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História Loup Garou: Herege - Bastets


Escrita por: InvisibleWriter

Capítulo 68 - Bastets


Fanfic / Fanfiction Loup Garou: Herege - Bastets

 

 

Mesmo que fosse o significado da destruição de Asferia, mesmo que naquele instante ele não passasse de um representante lendário da morte, ele era a coisa mais linda e terrível que alguém poderia ver. Portava toda a sua majestade, e eu não acharia indigno lhe dar uma coroa. Ele voava lentamente, o rugido de estrondo começando a sumir.

Olhei para Emily, os lábios voltaram a ficar azuis. As lentes de seus óculos goggles haviam congelado, assim como os pelos de seu casaco e algumas de suas penas.

- Como vamos vencer algo assim? Não podemos. Acabou. – disse ela, os olhos cheios de lágrimas. Limpei a lágrima antes que ela percorresse seu rosto. Peguei seu rosto gélido entre minhas mãos, esperando que isso a mantivesse aquecida.

- Você precisa ser forte agora. Vamos vencer, com um custo muito alto, mas iremos. Ele está indo para a corrente Leste, precisamos detê-lo antes de chegar até ela e acho que sei como, mas eu preciso de você. Emily, vamos. Só podemos fazer isso juntos.

- Você tem razão. – ela pigarreou, balançou a cabeça e se forçou a se firmar. De novo, eu a assisti obter o controle sob si mesma. Mesmo como humana ela costumava fazer exatamente isso. Endireitar os ombros, erguer o queixo e travar a mandíbula, aquilo era familiar pra mim e foi bom ver que isso não se perdeu. Ela se virou para a turba de anjos ainda petrificados, seus olhos determinados. – Todos treinamos pra isso. Todos nós enfrentamos e perdemos muito, resistimos até aqui e não é agora que vamos falhar. Vocês fizeram um juramento de proteger Asferia, agora cumpram-nos todos!

Os anjos começaram a voltar pouco a pouco, a determinação vindo aos seus olhos, embora ainda parecessem temerosos e eu não os culpava. Um Ba Gua não era uma força que eu iria querer enfrentar, pois tratava-se basicamente de um deus. E deuses só morrem com armas especificas. Se nem mesmo as flechas negras conseguiram transpassar as escamas de Aurora, então como eu faria para derrotar um Ba Gua em pleno poder e loucura invernal? Eu sabia como e sabia o quanto me custaria fazer isso. Só que não havia jeito de eu deixar Asferia ser destruída.

Os anjos voaram junto com as corujas e corvos, nós percorremos a distância correndo em nossas formas mais fortes, cada par de olhos seguindo a serpente branca no céu. Era de arrepiar. O poder dele enfraquecia os anjos, alguns não conseguiram voar e apelaram para nos acompanhar em uma corrida. Seguimos por dentro da mata fechada, seguindo os sons de nossos próprios corações desesperados. Emily estava montada em mim, os dedos segurando com firmeza os meus pelos, ela tremia bastante. No céu, um fogo de artificio subiu e explodiu no formato de duas asas prateadas em holograma que foi sumindo aos poucos como um sinalizador.

- É o exército do Leste. Eles precisam de nós. – disse Emily, os dentes batendo com o frio.

Use seu fogo interno para se aquecer. Demônios conseguem aumentar sua temperatura corporal.

- Eu mal tenho forças pra pensar em qualquer outra coisa agora. Eu vou ficar bem. – disse ela, teimosa. Revirei meus olhos.

Fomos pegos de surpresa por um barranco de rochas e neve. Todos caímos rolando e fiz o meu melhor para não perder Emily naquela bagunça de corpos rolando por cima de corpos. Lá de baixo no vale dava pra ver o outro exército angelical olhando pra nós embasbacados. Aquela foi a pior entrada triunfal da história. Só paramos depois de quase causar uma avalanche.

- Ouch. – reclamou Emily, cuspindo neve. Me ergui e sacudi meus pelos, grunhindo no fundo do peito. Voltei a forma humana.

- Emily!

Uma loura platinada alta surgiu, tinha aparência de uma valquíria, talvez fosse norueguesa ou irlandesa. Seus olhos azuis me encararam por um instante antes de se desviarem para Emily.

- Algum plano de como derrubar aquela coisa? – perguntou ela. Emily fez uma careta.

- Não faço ideia, Josva.

- Mas, tem alguém que faz. – eu disse, dando um meio sorriso. Elas olharam pra mim e eu apontei para os formatos estranhos rasgando as nuvens bem mais a frente, em rota de colisão com o Ba Gua.

- O que é aquilo? – perguntou Ramona, ela apertou os olhos, eles mudaram de cor para o alaranjado. – São...cascos de navio?

Ouvimos o som de canhões no alto e clarões amarelados nas nuvens. Um raio roxo brilhou entre elas, assistimos chocados dezenas de linhas se formarem nas nuvens e seguirem em direção ao Ba Gua. Seja lá o que fosse, conseguiu atingi-lo de frente com um tremendo estrondo e o Ba Gua rugiu nos céus. Senti o tremor na terra, era muito baixo, uma vibração extremamente sutil...mas, estava lá. Olhei para Asynjor, ela estava agachada com a mão na terra e trocou olhares comigo. Senti o sangue fugir do meu rosto.

- EM FORMAÇÃO! – berrei, pegando minha espada e ficando ombro a ombro com os guerreiros Anunai. Alguns anjos pularam com o meu grito e nos olharam estupefatos.

- O que? O que? – Ramona segurou seu machado, os olhos para todos os lados.

- Embaixo da terra... – respondeu Emily, de olhos fechados. Ela ficou assim por um instante, o rosto sério como o de uma estátua perfeita de um anjo esquecido no tempo. Abriu os olhos de repente, azuis sob pretos daquele jeito perigoso. – Estão vindo para nós.

- Formação de batalha! Rápido! Rápido! – berrou Olivia. Duas angelicais vieram para o lado delas na correria enquanto assumiam suas posições.

- O que está vindo? – perguntou uma delas, sua aparência gritava oriental. Mesmo sob vestes pesadas dava pra ver que ela usava um sari por baixo, uma joia fora colada bem no meio de sua testa e a maquiagem congelada me disse de onde era, sem falar na pele morena belíssima. Uma indiana. Parecia que eu estava olhando para uma das pinturas hindus de Parvati ou Krishna. Se eu ficasse mais tempo na presença angelical acabaria criando um complexo.

 Emily não tirou os olhos da terra, inclinou a cabeça para o lado com uma expressão de curiosidade.

- Eu não sei, Dalisay. Mas, está faminto. Está se escondendo de nós.

- Faça-os sair. – eu disse, dando um meio sorriso pra ela.

Ela andou ao meu lado quando fomos para a linha de frente dos angelicais e os ultrapassamos. Ramona veio conosco junto com Olivia e as outras duas. Eu e Emily sentimos na terra, estava próximo, mas hesitava. Ficamos ali por um tempo que me pareceu enorme, o silêncio teria sido assustador se não fosse pela respiração do exército atrás de nós e os sons dos canhões no alto.

Uma olhada rápida pra cima me disse o que estava acontecendo. Os navios estranhos circulavam ao redor do Ba Gua e lançavam ganchos brilhantes em verde. Eles tentavam prendê-lo e enrola-la. Aposto que eram encantados de algum modo, pois fez efeito contra a fera. Conseguiram enrola-lo, os navios lançavam chamas nele para impedi-lo de soltar qualquer rajada de gelo. As bolas de canhão explodiam no ar e jogavam redes enormes em cima do dragão colossal. Isso iria atrasa-los.

Voltei minha atenção para o perigo em terra e o tremor misterioso embaixo dela.

- Me empreste um instante. – disse Emily, estendendo a mão para o machado de Ramona. A angelical a olhou de forma estranha antes de lhe dar o machado gigante.

- Coloquem seus arqueiros angelicais em posição. – eu disse para Olivia. Ela assentiu e passou para trás das linhas de angelicais tensos e armados.

Emily não pareceu ter dificuldade de segurar aquela coisa. Ela ergueu o machado, de repente eletricidade começou a crepitar dele e demos vários passos para trás a medida que raios azuis e brancos estalavam como se ela empunhasse o martelo de Thor. De súbito, com um grunhido de esforço máximo, Emily arremeteu o machado contra o chão.

ZZZZZZANG!!!!!!!!!!!

Você já deve ter visto uma granada de luz, não é? Ou talvez, alguém acendesse uma luz forte nos seus olhos logo depois que você acorda. Essa foi a sensação e foi exatamente assim que pareceu. Primeiro veio o clarão como o de uma estrela branca, então o calor e logo a onda de choque. Finquei minha espada no chão para impedir o vento forte de me jogar para trás e protegi meus olhos com a mão livre, então tive de segurar a espada com ainda mais força por causa do terremoto que se seguiu. Através dos meus dedos vi rachaduras gigantes se formarem e tragarem para dentro a neve. Parecia um bando de enraizados, zapeando por toda a terra e abrindo crateras de luz e calor.

As rachaduras continuaram a se estender a frente, abrindo-se como um leque e formando seus padrões iluminados. Ouvimos batidas na terra, algo tentando irromper por ela. Foi aí que começou a confusão.

BUM!

Criaturas de metal dourado irromperam do chão, enormes como um tanque de guerra. Eram longos como serpentes, tinham pinças e dezenas de pés. Através do espaço entre sua couraça dava pra ver as engrenagens furiosas girando, os olhos iluminados e amarelos nos fitavam e as bocarras cheias de dentes enferrujados de metal se abriram para soltar seus rugidos de protesto a medida que os raios de Emily ainda os atingia. A visão daquelas coisas fez com que o exército angelical inteiro desse vários passos para trás.

- Lagostas? Sério? – ofegou Ramona, pegando seu machado da mão de Emily. Ela também invocou seu poder de relâmpago, embora não crepitasse com tanta força quanto os raios de Emily.

- Ksoi finir! (arqueiros prontos!). – falei em nórdico.

- Läarc ir firnir toish ksoi. Proit marc ard. (Läarc está pronto com os arqueiros. Esperam sua ordem.) – respondeu Gard, o anunai ao meu lado. Olhei por cima do ombro e atrás de todo o exército angelical eu vi as centenas de vikings na linha das arvores com arcos enormes de ponta de gelo.

- Se eu fosse vocês abaixaria a cabeça. – eu disse para Olivia, erguendo uma sobrancelha. Ela olhou para trás, confusa, então deu um berro para que o exército angelical se abaixassem.

ZUM! ZUM! ZUM!

Os anunai soltaram suas flechas e elas passaram raspando pela cabeça dos angelicais assustados, zunindo na direção dos centípedes dourados que corriam até nós como lagostas de metal furiosas, batendo as pinças e as bocarras abertas jorrando óleo e fogo. Prometiam destruição e muitas mortes, principalmente com aquelas caudas cheias de espinhos.

Boa parte delas fora fritada por Emily, outra parte fora destruída pelas nossas flechas, só que mais surgiam das rachaduras no chão e, cara, elas simplesmente se multiplicavam sem parar. Rugi alto junto com os outros anunai e corremos de encontro a elas, impacientes pela hora do embate. Os anjos nos deixaram ir na frente, provavelmente achando que iriamos apanhar feio. Não podiam estar mais enganados.

Dobramos nosso tamanho com grossas camadas de gelo e nos tornamos gigantes de até seis metros, levei meu punho para trás e o esmaguei de encontro a um centípede que saltara na minha direção. Eu o peguei pela cauda afiada e comecei a usá-lo como chicote em cima de seus amigos centípedes. Ouvi o som das asas coriáceas e um rugido forte antes de ver a dragão branco mergulhando do céu e jorrando fogo em cima dos pernudos. Não surtiu efeito, eles continuaram a tentar nos atacar.

Os anjos deram seu melhor. Usaram todos os elementos que possuíam, trolls gigantes de pedra saltavam das rochas e surgiam da terra, prontos para lutar com suas mãos enormes. Os angelicais se esforçaram em seus elementos, Emily lançava seu chicote de fogo e rajadas de raios poderosos que abria caminho pela multidão de robôs assassinos.

Os lobos rasgavam o que estivesse em seu caminho, a dragão jorrava fogo para todos os lados. Ela pousou perto de Emily, esmagando centípedes com aquele peso e cuspindo mais chamas ao redor, rugindo em sua fúria e poder. Juntei forças com os Anunai, combatemos os inimigos usando nossas formas gigantes de gelo. Foi então que eu percebi que eles estavam nos fazendo entrar em campo aberto, saindo de perto das margens da floresta. Não devia ser bom sinal.

Aí vai uma dica: Toda força de ataque possui o seu líder, o cérebro, aquele que coordena toda a parada. E aquelas lagostas metalizadas não eram exceção a regra.

Cortei uma dúzia deles com uma estalagmite de gelo antes de prestar atenção que a terra tremia de novo. De início achei que fosse por nossa causa, só que a terra remexia num ritmo conhecido. Não demorou muito para que a resposta viesse antes que eu pudesse pensar na pergunta.

Uma rajada de vento ártico trouxe consigo um cheiro estranho de podridão, putrefação e morte. Também havia um cheiro distinto que eu conhecia muito bem. Cera de vela? Maresia?

- EM FRENTE, SEUS CÃES! SERÁ QUE ALGUMA COISA VOCÊS CONSEGUEM FAZER DIREITO?! – berrou uma voz grave com um sotaque estranho.

De repente, explodindo das margens da floresta e saindo desembestados, estavam o que pareciam fantasmas. Eram dezenas deles, caíram matando em cima das máquinas confusas e não sei quem se assustou mais: Centípedes ou Anjos.

Liderando o grupo e montado em um cavalo de ossos estava o que parecia ser um pirata. Estou falando de um cara com um longo chapéu com pluma, barba negra com algumas tranças ornadas com contas de prata, cabelos longos e escuros, pele morena por causa do excesso de sol e olhos ferozes, assim como sua voz de trovão e os berros que percorriam toda a colina.

- FAÇAM UM ENSOPADO COM ESSAS LAGOSTAS, FANTASMAS INUTEIS!! – berrava ele, apontando para as máquinas com seu espadim escuro.

De cima da linha das árvores, surgiu um navio-dirigível gigante, algo girava nos dois lados e começou a fazer um som bastante discernível.

- RECUEM! – berrei, apontando para trás.

TA-TA-TA-TA-TA-TA-TA!!

Todos correram para a mesma direção enquanto o navio abria fogo com suas metralhadoras, eu e os Anunai impedimos que as maquinas seguissem para o mesmo caminho que os anjos quando levantamos uma parede de gelo grossa. Bati no chão e o risquei com a ponta da minha espada negra. Uma linha de gelo seguiu e do chão começaram a explodir estalagmites de gelo bem grandes, as pontas afiadas empalando as maquinas que não conseguiam desviar com rapidez o bastante, pois estavam muito confusas. Se corressem para nós, elas morriam em combate corporal. Se fugissem, as estalagmites de gelo os pegariam antes, sem falar nos fantasmas que corriam feito loucos para pega-los. Não estavam armados, quer dizer não exatamente.

Um vulto preto esmagou uma máquina atrás de mim e me virei, pronto para lutar. Era apenas Emily, as asas enormes abertas e a lança empalando a cabeça de uma das lagostas. Ela virou os olhos azuis fluorescentes pra mim, parecia brava.

- Como é que você não viu essa coisa se esgueirar atrás de você? Ficou louco de se distrair? – disse ela, raivosa.

Eu não estava prestando atenção. Uma vertigem estranha tinha me pegado e de repente não era o rosto dela que eu estava vendo. Eu estava vendo uma cena diferente. Senti meus joelhos fraquejarem, Emily me amparou, o rosto saindo da raiva para o medo ao olhar pra mim. A voz dela estava alta, eu sabia disso, só que estava tão distante que não dava pra ouvir.

 

O dia se torna noite, o inverno piora e congela até o coração embebido em chamas dos dragões. O ar para, a respiração morre na garganta. “CLANG”! É o único som discernível, é o único aviso de que tudo está perdido. Lágrimas marcam o dia, gritos de batalha transcendem a noite, as chamas queimam as nuvens...

Há gritaria, pessoas correndo por cima dos corpos dos mortos, pisoteando-os em seu desespero. Um rugido ecoa na escuridão. Ele está vindo, ele está vindo, brada uma voz. O tremor faz com que as pernas se enfraqueçam, as construções caem.

Os fantasmas são o sinal. O inimigo sem a esquerda. O inimigo sem a esquerda. Derrube o inimigo sem a esquerda.

 

- VINCENT!

A voz de Asynjor me trouxe de volta. Assustado, olhei ao redor. Emily e ela tinham me puxado para próximo das árvores, as duas com as expressões vincadas de preocupação, até mesmo os olhos de Emily tinham voltado ao verde claro. Ela colocou a mão no meu peito, seus olhos se arregalaram pra mim.

- Acalme-se, Vincent. Seu coração vai parar se você não se acalmar. – disse ela, puxando uma respiração mais profunda, me instigando a fazer o mesmo. Tentei fazer, só que o ar não entrava nos meus pulmões como deveria. Ela pediu que eu fizesse de novo e dessa vez me obriguei a manter a mente no lugar. Não era hora pra ficar louco. Ainda mais louco. – Melhor?

Fiz que sim para ela e tentei me levantar. As duas me ajudaram, Asynjor me deu a espada. Um dos Anunai veio para o nosso lado, me olhando com preocupação. Era Gard.

- O que você viu? – perguntou ele.

- A nossa resposta. – eu disse, balançando a cabeça.

- O que está acontecendo, Vincent? – perguntou Emily, os lábios se juntando teimosamente.

- Uma visão. Depois explico o como e por que elas acontecem, mas agora não temos tempo. Foque as forças angelicais para mais dentro do leste, próximo a corrente. Precisamos ir até lá, agora. – eu disse, a urgência na minha voz.

- Com todo esse exército no nosso caminho será impossível! – disse ela, olhando para a destruição ainda acontecendo. – Mesmo com o exército de fantasmas de Batroc.

De repente, entre a bagunça da batalha eu vi. Lá estava. Eu o vi passando entre os outros centípedes com uma pressa suspeita, pegando pedaços deles aqui e ali, unindo as carcaças em seus corpos. Ele só tinha a pinça direita e ao invés de ser afiada como as outras, ela mais parecia um daqueles imãs industriais, pois tudo o que era metal era puxado para sua mão. Apenas a pinça direita, já que a esquerda havia sido arrancada.

Os fantasmas são o sinal. Derrube o inimigo sem a esquerda.

- A segunda corrente foi comprometida. Evacue todos. – sussurrei. Então me virei para o trio incrédulo – AGORA!!

A lagosta lutava para passar entre os corpos furiosos de seus companheiros. Ele tentava correr na direção contrária, parecia a beira do desespero enquanto coletava a maior quantidade de sucata destruída que podia, mas ele só pegava partes especificas.

Seus núcleos de energia. O desgraçado ia fazer uma bomba atômica.

- Vincent, espere! – berrou Emily, atrás de mim.

Não esperei, continuei a correr na direção do mar de monstros de metal furiosos. Não me importei que fosse suicídio, não liguei que eu fosse morrer antes de conseguir pegar a lagosta fujona, também não me importei que Gungnir não fosse me obedecer já que ela pertencia a Odin. Eu tinha que destruir aquela lagosta.

Uma lagosta tentou me empalar com suas pinças. Escorrei por baixo dela, passei minha espada por sua barriga, a espada abrindo facilmente suas entranhas e fazendo chover óleo quente e peças em mim. Já levantei enquanto ela caía com seu peso no gelo. Cortei as pinças de uma outra que as bateu na minha frente, acertei meu cotovelo em sua cara, dei um passo para o lado enquanto o bicho desorientado tentou me empalar com sua cauda espinhosa como um escorpião. Agarrei sua cauda quando ele a puxou do chão e fui arremessado para frente como num estilingue.

Voei por cima das cabeças dos angelicais, aterrissei nas costas de outra lagosta, aproveitei para fincar minha espada em suas costas, rolei por cima dela e voltei a correr. Deslizei por baixo das máquinas, cortei outras que se impuseram no meu caminho, desviei de angelicais e lobisomens, do fogo do dragão. Meus olhos estavam fixos nele, na lagosta covardona ainda juntando os núcleos de energia que ia arrancando dos corpos mortos de seus companheiros.

Derrapei na terra ao sentir o movimento com o canto do olho e levantei meu queixo quando duas caudas espinhosas passaram raspando pela minha cara e se bateram no ar bem diante dos meus olhos. Rebati a da direita com a minha espada.

CLANG!

Seu metal contra a minha espada fez faíscas alaranjadas saltarem. Rolei para o lado para escapar do golpe da segunda, que rebateu sua cauda no chão e suas pinças na direção da minha barriga, pulei para trás. Cortei para baixo, sua pinça caiu no chão e a lagosta berrou um som metálico de dor enquanto jorrava óleo de seu ferimento. A segunda convergiu pra mim com sua cauda uma última vez. Eu não tinha tempo a perder.

Num giro escapei de sua cauda outra vez e das pinças da segunda lagosta furiosa e ferida. Peguei Gungnir nas minhas costas. Com a minha espada empalei a cabeça da primeira lagosta e com Gungnir praticamente arranquei a cabeça da segunda. Elas pararam de se mover, tirei minhas armas de dentro delas rapidamente e voltei a minha rota, só que dessa vez usei o corpo dela como trampolim e comecei a pular de lagosta em lagosta. Isso as distraía, olhavam para cima apenas por um instante fatal antes de serem mortas por seus inimigos. Aparentemente a curiosidade não era defeito apenas dos lobos. Se bem que se alguém estivesse pisando em mim eu também iria querer saber quem é.

Pisei numa grandalhona e pulei o mais alto que pude quando vi que não conseguiria atingir meu objetivo. Segurando Gungnir com os dedos apertados, estiquei todo o meu corpo e impus a maior força que eu podia no arremesso. Rezei aos deuses para que desse certo enquanto eu caía e via a lança voar na direção da lagosta. Ela tinha um assovio estranho, ia aumentando como um grito de águia.

Me vi correndo em câmera lenta enquanto a lança percorria o ar até seu alvo de costas. A lagosta devorava desesperada os núcleos de energia, fumaça saía dela de um jeito nada saudável e sua barriga começava a inchar. Gungnir a pegou pelas costas e ela saiu rolando na terra com um rugido. Apoiei meu pé na pinça de um centípede que tentou me cortar ao meio, ele a tinha fincado no chão ao invés de em mim. Assim que consegui o trampolim perfeito, acertei meu joelho com força em sua cara feiosa. Quebrei praticamente todos os seus dentes nojentos. Fiquei tão furioso por ele estar me atrasando que não tive escrúpulos quanto ao que fiz.

O peguei pela cauda e comecei a gira-lo e rebate-lo contra as outras lagostas que pareciam convergir todas pra mim. Eu cortei, esmaguei, mutilei, destruí tudo o que se aproximava na minha fúria cega, rosnando alto em alerta. Joguei a cauda dela na direção das outras, era tão pesada que rebateu em dois centípedes e acabou jogando-os pra longe também.

Invoquei meus dons do gelo, a terra se cobrindo e fazendo surgir estacas de gelo afiadíssimas, destruindo tudo o que havia a frente. Quando meu caminho pareceu limpo, voltei a correr, meus olhos na lagosta fujona que se arrastava inutilmente, cuspindo óleo, sua barriga ainda inchando. Sob o comando de Emily, os anjos jorravam uma chuva de flechas em cima da lagosta. Ela não parou. Os Anunai mandaram mais gelo e a dragão mandou fogo, a lagosta continuava a tentar fugir.

Com um grito de batalha dei um mortal por cima de uma lagosta, cortando sua cara no processo e rolando por cima dela. Pulei de suas costas, minha espada apontada para as costas da senhorita fujona. Pouco antes de minha espada lhe dar o golpe de misericórdia, de sua boca explodiu uma bola imensa e laranja de poder, que voou como um meteoro na direção dos navios no céu que impediam o avanço do Ba Gua. Consegui matá-la, mas foi tarde demais.

A bola de fogo iluminou o céu, fazendo caminho como um cometa da morte e daí...

KABLOOOM!!!!

Observamos impotentes a bola de fogo destruir os navios no céu e consequentemente as correntes de magia que prendiam o Ba Gua e o detinham de avançar. O monstro rugiu no céu, se libertou das correntes com um chacoalhar e abriu a bocarra para cuspir gelo nos navios que batiam em retirada, assim como também para jorrar gelo na corrente Leste perto demais.

- MEUS NAVIOS!! SUAS CARCAÇAS DE MERDA, RUFIÕES! EU VOU FRITAR CADA UM DE VOCÊS! ARGH! – o pirata perdeu a linha, desceu de seu cavalo fantasma e se transformou num enorme leão cinzento, atacando os centípedes com fúria.

O gelo do Ba Gua cobriu o metal ancestral da corrente Leste e os sons de trincados foram altos demais, assustadores demais. Os anjos começaram a cair um a um, como consequência as lagostas restantes os massacravam facilmente. Me virei e fiz o que pude para impedir a chacina. Uivei para o alto, chamando por Sam. Felizmente o uivo de resposta não estava longe. Ele deve ter visto a bola de fogo no céu como um sinalizador para nossa localização.

Das árvores, centenas de homens gato irromperam, saindo bestos das sombras e digladiando as lagostas restantes. Sam estava com eles em sua forma crinos marrom-chocolate. Ele uivou pra mim, o som alegre, mas meu uivo de resposta veio repleto de agonia.

Lobisomens e homens-gato, fantasmas e anjos, todos trabalharam juntos na derrota contra o exército de centípedes. Uma vitória amarga enquanto a corrente Leste era destruída, uma vitória cheia de dor pelos corpos dos mortos empilhados no chão como um tapete macabro que ninguém queria ver. Os anjos pareciam mais fantasmas do que anjos, todos pálidos, todos com lábios azuis e tremendo de frio, os olhos a todo momento indo para a corrente prestes a se romper.

Encontrei Emily no meio deles, lutando com dois centípedes. Dava pra ver que estava ali apenas em corpo, sua alma e pensamento estavam muito longe. Foi o seu erro, pois uma das coisas atingiu seu braço direito com a cauda afiada e a empalou. Ela estava tão aérea que nem pareceu sentir, apenas dividiu sua lança curta em suas e cortou a ponta afiada de seu ombro.

Caí matando em cima da segunda lagosta, rolando com ela pela terra fincando minha espada nela. Não morreu de primeira, me ofereceu algum desafio. Emily e eu ficamos de costas um para o outro, ambos lutando cada um com um centípede. Cortei para o lado a pinça do centípede, então desviei de sua cauda. Vi o brilho azul em tempo de pular para o lado e deixar Emily pulverizar os dois com seus raios poderosos. Eles estalaram no ar, na direção dos dois. Joguei minha espada no ar, bem no meio de um dos raios e ela seguiu com velocidade bem no meio da cara de um dos centípedes.

Os dois caíram, inertes e vertendo fumaça. Ofegante, olhei para Emily. Os lábios azuis se batiam, o corpo inteiro tremia. Ela se apoiou em uma árvore e deslizou até a terra, lágrimas caindo de seus olhos. A árvore ficou com o rastro de seu sangue.

- Merda. – grunhi, indo até ela. – ASYNJOR!

Asynjor surgiu do nada junto com outros dois Anunai e Sam. O lobo voltou a forma humana com roupas pesadas para o inverno rigoroso e se agachou diante de Emily, a expressão tão assustada como a minha ao ver Emily cada vez mais perdendo a cor, se tornando tão pálida como eu. Ela agarrou meus antebraços, os olhos vazios e a respiração difícil.

- Calma, anjo. Vai ficar tudo bem. – eu disse, tentando acalma-la, mas louco de preocupação.

- Use a água das raízes do vale de Dáinn. – disse Asynjor, me estendendo um cantil.

- Vai funcionar nela? – perguntei.

- É mística, Vincent. Mas, esteja avisado, este é o seu último recurso. Não haverá mais para trazê-lo de volta. Usamos praticamente tudo em você durante o tempo com Gungnir, se usar nela e algo acontecer...bem, você sabe. – disse Asynjor, a voz baixa.

Aquela era a água com seiva que os cervos haviam dado a ela e que me ajudaria em algum momento. Essa era a mesma água que me trouxe de volta dos mortos depois de ser empalado por Gungnir para ter as visões. Se Emily a bebesse agora, não haveria mais nada para salvar ninguém depois.

Nem pensei duas vezes. Arranquei o pedaço de metal alojado e fiz um torniquete no braço de Emily, ela gemeu baixo de dor.

- Aperte firme, Sam. Ela não pode perder mais sangue do que isso. – eu disse.

- C-certo. – disse ele, apertando o braço de Emily.

- Beba. Isso vai ajudar. – levei o cantil até os lábios de Emily e despejei o liquido em sua boca. Ela bebeu avidamente, então teve um acesso de tosse e tive de segura-la e força-la a beber tudo.

Sua respiração ficou ofegante por um instante. Demorou alguns instantes para que ela recuperasse alguma cor, o azul sumiu aos poucos de seus lábios e um leve corado veio a suas bochechas. Ela fechou os olhos e recostou a cabeça na árvore. Então, os abriu e olhou confusa para o braço que Sam segurava. Ela levou a mão até a faixa suja de sangue e a removeu. Emily ofegou ao ver a ferida cicatrizando até se tornar uma linha rosada. Seus olhos arregalados pararam nos meus.

- Era a água de Asferia? – perguntou, chocada. Fiz que não.

- Orvalho e seiva de Yggdrasil. São místicos. Consegue se levantar? – perguntei, ajudando-a. Apoiou suas mãos geladas nas minhas e eu a ajudei a se erguer.

Olhamos para a destruição. Corpos de amigos e inimigos estava jogados fazendo caminho por todo o vale, a dragão ainda jorrava fogo para terminar de matar as máquinas que se debatiam no chão. A maioria havia batido em retirada ao ver o pequeno contingente de Bastets que Sam trouxe. Bati em seu ombro.

- Essa foi rápida.

- Não me agradeça. Batroc é que conseguiu ajuda a tempo, mesmo assim os gatos só vão se envolver até aqui. Não irão se aprofundar numa rixa que não é deles. – disse ele, fazendo uma expressão triste.

- Todos já recuaram. Vincent, a corrente Leste foi atingida. O gelo do dragão irá consumi-la, ele está rumando...

- Para o sul. E é pra lá onde devemos ir. – respondi para Asynjor. Olhei para Emily, seus olhos fixos na corrente se destruindo aos poucos. Chamei por ela, seus olhos se desviaram lentamente da corrente. – Força, Emy. Ainda podemos vencer isso.

- Como sabia que aquela coisa ia destruir os barcos e libertar o dragão? – perguntou ela, do nada.

- É uma longa história, mas vamos resumir dizendo que posso ter visões do que aconteceu, do que pode acontecer e do que acontecerá. Não são definidas e muitas vezes eu não posso interpretar. Outras vezes eu interpreto tarde demais.

- Ninguém culpa você, Vince. Precisamos parar isso. Asferia não vai resistir com apenas duas correntes. Isso tem que acabar agora. Tem que acabar já! – disse ela, trincando os dentes e apertando sua mão ao redor da lança curta.

- Reúna seu exército, voe para a corrente Sul. Vocês chegarão lá primeiro do que nós. Eu, Sam e o capitão vamos parar o Ba Gua.

- O QUÊ?! ENFRENTAR O DRAGÃO DE GELO?! – ganiu Sam, os olhos arregalados. – Até onde eu saiba a versão Jack Frost do Chris Evans é você, parceiro!

- Não podemos perder tempo! Vamos pegar aquele barco. – apontei para o navio-dirigível que havia atirado em nós. Assoviei para o leão cinzento ainda ocupado massacrando alguns centípedes sobreviventes. Ele olhou para mim e eu o chamei com um gesto.

O leão bufou, massacrou outros antes que ele e mais alguns gatos viessem a nós. Ele se metamorfoseou em pirata, a expressão de deboche dele pra mim se desfez ao notar o sangue no braço de Emily.

- Milady, seu braço! – ofegou ele, segurando o braço dela. Emily olhou pra ele.

- Estou bem. É bom vê-lo de novo, capitão Batroc. – ela lhe deu um pequeno sorriso, os olhos ainda nadando em preocupação. Por baixo da pele morena vi ele corar pra ela.

- Eu esperava que nos víssemos em circunstâncias mais favoráveis. – ele tirou o chapéu e fez uma mesura para ela. – Mas, ainda assim é sempre um prazer reencontra-la. Continua tão bela quanto minha parca memória se lembra.

Grunhi no fundo do peito, meus olhos mudando de cor espontaneamente. Eu não tinha tempo pra minha possessividade idiota, só que lá estava, fervendo no meu sangue. Isso trouxe a atenção de todos pra mim. Emily ofegou ao olhar pra mim.

- Vincent, seu olhos...

Sim, vermelhos ou invés do prata. Me coloquei lentamente entre Emily e o pirata. Rosnei para ele, mostrando os meus olhos escarlate e minhas presas. Batroc fez o mesmo, embora parecesse confuso com a minha reação.

- Se já terminou o seu flerte, temos coisas mais importantes pra resolver aqui. – grunhi, minha voz saindo o dual do alfa.

E ela é minha. Cai. Fora.

Ficamos nos encarando por um tempo, Sam interveio entre nós.

- Batroc, precisamos do seu navio.

- É o ultimo que restou, toda a frota caiu por causa daquela galinha escamosa. – grunhiu ele, voltando seus olhos de gato pra Sam.

- Preciso que dê aos anjos as suas correntes encantadas e todo o armamento e suporte que puder prover. – eu disse. Batroc voltou os olhos raivosos pra mim.

- Garous. Sempre se sentindo os líderes, os “alfas”, esbravejando ordens com a mesma paixão que um bêbado tem ao se afogar em um barril de cerveja. Loucos, irresponsáveis, sedentos por destruição. É por isso que Gaia abandonou vocês na sua luta contra a escuridão. Enquanto os outros filhos dela acumulam conhecimentos, vocês acumulam cadáveres.

- Essa é a beleza da situação. Vocês usam o tempo que tem para lamber as bolas dela enquanto nós sacrificamos nossa honra para mantê-la viva. Quem de nós tem feito um trabalho melhor, bichano? – grunhi. Balancei a cabeça. – Não temos tempo pra isso. Vai ajudar ou não?

Ele resmungou algo aos seus gatos e eles riram alto. Então ele virou a cara enojada pra mim.

- Por eles. E não por você.

- É só o que eu precisava saber. Vamos.

- Vincent! – uma mão impediu a minha de partir. Emily tinha os olhos determinados ao invés do medo de antes. – Tome cuidado, tomba-lata. Não faça nada louco.

- Todos os meus planos são loucos, anjo. Não posso prometer nada.

Eu estava para me virar e ir, mas uma vontade estranha me impediu, algo que eu não conseguia explicar muito bem. Era uma mistura de dor e desespero e raiva. Sem pensar puxei a mão de Emily de modo que ela foi pega de surpresa ao dar um passo até mim, me inclinei para baixo e dei um beijo nada delicado nos lábios frios dela, meus dedos se trançando em seus cabelos longos e macios. Só a soltei quando ela estava com dificuldade para respirar. Beijei sua testa e olhei para Asynjor.

- Ajude-a aqui com os Anunai.

- Vincent, só use aquela cartada se for sua única opção de parar o ataque do Ba Gua. Entendeu? – ela disse, a voz cheia de autoridade. Ela se virou para Emily. – Temos que ir. Não há mais nem um segundo a perder.

Emily e eu corremos juntos, então nossas mãos deslizaram uma para longe da outra. Cada um com um caminho diferente, com objetivos iguais, embora os destinos não fossem os mesmos. Mas, do fundo do coração eu sabia, que não importa pra que direção nós corrêssemos, sempre acabávamos no mesmo lugar.

E isso era bom e ruim. De algum modo.


 



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