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História Llévame Gitano - Dulce Amor


Escrita por: Tinkerbaek

Notas do Autor


Pois é, pessoas... Chegamos, depois de todo esse tempo, ao fim de Llévame Gitano.

Fic que eu tive a ideia por algo bobo de colégio, um arraiá temático de ciganos. Quem diria que eu faria uma história sobre isso?! Confesso que fiquei receosa em postar, ainda mais pela escrita um tanto cansativa e pela história ser um tanto grande. Mas fiquei extremamente feliz com a resposta positivíssima que tive com relação a ela! Obrigada, de todo o coração, a todos que leram! Saibam que todo o autor posta suas histórias pelos leitores, então vocês foram meu combustível pra não abandoná-la.

Continuarei respondendo os reviews pendentes, mas quero logo postar o último capítulo sem mais delongas. Espero que continuem a acompanhar minhas outras histórias.

Obrigada a carol_ também por me dar apoio e ser minha beta. <3

Enfim, vamos ao último capítulo.

Capítulo 15 - Dulce Amor


Fanfic / Fanfiction Llévame Gitano - Dulce Amor

 

O feixe luz incômodo tocou seus olhos, despertando-o de um sono que não desejava que se encerrasse tão brevemente. Não gostaria de acordar, seu corpo clamava por mais repouso, mas sabia que teria de levantar, e assim o fez.

Enrolou-se em um roupão de seda verde, bagunçando os cabelos, que estavam compridos o suficiente para que as pontas de sua franja incomodassem seus olhos. Suspirou, sonolento, tomando em mãos uma bengala ao caminhar pelo assoalho de madeira em direção à cozinha. Uma de suas pernas passara a necessitar de apoio desde que a quebrara.

Avistou a cozinha e um certo movimento ali, tornando aquele seu destino de caminhada. Sentou-se em uma cadeira para logo juntá-la à beirada da mesa onde estava sendo posta uma diversidade de frutas, sucos e outros alimentos dedicados ao café da manhã.

Estava com fome, era fato, mas sentiu seu estômago pesar quando ouvira aquela voz que passara a irritá-lo todas as manhãs.

“Quantas vezes tenho de te dizer para que não acordes tão tarde?!” A voz aguda ecoou por seus ouvidos, fazendo-o friccionar as mãos sobre o rosto antes que pudesse olhar a face que lhe dissera tais palavras.

“Já havia alertado que hoje acordaria tarde, mulher!” Bravejou, lançando um olhar intimidador para a moça de longos cabelos castanhos claros, que vestia-se com elegância desnecessária para uma manhã.

“Sempre ei de fazer tudo nesta casa?!” Estava claramente alterada, deixando transparecer isso em sua voz. “Tenho de ir ao palácio, requisitaram-me para fazer roupas novas para a família real. Espero que, ao menos, possas cuidar das coisas por aqui!”

Ocupou-se em tomar um gole do copo de suco, evitando olhar para o rosto provavelmente enfurecido da mulher que andava de um lado para o outro, reclamando e empurrando qualquer empregada em seu caminho porém, entre aqueles barulhos irritantes de vozes e panelas, foi capaz de ouvir passos rápidos de alguém correndo naquela direção. Notou o corpo pequeno surgir e agarrar-se no vestido longo e azul da mulher de cabelos claros. Esta lançou um olhar irritado, segurando os ombros do menor afastando-o para longe.

“Agora não, criança!” Disse ela, ignorando totalmente aquele ser humano pequenino, que deixara um soluço agudo desprender-se em um choro alto. Irritou-se ainda mais com aquela situação que presenciava, batendo a palma da mão sobre a mesa na tentativa de atrair a atenção da mulher ali.

“Não sejas grosseira com o garoto!”

“Ao contrário de ti, não estou com tempo suficiente para dar-lhe atenção! És o pai, faça alguma coisa sobre o choro de teu filho!” Ela apontara para a criança de cabelos cortados em forma de cuia, que estava sentada sobre o chão a coçar os olhos com as pequenas mãos enquanto seu rosto era coberto por lágrimas.

“E tu és a mãe, deverias agir como tal!” Retrucou, chamando a criança com as mãos. Logo o pequeno corpinho estava sentado sobre suas pernas e tinha os cabelos em forma de cuia acariciados. “Vamos, Yejun, calme-se e comas um pouco...” Sussurrou para ele, que ainda fungava enquanto se acalmava lentamente.

“Estou farta de como estás a mimar esse garoto, Kyungsoo!” A mulher continuava a reclamar, tentando retirar uma pequena mancha que achara em seu vestido, mancha que o burguês demorara a conseguir encontrar por sua tamanha insignificância.

“Não grites em frente ao menino!” Tentou ser calmo, mas sua voz transparecia sua demasiada irritação. Apertou a criança junto a si, encostando a lateral sua cabeça sobre o ombro para que um dos ouvidos ficasse pressionado ali, enquanto com uma mão bloqueava o outro ouvido da criança.

Sabia que ele escutaria toda aquela conversa, mas sentia-se mais confortável ao enganar-se daquela forma. Sentira um alívio ao notar que o tutor da criança chegara para levar o pequeno até o escritório, que era também a sala de estudos. A educação dele deveria ser a melhor, era o mínimo que poderia fazer.

Do Yejun tinha apenas nove anos, era seu primeiro filho, e possuía grandes chances de ser o único.

Casara-se com Nam Hani logo após o falecimento do homem que amara. Não lutara contra esse destino cruel, não fora possível escapar, e muito menos possuíra forças para ir contra, depois de toda aquela dor e trauma que passara, sua vida não fazia mais sentido algum. Baekhyun tornara-se padre, e achou melhor daquela maneira.

Não era mais puro, cometera pecados demais para tornar-se um homem religioso, mas não arrependia-se de nada do que fizera, e talvez nunca fosse se arrepender. Baekhyun mantivera sua pureza corporal e confessara seus pecados. Ao menos o rapaz mais velho tornou-se mais bondoso e legitimamente arrependido, tornando-se também um tio presente e gentil, porém ele mesmo tornara-se irritadiço e infeliz. Seu casamento nunca chegara perto de ser o ideal... Em sua lua-de-mel nem ao menos fora capaz de consumá-lo. Por tempos, a nova senhora Do insistia por um filho. Logo seus pais e seus sogros também estavam a cobrar por um neto.

Mas era incapaz de deitar-se com sua esposa. Não sentia-se atraído, não sentia desejo... Com o tempo Hani descobrira, sem tantos esforços, que seu corpo não o agradava pelo simples fato de ser uma mulher. Seu desespero por um filho era tanto que ofereceu-lhe um acordo sujo e impensável.

Chamar outro homem para que pudessem tentar consumar o casamento. Sentiu-se enojado com aquela proposta, mas para Hani era tudo ou nada, seu objetivo obsessivo era conceber uma criança de seu sangue, para que pudesse, por fim, descansar de toda aquela cobrança. Seria sua escapatória de uma má reputação.

Dia após dia, durante dois anos, ela insistira com fervor sobre aquela proposta pecaminosa até que, por fim, acabara por aceitar. O homem que sua esposa conseguira era um rapaz alto, de cabelos negros e curtos, um tanto desinibido, possuidor de um sorriso tão grande que chegava a incomodar.

Era, de fato, muito bonito, porém não era de seu feitio submeter-se a uma situação daquelas, então tentara relutar... Em vão. Logo estava entre os braços daquele rapaz alto. Nunca havia feito aquele ato com mais ninguém além de Jongin, entregar seu corpo a outro. Sentiu-se culpado ao fazê-lo, mas deixou-se levar pelos prazeres carnais e usou disso para conseguir consumar seu casamento com sua esposa.

Apesar de sentir a diferença de ter seu íntimo tomado por uma mulher, esqueceu-se tentou esquecer de que ela era uma mulher, mas fora o suficiente para que o sonho de todos se realizasse quando esta engravidara. Fora quase capaz de ajoelhar-se e agradecer aos céus por terem sido atendidos na primeira tentativa, pois assim evitaria colocar-se em uma situação como aquela novamente.

Nove meses depois nascera aquela gotinha de luz em sua vida mais uma vez depressiva. Não imaginou que pudesse sentir felicidade novamente, mas aquele pequeno menininho fora capaz de fazê-lo.

Porém a mulher que tanto pediu por uma criança não parecia totalmente feliz. Os choros do bebê a irritavam, e uma ama de leite fora chamada para amentar o pequeno. Ao menos nunca levantara a mão para ele, pois isso não perdoaria de forma alguma. Todavia, Do Hani era quase como sua própria mãe. Nem todas as mulheres, pelo que havia percebido, realmente desejavam dar frutos. A sociedade exigia e sua esposa, desejando viver um pouco mais em paz, resolveu seguir todas as regras.

Ao menos não fariam a criança passar pelo mesmo que passara, não tivera culpa alguma de nascer em berço tão conturbado. Se havia alguma vítima inocente do mundo insensível e sem escrúpulos no qual viviam, esse era seu filho. Seu primogênito.

Porém não era o suficiente ter o filho em seus braços, não era toda a alegria que desejara ter. Sua felicidade há tempos fora arrancada de seu coração. Ainda amava o cigano que um dia sua visão descobrira numa noite aconchegante. Aquele homem que dançara em torno da fogueira de modo encantador e esplendoroso. O moreno que apresentou-lhe um mundo de cores, amores, prazeres e felicidade.

Fora com esses pensamentos que arrumou-se devidamente em seu quarto, saindo da grande casa sem dar importância alguma em saber se sua esposa saíra ou ainda estava em algum cômodo. Não faria diferença se despedir.

Andou pelas ruas de pedra da cidade, sentindo o sol quente sobre sua cabeça. Calor excessivo acabava por fazê-lo reviver suas piores lembranças. Temia o fogo, temia tudo que pudesse queimá-lo. Pois foram a chamas que consumiram seu amor por toda a eternidade.

Entretanto ainda estava lá, desolado, sem rumo, como sempre fazia. Suas pernas o forçavam a andar por locais conhecidos, os quais guardara em seu coração por onze anos.

Onze anos...

Tudo ainda estava completamente vivo em seu interior. As lembranças de um amor que o arrebatara de tal maneira que talvez nunca pudesse amar novamente outro alguém. Em sua alma sabia que Jongin nunca sairia de sua mente, corpo e coração.

Talvez o amor épico realmente existisse, um amor ficcional retratado em textos literários arcaicos como um culto ao belo e ao perfeito. Tão inebriante, apaixonante e enlouquecedor que um alguém, por mais que arrebatado por tão lindas palavras ali escritas, não conseguiria convencer-se sobre aquela intensidade, de que é realmente tudo real, mas se não houvesse realidade em tudo aquilo... De onde tirariam inspirações para romances tão fortes e inexplicáveis? Seria possível escrevê-los se não existissem? Algo naquele amontoado de amor ardente da literatura era verdade, baseado em fundamentos verdadeiros, pois seu amor fora assim.

Sim. Kyungsoo sabia, de todo seu coração, que nunca amaria outro homem - ou mulher -, como amou aquele cigano moreno. Tão estonteante que nem mesmo os mais caros vinhos deixariam uma pessoa sem chão como ele fora capaz de deixá-lo. Outro homem tão belo e gentil não existiu, e talvez não fosse existir tão cedo.

Amores épicos e marcantes são para poucos, mas são duradouros e tão fortes que nem o tempo consegue apagar tantos sentimentos, tantas emoções, pois são marcadas quase que a ferro por toda a pele... Como um registro de que nunca esquecerá, por mais que todo seu corpo grite para que supere e siga em frente.

Era demasiadamente grandioso. Amor que chegava a doer. Tão grande que o mundo tornava-se menor, mas tão grande que podia preenchê-lo. Tão inexplicável que o termo “inexplicável” era a explicação mais correta para esse amor em excesso. Mas tão doloroso que, de tanta dor, tornava-se impossível sentir a dor.  Era uma anestesia dolorosa.

Tão confuso... Tão poderoso... Amar era tão sublime quanto deplorável.

"¿Como hacer para olvidarte? Si tu te quedaste para siempre en mi corazón..." Kyungsoo dizia a si mesmo em um sussurro pesaroso, apoiando sobre a bengala de madeira todo o peso de seu corpo cansado.

Sabia, no fundo de seu coração, ninguém substituiria tudo aquilo que ainda sentia vivo em seu interior. Jongin o completava, era sua outra metade. Como se necessitasse do cigano para conseguir respirar com facilidade, dormir em calmaria.

O vazio da alma realmente existia, e o burguês descobrira da pior maneira. O vazio de ter seu grande amor arrancado de seus braços pela maldade humana. Ah, vida tão cruel e injusta...

Lágrimas borraram sua visão por tanto tempo desde que vira as chamas consumindo e tornando pó tudo o que sonhara e desejara. Durante dias, semanas, anos... Não havia um dia sequer que não se sentisse só, incompreendido e despedaçado sem misericórdia alguma.

Lembrava-se do cheiro do cigano, da voz grave, dos longos cabelos que lhe desciam o pescoço, o corpo indomável que podia desafiar o vento, seu misticismo, seu amor e gentileza. Não amaria mais ninguém em sua vida. Jongin seria único, para todo o sempre. Quando a vida escolhe uma pessoa, é a ela que seu coração pertencerá até o fim de sua vida.

Ainda sentia tal sensação de falta de espaço... Aquela que lhe sufocava, pois tamanho amor sentia pelo moreno que seu interior ameaçava rasgar-se, na tentativa de procurar mais espaço para preencher com todo aquele sentimento intenso.

Ano após anos, o sofrimento da perda batalhou juntamente ao lado do amor inarredável que sentia por Jongin, deixando-o atordoado e inconformado por perder o homem que tanto o abalou.

Logo notara que suas pernas o levaram de forma inconsciente até o local que um dia estava Jongin a dançar. Onde tudo começara, o lugar onde amou um homem com toda a força de sua alma. Sempre acabava ali, de alguma forma. Todos os anos, todos os meses, seu coração o levava de volta para o lugar que tornou-se um poço de lembranças dolorosas, mas naquele momento sentira uma dor dilacerante palpitar dentro de si, ao focar sua visão mais ao longe, juntamente com o amontoado de lágrimas que aglomeravam-se em seus olhos para logo deslizarem como pequenas cascatas cristalinas sobre o rosto branco.

Um homem alto, forte, com a pele de um bronze pintado pelo sol se fez presente perante seus olhos... Com os longos cabelos castanhos que lhe chegavam a metade das costas... O mirava com incredulidade, e sentiu-se uma criança indefesa, recuada e confusa ao ver os fartos lábios sorrirem em sua direção.

Aquela figura só podia ser uma enganação de sua mente, mais uma das muitas que sua imaginação criara sem consentimento para amenizar a dor da perda... Uma das que quase fez Kyungsoo afogar-se na forte maré de ressaca ao pensar ter visto Jongin em meio às ondas. Tão tolo e desesperado que nem sequer pôde refletir o quão humanamente impossível seria enfrentar águas em demasiada violência.

Kyungsoo desejou tanto aos céus que lhe devolvessem o amor de sua vida que a mente fraca e cansada proporcionava esses lapsos momentâneos de felicidade, enganando-o cruelmente com ilusões impiedosas. Todavia aquilo não parecia uma miragem, não parecia uma alucinação.

O corpo alto caminhou em sua direção, direcionando um sorriso receoso, assim como os passos lentos. O branco encolheu-se, retribuindo com passos para trás, como se estivesse pronto para fugir dali sem pestanejar. Seu corpo tremia, e logo soluços daquele choro engasgado se fizeram audíveis.

Antes que pudesse dar meia volta e correr daquele local, as grandes e ásperas mãos do homem moreno tomaram seu rosto molhado em lágrimas. Dedos deslizaram gentilmente sobre a face rosada, tentando, inutilmente, afastar as gotas que rolavam pelas bochechas.

“Perdoe-me... Sei que prometi que enxugaria suas lágrimas... E não há um dia sequer que eu não me amaldiçoe por não ter cumprido tal promessa.” Os joelhos do burguês perderam a pouca força que lhes restavam, indo duramente contra o chão. O dono da voz grave ajoelhou-se quase que ao mesmo momento, segurando sua cintura, tentando impedir que o impacto com o solo não fosse doloroso.

“Não... Não...” Disse o branco, por fim, falando consigo mesmo. Aquilo não podia ser real. “Ele... Ele não existe mais...” Dizia para sua mente, e logo uma risada de dor e desespero desprendeu-se de seus lábios. Kyungsoo não compreendia o que estava a acontecer. “A vida o tirou de mim... As chamas o tomaram... Eu vi! Eu... vi...”

Seu rosto fora tomado novamente pelos grandes dígitos, fazendo com que suas visões se encontrassem. Os olhos do moreno estavam tão lacrimejantes e avermelhados que Kyungsoo sentiu um impulso de abraçá-lo, mas não havia como abraçar algo que sua mente criara, por mais que aquela visão fosse a mais real que tivera.

“Meu doce amor... Ainda és meu doce amor...” Sussurrara tão gentilmente que toda a histeria que o corpo do burguês liberava cessara. Apenas os grandes e cansados olhos observaram a face à sua frente.

“Jong... In...?” Perguntou quase inaudível em sua voz falha. E a concordância em um aceno de cabeça pela parte do moreno fora o suficiente para que os soluços voltassem com ainda mais potência. “Jongin!” Gritou, socando o tórax do maior, jogando-lhe a terra e a grama que arrancou ao apertar o chão com tanta força, segundos atrás.

O cigano não fez nada para impedir as agressões, gritos ou choro. Kyungsoo sentia sua visão embaçar novamente, engasgando-se com a própria saliva. “Maldito! Maldito!” Bravejou em prantos “Por que me deixastes?! Estavas morto, eu vi! Vi o fogo consumir teu corpo! Eu vi...!” Continuou a agredir os ombros e peitoral do moreno com os punhos fechados. Mas logo sentiu sua força esvair ao ter o corpo envolto por aqueles braços fortes -ainda mais fortes do que podia lembrar que eram.-

Deitou a cabeça sobre o ombro do cigano, deixando que ele afagasse suas costas.

“Perdoe-me... Peço seu perdão com todo meu coração...” Sussurrou Jongin, a voz cortada em dor e arrependimento. “Eu contei todos os dias de minha vida longe de ti, e em nenhum deles eu deixei de lhe pedir perdão. Seria capaz de repeti-los nesse momento, todas essas incontáveis vezes que implorei para que seu coração pudesse sentir meu arrependimento...”

 “Por quê? Por quê?!” Ainda de joelhos, Kyungsoo encolheu-se entre os braços do cigano, como uma criança medrosa, sentindo o aroma que desprendia-se daquela pele, era exatamente o que sua memória havia gravado, e sendo amparado pelo maior de forma amorosa. Roçava seu rosto no tecido da camisa do mesmo, sem se importar em molhá-la com lágrimas.

Sentiu-se enganado, revoltado, raivoso... Mas ao mesmo tempo era como se o milagre por qual rezou por dias a fio lhe fora concedido, por fim.

Todavia a emoção fora tão intensa que o corpo cansado do branco não foi capaz de suportar todo aquele sentimento de forma tão arrebatadora, assim desfalecendo-se entre os braços que há tantos anos achou que nunca mais sentiria a abraçá-lo, mas que, daquela vez, estavam lá para ampará-lo de verdade.

•••

  Sua cabeça girava em tontura, e sentia-se mal pelo sonho que acabara de ter... Será possível que seus sentimentos por Jongin ainda estivessem fortes a ponto de fazê-lo delirar novamente? Todavia seus olhos focaram no rosto cansado e gentil do homem ao seu lado. O rabo de cavalo longo caía por seus ombros e em sua bochecha havia uma cicatriz de corte na horizontal. Mas nada que lhe tirasse a incrível beleza. Seu coração parara ao notar o pequeno brinco em uma das orelhas do homem, o qual o pingente era um caco de porcelana preso ali.

“Kyungsoo...” Ele sussurrou, o timbre grave e marcante fazendo seu corpo estremecer, eriçando os pelos de seu braço. Os lábios fartos sorriam de forma acanhada. As mãos ásperas e pesadas tocaram seus cabelos em uma carícia temorosa, que quase não durara.

Só poderia estar doente e com algum tipo de febre forte, pois que delírio o faria enxergar, ouvir e sentir tão perfeitamente aquele cigano consumido pelo fogo? Não era possível, nada daquilo deveria ser real. Nem mesmo o beijo que recebera em sua testa dos lábios tão cômodos e reconhecíveis.

“Por quê...?” Perguntou a ele, aquele que talvez fosse uma miragem, uma questão que não sabia ao certo qual seria a resposta. Nem ao menos sabia ao certo o que gostaria de ouvir. Mas sua mente estava confusa, ainda mais confusa do que da vez que ouvira a declaração de Jongin.

Levou uma mão trêmula até os fios lisos do longo rabo de cavalo, acariciando as pontas... Apesar de maior, era a mesma textura que um dia vira ondular contra o vento, os fios que colavam no corpo bronzeado quando molhado. Os cabelos castanhos escuros que também tanto foram alvos de puxões forte que o prazer obrigava-o a descontar.

Os dedos brancos tocaram a face do homem ali, deslizando os dígitos pela cicatriz reta e fina que agora era como um risco no desenho perfeito que antes era o rosto do cigano. Sentiu a mão do maior cobrir a sua enquanto fazia aquela carícia, mas ali havia apenas quatro dedos, e seu coração revirou em dor.

Ele sofrera... Jongin também sofrera...

“Por que não... Por que não me avisaste?” Questionou, sentindo novamente um choro tentar desprender-se de sua garganta. “Por que me deixaste sozinho?!” Gritou com todos seus pulmões, a raiva consumindo sua alma.

Raiva, mágoa e solidão.

“Todos estes anos... Fizera-me acreditar que estavas mortos!” Quando pusera-se a socar novamente os ombros e tórax do moreno, este não fizera nada para impedi-lo. Apenas deixava-se ser agredido, seu rosto abaixado e sem expressão demonstrava que nada reagiria. “Como podes...” soluçou em meio ao choro, suas mãos agora seguravam o colarinho da camisa de Jongin “Como podes ser tão cruel a esse ponto?”

Sem aviso algum levantou-se do local sobre o qual repousava, notando que tratava-se de uma das tendas ciganas que há onze anos já não via. Correra dali, ouvindo os gritos graves do maior a implorar que não fugisse.

Todavia seu coração em confusão sentia-se traído demais para permanecer ali.

•••

 Desde então refugiou-se em sua casa ou trabalho, confinando-se em um cárcere que criara para si próprio. Mais de cinco meses escondendo-se da presença do cigano que há muito sabia que o procurava. Mas a raiva e tristeza que afligiam sua alma o impediam de estar disposto a ouvir as desculpas que o maior poderia lhe dar. Infelizmente criara um orgulho quase inabalável, que dificilmente seria quebrado.

Obviamente ter a imagem viva de Jongin em sua frente era ter suas orações desesperadas atendidas, mas a mágoa de ter sido abandonado e enganado tornou-se tão grande que estava sendo incapaz de ceder aos pedidos desesperados de um reencontro. Não conseguiria esquecer as noites em claro que passara aos soluços e clamores para que o cigano fosse devolvido a ele.

Foi caminhando para o sexto mês de tentativas de se afastar que Kyungsoo fora pego de surpresa em seu caminho para o trabalho, arrastado a força por braços fortes, para longe da visão alheia pelas mãos pesadas daquele cigano alto.

Fora obrigado a escutá-lo.

•••

 Estava sentado sobre aquela pedra junto ao mar, um local repleto de lembranças de amor e paixão, lembranças que por anos a fio tentaram apagar de sua memória para que o sofrimento da suposta perda fosse amenizado, mas também tornou-se lugar onde, diversas vezes, divagou sobre o valor da vida, e apenas não derramara seu próprio sangue ali pois Do Yejun necessitava de um pai.

Todavia encontrava-se sem palavras e em um pequeno estado de choque ao ser obrigado a ouvir tudo o que o cigano insistira em contar. De fato fora preso pelos inquisidores, rapidamente levado a jure pelo tribunal da Inquisição, fora condenado culpado de heresia, sua sentença seria a morte por envolvimento com bruxaria. Tudo ocorrera rápido demais, como se tentassem se livrar logo da “carga”.

O moreno fora torturado, tendo seu dedo arrancado e a parte de trás de seu corpo marcada pela mesma cadeira que deixara o menor marcado pelo resto da vida. Seu coração pesara com o fato de imaginar Jongin a sofrer sob aquela tortura cruel, mas manteve-se calado, tentando criar um escudo com seu orgulho.

Soube que o momento crucial naquele dia negro fora quando o botaram na carroça de carga, como um animal pronto para o abate, mas naquele momento houve sua salvação. Os remanescentes de seu povo lutaram por sua vida e dos outros ciganos que foram capturados, entre seus salvadores estavam o Kaku e sua irmã, esta que apenas o puxou de dentro da carroça, e então a perdeu de vista conforme outros de seu povo o seguraram.

Tudo acontecera tão rápido, disse ele, que apenas sentiu-se ser arrastado por um dos braços para longe do local. Sua visão embaçada de sangue o impedia de ver o que acontecia ali, e minutos depois acabara por desmaiar, culpados a dor e o cansaço por isso, porém além da dor física, sentira a dor em seu coração ao saber que o chefe de seu povo e sua irmã, o único membro de sangue de sua família, provavelmente haviam sido queimados em seu lugar.

Fora impedido de retornar, o povo que lá estava, machucado e marcado, além de melancólicos pelas perdas que tiveram, fizeram-no prometer que não voltaria. Fizeram-no prometer, por sua falecida irmã, que mais uma vez o salvara dos envolvimentos com a burguesia, mas que dessa vez tivera a vida tomada para protegê-lo. Não pôde voltar, revelou o cigano, mesmo que seu coração se dilacerasse ao pensar o que poderia estar havendo com seu pequeno doce amor...

Riu em amargura ao ouvi-lo ser chamado daquela forma depois de tantos anos. Era incrível como seu timbre e sua doçura ao pronunciar tais palavras estavam incrivelmente marcados em sua lembrança, mas escutá-lo daquela maneira, tão vivo e presente, abalava suas frágeis estruturas.

Descobrira em seguida que tornara-se o novo Kaku, pois sempre o homem mais forte e capaz poderia ocupar este cargo tão importante entre os ciganos. Aquele quem os comandava, que mantinha a paz e a ordem. Era a mesma ideia de um rei, mas sem as regalias e luxuosidades.

A marca em seu rosto conquistara com os anos, tentando proteger seu povo ao fugir de cidade em cidade, chegando a refugiar-se em outros países, como a França. Tudo porque não eram bem-vindos, e talvez nunca fossem.

Mesmo com tudo aquilo, mesmo agarrando os próprios braços para evitar um novo choro que ferisse seu orgulho, sentiu-se confuso e com pesar no coração.

Jongin aproximara-se, virando seu rosto pelo queixo para que pudessem encontrar os olhares, e aquilo fora o basta para aguentar-se. Sentira uma fina lágrima descer em teimosia de seus olhos por sua bochecha quando ele disse, em alto e bom som:

“Espero por ti até hoje. Nunca houve ninguém em minha vida, e nunca haverá... Por mais que me impusessem tomar alguma das moças por esposa, todos poderão esperar pela eternidade, pois nunca tomarei ninguém em meus braços enquanto ainda mantiver minha promessa de ser apenas teu.”

E ele, tão fraco, casou-se com outra... Por que ganhava o amor daquele homem se não era merecedor? Jongin mantivera sua promessa por tantos anos, e fora incapaz de manter seu lado daquele juramento de amor. Deitou-se com sua mulher, e com a ajuda de outro.

Sentia-se sujo e baixo. Suas lágrimas não limpariam a imundice que sentiu que sua alma se tornara. Porém não desfazia-se em choro sozinho, pois observara o corpo do maior deslizar até o chão, usando as mãos para tapar o próprio rosto, abafando um soluço doloroso.

“Perdóname, mi dulce amor...” Disse ele entre soluços... Prostrado ao solo, como se ali implorasse à sua alma para ser perdoada.

Percebera que, por mais que os anos passassem, ver o cigano chorar era uma das piores dores que poderia sentir. Ajoelhou-se em frente a ele, envolvendo o corpo moreno e acuado entre seus braços. Aquele corpo chacoalhava enquanto as lágrimas molhavam o tecido de sua camisa sobre os ombros. Parecia tão frágil ali... Seu Jongin. Ele nunca deixara de ser seu.

Mais uma vez eram acalentados pela brisa do mar, a única que testemunhava todo o amor que ainda possuíam um pelo outro.

•••

 Anos se seguiram... Anos de encontros às escondidas, por mais que fosse difícil marcá-los. Às vezes viam-se por apenas um dia, às vezes os ciganos sumiam de Barcelona, fugindo de seus perseguidores, mas a caravana sempre voltava.

Havia contado a sua esposa sobre Jongin e ela, apesar de não possuírem um relacionamento regado em carinho, lhe dera permissão de encontrar-se com o cigano, sob a condição de que ela também pudesse estar com o homem que realmente amava, e que mantivessem segredo a todo custo.

Em 1793, quando ambos alcançaram a faixa dos quarenta anos, Do Yeju arrumara para si um casamento com uma duquesa, mudando-se para o palácio e levando sua mãe consigo. Kyungsoo resolvera, por fim, ir embora. Sabia que Hani e seu filho viveriam bem, em meio a riquezas e luxos.

Deixaria sua família para viver, finalmente, com o homem que amava... Por mais que fosse visto com maus olhos pela sociedade. Pediu para que Hani forjasse sua morte, como uma desculpa para também ficar livre e ser feliz com quem escolhesse.

Fora naquela manhã de inverno que ele e o cigano, que deixara seu povo sob os cuidados do novo Kaku, partiram para uma nova vida, talvez tão conturbada quanto a que deixavam para trás, mas enfrentariam juntos... Mesmo que tivessem de morrer juntos.

Mudaram-se para França em um momento conturbado. Vivendo próximos a um vilarejo pequeno, não muito longe da Espanha, mas permaneceram ali, sendo silenciosamente julgados, até mesmo sendo quase apedrejados ao condená-los pecadores. Sempre juntos, contudo.

Mesmo em idade avançada, os cabelos brancos surgindo entre os fios que antes eram apenas escuros, as rugas tomando forma em seus rostos. Ainda eram capazes de se amarem sob os lençóis com o mesmo ardor de suas juventudes, arrancando gemidos e juras de amor que, daquela vez, realmente pudessem durar pela eternidade.

Em 1804, quando alcançaram os cinquenta anos, ainda viviam no país que tomaram por lar quando este fora alvo de uma revolução tão grandiosa que presenciaram uma nova estrutura política, após a morte do rei Luiz XVI e sua esposa, rainha Maria Antonieta.

Napoleão Bonaparte tornara-se Imperador daquela nova França. Revogando os direitos da igreja sob o Estado, separando-os. A Inquisição, que fora responsável por tanta dor e lágrimas em suas vidas, por fim, caíra.

Seus corações foram tomados por um alívio reconfortante, por mais que a vida que levassem ainda fosse considerada errônea e vista com maus olhos pelos demais. Moraram longe do alcance dos outros, vivendo apenas de pequenas trocas, agricultura e criação de animais em uma pequena casa fora do alcance do vilarejo humilde. Não precisavam de mais nada, por mais que o burguês ainda sentisse na pele as dores e pesares de um camponês pobre.

Jongin estava lá, então tudo estava bem. O moreno sempre esteve... Mesmo quando o branco começara a sentir o corpo ser tomado por um cansaço que não o abandonava, tossindo sangue por diversos dias. Às vezes acordando coberto de suor, sentindo os ossos fracos e indispostos.

Não conseguia comer, não conseguia dormir de maneira apropriada. Estava magro e cansado quando notara que Jongin passara a sentir o mesmo. Os dois adoeciam juntos, talvez por amor... Gostaria de pensar daquela maneira, pois nunca se perdoaria se a culpa daquele mal duradouro de seu amor fosse sua.

“Jongin...” Chamou o branco, suas mãos fracas puxando o maior para perto de seu corpo, sobre a cama. Este o aconchegou entre os braços, onde pôde respirar o aroma da pele do cigano. “Vivenciamos este amor tão conturbado quanto acolhedor...” Disse a ele, tossindo contra seu peito. “Nunca haverá história tão forte e dolorosa quanto a nossa, mas também nunca haverá seres humanos tão ligados como tu e eu...”

Um crise de tosses perturbou a voz rouca e cansada daquele homem que podia-se considerar quase idoso. Tocou os cabelos, agora curtos, do homem que o abraçava junto a si. Sempre macios, os fios castanhos.

“Todas as marcas em nossos corpos, todas as vezes que fui teu, e tu foste meu... Não serão capazes de escrever sobre amores tão grandes quanto este que possuímos um pelo outro.” Era como se seu corpo murchasse lentamente, a força esvaia-se pouco a pouco, mas estava tudo demasiadamente bem. Pois Jongin estava ao seu lado. “Apenas nós poderíamos ter suportado tamanha dor e sofrimento, apenas por amor... Somos únicos, meu amor.” Sorriu para ele, notando o rosto também cansado do maior, que claramente possuía uma respiração pesada e difícil.

“Meu doce amor. Meu pequeno doce amor... Me mangav tut.” Sussurrou em resposta o moreno, puxando-o para si. Selaram os lábios de forma tão inebriante que o beijo durara minutos... Os lábios provavam do sabor um do outro mais uma vez, mas com anseios e desejos inexplicavelmente fortes.  A idade não os incomodava, pois o amor ainda preenchia a alma daqueles amantes de longa data.

As línguas roçavam levemente uma sobre a outra, cabelos eram acariciados e suspiros altos eram soltos de suas gargantas. Dormiram abraçados, acordando poucas vezes para beijarem-se vez ou outra... Como sempre, seus corpos não eram capazes de suportar tanto amor em seus pequenos corações.

•••

 “Quando o vi pela primeira vez, meu doce e pequenino amor, também tornei-me temoroso com sua presença brilhante e acanhada, e quando deixaste que suas mãos fossem tomadas pelas minhas naquela leitura inocente, fui capaz de descobrir que o destino nos ligara. Por mais que ali dissesse que passaríamos por provações e dores, quis tê-lo ao meu lado de qualquer forma. Tornei-me capaz de suportar tudo por ti, mesmo que o mundo se voltasse contra nós... Nosso amor estava escrito em nossas mãos e ninguém, jamais, poderia apagá-lo.”

•••

 Na manhã que se seguira, em um dia frio de 1808, quando as tropas napoleônicas invadiram a Espanha, Kyungsoo dera seu último suspiro, entre os braços do cigano que um dia vira dançar ao redor da fogueira, livre como o vento.

Este permaneceu ao seu lado por mais dois dias, sendo consumido e derrotado pela mesma doença que levara seu doce amor... Morrera ali, sem deixar o leito do burguês delicado, porém forte, que amou e foi fiel até o fim de suas vidas.

Amor tão grandioso e forte não haveria de existir tão cedo... Pois amar e suportar a dor do amor era para os poucos corajosos que no mundo vivem, os únicos capazes de enfrentar tanto sofrimento em busca da felicidade. O cigano e o burguês viraram suas costas para o mundo e declararam seu amor, escrevendo-o em linhas tortas na folha manchada da vida.

 

O burguês aparecera acanhado e tímido entre as tendas coloridas daquele povo desconhecido... E o cigano levara seu coração, para todo o sempre.


Notas Finais


Encerramos aqui Llévame Gitano. Obrigada, mais uma vez, a todos que leram!

Glossário Espanhol-Português:
"Como fazer para te esquecer? Se você está para sempre em meu coração."
"Perdoe-me, meu doce amor."

Meu twitter: @tiinkerbaek com dois "i"s
<3


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