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História Loup Garou: Herege - Promessas


Escrita por: InvisibleWriter

Capítulo 66 - Promessas


Fanfic / Fanfiction Loup Garou: Herege - Promessas

 

Ser usada como bola de futebol por um gigante de metal realmente muda sua perspectiva sobre você mesma. Ou você se sente muito pequena ou se sente muito furiosa. Neste caso, eu apelei para a última opção. Deixei meu corpo afundar no oceano apenas para poder me concentrar. Eu não podia desmaiar, só podia invocar meu poder primordial e subir a superfície. Foi exatamente isso o que fiz.

- Jesus! – exclamou Ramona quando explodi pra fora da água sob minha forma primordial. Muitos nefilins perderam a cor ao me ver. Voltei a minha forma normal, coloquei a mão no lado esquerdo do meu tórax. Eu tinha quebrado duas costelas, dava pra sentir.

- Droga. – grunhi, tentando respirar. Ramona me amparou junto com Sasha.

- Como é que você não viu um pé daquele tamanho vindo na sua direção? – disse ela, encharcada e suja. Parecia cansada.

- Temos coisas maiores pra nos preocupar. – respondi, olhando para os gigantes jorrando fogo nas correntes, mas esse fogo era estranho. Liquido vazava do laser, parecia gosmento como a baba de algum animal.

- Malditos. – a voz de Ramona tremeu.

O terceiro gigante apontou seu laser pra nós, só que dessa vez ele não ia nos atingir, pois eu não ia permitir. Ergui a mão em sua direção, Ramona preparou seu machado. Invoquei meu poder obscuro, aquele que geralmente eu não usava, pelo menos não aqui. Eu não tinha ideia se funcionaria, mas eu precisava tentar.

Duas formas escuras feitas de cinzas e enxofre se formaram um em cada lado dos meus flancos. A fumaça começou a tomar forma e se transformar em dois enormes dobermanns de orelhas finas.

- Gah! – Ramona deu um grito fino e pulou para trás junto com Sasha.

- Agonia. Pânico. – eles olharam pra mim. Um com olhos de tempestade e o outro com órbitas negras que instilavam o medo mais profundo. Acariciei o pescoço dos dois, eu podia sentir os pelos macios, mas não podia vê-los. Sussurrei pra eles. – Já sabem o que fazer.

Os dois grunhiram de felicidade quando os soltei em cima do terceiro gigante.

- Cães infernais? – ganiu Ramona, olhando para eles. Os dois pareciam duas manchas negras serpenteando pela superfície do oceano e voando em direção ao gigante. Ele tentou acerta-los com seu raio gigante vermelho, só que ambos eram rápidos demais, os latidos soando como trovões breves.

- É a nossa deixa. – eu disse, pegando minha lança. Em um alto ZING ela se expandiu. Um lado com a lâmina de ouridium angelical, a outra lâmina com o aço negro do Tártaro com runas azuis brilhando pra mim.

- Cães infernais. – balbuciou Ramona, apontando para eles.

- Ramona, mexa-se!

Lá vinha outra rajada de raios. Grudei na capa pesada de inverno dela e na de Sasha, ele xingou em russo enquanto eu usava o meu dom do Pulo para tira-los do alcance dos raios. Infelizmente, tive de correr para longe para que nada os acertasse. Só parei o Pulo quando senti que era seguro.

Eles estavam ofegantes quando os soltei. O gigante tinha perdido sua visão quando Agonia e Pânico o atacaram, arrancando seus circuitos, entrando e saindo dele na forma de fumaça. Eles estavam se divertindo bastante.

Chamei os angelicais surpresos com a minha aparição. Corri para o centro da tormenta, exatamente de frente para os juggernauts.

- Em formação! – berrei.

Eles piscaram algumas vezes, então se juntaram a mim. Alguns me tocaram de leve, quase como se não acreditassem que eu estivesse viva e precisassem me tocar pra ter certeza. Quando a certeza foi evidente, vi a determinação se formar em centenas de pares de olhos.

- Elementais da água, levantem o mar o máximo que puderem. Elementais do trovão esperem o meu comando, elementais da terra engulam os pés dos gigantes. Dalisay, atire com as balestras para distraí-los enquanto acumulamos poder.

Ergui a mão. Dalisay, tão chocada quanto todo mundo com a minha presença, ordenou as suas tropas de elementais da água para levantarem o mar e aos outros para soltarem mais flechas gigantes, dessa vez com pontas de fogo. Vi Josva perto, já ordenando as suas tropas que segurassem os raios e os outros que afundassem a terra até o pé dos gigantes. Comecei a acumular poder, o máximo que pude.

- Você ainda tem angelicais nos morteiros em Asferia? – perguntei, fechando meus olhos.

- Poucos. – disse ela, trincando os dentes ao ajudar os angelicais a rachar a terra por baixo do mar. Não dava pra ouvir, mas dava pra ver a agitação na água furiosa. O vento ártico nos castigava sobre o mar, aposto que minha boca estava azul como a de todo mundo. Uma chuva de flechas gigantes caía sobre eles.

- Anjos da terra, agora! – ordenei. Me virei para Josva. – Mande-os apontarem os morteiros para cá.

O mar afundou um bom tanto, provavelmente com alguma rachadura colossal criada por baixo. Josva fez um sinal luminoso, enquanto isso os gigantes cambalearam. O terceiro já estava quase destruído por causa dos meus cães que faziam a festa.

- Agora, Josva!

- Preparar. Apontar. FOGO! – berrou ela.

Além de mim e Ramona, havia apenas mais quatro elementais com o poder do relâmpago. Soltamos tudo em cima deles, fritando seja lá qual for a proteção que eles usavam naquelas couraças gigantes de metal vermelho. O terceiro gigante começou a cair, fumaça saindo dele e meus cães latindo de felicidade com o estrago. Ramona, em uma jogada aproveitada, preparou uma rajada de relâmpago que crepitou nas lâminas duplas de seu machado anjo, então o arremessou com toda a força.

Aquela coisa voou muito rápido, sendo iluminada pelo azul e branco dos relâmpagos, só para bater no peito do gigante e fazê-lo se virar em direção aos seus outros dois irmãos, seu laser enorme atingindo um deles, que não resistiu a potência do fogo e logo explodiu, levando consigo o terceiro.

Gritamos em comemoração. Uma comemoração que durou pouco tempo, pois com espanto vimos a corrente de Asferia começar a derreter.

- Não é possível. – eu disse, vendo o metal mítico se desfazendo muito lentamente. Tínhamos cerca de vinte e quatro horas até que derretesse por inteiro. – Josva, mande fogo nele! AGORA!

Josva, o rosto tão pálido quanto o meu, fez o sinal de luz duas vezes e ouvi o som abafado vindo das nuvens no alto e clarões amarelos. Entramos em formação de batalha, todos ombro a ombro e usando o poder que tínhamos para nos preparar para o impacto. Primeiro veio o som alto e crescente de alguma coisa quebrando a barreira do som e chegando mais perto, mais perto e mais perto, até que...

BUM! BUM! BUM! BUM!

Vários tiros de morteiro caíram pesadamente em cima dos três, fazendo barulhos infernais que praticamente me deixaram surda, uma nuvem de poeira se ergueu e tapou nossa visão dos três sendo atingidos por morteiros sucessivamente. Então parou. Nossa respiração ficou presa na garganta, ninguém se atreveu a fazer o mínimo movimento. Não tínhamos tempo a perder.

- Soltem a água em cima deles. – sussurrei, preparando outro relâmpago na minha lança e entrando no modo primordial. Isso ia me dar mais força, mais poder.

Dalisay ordenou com apenas um gesto e os anjos soltaram a água que formou uma muralha que quase tocava as nuvens. Ela caiu com um estrondo e uma ventania que se assemelhava a um furacão. Tive de flutuar mais alto pra não acabar me afogando. Tudo ficou quieto e não havia sinal algum dos três. Mesmo assim, ninguém ia ser enganado.

- GAH!

Alguém gritou, olhamos, mas não vimos quem foi. Ramona veio para o meu lado. Trocamos olhares.

- AHHH! – gritou outro anjo. De novo, não havia nada pra ver.

- AJU...

De repente, um por um dos anjos começaram a ser sugados para baixo da água.

- Subam, subam! – berrei, batendo minhas asas.

Em uma chuva de penas, nefilins começaram a alçar voo e lá de cima vimos centenas de figuras de metal serpenteando por baixo da água. Eu estava subindo, quando algo agarrou meu pé e me puxou pra baixo com força. Usei minhas asas para não me deixar cair, felizmente elas eram muito fortes e ao invés de eu ser sugada pela coisa misteriosa no oceano, foi eu quem a puxou pra fora da água.

- Mas que...? – ofeguei. Aquela coisa tinha uma forma humanoide, mas possuía tentáculos que eram afiados como navalhas. Senti o corte no meu tornozelo e grunhi de dor. Usei minha lança para cortar o tentáculo de metal. Empurrei a coisa com a minha telecinese e desci para enfrenta-lo.

SPLASH! SPLASH! SPLASH!

Um a um nossos inimigos misteriosos começaram a aparecer e essa foi a pior coisa que podia acontecer, pois eles estavam em número o bastante para nos atrasar, já que um dos gigantes meio destruído submergiu da água em um último esforço e soltou uma explosão de seu laser onde antes tentava derreter a corrente. Ninguém sabia o que fazer além de lutar com as ameaças imediatas que eram aquelas coisas.

Pensei em eletrocutar a água e torrar todos de uma vez, só que eu faria mais da metade do exército angelical fritar em menos de vinte segundos. Também não dava pra parar, aquela coisa com forma humana, mas com tentáculos nas costas era muito rápida e exigia minha atenção. Ele atacou com um de seus tentáculos na direção do meu rosto, usei a lança para desviar o ataque, então ele veio com o outro tentáculo na direção das minhas costelas. Bati com o outro lado da lança, ainda insistente seu quarto tentáculo voou rapidamente na direção da minha perna, puxei a perna para trás e segurei seu tentáculo. Ele enrolou o outro na minha lança e me puxou. Sua cara de metal estava a centímetros do meu rosto de modo que pude ver através das chamas azuis dentro de seus olhos brilhantes.

- Você não deveria ter feito isso. – eu disse, o estalar da minha lança iluminou meu rosto pra ele. Levitei um pouco para tira-lo do contato com a água.

Em uma explosão, raios subiram pela minha lança e a corrente elétrica forte o fez ter convulsões, infelizmente o maldito tentáculo em minha perna começou a apertar com uma força esmagadora. Berrei de dor ao mesmo tempo em que mandava aquela coisa para o inferno. Suas peças começaram a cair, dentro dele se revelava seu mecanismo entrando em curto circuito, então o drone dourado ficou imóvel, fumaça saía dele.

Eu o arremessei na água, vi sua couraça de metal dourado afundar. Levitei para baixo e tentei apoiar meu pé na superfície da água, a dor aguda no meu tornozelo não me deixou me mover muito mais. Eu ia ter que usar a levitação, não dava para parar e usar o dom da cura. Havia muitos drones ainda. Voei até Dalisay, ajudei-a a combater seus drones quando o peguei pelas costas, minha lança penetrando entre suas couraças e o levantei no ar. Soltei uma rajada de poder na ponta da lança, o trovão alto fez o mar congelado se agitar e o drone voar para o alto a centenas de metros de nós.

- Obrigado. – disse ela, apoiando as mãos nos joelhos enquanto respirava. Seu rosto estava cheio de pequenos cortes, assim como seus braços.

- Temos de nos dar tempo de resposta ao ataque dessas coisas. Consegue criar bolsões de ar na água? – perguntei, meus olhos atentos ao que acontecia ao redor.

- Acho que ainda tenho poder pra isso. Ai! – ela moveu um pouco o ombro, escutei o estalo baixo. Sua boca ficou branca por um instante, mas ela conteve uma manifestação maior de dor.

- Reúna os que puder, então criem bolsões de agua embaixo de cada drone. Isso os jogará para o alto quando o bolsão explodir. Eu e Ramona cuidamos do resto. – puxei o chicote de Natalia preso ao meu cinto.

Dalisay correu entre os anjos que já tinham vencido seus drones e ajudavam os outros a venceram também. Ramona terminou de espatifar um último drone com aquele seu machado gigante, então se virou pra mim com um sorriso diabólico ao também tirar um chicote de seu cinto.

- Isso vai ser divertido.

Lançamos o chicote uma para a outra, as pontas se enrolaram sozinhas e invoquei o poder do fogo. A língua de fogo percorreu toda a extensão de ambos os chicotes, tive o cuidado de não deixar queimar a mão de Ramona. Fiz sinal para Dalisay.

Em uma ordem silenciosa, aqueles que podiam lutar, tocaram a água. Foi como assistir a demolição de um prédio. Geralmente, os engenheiros costumam colocar uma bomba em cada andar e explodi-las com uma diferença de centenas de segundos de forma que parecia ter sido uma única bomba quando na verdade foram várias. Naquele dia, aconteceu quase a mesma coisa. Um a um os bolsões de ar embaixo d’agua foram explodindo em sequência e fazendo os drones em cima deles voarem muito alto.

Usei o Pulo para voar na velocidade da luz. Eu devia saber que Ramona daria um jeito de me acompanhar. Os anjos que nos viam passar como o vento por cima de suas cabeças pulavam e seguravam a mão livre de Ramona, então a arremessavam com toda a força para frente passando ao próximo que fazia o mesmo e o anjo seguinte também fazia o mesmo. Ela os estava usando como estilingue para dar impulso e poder me acompanhar. A filha da mãe era muito inteligente.

Esticamos o fio de fogo e entre eles fomos partindo ao meio os drones que eram arremessados para cima pelos bolsões de ar. Passamos tão rápido por eles, que o chicote parecia estar cortando manteiga de tão fácil.

CLANG! CLANG! CLANG!

Um a um eles foram cortados ao meio, suas carcaças afundando na água e desaparecendo no fundo do oceano. Os anjos começaram a dar um grito de vitória conforme íamos passando por cima deles, apenas dois raios de tão rápidas. Demorou até que já não houvesse mais drones para destruir. Abri minhas asas, elas deram um solavanco como um paraquedas.

- Uou! – Ramona passou direto, não conseguiu parar. Então afundou na água com um alto som de TSSS, o mesmo som que algo quente faz ao encostar na água. Ela veio a superfície, então ergueu um polegar pra mim, cuspindo água, sinalizando que estava bem.

Me virei para o campo de batalha. Meu estômago revirou ao ver os drones que destruímos começarem a surgir e se remontar, exatamente igual ao terceiro robô gigante que ainda jorrava seu fogo na corrente Oeste.

- Merda. – grunhi, furiosa. Alguns anjos se aproximaram de nós, os rostos pálidos. Um deles era Josva. Todo nosso exército exausto se colocou ombro a ombro, os olhos arregalados diante da ameaça do exército dourado se remontando aos poucos.

- Como é que vamos parar essas coisas? Talvez seu raio...

- Não posso. Isso eletrocutaria cada um dos anjos sob a água. – respondi, ofegante.

- É impressão minha ou esse frio está piorando? – disse Ramona, batendo os dentes com o frio.

- Sim, está pior. Não vamos conseguir ficar sob a água por muito tempo. – disse Josva. – Vou mandar mais uma onda de morteiros em cima do gigante. Talvez artilharia pesada dessa vez.

- Faça isso. – eu disse. Ela tocou um ponto eletrônico em sua orelha e começou a bravejar ordens, provavelmente para o comando no alto em Asferia.

- Talvez se nos afastássemos dos anjos pudéssemos usar o raio.

- Ramona, dá pra sentir daqui o seu poder se esvaindo. Assim como o de todos. Eles não vão conseguir se sustentar nesse frio por muito tempo. O gelo está os drenando aos poucos, logo menos já não terão forças para lutar.

- Temos de fazer algo! – grunhiu ela, então se abraçou. Suas roupas estavam encharcadas.

- Você precisa voltar. Vai morrer de hipotermia.

- Eu posso continuar. – ela quase decepou a própria língua ao tentar falar. Coloquei a mão em seu ombro.

- Volte para o acampamento, descanse. Vou ver o que posso fazer aqui, mas se não houver solução mandarei todos recuarem. – aquela decisão pareceu ainda mais pesada depois que eu disse em voz alta.

Ramona olhou pra mim, estava preocupada. Fiz sinal para ela de que ficaria bem. Seus olhos se estreitaram levemente, então ela concordou.

- Não morra.

- Você também.

- Vou ver como está a outra frente de batalha. Mando notícias. – disse ela. Tocou meu ombro e eu toquei o dela, então partiu.

Voltei minha atenção para a batalha, assoviei alto. As duas figuras se formaram ao meu lado, Agonia estava com uma cabeça de drone na boca e Pânico mastigava um braço. Toquei o pescoço de ambos.

- Muito bem, meninos. Agora preciso que afastem os drones dos anjos. Agrupem-nos em um só lugar.

Eu não tinha ideia se podiam me entender, mas entenderam o bastante para começarem a empurrar os drones e deixar os anjos confusos. Como dois raios negros eles mordiam e empurravam os drones para longe, formavam um círculo ao redor deles. Estiquei o chicote e comecei a andar em direção a eles lentamente, deixei o fogo se espalhar pelo chicote, fazia o mesmo som de TSSS ao se arrastar pela água atrás de mim. Eu estava para lançar neles quando a água ao meu redor explodiu.

BUM!

Protegi meu rosto contra a água que me chicoteava. Vi por cima do meu braço o maldito robô gigante, apenas metade dele, pois ainda estava se recompondo. Ele apontou um grande buraco luminoso em sua mão para mim, estava prestes a me incinerar.

CRACK! TRKK!

Sons de gelo rachando.

ZUING!

Uma estalagmite do tamanho de um poste surgiu entre os meus pés. Foi tão rápido que só percebi o que estava acontecendo muitos minutos depois que a estalagmite empalou o braço do gigante e o desviou para o alto. Então, algo girou no ar por cima de mim e vi o brilho de uma espada negra cortando o braço do tamanho de um túnel de trem.

CLANG!

O braço afundou no oceano. O robô com seu único olho de luz que piscava como se estivesse nas últimas, olhou para a figura misteriosa agachada na água a minha frente, eu também olhei. A figura começou a se erguer lentamente. Era alto, estava todo de preto, até mesmo sua armadura, os cabelos brancos curtos esvoaçavam com o vento ártico, da espada preta como o Universo escorria óleo negro pegajoso.

Ele fechou uma mão subitamente. A estalagmite cresceu e empalou a cabeça do gigante, começando pelo queixo e subindo mais até quase arranca-la. Minha respiração estava parada na garganta. O olho do robô piscou algumas vezes, então ele se apagou de vez. O guerreiro virou-se, os olhos azuis brilharam pra mim e um meio sorriso se arrastou por seu rosto.

- Olá, anjo. – nem mesmo o vento se atrevia a roubar sua voz grave.

- Vincent. – ofeguei. Ele estendeu uma mão pra mim, eu nem tinha percebido que tinha caído. Sua mão era absurdamente quente na minha. Eu queria muitas coisas, perguntar muitas coisas, dizer muitas coisas. – Onde está Sam?

- Ele está em uma pequena missão agora. – disse ele, estreitando os olhos levemente. Soltou minha mão, seus olhos azuis se voltaram para a batalha que acontecia. Alguns anjos pararam para olhar e arregalaram os olhos ao verem Vincent.

- Você precisa dar o fora daqui. Agora. – eu disse, empurrando o peito de Vincent ao ver os anjos convergirem para ele. Comecei a suar frio.

- Não, são vocês quem precisam dar o fora. – disse ele, juntando as sobrancelhas.

- Vincent, você não entende. Os anjos estão caçando você. Você precisa ir embora! – eu disse, o desespero tingindo minha voz. Me coloquei entre ele e os outros anjos.

Vimos os anjos formarem uma bolha ao nosso redor, os olhos iam de mim para ele, então se fixaram em Vincent. Estavam loucos para pega-lo. Ergui a mão.

- Ele não é o que vocês pensam. – eu disse, tentando argumentar.

- Emily, saia da frente. – disse Dalisay, se juntando a eles. Seus olhos furiosos nele.

- Ele não é um assassino. Os demoníacos não o enviaram.

- Saia. Da. Frente. – grunhiu ela, apontando uma arma pra mim. Apontei minha lança crepitando eletricidade. Ela fez uma expressão triste. – Não me faça fazer isso.

- Que perca de tempo. – suspirou Vincent.

Do nada, ele tirou uma lança estranha de suas costas e a bateu na superfície da água. Foi aí que...

BUUM!

A rajada de vento ártico levantou tanta neve e água que fui obrigada a usar minhas mãos em brasa para afastar o frio. Senti meus lábios racharem, meus dentes começaram a bater, só depois que o vento parou foi que consegui abrir meus olhos. Toda a superfície do oceano estava congelada. As pernas dos nefilins estavam cobertas de gelo até os joelhos, eles lutavam para se mexer. Olhei para Vincent, nem um único fio de cabelo fora do lugar.

Os anjos não foram os únicos atingidos, as maquinas também tinham sido e se debatiam em cima de uma placa de gelo maciça. Toda a superfície do oceano num raio de setecentos metros havia se vitrificado em gelo, os drones pareciam peixes desesperados se debatendo no chão e tentando voltar para a agua.

- O que eles estão fazendo? – arfei, olhando para os drones se debatendo no gelo.

- São drones elementais. Se alimentam de energia retirada da natureza, formados das teias da Weaver e soltos no mundo umbral para proteger as criações da Aranha. Eles escolhem um elemento e permanecem nele. Mas, se saírem...morrem. Estes escolheram a água, o gelo não permite que eles a toquem, mas não vou segura-los por muito tempo. – seus olhos azuis brilharam um pouco mais, era quase inumano. A mão de Vincent ganhou um brilho branco, como se uma luz meio fosca corresse por suas veias. – Estou reservando energia para o que virá.

- Do que está falando? – perguntei, meus olhos ainda fixos no brilho branco em suas veias. Vincent estava diferente. O que diabos tinha acontecido com ele?

- Não vale a pena lutar por esta corrente. Ela já está condenada. Asferia precisa de vocês em outro lugar.

- E como um assassino, psicopata, sadista saberia do que a Cidade dos Anjos precisa? Você me enoja! – Josva cuspiu para o lado, lutando para retirar seus pés de dentro do gelo. Vincent lhe deu um olhar frio, logo veio seu meio sorriso ainda mais gelado.

- Eu sou a única chance de sobrevivência da sua espécie, penugem. O que está vindo para você não é nada do que qualquer um já tenha enfrentado antes. Acha que sou eu quem está criando todo esse gelo? – perguntou Vincent, o tom grave hipnótico. Vincent andou até ela e fiquei tensa quando ele parou bem diante dela. Ele era bem mais alto, se inclinou para baixo para que seu rosto e o dela ficassem a centímetros. Josva perdeu a cor, sua aura escureceu tanto que seu medo me sufocou. – Existe uma coisa tão antiga quanto o seu povo, uma criatura tão poderosa quanto o seu Deus. Uma força da natureza indomável que poderia criar outros mundos se quisesse, mas sua humildade e compaixão o fizera pensar que ele é um ser menor, o que o reduziu a um simples guardião. Seu coração carrega o renome infinito do inverno. Ele está a quilômetros daqui, mesmo a essa distância sua aura consegue congelar o seu sangue quente ainda nas veias. Você consegue sentir no ar, não é? Eu tenho certeza que quando você o vir, vai estar tão congelada que nem vai conseguir se mijar de medo.

Engoli em seco com o tom de ameaça de Vincent. Sua aura estava estranha, não era uma aura que eu pudesse interpretar e isso congelou meu sangue. Ele tinha mudado. Antes eu podia sentir sua fúria, seu medo, suas emoções, eu podia lê-las em sua aura. Só que agora não havia...nada. Havia padrões que eu não podia ler, eram confusos e mudavam para cores que eu nunca tinha visto.

Vincent fez um gesto com a mão brilhando em branco e o gelo nos pés dos nefilins começou a derreter aos poucos.

- Os demoníacos conseguiram apagar a mente de um Ba Gua e colocar uma ilusão lá. Como conseguiram tal feito, eu não faço ideia. Mas, o dragão está vindo pra cá, está cego e seu faro está em vocês. – ele se aproximou de um angelical ferido. O anjo ganiu quando Vincent se aproximou e tocou a ferida dele. Ele a fechou com gelo, fez o mesmo na ferida no meu tornozelo e costelas, então se afastou e colocou sua espada em cima do ombro. Seus olhos azuis focaram em mim.

- O que é um Ba Gua? – perguntei, ajudando Josva a se levantar. Ela tremia levemente, seus olhos selvagens estavam em Vincent. Na verdade todos os anjos o encaravam, mas ninguém se atreveu a atacar. Pelas suas auras eu percebi que estavam mais interessados no que ele dizia. Por quanto tempo? Eu não fazia ideia.

- Um dragão de gelo milenar. É um dos dois guardiões restantes da entrada de Shangri La, o paraíso para as almas mais puras.

- Asferia é o paraíso das almas. – retorquiu Dalisay, apertando a mão em sua espada.

- Das almas que vocês acham dignas de salvar. Vocês anjos se acham tão importantes com suas aureolas, suas asas brancas e sua santidade. Mas, chegará um tempo que nem o herói mais puro de vocês poderá salva-los da perdição. A única forma de entender as trevas é fazendo as pazes com ela. Vocês a combatem incessantemente sem nunca obter uma vitória. – grunhiu Vincent.

- Os anjos são feitos da luz. Não é da nossa natureza compactuar com as trevas. Deixamos isso para demônios como você. – disse um dos anjos. Vincent gargalhou alto. Seu riso não era divertido, era irritado, amargo e cheio de desdém. Eu já tinha ouvido esse riso antes, já tinha sentido a crueldade no som de sua voz como eu ouvia agora.

- Não perca seu tempo comigo. Seu povo precisa de você. De todos vocês. – Vincent bateu a lança na água e um caminho de gelo se fez por todo o oceano com sons de trincado, o vento ártico aumentou. O caminho de gelo seguia para o Leste. – O pilar Leste está sendo atacado por forças que vocês podem combater. Não usem seus elementos, os robôs se alimentam de energia espiritual e vocês a exalam a exaustão. A presença deles enfraquece vocês, mas há algo que eles não suportam e é ter de lutar com marionetes.

- Nossos trolls. – ofeguei. Podíamos invocar trolls de pedra. Eles não carregavam nossa essência, eram feitos da energia natural e não espiritual.

- Exato. Mantenham a luta no chão, isso os obrigará a terem de manter uma formação e será mais fácil ataca-los. Nós ajudaremos.

- Nós?

Vincent deslizou seus olhos para a costa, para a praia. Olhei ao mesmo tempo em que todos os nefilins e ofeguei. Mesmo com a névoa ártica e a neve caindo, suas formas eram completamente visíveis. Havia centenas de Crinos cinzentos e brancos nos olhando da margem, alguns anjos estavam entre eles e de longe deu pra ver suas expressões de surpresa e assombro. Provavelmente mais do que nós. Olhei para Vincent, ele abriu um pequeno meio sorriso.

- Os Presas Brancas se juntarão a vocês.

Ninguém disse nada, talvez porque já não houvesse nada pra dizer ou porque não dava para pensar em palavras. Depois de todo aquele desespero, a cada momento aparecendo hordas e mais hordas de demônios metalizados, de repente a esperança se fazia presente. Eu queria pular de felicidade, mas me contive e olhei para Vincent com gratidão. Ele revirou os olhos pra mim.

- O que seria de você sem mim. – zombou ele. Engoli o nó de felicidade e apontei a minha lança pra ele de brincadeira.

- É melhor torcer pra eu não querer descobrir. – ele abriu um pouco mais seu sorriso, só que o mesmo calor não chegou aos seus olhos e isso me preocupou. Dalisay se aproximou, com ela veio Josva e mais outros dois anjos.

- E o outro drone? Ele vai derreter a corrente. – perguntou um dos anjos, todos olharam para o gigante ainda ocupado em lançar fogo na corrente.

- Vocês não vão conseguir chegar até ele. Aquela coisa se alimenta da água, por isso pode se remontar e a aura dele está ficando mais forte. Logo sugará todo o poder espiritual ao redor para aumentar seu poder e destruir a corrente Oeste. Ela já está condenada, mas a corrente Leste e Sul ainda podem ser salvas. E é pra lá que devemos ir.

- Você confia nele? – perguntou Josva, olhando de mim para Vincent.

- De olhos fechados. – eu disse, meus olhos ainda em Vincent.

- Espero que a gente não morra, Griggori. Mas, se acontecer eu vou sussurrar no seu ouvido até você se matar. Avante, legião! – berrou ela.

Os anjos ergueram suas armas e bradaram um grito de batalha, alçaram voo um a um, todos se dirigindo para a costa. Dalisay e Josva ficaram, talvez por não confiarem em Vincent perto de mim. Mesmo com elas ali, eu não pude conter a pergunta.

- Você...você está desligado? – sussurrei. A expressão de Vincent foi estranha. Era uma mistura de pesar, com raiva e dor. Mesmo vendo as emoções em seu rosto eu não conseguia mais ler sua aura.

- Eu não consigo...eu... – ele lutou com as palavras, parecia engasgado e torturado. Ele estendeu a mão pra mim e eu a peguei. Ele levou minha mão até seu peito e fiquei surpresa por seu coração estar tão acelerado, fechou os olhos por um instante e quando voltou a abri-los seu rosto estava composto, sério. – Eu prometo responder sua pergunta ainda hoje. Mas, no momento temos uma batalha pra vencer e não há tempo. Temos que ir.

Suspirei e assenti pra ele. Aquela evasiva já respondia tudo. Vincent sabia sobre o que havia feito com os angelicais, sabia que tinha sido usado como marionete para acabar conosco. E como regra geral, ele não soube lidar com suas emoções, então era óbvio que escolhera se desligar. Isso explicava porque ele parecia tão frio quando se afastou levemente e começou a correr por cima da água congelada. Eu o segui do alto, sem conseguir manter meus olhos longe dele. Dalisay e Josva voaram ao meu lado.

- Eu aceito você ter ressuscitado dos mortos para nos salvar. Mas, ele? Não sei, Emily. E se for uma armadilha? – perguntou ela.

- Ele parece possuído pra você? – perguntei, erguendo as sobrancelhas. Ela franziu as dela.

- Não, mas...

- Então confie em mim. Vincent não é o vilão.

Pelo menos não do jeito como vocês pensam. Rezei para que ninguém tivesse captado esse pensamento.

A horda de lobisomens do ártico nos seguiu por terra. Eram grandes, tinham armaduras prateadas e brancas, armas grandes e perigosas. Tínhamos uma legião de anjos voando e uma legião de lobos correndo e foi assim que chegamos até a corrente Leste. Como um. Eu podia sentir a desconfiança no ar, a insegurança, a raiva, a suspeita. Eu não podia pedir aos angelicais para engolirem essa pílula amarga, mas podia pedir a eles que a mantivessem na boca o tempo mais longo possível. Pois essa pílula podia ser a nossa única chance de salvação.

Estava feio quando chegamos a corrente Leste. As hordas demoníacas metalizadas mandavam grandes maquinas com armamentos para nos atacar de longe, as menores lutavam corpo a corpo com nossos anjos por toda a colina devastada de lama e sangue, os angelicais chapinhavam nela, guerreavam a exaustão, suas expressão me diziam que eles sabiam que não iam aguentar por muito tempo. Dava pra sentir aquelas maquinas sugando o ar espiritual a volta deles e os enfraquecendo. Era tão sutil que não fiquei surpresa por eu não ter notado antes. Vincent tinha sentidos muito aguçados.

Vi a expressão dos angelicais passar de derrota para a surpresa ao ver um exército de lobisomens vindo até eles como uma linha de frente cheia de presas e garras gigantes. Eles não sabiam se miravam nos drones ou nos lobos. Mas, começaram a perceber que aquela nuvem enorme no céu não era nuvem nenhuma, era uma legião inteira de angelicais se aproximando. Mesmo de muito longe, deu pra ouvir o grito de alivio deles, dava para ver nas auras brilhando em um caleidoscópio cheio de cores lindas.

A esperança era o que predominava e eu descobri que essa era a melhor sensação do mundo. Ser a fonte de esperança de alguém e nunca deixar essa fonte secar. Pois, não importa se o mundo paga em dólares por cada boa ação, o que importa é que você pode devolver em euros. O mundo te dá um chute, você não devolve com um tapa. Você retribui fazendo o melhor que pode com o que tem, mostrando a tudo e a todos que a cada chute levado você fica mais forte. Sempre existe uma oportunidade de ser melhor do que fomos ontem e do que seremos amanhã.

Seguindo essa linha de pensamento, eu me esqueci de tudo, me esqueci da minha própria dor, das minhas incertezas, da perda. Esqueci dos meus problemas e de tudo o que a acompanhava. O que eu tinha era a única coisa que interessava, e o que importava era que eu podia defender o meu lar e o meu povo, pois era minha obrigação fazer porque eu tinha poder pra fazer.

Os lobos chegaram primeiro, Vincent os liderou explodindo em sua forma enorme. Ele era o único lobo negro, então era impossível não vê-lo lá do alto. Foi uma porrada e tanto quando as maquinas surpresas se juntaram ombro a ombro para deter o exército de lobisomens que se aproximava de um jeito feroz. Vincent e os lobos puxaram ar e então...sopraram.

FUUUUU!!!

A rajada ártica foi espetacular e congelou toda a primeira fileira de monstros de metal, que caíram feito pedra. Então os mais leves que se protegiam atrás deles saíram voando a centenas de metros para trás, se espatifando com o vento que mais lembrava um furacão.

- Puta merda. – disse Josva, voando ao meu lado, os olhos se arregalando. – Que pulmões!

BAM! TTBANG!! CLANG!!

Virou uma bagunça de drones empilhados uns nos outros e tentando se prender ao que quer que fosse com a força dos pulmões dos lobisomens, então os lobos pararam e caíram em cima. E como eu disse, foi uma porrada e tanto, mesmo a distância conseguimos ouvir o baque dos lobos contra o metal congelado. Alguns drones se espatifaram como vidro diante de tantas presas e garras. Comemoramos do alto, já estávamos bem perto agora, sobrevoávamos por cima das cabeças dos angelicais cansados que também comemoravam.

- Aqueles são drones da terra. – eu disse, percebendo como os drones tentavam inutilmente rasgar o gelo no chão para abrir um buraco na terra.

- Eles não conseguem penetrar a terra. Está congelado demais. A tsunami que vocês mandaram encharcou a terra, tinha os deixado fracos. Mas, esse gelo todo vai acabar com eles de vez. Esse cara é esperto. – disse Josva, balançando a cabeça.

- Não vai sobrar nenhum se continuarmos assim. – concordou Dalisay.

- Formação em cinco! – ordenei, pegando minha lança.

Os anjos se colocaram em vários grupos de formação em V enquanto descíamos em alta velocidade. Íamos fazer três frentes de batalha e obriga-los a se estreitar, assim o número deles não ia importar se fosse maior do que o nosso e nós acabaríamos com eles.

- O terreno do vale não permite uma formação esparsa ou ombro a ombro como eles costumam fazer. Terão de se espalhar, vai ficar mais fácil pegá-los se não puderem formar duplas, coisa que eles também tem feito. A vegetação alta ao redor dos rochedos vai permitir um ataque maior, as arvores oferecem proteção contra ataques vindos do alto, então usem-nas para ataques a longa distância. Usem o que tivermos. Invoquem a maior horda de trolls de pedra que puderem. Vão! – separei dois grupos e mandei cada um para um lado com Dalisay e Josva. O terceiro foi com um novato que eu não conhecia, mas era de confiança de Dalisay e o quarto e quinto grupo ficou comigo.

Ao nos espalharmos, formamos nossa frente de batalha em V e atacamos do alto com chicotes, lanças, armas de fogo, espadas, lanças. Dávamos rasantes por cima dos drones que se separavam da formação e os destruíamos no ar. Os lobisomens pareceram entender nossa estratégia e nos ajudaram a afunilar os drones e obriga-los a formação em estreito. Descemos para a terra e invocamos o maior número de trolls de pedra que pudemos. Um exército de pedra steampunk contra um exército de metal dourado cyberpunk.

Foi a batalha mais épica dos anjos, totalmente coordenados com os lobisomens, nós os vencemos de dois para um. Equilibrado, eu admito, mas ainda assim uma ótima vitória. Olivia me encontrou no meio da batalha, seus olhos cheios de lágrimas, provavelmente por ver que havia esperança para nós e lutou ao meu lado. Erguemos juntas um troll de pedra diretamente dos rochedos e coordenamos uma linha de atiradores de pedregulhos gigantes. Ateei fogo em algumas pedras, o gigante segurando-a na mão sem problema algum.

- FOGO! – berrei.

FIIIIIIIIIIIU...BUM!!!!

A pedra caiu bem no meio dos drones e se espatifou em estilhaços ao redor deles, os lobisomens não tiveram problemas em se desviar dos estilhaços, o que fiquei grata. Subi em um troll de pedra e carreguei minha arma enquanto ele corria pelo meio do exército dourado descendo a todo momento seus punhos de pedra e esmagando drones dourados a todo instante. Comecei a atirar, a arma parecia leve na minha mão. Eu não podia chegar muito perto já que eles se alimentavam da nossa aura espiritual, subir no troll de sete metros me deu uma boa vantagem.

Ordenei a Dalisay e Josva para que mandassem suas forças derrubarem as maquinas enormes que ateavam bombas em nós, muitas delas de gás venenoso. Os elementais da terra abriram uma cratera gigante, a rachadura do tamanho de uma casa se abriu de um modo que dava pra ver a lava lá embaixo no precipício. Fiz soar um terremoto que tremeu os rochedos onde as maquinas estavam e causei uma avalanche. As maquinas enormes rolaram lá de cima trazendo pedras enormes, muito gelo e algumas arvores. Voamos para sair do caminho e ver do alto as maquinas rolarem para dentro da fenda gigantesca, cair para dentro do precipício e ganhar caminho até a lava a quilômetros abaixo.

Foi uma batalha dura e nunca nos exigiu tanto em termos de poder sobrenatural. Não dava para usar nossos dons espirituais, mas usamos a energia natural ao redor para causar o maior estrago que pudemos nas hordas demoníacas. Diminuímos drasticamente os números deles até que o dia se tornou uma noite gelada e cruel, ainda cheio de maquinas para destruir. No meio disso encontrei um mecanismo escondido na minha lança. Era um pequeno emblema em alto relevo que brilhava em laranja. Uma roda dentada com duas asas de anjo e uma espada no meio. Era o símbolo do exército de Asferia. Aquilo não estava ali antes. Apertei o símbolo e com um clic a lança se partiu em duas. Agora eu tinha duas espadas que se juntasse os cabos formariam a lança primordial. Fletch devia saber que eu precisaria dela assim. Eu ia me lembrar de agradecer.

Desamarrei a tira de couro que havia nela e a prendi em ambas as extremidades. Girei-as com toda a força e formaram um vulto preto e prateado extremamente perigoso. Corri por um desfiladeiro e pulei de lá, eu estava perto do chão quando, de repente, um lobo negro gigante apareceu e quando vi eu já estava montada nele. Pareceu até combinado. Girei a tira amarrada com as espadas, ambas formando uma hélice afiada que cortava tudo em seu caminho enquanto Vincent corria por todo o campo demoníaco. O que iluminava a noite eram os robôs explodindo e queimando como fogueiras em centenas de pontos diferentes.

Vincent pulou de uma pedra grande e voei de cima dele para ficar em cima de um troll de pedra gigante exagerado. Juntei as duas espadas e elas formaram de novo a minha lança de pega curta. Olhei ao redor, sabendo muito bem de quem era aquele exagero.

- Yuhuuu! A dona da noite chegou! Quem quer traseiro de metal mal passado?

Quase dei risada em ver Ramona montada em um outro troll e girando uma carcaça de metal parecida com uma bunda cheia de pregos afiados e pegando fogo. Ramona deve ter tirado de um dos robôs mortos. Ela girou aquela coisa como uma estrela-da-manhã medieval gigante. Ela gargalhava alto toda vez que sua maça improvisada girava e levantava para o alto dezenas de robôs desavisados.

- Emily, vá para o monte vermelho! – disse ela, apontando para a direita.

Olhei para lá e vi algumas figuras paradas lá em cima. Pulei de cima do troll e voei para onde ela havia apontado. De longe pude ver mais claramente as figuras exaustas de Olivia, Dalisay, Josva e as caras novas de Sasha, Phil, Luke, Pietro e mais alguns outros. Aterrissei lá, feliz por ver Pietro vivo e bem.

- Pietro. – ele me abraçou e então olhou bem pra mim.

- Puxa, como você mudou. Não parece a menina medrosa de antes que não parava de fazer perguntas. – disse ele, quase saudosamente. Revirei meus olhos para ele, então percebi que ele ainda tinha suas duas asas. Ele reparou que eu estava olhando. – É, também fiquei surpreso. Acho que isso tem a ver com o estranho.

- Vincent. – eu disse. Ele fez que sim.

- Contei a eles que ele estava tentando ajudar quando também foi capturado. Os anjos agora sabem sobre ele.

- Obrigado, Pietro. – respondi, abrindo um leve sorriso.

- Não agradeça ainda, ruivinha. Eles entendem que seu amigo veio para ajudar, mas colocar no coração deles que ele não é uma ameaça depois da segunda maior queda coletiva de anjos da história ter sido causada por ele...Isso eu não pude fazer. Eu sinto muito, mas se eu fosse você o manteria bem longe do acampamento angelical.

Suspirei, eu não podia exigir nada. Não estava em posição para isso. Olivia se aproximou junto com Luke e Phil.

- Mandamos as tropas de Dalisay e Josva recuarem, você também deve recuar. – disse Luke, a pele negra brilhando na escuridão. Seus olhos azuis fluorescentes eram os mais vivos. Ele devia ser um descendente de Querubim ou Trono.

- Mas, ainda não vencemos.

- Emily, toda a sua tropa já recuou, apenas você ficou para trás. E olhe pra si mesma. Está só o farrapo. – Luke ergueu uma sobrancelha. Olhei pra mim mesma, eu realmente estava arruinada e suja. Me sentia exausta, mas não dava pra parar. – Nós revezamos aqui. Os lobisomens vieram em número o bastante para nos permitir respirar um pouco. Já não estamos mais em grande desvantagem e vocês conseguiram recuperar o controle do Leste, logo menos nós o teremos sob nosso poder.

- Soubemos que o Sul também está conseguindo recuperar suas forças. Sam trouxe outros homens-fera para ajudar e os anjos por lá conseguiram tempo para respirar. Asferia está segura por enquanto. – respondeu Phil.

- Ainda existe um drone na corrente Oeste. Ele vai derreter aquela corrente em algumas horas. Talvez menos. – avisei. Todos suspiraram, foi Olivia quem respondeu.

- Não podemos mais tentar defende-la. Aquele drone está na água, seu amigo disse que ele se alimenta daquele elemento e vai continuar se remontando toda vez que o destruirmos. A cada ataque nosso ele aumenta sua força. Temo que a corrente Oeste seja mesmo um caso perdido.

- O que faremos? – perguntou Dalisay. Usei minha lança para fazer um desenho na lama, um mapa improvisado.

- Estamos defendendo todo o lado esquerdo da corrente Leste. Conseguimos mantê-los abaixo do vale, então uma parede defensiva é difícil para eles. Talvez eles tentem nos fazer mudar de lugar, provavelmente aqui onde os ventos são mais fortes e não podemos voar. Tem muita terra nesse lado, é o elemento que eles precisam para recuperar as forças. – eu disse, marcando com um X a nossa formação. – Os lobisomens de Vincent podem manter uma guarnição aqui e aqui, assim não teremos que nos esforçar tanto para nos defendermos. O esforço dos drones e o gelo vai acabar matando-os pra nós.

- Bom plano. – elogiou Luke. Os outros concordaram. Josva se inclinou e também começou a riscar no meu mapa.

- Posso manter duas frentes no lado direito e o lado externo da corrente.

- Isso vai impedir que batedores passem por nós. Boa ideia. – eu disse, aprovando. – O que houve com o restante de nós?

- Alguns descansando no acampamento, outros por aqui mesmo na floresta ou sendo atendidos pelos cantos. Algumas criaturas da floresta se ofereceram para ajudar nos ferimentos, embora digam que não vão se envolver em batalha. – disse Phil.

- É o máximo que podemos pedir deles. Essa guerra é somente nossa. – eu disse. Todos concordaram. Luke colocou a mão no meu ombro.

- Vá descansar, nós assumimos o turno por aqui. Vocês assumem pela manhã. Vamos nos revezando até que isso termine. Estamos mantendo contato com qualquer anjo que tenha premonições durante a vigília, então se você vir alguma coisa importante enquanto estiver inconsciente é melhor reportar a Gabriel.

- Gabriel? Ele ainda está aqui? – eu disse, minha voz soando alta.

- Está coordenando o QG no acampamento. Por que? – perguntou Luke, fazendo uma cara estranha. Encontrei com os olhos de Olivia e vi o alerta neles. Os anjos ainda não sabiam o que tinha acontecido no penhasco. Agora não era o momento de eles saberem ou perderiam totalmente a confiança uns nos outros. Uma rixa dentro da moral angelical já ferida seria péssimo no momento. Minha justiça ia ter que esperar.

- Por nada. Os lobisomens também vão recuar? – me perguntei porque Vincent não estava ali para participar daquela reunião. Ele também era um líder, certo?

- Alguns já fizeram isso, estão nos ajudando com os feridos em alguns pontos na floresta. São uma gente bem peculiar. – disse Luke, dando um meio sorriso. – O líder deles partiu faz uma hora, talvez menos.

- Ele partiu? – ofeguei. Luke juntou as sobrancelhas.

- Sim. Havia algo importante que eles deveriam fazer, talvez vão chamar mais reforços.

Vincent tinha ido embora? É claro. Ainda devia estar puto comigo por eu ter fugido para a umbra. Uma das coisas mais irritantes nele era o seu rancor. Ele o guardava como ninguém em uma memória de mil terabytes. A atitude fria dele comigo era por causa disso. Lembrei-me de suas palavras que ainda me cortavam fundo desde que lembrei delas. De repente ficou difícil respirar, mas contive minhas emoções. Eu estava com raiva, eu preferia ficar com raiva do que ter que lidar com a dor. Ele era um covarde, não teve nem mesmo a decência de gritar na minha cara o que estava pensando. Como se fossemos apenas dois estranhos, como se tudo o que temos passado tivesse significado nada pra ele. Lobo idiota.

- Você está bem? – perguntou Luke, preocupado.

- Sim. Só estou cansada. Acho melhor eu descansar um pouco, eu volto assim que eu estiver melhor.

- É melhor mesmo. – disse Dalisay. Minha cara devia estar tão verde de raiva que parecia que eu estava passando mal.

Desci a colina com Olivia vindo logo ao meu lado. Ela não disse nada, talvez estivesse tão cansada quanto eu ou só percebesse que a última coisa que eu queria era papear. Mas, eu devia saber que seu silencio nada tinha a ver com a minha irritação evidente e sim por seu cérebro estar mais a frente do que o meu, como sempre. Ela esperou até que tivéssemos alçado voo para dizer o que estava pensando.

- Emily, talvez fosse melhor você não ir para ao acampamento.

- Por causa de Gabriel. Você acha que vou perder o controle.

- Eu tenho certeza de que você vai perder o controle. Ele disse pra todo mundo que você estava morta e de repente você aparece viva. Preferiram achar que você é um milagre ambulante do que pensar que ele é um mentiroso. Eu não sei qual é a intenção de Gabriel com isso, mas tenho certeza que tem algo a ver com Maurice, os dois andam muito juntos ultimamente.

- Os dois estavam lá quando eu fui praticamente obrigada a me jogar do penhasco. Gabriel não estava fora de controle como todos os outros angelicais, Olivia. Seus olhos não eram alaranjados. Eu vi, pude ver dentro de seus olhos que ele realmente não se importava que se tratava de um inocente ou não. Ele sabia que Vincent estava possuído pelos demoníacos, só que ele não ligou. Gabriel estava determinado a mata-lo.

- Uma coisa que só me ocorreu a pouco tempo é que Gabriel tem o dom telecinético mais forte de Asferia. Nós já o vimos levantar as pedras do Paredão sem nem mesmo suar. Se ele quisesse, poderia ter evitado a sua queda e a do seu amigo, poderia tê-los puxado usando a telecinese. – disse ela, maquinando. Então balançou a cabeça com se quisesse afastar um pensamento. – Eu não sei. Não gosto de pensar nele dessa forma.

- Talvez seja exatamente assim que devemos pensar nele, Olivia. Eu não sei o que aconteceu com Gabriel e nem o porquê de ele ter agido como agiu, mas tenho certeza de que há uma explicação e eu vou descobrir qual é. Isso vai além de perder uma asa.

- Nós vamos descobrir. Sou uma oradora e membro sênior do conselho angelical, é minha obrigação descobrir qualquer tipo de transgressão às regras e se Gabriel tem quebrado as regras angelicais, mesmo em tempos de guerra ele será punido. – disse ela, o rosto severo.

Não dissemos mais nada enquanto nos aproximávamos da corrente Norte e o acampamento se aproximou. Olivia se despediu antes de descer numa espiral até o mar de tendas lá embaixo. Já que eu não ia ficar no acampamento, então iria para onde ninguém me conhecia. Voei até a aldeia Norte, estava quase vazia exceto pelos Griggori mantendo sua vigília de gigantes e fazendo mais armas, mandando suprimentos para o acampamento do outro lado do vale.

Foi fácil encontrar a casa, mesmo que estivesse no meio da noite. Não havia luz da lua ou estrelas para iluminar o caminho pra mim. Tudo parecia escuro de novo, indefinido, escondido na penumbra como um monstro prestes a me devorar, o que iluminava um pouco eram as forjas dos Griggori e os sons reverberantes de seus martelos que pareciam ecoar por toda a cordilheira branca.

Pousei a poucos metros da casa e achei a chave debaixo do carpete. Quando entrei tudo estava escuro e em silencio. A arquitetura interior era completamente de madeira, lembrava muito uma cabana ou um chalé perdido em algum vale esquecido no Canadá ou Alasca. Era lindo. Mantive a iluminação média no interruptor de regulagem e subi para o meu quarto no segundo andar. Era um alivio estranho entrar lá, mesmo sabendo que não era o meu quarto no duplex. Se eu não olhasse pela janela dava para fingir por um instante que eu estava em casa e que havia uma pilha de relatórios para eu preencher, atrasada como sempre.

Se eu não reparasse no som baixo das marteladas nas forjas, dava pra pensar que eu estava em casa. Fui tomar um banho quente, os tremores no meu corpo pararam depois de vários minutos. Examinei os cortes e hematomas arroxeados. Usei meu dom da cura para poder sara-los mais depressa, só que eu preferia reservar minhas forças para amanhã de manhã. Coloquei uma roupa leve, mas não um pijama já que a qualquer momento eu poderia receber um chamado repentino e caí na cama macia. Fechei meus olhos e respirei fundo, chamei pela inconsciência. Me perguntei o que ela revelaria dessa vez.

Anjos não precisam dormir, mas fazem por um habito que ensinamos aos humanos. Porque a energia da criação ainda presente no universo costuma conversar conosco através de códigos que nossos cérebros interpretam em imagens confusas e cheias de significados. Os humanos chamam de sonhos, nós chamamos de presságios ou premonições. Nefilins não sonham.

Senti a energia da criação me puxando para baixo e enchendo minha mente de imagens. Dormi tão profundamente quanto um defunto, até que uma batida no vidro da minha janela me acordou e fez meu coração ir parar na boca. A luz fraca do dia entrava pela minha janela, eu podia ouvir o vento ártico assoviar do lado de fora. Ouvi outra batida baixa.

Fui até a janela sob lentos passos, se fosse Sam eu ia joga-lo lá do alto por me acordar. Fiquei paralisada ao ver o rosto do outro lado do vidro. Dessa vez eu realmente tive de olhar para fora para ter certeza de que eu não tinha voltado para casa, para o tempo em que ele costumava aparecer exatamente assim na minha janela.

Seus olhos azuis estavam cálidos no brilho nublado da manhã, sua expressão era um misto de tristeza e preocupação. Estava limpo, provavelmente tinha tomado banho em algum lugar. Deslizei para cima lentamente o vidro do janelão, um vento super gelado entrando e fazendo minha pele arrepiar. A respiração de Vincent estava tão rápida como a minha, seus olhos perdidos nos meus. Demorou um tempão para que ele quebrasse o silencio.

- Não. Eu não estou desligado.

Eu não sei bem o que me fez ter certeza de que ele não estava mentindo sobre isso. Não sei se foi a dor em sua expressão ou em sua voz, sua presença ali ou por ter se lembrado de cumprir a promessa, mesmo que aquela tenha sido uma noite e tanto. Quando eu achei que ele não diria mais nada, continuou com a mesma voz grave e baixa, seu sotaque era carregado por causa do nervosismo.

- Eu estou completamente quebrado por dentro. Em pedaços. O que eu fiz foi imperdoável. – ele fechou os olhos, o rosto em agonia. – As coisas horríveis que eu disse a você, as coisas que eu deveria ter dito, mas não disse. O que eu deveria ter feito, mas não fiz. Isso eu nunca vou perdoar. Eu fiquei tão focado em te dar uma chance para um futuro que acabei me esquecendo do seu presente. Acabei me esquecendo que você tem uma vida aparte a minha e que as vezes o mundo nos obriga a percorrer linhas separadas só para se encontrar de algum jeito no final. Fiquei tão focado em manter você comigo que me esqueci o quanto era importante você crescer sozinha. Fui eu quem a deixou vulnerável, fui eu quem tornou possível cada ataque de Asrael e por minha causa você perdeu praticamente todos que ama e por causa disso eu vou me odiar pelo resto da existência.

Ele ficou de pé no parapeito, colocou ambas as mãos nos batentes do lado de fora da janela, o rosto a uns trinta centímetros do meu. Seus olhos perfuravam os meus com a mesma força magnética da lua, movendo as marés.

- Nunca pense que o que vivemos não foi importante, Emily. Sua presença na minha vida contou cada respiração que dei. Você importou pra mim mais do que mil vidas passadas repletas de ouro e glória. E vai continuar a importar por toda a eternidade. Eu amo você, anjo. Isso nunca vai mudar, mesmo que você me chute daqui até lá embaixo. Mesmo que você me odeie por tudo o que te causei. – a voz era apenas um sussurro agora. – Morto ou vivo, eu estarei aqui por você.

Uma lembrança veio a minha mente. Nós dois na frente do Naughty Dog na noite em que eu fugi com o arqueiro. Ele tinha dito aquelas mesmas palavras pra mim. E realmente, não tinha importado pra ele que eu tivesse fugido com o arqueiro e feito tudo o que ele me disse pra não fazer. Mesmo tendo odiado minha decisão, Vincent não foi embora da Umbra como eu havia pensado, ele ficou. Ficou por mim. Correu o risco de ser morto por várias criaturas diferentes simplesmente porque acreditava que eu podia ser melhor e ele estava certo. Eu me tornei mais forte.

Duas Emilys brigavam dentro do mim. Aquela que queria muito beija-lo agora e a outra que queria mesmo chuta-lo lá de cima. Qual delas eu iria ouvir?



 



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