História Little things - Thirteen

Dedilhando as últimas notas da música, Mark ouviu aplausos solitários mas ainda animadores de Jaemin. O primeiro ocupava todo o sofá enquanto este se acomodava na poltrona ao lado. Estavam sentados na sala enquanto o cheiro da última fornada de biscoitos possuía todo o ambiente; era possível sentir um leve calor emanar da cozinha. As luzes continuavam apagadas, e eram clareados apenas pela iluminação urbana e um conjunto de lâmpadas pequenas que emitiam um fraco lampejo amarelado. A escureza sutil era aconchegante e causava em Mark um misto de sensações, quase como uma tranquilidade excitante.

Jaemin deu mais algumas palmas enquanto olhava para o outro.

-Waa, Mark hyung, você já tocou milhares de músicas pra mim, mas eu sempre vou ficar em choque com o quanto você é bom. - sorriu.

-Valeu. - Abaixou a cabeça, olhando para o violão em seu colo. Estava satisfeito. - Você realmente acha isso?

-Tô falando seríssimo. - aspirou audivelmente algumas vezes. - acho que tá pronto. Já volto.

Mark olhou o garoto se levantar e rapidamente ir em direção a cozinha pela terceira vez - desde que terminaram a preparação da massa. Ele realmente parece uma criança totalmente empolgada, acho que é esse cabelo colorido. Jaemin não tinha deixado ele tocar em nenhum cookiezinho sequer das fôrmas que já estavam prontas, só permitindo eles saborearem os doces após todos estarem assados. 

Obviamente ele ficou frustradíssimo, e sugeriu tocar algumas músicas para o tempo passar mais rápido. As duas horas que haviam se passado foram tão agitadas que Mark se distraiu e esqueceu completamente do Norae Jam e do porquê realmente tinha ido para casa de Jaemin. Seu rosto ainda estava manchado de farinha e um pouco de chocolate que o mais novo jogara brincando em seu rosto, e sorriu com a lembrança do momento:

-Hyung!

Mark tinha virado para pegar mais uma espátula na gaveta depois de Jaemin ter derrubado a sua no chão. Quando atendeu o chamado, foi pego de surpresa com um sopro do pó branco no seu rosto.

-Pra quê isso, meu Deus. - Limpou os olhos com os dedos, rindo.

Mesmo depois de passar um pano molhado, alguns resquícios ficaram ali. Vou contar assim que ele voltar.

Saiu do seu devaneio quando ouviu passinhos abafados pelo carpete, junto ainda de uma fumaça doce proveniente de uma tigela de vidro lotada de cookies. Pôs o instrumento de lado e se sentou sobre seus joelhos, completamente empolgado. Jaemin colocou-a na mesinha de centro e logo pegou um; Mark não demorou e fez o mesmo.

-Hm. Hm. Hmmmm…. - não podia conter sua satisfação. Estava simplesmente perfeito: com casquinha crocante em volta e o centro macio. As gotas de chocolate derretiam na boca e os dois se sentiam no céu. Todo mundo que eu conheço agora cozinha bem? Não é possível. Haechan ia adorar isso aqui.

-Muito obrigado, hyung, isso tudo foi possível graças a você. - mesmo de boca cheia, Jaemin comentou. Fingiu secar lágrimas de emoção.

-Você que fez tudo! Eu só te entreguei as coisas. - Riu, mordendo um grande pedaço. 

-Sua presença foi suficiente. - Sorriu, dando uma piscadela. Mark sentiu o estômago revirar. Esboçou um riso sem graça.

-Obrigado? Não sei reagir a isso. - Pegou outro biscoito, comendo mais pra disfarçar sua vergonha. Jaemin só riu mais uma vez.

Alguns cookies e grunhidos de prazer depois, Mark respirou fundo e pigarreou.

-Jaemin. Eu tenho um negócio pra te contar. É assim, provavelmente a coisa mais importante que já aconteceu na minha vida.

-Hm? - Ajeitou sua postura na poltrona, apoiando seus cotovelos nos joelhos e se aproximando mais. - É grande assim?

-Sim. Muito. Olha, cê sabe de toda minha paixão por música e tal, eu já falei inúmeras vezes contigo disso. Eu costumava tocar em eventos pequenos e tal, mas parece que agora o negócio é sério.

-Conta isso direito, garoto. O que aconteceu?!

-Eu fui chamado junto de outro amigo meu pra tocar no Norae Jam. Já ouviu falar? Tipo, o maior festival de música dessa cidade inteira??

Jaemin arregalou os olhos, abriu a boca e se levantou, completamente surpreso. Soltou algumas exclamações e logo sorriu. Sentou novamente, batendo os pézinhos no chão.

-Lógico que conheço! Isso é real mesmo? - balançou a cabeça em resposta, o sorriso e a empolgação voltando. Estava feliz de ter alguém para dividir essa alegria. - Hyung! Isso é maravilhoso! Na edição do mês que vem?

-Sim! Foi meio em cima da hora, eu sei, mas é nessa mesmo. Só espero ter tempo pra ensaiar. Mas eu vou fazer de tudo, tudo real, pra poder me apresentar.

-Quando você disse que era algo tão importante não achei que era importante assim. Quando você ficou sabendo disso que só me contou agora? Jesus, Mark, parabéns!

Gargalhou, olhando para o teto e respirando fundo mais uma vez.

-Obrigado, cara. Eu descobri hoje. Por isso vim pra cá. Você foi a primeira pessoa que ficou sabendo depois disso, além do meu amigo, óbvio. Inclusive, tô esperando ele me ligar de novo. É que-

Um toque foi ouvido do outro lado do cômodo, vindo de cima da mesa de jantar. Mark reconheceu como seu celular, e após trocar olhares rápidos de surpresa com Jaemin, saiu correndo, quase em desespero. Deus existe mesmo, eu tô impressionado.

-Alô? Lucas?! Cacete, eu tava falando de você agora mesmo.

-Oi, oi. Que bom saber que você me ama esse tanto, Mark.

-Deixa de ser idiota, conta logo tudo. - Olhou para o lado e viu o garoto parado na sua frente, levemente aflito. Colocou a chamada no viva-voz.

-Tá bom, grosso. Basicamente, quando eu saí mais cedo porque a So-Yun tinha me chamado urgente, era urgente mesmo. O organizador que eu te falei não conseguiu ligar pro meu celular sei lá porquê e procurou o amigo dela que tinha filmado a gente pra me encontrar e tal.

-Resume isso, Lucas. 

-Ai, calma, caralho. - riu no microfone, causando um ruído breve. - Eu encontrei ele pessoalmente. Eu disse que você e eu concordamos com a proposta. Mano, juro, foi tão rápido que eu achei que era golpe de novo, até ele repetir todas as informações de antes e puxar um contrato. Mark, um contrato!

-Mas só você assinou? E eu?

-Eu tava te ligando pra falar exatamente isso! Amanhã a gente vai ter que ver ele, nós dois, para discutir o resto. Mas a gente já tem data, horário, ordem de apresentação, quantidade de tempo que temos disponível, tudo. É bizarro.

Os dois deram pulinhos enérgicos e pronunciaram grunhidos de felicidade, dando tapas leves nos braços um do outro. Era real! Estava acontecendo!

-Que horas e onde isso?

-De 14h, naquele café mó chique que tem a umas duas quadras da faculdade. Tá tudo bem, Mark? Tem outra pessoa aí?

-Tá tudo perfeito Lucas. - Ele virou para Jaemin, que estava com as mãos atadas, olhando com expectativa. - Tá tudo muito perfeito.

***

Eram 2h da manhã, mas o tempo não importava para aqueles dois. Na grande cama de Jaemin, no escuro azulado da noite iluminado somente pela janelinha do cômodo, os assuntos pareciam não acabar. A grande bacia de cookies agora se resumia em migalhas espalhadas em cima do acolchoado, mas não incomodava ninguém. O violão finalmente foi esquecido no sofá, depois de receberem uma reclamação pelo barulho - especialmente depois do telefonema de Lucas. Era um mundo quieto e totalmente diferente do real ali dentro.

Mark estava deitado sobre o colo de Jaemin, apoiado contra a parede, que fazia um carinho discreto em seus cabelos pretos. Ele achava natural, visto que acreditava que o amigo era assim com todo mundo - estava completamente confortável. Agora estavam fingindo estar numa entrevista em um grande programa de TV, após a carreira de cantor ter estourado e fama ser seu segundo nome.

-Achei extremamente sensato. Mas então, Mark, agora a pergunta que a Coréia e talvez o mundo inteiro quer saber. Você está solteiro? - Perguntou, num tom risório. Por alguma razão, Haechan passou na cabeça dele, o que o deixou roxo de vergonha. Felizmente não foi visível ao entrevistador.

-Estou sim.

Ele imitou um som de choque e gritinhos finos da platéia.

-Calma, calma, pessoal. - Gesticulou com a palma da mão livre. - E suas canções tão lindas, não tem ninguém que sirva de inspiração pra elas?

-No momento não. Eu só vejo muitos doramas e filmes de comédia romântica, então acho que sei mais ou menos como funciona. - os dois riram. - E você, Jaemin, tem experiência na área?

-Eu? - o olhou curioso, sorrindo. - Sou eu que faço as perguntas aqui, lindo.

-Tava perguntando sério, besta.

Jaemin respirou fundo, e passou uns segundos calado, parecendo ponderar sobre o assunto. Aquilo deixou Mark curioso. Nunca tinha perguntado se ele tinha namorada ou outra coisa similar, pois não tinha oportunidade. Com essa reação, provavelmente algo complicado fazia parte da vida dele; começou a criar hipóteses na sua cabeça.

-Tá tudo bem? Não precisa dizer se não quiser.

-Não, relaxa. Eu… - desviou o olhar do garoto em seu colo e passou a encarar fixamente a parede na sua frente. - Eu tinha um namorado. A gente terminou fazem mais ou menos quatro meses.

-Wow. Sinto muito. Quanto tempo vocês ficaram juntos?

-Dois anos.

Mark ficou em choque. De certo era alguém de muita importância na vida dele, mas não fazia ideia de nada. Alguma coisa mudou dentro de si depois daquela informação, mas não sabia o que; preferiu ignorar. Não se lembrava de ver alguém indo para casa dele em nenhum momento. Ninguém que pudesse, pelo menos, dizer estar nesse nível de relação. Queria fazer mais perguntas, no entanto não queria parecer invasivo ou algo do tipo. Passaram mais uns minutos em um silêncio esmagador, até Jaemin se pronunciar:

-Eu sei que você quer perguntar como a gente terminou. - Sorriu. - Não tem problema não.

-Como foi?

-Ele terminou primeiro. Dizia que eu… tinha umas atitudes que ele não gostava. Eu ainda quis continuar, só que ele basicamente desapareceu. Não literalmente, mas cortou todo tipo de contato comigo. E nossos amigos em comum pararam de falar dele. Eu devia entende-lo, ou pelo menos saber totalmente o que eu fazia de errado. Eu tentei respeitar isso, pelo menos. Se era isso que ele queria... - Ele não piscou em nenhum momento. Mark ficou receoso de continuar nesse assunto e machucá-lo de alguma forma. No entanto, devia aproveitar a abertura mínima que Jaemin o estava proporcionando.

-Você… ainda gosta dele?

Quebrando as expectativas, ele só riu. Ficou em silêncio reflexivo por mais um pouco, girando alguns fios do mais velho pelo indicador.

-Não. Quer dizer, não deixei de gostar completamente, eu estaria mentindo se dissesse que sim, mas já superei bem mais que antes. Penso muito no que eu faria se o encontrasse de novo, mas nunca soube bem a resposta.

-Entendi.

Mark ficou se sentindo mal por ter insistido no assunto. Ficou preocupado de tê-lo deixado chateado. Quem esse cara acha que é pra fazer algo assim?! Coitado do Jaemin. Fez questão de mudar de tópico, antes que começasse a piorar o clima.

Mas não precisou por muito tempo. Taeyong o ligou, claramente desesperado, buscando saber onde se encontrava por tais horas que não estava em casa. Sem querer assustá-lo mais ainda, foi embora o mais rápido possível. Jaemin o agradeceu pela companhia, e disse que falaria com ele o mais cedo que pudesse, para saber novidades do evento e do contrato que assinaria no dia seguinte. Ele garantiu estar esperando as notícias, e com um sorriso meigo, se despediu.

Antes mesmo de dispor seus sapatos no tapete frente a porta, seu irmão chegou correndo.

-Onde você estava, Min-Hyung?! - Cruzou os braços, falando baixo.

-Eu estava no Jaemin. - Apontou para o lado com o polegar. A expressão dele aliviou um pouco, mas suas sobrancelhas ainda elevadas demonstravam preocupação. - E você? Eu cheguei em casa nem tinha anoitecido ainda! Como você sai e nem me avisa onde vai?

-Desculpa, Mark. Eu cheguei agora há pouco. Eu precisei ir na casa do pai, ele disse que era urgente. Mas eu não quis dormir lá então fiz questão de vir embora assim que eles adormeceram…

-O que era tão importante assim? - Se encaminhou para a cozinha, enchendo um copo de água.

-É sobre a empresa. - Se apoiou na bancada, vendo o irmão beber o líquido. - Tá dando uns rolos meio sérios com o financeiro e um dos parceiros comerciais e blá blá blá, ele queria minha ajuda, apesar d’eu não entender muito sobre isso. - Revirou os olhos, balançando a cabeça e esfregando o pescoço. - Eu não queria que ele te incomodasse, então aceitei na hora.

O coração de Mark se aqueceu no momento que ouviu isso. Ele sorriu e deu tapinhas no ombro dele. Olhou compadecido e se sentiu muito agradecido por ter um irmão tão bom como ele.

-Muito, muito obrigado, hyung. Mesmo, mesmo.

-De nada. - Sorriu de volta. Seus olhos pareciam cansados. - Eu tô morrendo de sono, então vou dormir agora. Depois a gente se fala melhor, ok?

-Tudo bem. - Deixaria para contar sobre o Norae Jam quando fosse um tempo melhor.

Já deitado, ele se perguntou por um momento com o que seu pai estava passando e quais problemas tinha. Fazia muito tempo desde a última vez que se conversaram, mesmo por telefone - quase sempre quem fazia as ligações era a mãe, quando ele não estava presente. E mesmo assim, eram sempre sobre necessidades ou para falar da faculdade. Se lembrava de a última vez que os viu como família mesmo era no Ensino Médio; agora, parecia ter somente Taeyong e mais ninguém. Aquilo o assustava um pouco, mas fazia parte, sabia que nada seria o mesmo depois da discussão que tiveram antes d’ele se mudar. No entanto, não podia deixar de considerar se devia oferecer alguma ajuda ou só deixar a vida encaminhar. Querendo ou não, ele sabia mais sobre negócios que o irmão, ainda que não gostasse nem um pouco disso.

Só conseguiu dormir de verdade quando apagou todos os pensamentos da sua mente.