspirei aliviada quando fui devidamente apoiada na cadeira para me recompor. O ar gélido e condensado do ambiente era refrescante a minha pele quente e coberta por uma camada fina de suor, sentia meus pelinhos na nuca se arrepiarem a cada nova onda fria que passava por eles e ao som estridente dos monitores eu notei a aproximação perspicaz do Kim mais novo.

 

Eu realmente odeio médicos.

 

- Se sente melhor? - percebi o tom levemente alterado do rapaz ao me estender um copo com água e uma tigela metálica - Enxágue a boca para tirar o gosto da bile - fiz o que me pediu e suspirei secando os cantos da boca com o jaleco que usava - qual a parte do você precisa comer você não consegue entender? Quer morrer de fome? - ele me repreendeu me fazendo olhá-lo de soslaio - Você tem anemia, continue sem se alimentar adequadamente e ganhe uma passagem só de ida para o outro mundo.

 

- Taehyung! - Namjoon brandou sendo completamente ignorado pelo mais novo.

 

- Você é uma pessoa completamente sem noção, eu tenho certeza que você não come nada a dias e não me admira nada que você seja uma daquelas solteironas de meia idade que vivem de macarrão instantâneo e rosquinhas recheadas de gordura saturada e corante cancerígeno - o Kim disparou em acusações que por muito pouco me fizeram rir, pois de fato eu era amante de macarrão instantâneo e as rosquinhas eram um bom lanche da tarde - vai me dizer que também tem um gato de nome incomum e faz crochê? Garota estúpida.

 

- Uchichi é um gato adorável - roguei divertidamente o vendo retorcer a cara em puro desgosto - e infelizmente eu não sou boa em crochê, mas confesso que tenho uma queda pelas rosquinhas recheadas de gordura saturada e corante cancerígeno.

 

- Olha garota, você..!

 

- Taehyung, chega - Namjoon apoiou a mão sobre o ombro do Kim que bufou esfregando as mãos no rosto antes de se voltar para mim com a cara fechada - você é médico não uma criança de cinco anos.

 

Sem nem mais uma palavra vi Taehyung puxar uma cadeira de frente a mim e sem pedir permissão passou a desabotoar meu jaleco, eu até contestaria, no entanto eu sentia meu corpo adormecido e com as extremidades frias, me sentia sonolenta e enjoada, a cabeça latejava e a visão embaçava sobre a leve escuridão.

 

Com agilidade o Kim puxou o estetoscópio e fez uma breve ausculta pulmonar, verificou minha temperatura e pressão, um pequeno teste de visão também foi rapidamente feito e sem perguntas o vi ajustar o suporte de soro mais uma vez naquele mesmo dia.

 

Meu braço foi perfurado sem piedade e um novo acesso se fixou em mim que relaxei ao alívio de que estava pelo menos sendo cuidada, minha respiração se acalmou e quando reparei ao meu redor notei que a sala havia se esvaziado quase que por completo, ali apenas permaneciam os Kim e Lívia a me observar desfalecida.

 

- Ela vai ficar bem? - observei Jin se pronunciar pela primeira vez.

 

- Ela é boa para salvar a pele alheia, mas uma verdadeira catástrofe para sobreviver por conta própria, me admira que esteja viva a esta altura da vida - Taehyung retrucou irritado enquanto guardava seus objetos em uma pequena maleta.

 

- O que colocou em mim..? - perguntei sonolenta notando seu olhar me queimar com raiva.

 

- Soro glicosado com potássio - afirmou seco e acabei retesando os músculos contrariada -, mas fiquei seriamente tentado a colocar veneno.

 

- Exatamente… I-isso… - minha voz falhou e o Kim me olhou estranhando.

 

- Por que você está ficando mais pálida? - ele me olhou minuciosamente - Lee aperte minha mão - ouvi me ordenar, mas não tinha forças para fazer o que me pedia - Lee, vamos aperte minha mão - ele mandou mais uma vez encaixando a mão na minha tateando o pulso em seguida.

 

- O que está havendo? - Lívia se alarmou ao meu lado.

 

- Eu não sei! - Taehyung se irritou puxando um pequeno objeto do bolso do jaleco e lançou uma luz em meus olhos - a pupila está dilatada e a frequência cardíaca está baixa…

 

- E o que isso significa? - Jin perguntou preocupado.

 

- Eu já disse que não sei! Pode ser um monte de coisa - ele gritou irritado com a pressão imposta a si - Ei Lee, você tem alergia a algum medicamento?

 

- V-ve-veneno… - falei sem conseguir respirar direito.

 

- Não Lee, eu estava brincando, eu não coloquei veneno, pare com isso e me responda direito, você tem alergia a algum medicamento? - ele tornou a perguntar tateando meu pescoço e eu acenei positivamente - Merda!

 

- Taehyung você está nos deixando preocupados! - Lívia brigou - O que a Lee tem??

 

- Alergia medicamentosa - ele afirmou revirando a maleta em busca de algo - ela não falou nada, mas não era para passar mal agora, eu a mediquei não tem muitas horas, ela tomou soro glicosado com potássio antes e dei a mesma coisa agora… Droga! Namjoon para esse soro agora! - ordenou pegando um frasco na maleta e logo puxando uma boa porção do líquido na seringa - Ela não tem hipocalemia, nem mesmo hiperglicemia, não me admira que o pescoço esteja inchado! - rapidamente o kim desacoplou o soro do acesso e conectou a seringa com medicação - Por que demônios não me disse que tinha hipertireoidismo?!

 

- Ela o que?! - Jin quase berrou ao meu lado.

 

- E-eu não go-gosto… De falar… - respondi ainda sentindo dificuldade para respirar.

 

- Isso não é uma questão de gostar ou não de falar! Isso é necessário, eu poderia ter te matado! - Taehyung me repreendeu suspirando em seguida - Você é louca… Francamente.

 

- 1001… - ditei fraca vendo Taehyung franzir o cenho - Ve-ve-venen-o…

 

- O que disse? - Namjoon se aproximou me olhando analítico - O que foi que você disse Lee?

 

- Shinzui… Está… - espirei boa quantia de ar tentando falar o mais claro possível - E-env-envenen-ando… 1001.










 

 

 

 

 

 

 

 




 

Aprende que falar pode aliviar dores emocionais, descobre que se levam anos para se construir confiança e apenas segundos para destruí-la, e que você pode fazer coisas em um instante das quais se arrependerá pelo resto da vida.

 

 William Shakespeare ~





 

Continua...






 



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