História Livin' on a prayer - Three

Amanhã é sábado, dia de quê? Isso mesmo, dia de vingança. 

Sakura ficou de vir dormir aqui em casa para concretizarmos nossa vingança contra o meu irmão. Ele vai aprender lindamente que sair zoando os outros não é legal, pois vai sentir na própria pele. 

Comprei sorvete e pipoca para esperá-la. Eu queria comprar mais coisas, só que o dinheiro que eu tenho precisa dar até o fim do mês. Fé no Pai.

Fui atender o portão feliz da vida quando Sakura chegou. Ela apareceu com um short jeans escuro, blusa branca e sandálias de borrachas pretas; Também trouxe consigo uma bolsa com estampa de oncinha, com certeza com suas coisas pessoais.

- Oi. - Cumprimentei, dando passagem para a rosada entrar. Tão linda.

- Então, baixou o vídeo? - Questionou empolgada, com um sorriso enorme no rosto. 

Sádica. Gosto assim.

- Óbvio. - Falei enquanto entrávamos em casa - Tá no pen drive. 

- E cadê o traste? - Perguntou. 

- Deve estar no décimo sono. - Suspirei. 

Ele podia ter aproveitado pra estudar durante o dia, como eu fiz, mas não, o vagabundo vai hibernar. Depois chega na hora da prova e está se desesperando... Acho é bonito! 

Sakura deixou as coisas dela no meu quarto e veio atrás de mim na área de serviço.

- Tá fazendo o quê? - Questionou. 

Olhei por cima do ombro e vi Sakura curiosa.

- Tirando a roupa da máquina. - Respondi - Não quero deixar acumular. 

Ela se aproximou do tanque e fitou a bacia que deixei dentro dele.

- E isso aqui, é pra lavar na mão? 

- Seria. - Falei com desânimo - Acho que vou acabar tendo que jogar fora. - Notei que Sakura me encarou com as sobrancelhas unidas - Tipo... o fundo das meias encardiu todinho... - Expliquei enquanto pendurava algumas camisas no varal de chão - Deixei de molho, mas a sujeira ainda não saiu. 

- Há quantos dias isso tá aqui? - Ela achou graça da situação - Sério, Sasuke, quantos dias?

E isso importa?

Nossa... Mulher gosta de se apegar a detalhes irrelevantes, né? 

- Ah, Sakura. - Bufei - Dois dias... ou três... Não tem importância.

- Alguém já falou que pra sujeira sair você precisa esfregar? 

Parei pra pensar por um instante. Nas propagandas - agora declaradamente enganosas - de televisão as manchas saem como passe de mágica. Ninguém me falou que precisava esfregar. 

- É? 

- É! - Gargalhou - Você esperava que suas meias se limpassem sozinha? 

Na televisão as sujeiras se dissolvem. Por que a vida real é tão frustrante?

- Quase isso. - Admiti. Nossa, eu sou burro demais - Deixa aí, depois eu esfrego. O que é mais um dia de molho, né? 

Agora é oficial: Comprarei somente meias pretas, quero nem saber.

- Você ainda aprende... - Suspirou.

- Quer comer? - Questionei assim que estendi a última peça de roupa - Tem sorvete.

- Eu adoraria um sorvete! - Riu.

Fomos até a cozinha e eu peguei uma xícara pra mim e outra para Sakura. Sim, vamos tomar sorvete na xícara, alguém acha que aqui tem vasilha pra sobremesa? E, só a nível de informação, aqui só existem duas xícaras: Uma minha e outra do Itachi. 

Enfim, abri o congelador e peguei o sorvete de flocos para nos servir. 

- Gosta de flocos, né? - Indaguei. Céus, só falta ela não gostar de sorvete de flocos. Mas quem em sã consciência não gosta, Senhor? 

- Gosto sim. - Assentiu - Ele não é com 0% de lactose. Tem certeza de que não vai te fazer mal? 

O sorvete com 0% de lactose era de dois litros e de uma marca um pouco mais cara do que esse que eu comprei, que é de apenas um litro. Universitário precisa economizar muito, tô aprendendo isso na marra. Sem falar que ainda preciso comprar ração pro meu gato.

- Eu não sou alérgico, sou intolerante. - Expliquei - Posso consumir até uma certa quantidade. Relaxa, um pouco desse sorvete não vai me fazer mal. 

Ela pareceu ter se acalmado. É óbvio que eu vou tomar cuidado com a quantidade de sorvete que vou tomar, afinal, não estou nem um pouco a fim de ter uma dor de barriga daquelas perto da Sakura... outra dor de barriga. Enfim, podemos esquecer esse acontecimento. 

Nos servimos e fomos para o meu quarto, onde Floyd dormia em cima do meu travesseiro. Folgado. 

Sentamos na minha cama, lado a lado, para tomarmos o sorvete. 

- Espero que seu irmão não durma o dia inteiro, ou vai ficar acordado à noite e nosso plano não vai dar certo. - Disse Sakura.

- É capaz de ele emendar o dia com a noite e acordar só amanhã. - Observei - Relaxa... nosso plano vai dar certo sim.

- Espero. 

- Vem cá, sua mãe deixou você vir dormir aqui de boa?

Ué, só uma curiosidade. Não é toda mãe que deixaria uma filha dormir sozinha numa casa com dois rapazes da mesma idade. Ou a Sakura mentiu ou a mãe dela é liberal até demais.

- Minha mãe tá viajando. - Contou - Então, o que os olhos não vêem o coração não sente. - Deu de ombros. 

Não julgo. Quem nunca escondeu algo dos pais, né? 

Pois é... Minha mãe certamente iria enlouquecer se soubesse que uma garota está dormindo aqui. 

Não estamos mentindo, apenas omitindo um fato. Não é errado.  

- Concordo. - Assenti com a boca cheia - Quer ver um filme? 

- Eu adoraria.

Tão linda, tão meiga e educada. Sakura é o tipo de garota que está em falta, realmente. É bom eu não bobear pra não perder, né? Outra assim ninguém encontra em qualquer lugar. 

[...] 

O que fazer quando se perde o sono de madrugada? Redes sociais. 

Pois é, dormi o dia inteiro. Aproveitei pra ostentar sono, mas agora ele me abandonou. 

Fui stalkear o Facebook da Izumi, porque eu sou desses. Gostei ainda mais dela quando vi suas publicações. Ela compartilha memes engraçados, coisas sem noção que a gente ri de tão idiota que é. É difícil achar garotas com senso de humor hoje em dia. 

Posso dizer que dá pra saber muito sobre uma garota só olhando suas publicações no Facebook. Se vive de compartilhar textões - que ninguém nunca lê - problematizando até o vento e vendo machismo até em um simples cumprimento, eu fujo como o diabo foge da cruz e ainda jogo sal pra trás, pois certamente a criatura é insuportável. Se, a cada cinco postagens, três forem sobre legalização de drogas e o caramba, aposto que é Zé droguinha. Se só posta frases prontas e empoderadas com aquela necessidade quase palpável de "lacrar", já sei que tem algum complexo de inferioridade e também é chata pra caralho. Mas quando compartilha coisas legais, engraçadas, gosta de memes, não fica só postando coisas chatas sobre política e textos imensos que ninguém lê, tem senso de humor... Cara, mulher perfeita. 

E a mulherada nem inventa de vir jogar pedras em mim, pois eu sei que vocês também gostam de traçar o perfil dos caras pelo que eles postam no Facebook. 

Igualdade, amores, igualdade... 

Tá certo que eu nunca vi uma mulher exigindo alistamento militar obrigatório a partir dos dezoito anos, reclamando quando numa festa a entrada é liberada pra mulheres até um certo horário ou tem desconto na entrada, nem problematizando o fato de que se aposentam mais cedo do que os homens... Bem, vida que segue, né? 

Olhei a hora no celular e me espantei ao ver que já são três da manhã. 

Puta que pariu, isso me lembra um filme... Essa hora não é boa, eu sei que não é. 

Escutei três batidas na porta do meu quarto... Ai, Senhor! O Sasuke nem é de bater na porta, e certamente nesse horário já está no terceiro sono.

Me cobri completamente, feito uma lagarta no casulo. Daqui não saio, daqui ninguém me tira! 

Mais três batidas. 

O número três é amaldiçoado, certeza! 

Fiz o sinal da cruz e comecei a rezar. Não sou religioso, mas acho que até amanhã já estarei convertido. 

Três batidas, dessa vez mais fortes.

Não é o Sasuke, definitivamente. Ele não teria essa paciência de bater na porta assim, sem falar que só me acordaria numa hora dessas em caso de vida ou morte. 

Três batidas de novo. 

Meu coração já está quase saindo pela boca, posso senti-lo na garganta. 

Pai, perdoe meus pecados...Leva o Floyd, não eu.

Ouvi mais três batidas. 

Ora... Sou o que, um homem ou uma ameba? 

Tirei coragem sabe-se lá de onde e levantei da cama, caminhando a passos firmes até a porta. 

- Sasuke, você vai morrer!

Não tem ninguém... Abri a porta e não vi ninguém. 

Se isso for coisa do traste do meu irmão, até amanhã eu me torno filho único. 

Acendi a luz do corredor, claro, porque não sou idiota e nem personagem de filme de terror pra sair andando pela casa com luz apagada de madrugada.

Abri a porta do quarto do Sasuke e o vi dormindo, encolhido e coberto pelo lençol.

Puta que pariu, ele tá dormindo... Quem foi que bateu na porta do meu quarto? 

- Sasuke? - Chamei - Sasuke...

- Que foi? - Ele se virou, me encarando com o antebraço por cima dos olhos e falando sonolento - Itachi, me deixa dormir. Porra, fecha essa porta, a luz tá me incomodando. 

O medo foi tanto nesse momento que até senti meu pau encolher ao mesmo tempo que senti o cu trancar. 

Sasuke não seria esperto o suficiente pra me acordar e voltar pra cama como se nada tivesse acontecido. Meu irmão é um palerma. 

Fechei a porta do quarto de Sasuke e suspirei pesadamente. Acho que eu estava sonhando, isso sim. Era delírio, só pode ser. 

São três da manhã, e ainda tem um gato - animal maligno - habitando a casa. Óbvio que eu teria delírios do tipo.

A culpa é toda do Floyd. Preciso me livrar dele.

Quando eu estava voltando para o meu quarto, ouvi um barulho vindo da sala... Ah, sério que o Sasuke largou a televisão ligada? Depois a conta de energia vem alta e a mamãe vai querer arrancar o meu couro também. 

Caminhei até a sala e senti meu sangue gelar nas veias. Se tivesse merda pronta, eu teria me cagado, porque nessas horas o primeiro músculo a se perder a coordenação motora é o do cu.

É a fita da Samara, aquele maldito vídeo... O poço, a mulher no espelho, a cadeira, o farol...

Céus, eu não vi a fita - nem fita existe mais hoje em dia -, porque ela quer vir atrás de mim? Por que esse vídeo tá passando?

Alguém acha que eu tive coragem de me aproximar da televisão? Não... 

Meu Deus... Meu Deus, o que é isso? Acho que escorreu suor masculino pelos meus olhos. 

O vídeo acabou, a televisão desligou.

Minha respiração está descompassada, eu nem sei assimilar direito o que aconteceu. Meu coração está acelerado como nunca esteve, acho até que minha alma saiu do corpo e voltou porque entende que é muita humilhação chegar no céu e falar que morreu por causa de um vídeo. 

Eis que meu celular começou a tocar no meu quarto. Respirei fundo, meu coração quase parou. 

- Por que me abandonaste? - Choraminguei. 

Será que eu morri e estou no limbo, purgatório ou qualquer outra coisa dessas? Porque nem meu corpo eu sinto mais. 

O celular parou de tocar, mas logo tocou novamente. 

Fui amaldiçoado, certeza. Alguma praga caiu sobre a minha pessoa, agora estou sendo perseguido por forças malignas. 

Eu vou matar aquele gato. 

Corri até meu quarto e olhei meu celular que está sobre o criado mudo. Número privado.

Respirei fundo e tomei coragem. Com as mãos trêmulas, peguei o aparelho e atendi a ligação, rezando para que fosse algum presidiário dizendo que sequestrou meu filho e quer resgate; Mas pude ouvir uma voz feminina dizer lentamente e com a voz horripilante:

- Sete dias...

Deixei o celular cair no chão após ouvir essas duas palavras. Foi celular pra um lado, capa pro outro, a bateria acho que foi parar em baixo da cama.

Eu vou morrer. 

Pai, piedade! Eu sou muito jovem e muito lindo pra morrer. Não posso deixar esse mundo de uma forma tão indigna quanto essa. 

Se bem que eu não vou mais ter que aturar o Sasuke, nem o Floyd, nem vou ter que limpar a casa ou fazer comida, nem estudar... É, acho que posso me conformar com a idéia de morrer. Não preciso viver muito se vivi bonito, né? E a Samara mata rápido, nem deve doer... Se bem que é foda morrer e ficar com o cadáver todo deformado, né? Como é que as pessoas vão se lembrar da minha beleza esplêndida se me virem com a cara toda esquisita no velório? 

Não, eu não quero morrer... 

Que morrer, porra nenhuma! Isso não deve ser real, isso não existe. O filme nem é baseado em fatos reais. Eu tô botando minhocas na minha cabeça por influência do medo, mas isso não é real. Isso não existe.

Deitei na minha cama e me encolhi, todo enrolado no lençol. Assim, envolto numa fortaleza protetora, ninguém pode me fazer mal... 

Ah, Itachi, para de frescura. A Samara não existe, isso não é real. E, se existir, você enfia ela de volta na televisão pra mostrar quem manda nessa porra! 

Eu poderia começar uma novena pra espantar essa coisa ruim daqui, mas infelizmente eu só tenho mais sete dias de vida... Céus, o que eu faço? 

Nunca mais fico acordado até três da manhã. 

[...]

- Deu certo! - Sakura pulou em mim, me abraçando, pouco depois do meu irmão ter entrado no quarto dele.

- Fala baixo. - Sussurrei, colocando a rosada no chão - É, deu certo. 

Ela me abraçou novamente, comemorando o sucesso da trollagem. 

- Agora a gente espera uma semana pra concluir tudo! - Ela piscou um olho para mim e logo sentou na minha cama, perto do Floyd - O segundo passo pode dar mais um pouco de trabalho, mas vai valer a pena. 

- É. - Sentei ao lado dela e acariciei meu bichano que dorme todo esparramado na cama - Tem que ser às três da manhã, não podemos falhar.

- Uhum. - Assentiu - Melhor horário pra fazer algo assim! Itachi deve estar tremendo numa hora dessas.

- Fala baixo. - Insisti, mas rindo. Ela se empolga - Não vai ter graça se ele descobrir antes do tempo. 

- Verdade. - Respondeu, dessa vez falando baixo - Tudo no seu tempo. 

- Eu quero muito ver como ele vai estar amanhã. 

- Eu também! - Riu - Mas tenho que ir embora antes que ele acorde.

Verdade. Itachi sequer viu a Sakura aqui, vai dar muito na cara se ela amanhecer aqui amanhã. Ela tem que ir pra casa antes que o meu irmão levante, o que provavelmente não vai acontecer antes do meio dia.

- Eu relato tudo pra você. - Ri - Mas ele é orgulhoso, não vai me deixar perceber que tá se cagando de medo.

Sakura bocejou. 

- Vamos dormir agora?

- Tudo bem... Eu durmo lá na sala e você dorme aqui, pode ser? 

Ora, não tem colchão de sobra aqui, querem o quê? 

- Sasuke! - Ela riu - Não precisa abrir mão da sua cama.

- Mas eu não vou deixar você dormir no sofá. - Insisti.

Sakura revirou os olhos. 

- Dormimos nós dois aqui, algum problema? - Arqueou uma sobrancelha - Eu nem me mexo durante o sono, garanto que não vou incomodar você. 

Acho que fiquei um pouco vermelho depois dessa... e Sakura percebeu. Merda! 

- Tudo bem. - Concordei. Com mulher não se discute, não é mesmo? - Podemos dormir os dois juntos se você preferir. 

- Os três, né? Tem o Floyd. 

Verdade, ainda tem o Floyd. Ele dorme nos pés da cama, fica de boa lá. 

Eu ia pegar outro cobertor, mas já que vamos dormir juntos eu creio que não precise. É, realmente não precisa. 

Tranquei a porta do quarto para o caso de Itachi inventar de abri-la sem bater, visto que não posso correr o risco de ele abrir a porta e ver que Sakura está aqui; Apaguei a luz do quarto e deitei perto da rosada, ela logo se aproximou de mim e eu a abracei. 

Isso parece tão coisa se casal... Pode parecer até intimidade demais pra dois amigos, mas ela não acha ruim - eu muito menos -, então qual é o problema? Quando um não quer, dois não fazem. 

Às vezes eu penso que me apeguei demais em pouco tempo, mas isso não está me fazendo mal algum. Eu gosto da Sakura, amo a companhia dela, sinto prazer em ficar com ela... qual o problema em apegar? Pior é quem gosta e não demonstra, esse é o pior tipo de gente. 

Todavia, quando me pego pensando em Sakura, muitas das vezes me dá a impressão de que estou gostando dela mais do que deveria.