Os três pares de olhos estavam voltados para a criaturinha que havia se sobressaltado e corrido para se esconder entre os contêineres de lixo. Foi tudo tão rápido que não haviam identificado do que se tratava, pelo tamanho poderia facilmente ser um gato adulto ou um filhote de cachorro.
Emma, desceu os degraus da escadinha que levava ao quintal e caminhou lentamente até onde estavam empilhadas as latas de lixo. Utilizava a lanterna para guiar seu caminho, mas tomava cuidado para não assustar ainda mais o pobre animal. Quando chegou próximo ao local, iluminou-o rapidamente, só para encarar um par de olhos brilhantes e arregalados de medo. A medida que se aproximava das latas de lixo, mais o bichinho se encolhia e tremia.
— Ei, amiguinho… — a loira falou suavemente — Não precisa ter medo, não vou te fazer mal.
O animal não fez nenhum gesto de aproximação, pelo contrário, se escondeu ainda mais entre as sombras.
— Vamos, rapazinho, só quero te ajudar.
— Tente atrai-lo com isso aqui. — Emma ergueu a cabeça e percebeu que a morena se posicionava ao seu lado, lhe estendendo um pacotinho de ração para cachorro. Henry estava do outro lado, observando tudo.
— Obrigada. — sorriu para a amiga. — Acha que é um cachorro?
— Um gato já teria tentado se defender e emitido sons de ataque. — deu de ombros.
Emma assentiu e abriu o pacote, oferecendo para o bichinho. Jogou uma bolinha pequena de ração e alguns segundos depois, uma cabecinha escura desponta entre as sombras. Regina tinha razão, era um filhote de cachorro. Desconfiado, o animalzinho rapidamente capturou a ração e se escondeu novamente.
— Vem, pequeno. — A loira distribuiu as bolinhas de ração, de forma que montou um caminho até elas. — Tranquilo, aqui tem mais comidinha.
O animal, receoso, se aproximou trêmulo de medo e de frio. A vulnerabilidade no olhar daquele serzinho indefeso era de entristecer o mais duro dos corações.
— Onde conseguiu essa comida? — Emma sussurrou para não afugentar o filhote que capturava a bolinhas sem tirar o olhar das duas mulheres.
— Veio como amostra grátis junto com o pacote de ração do Byron. — respondeu, observando Henry depositar mais algumas bolinhas no chão. — O que faremos com ele?
— Vamos levá-lo para dentro. Depois decidimos o que fazer. — tentou acariciar a cabecinha, mas o cachorro se esquivou, ameaçando fugir. A loira colocou um bago de ração na palma da mão e ofereceu para o bichinho, que comeu, apesar da desconfiança.
— Nem quero imaginar o que ele pode ter sofrido para ter tanto receio dos humanos. — disse Regina, após um suspiro — Vou buscar algo para aquecê-lo.
A morena entrou em casa, seguindo para a lavanderia. Passou a vista pelas prateleiras e cestos contendo roupas limpas até encontrar o que procurava. A toalha serviria para aquecê-lo durante a noite.
Quando retornou, Emma e Henry já haviam conquistado um pouco da confiança do filhote. O pequenino já não tentava mais se esconder e agora abanava a cauda que outrora estava encolhida entre as patinhas traseiras.
Emma logo o enrolou na toalha cuidadosamente, mesmo assim ouviram um ganido assustado do animal.
— Coitadinho, estava congelando nessa noite fria. — disse Regina ao observá-lo tremer no colo da loira.
Quando entraram em casa e colocaram o cãozinho no chão, se assustaram ao ver o estado do animal. Na penumbra não haviam enxergado os detalhes, mas agora… Regina ofegou e seus olhos ficaram marejados, estava a ponto de chorar quando Henry a abraçou na tentativa de buscar consolo. Emma não estava diferente da morena. Swan respirou forte, resistindo ao choro por ver aquele animal tão maltratado.
— Não me admira que ele estivesse tão assustado. — negou com a cabeça. A pelagem do animalzinho estava toda embolada e grudada com algo que pareciam ser folhas e muita sujeira, uma das orelhas estava infeccionada, mancava em uma das patinhas traseiras e estava muito magro.
— Vamos cuidar dele, Emm! — limpou uma lágrima — Você conhece algum veterinário que possa atendê-lo?
— Tem a dra. Rose Jones, ela possui uma clínica, mas também atende no abrigo de animais. — lembrou enquanto procurava o contanto na agenda telefônica.
Regina assentiu e foi em busca de uma tigela com água para oferecer ao cãozinho. Henry estava agachado acariciando o bichinho que mostrava sinais de fraqueza, mas, ainda assim, balançava a cauda lentamente. A morena colocou a vasilha com água próxima ao animal que levantou da toalha e bebeu um pouquinho apenas, logo deitou novamente.
— Ei, rapazinho, não está com sede? — acariciou a lateral do corpinho peludo, que se virou de barriga para cima, apreciando o carinho. — Opa, você é uma menina!
Por sorte, a veterinária estava de plantão durante noite e aceitou atender a cachorrinha antes de ir para a clínica. Vinte minutes depois, uma loira vestindo jeans, casaco e cachecol, desceu de uma picape verde-musgo estacionada em frente a casa.
— Bem, onde está mocinha que precisa dos meus cuidados? — perguntou a médica após cumprimentar a família.
— Venha, ela está na cozinha, Rose. — indicou Emma.
A médica examinou a cadelinha cuidadosamente, sob o olhar de todos. Ao final, constatou que precisaria levá-la para tratar dos ferimentos e fazer exames mais minuciosos a fim de determinar o quadro de saúde do filhote.
— Ela vai ficar bem, não vai, doutora? — Regina perguntou ao ver o semblante preocupado da médica.
— Farei de tudo para que ela se recupere. — sorriu para a morena — Vamos pensar positivo.
Os três se despediram da pequenina e Rose a acomodou na caixa transportadora, que sempre trazia consigo na picape. A veterinária entrou no carro e acenou para a família.
— Obrigada, Rose. — Swan falou agradecida — Fico te devendo essa.
— Imagina, é o meu trabalho. — sorriu para eles que estavam abraçados no meio-fio da calçada. — Prometo entrar em contato o mais rápido possível para informá-los, ok?!
Assim que o carro sumiu de vista, os três entraram em casa. Já estava tarde da noite e fazia muito frio lá fora. Emma ajustou o termostato enquanto Regina pendurava os casacos e orientava Henry para lavar as mãos e trocar de roupa antes de se deitar.
— Que noite! — disse a loira para Regina assim que saíram do banheiro, após higienizar as mãos. Caminharam abraçadas pelo corredor e sem comentar nada, entraram juntas no quarto de Emma. Foi algo tão natural que sequer notaram que se comportavam como um casal.
Regina retirou o penhoar e apagou o abajur, deitando ao lado da loira que já estava confortavelmente acomodada, esperando por ela.
— O que foi, meu bem? — perguntou ao sentir a morena inquieta.
— Estou preocupada com a cachorrinha. Você viu aqueles machucados — suspirou — E o semblante da veterinária não me convenceu, ela me pareceu estar igualmente preocupada.
— Rose é a melhor veterinária da cidade.
— Vocês se conhecem há muito tempo? — encarou a loira, apesar da penumbra em que o cômodo se encontrava.
— Estudamos juntas no colegial. Depois ela foi para a faculdade, se formou e quando voltou para Weston, abriu uma clínica de médio porte em parceira com outros veterinários. Desde então tem cuidado dos peludinhos da cidade. — acariciou a face da amiga — A pequena está em boas mãos, linda.
O aparecimento da cachorrinha desencadeou, em Regina, algumas lembranças da infância. Ela sempre teve afinidade com animais. Quando criança, seu maior sonho era ter um bichinho de estimação, não importava o que fosse, ela só queria um amiguinho para amar, cuidar e brincar, porém Cora era terminantemente contra a ideia de ter um animal dentro de casa.
Em seu décimo aniversario, Henry sem consultar a esposa, levou as filhas até um abrigo de animais e deixou que escolhessem um bichinho. Zelena optou por um gatinho rajado, cheio de energia, enquanto que Regina havia sido escolhida por um cachorrinho mestiço de labrador e pastor alemão incrivelmente amoroso. Cora protestou, brigou e chantageou, mas o marido não cedeu, pelo menos até o fatídico dia em que Regina entrou no meio de uma briga entre seu cachorro e o gato da irmã, acabou ferida, resultando na cicatriz no canto do lábio superior. Lembrou-se do quanto chorou ao voltar do hospital e descobrir que sua mãe havia devolvido os animais para o canil.
Foi desperta de seus pensamentos quando Emma passou a mão sobre sua cintura, fazendo com que se aconchegasse em seus braços.
— Ei, o que quer que esteja passando por essa cabecinha, não vale a pena. Não quero ver esse rostinho triste.
— São só lembranças, apenas isso.
Regina se aninhou mais no abraço da amada, sentindo o calor do seu corpo, o seu cheiro, os seus carinhos e principalmente o som que ela mais amava, as batidas do coração dela, que tinham o poder de acalmá-la. Que delicia dormir abrigada nos braços fortes que faziam-na sentir-se a pessoa mais segura e amada do mundo.
***
A manhã de sábado estava intensa! Seria o jogo de estreia de Henry no time de basquete. O garoto estava muito agitado e não sossegava um segundo sequer, falando empolgado sobre o jogo.
— Regi, o treinador disse que o nosso time está muito bom, que nós podemos ganhar facilmente a outra escola. — disse animado antes de enfiar um pedaço de bacon na boca.
— Calma, garoto. — sorriu do jeito do menino — Come direito ou então vai se engasgar.
— Mãe, será que o meu pai vem dessa vez? — encarou-a com o semblante preocupado.
— Espero que sim, filho. O que ele disse?
— Ontem a noite, eu liguei novamente e ele prometeu que viria. — Emma assentiu, mas olhou desconfiada para Regina que lhe devolveu o mesmo olhar. Torciam para que Neal não decepcionasse o menino mais uma vez.
Neal Cassidy, o pai de Henry, era publicitário e morava em Hartford, capital do estado, localizada a cerca de uma hora e meia de Weston. Geralmente, o homem dividia com Emma a guarda compartilhada de Henry durante os períodos de férias e feriados, porém há mais ou menos um ano tem se mantido ausente, raramente liga ou aparece para ver o filho, atitude que tem deixado Henry confuso e magoado.
O ginásio de esportes da Weston High School estava lotado, acomodando as famílias que estavam ali para prestigiar os garotos. Os pais de Emma, Ruby e até mesmo a avó Lucas estavam presentes, torcendo por Henry.
A partida começou e a arquibancada vibrava. Henry respirou fundo para conter o nervosismo e encarou a bola com determinação. O garoto estava ansioso, queria ser um orgulho para sua família, principalmente para o seu pai. Aquele era o esporte preferido de Neal, assim esperava que o pai lhe desse mais atenção, que lhe levasse para ver os jogos ou que apenas ligasse para conversar e espantar a saudade, agora que haviam encontrado uma atividade em comum.
As oportunidades de marcar pontos foram aproveitadas, Henry estava atuando muito bem na partida, fazendo cestas e apoiando o time, de vez em quando, olhava para a arquibancada em busca de Neal, que ainda não havia chegado. Os períodos foram passando e a esperança de ver o pai foi se exaurindo junto da vontade de jogar.
O time de Henry ganhou ao final. O garoto até ensaiou uma comemoração com a equipe, mas ao perceber que Neal, mais uma vez, havia faltado com a palavra, ficou cabisbaixo e preferiu não sair com o time para comemorar na lanchonete. Regina estava penalizada por ver a expressão de decepção do seu pequeno príncipe, e não tirava a razão de Emma, que estava vermelha de raiva, querendo torcer o pescoço de Neal.
Quando chegaram em casa, o menino se isolou no quarto, preferindo ficar sozinho. Emma indignada com Neal, resolveu ligar para o homem, precisava falar algumas verdades ao idiota ou então explodiria. Descobriu que o homem estava em Nova Iorque, participando de um congresso.
— Por favor, insiste mais uma vez para ele atender o telefone, Emma. — pediu novamente ao perceber que o filho se recusava em falar com ele.
— Eu já disse que ele não quer falar com você, Neal. Entenda que o Henry está magoado, você quebrou a confiança dele. — explicou enquanto descia as escadas, atraindo a atenção de Regina para a conversa.
— Que droga, eu pensei que o jogo seria na semana que vem. — disse o homem em forma de desculpas.
— Ele te ligou ontem, Neal. — gesticulou irritada — Como pode ser tão irresponsável?!
— Eu estava ocupado com o trabalho, não prestei atenção, isso acontece. — bufou — É só um jogo, não é o fim do mundo! Amanhã eu saio e consigo uma camisa autografada do Knicks para ele ou o trago para assistir a um jogo e pronto.
— Você não pode compensar a sua ausência com coisas materiais. Ele não precisa de presentes ou viagens, ele só precisa que você faça seu papel de pai!
— E eu faço, Emma! — respondeu chateado — Todos os meses deposito o dinheiro da pensão, nunca deixei faltar nada ao menino.
— Neal, isso é o mínimo que você pode fazer por seu filho. Não é um favor, é sua obrigação, cara. Um pai de verdade participa da vida do filho, está todo dia presente, mesmo através de uma ligação telefônica ou por mensagem.
— Ouça, eu sei que não tenho visitado o garoto com frequência, mas estou sobrecarregado com o trabalho, como eu disse.
— Não acredito que não possa tirar algumas horas do seu ocupadíssimo dia para ver o Henry. Neal, Hartford não é tão longe, você sabe disso.
— Prometo que virei depois do feriado de Ação de Graças, ok?
— Poderia levá-lo para passar o feriado com você e seus pais.
— Infelizmente, não posso. Vou passar com a família da minha noiva, fica complicado levar o Henry.
— Continuo sem entender o porquê seria complicado levar o seu filho. Qual o seu problema?!
— Bem, a Tamara ainda não se acostumou ao Henry, você sabe como é…— disse sem graça.
— Não, Neal, eu não sei. O que eu sei é que o Henry deveria ser prioridade na sua vida. Se sua mulher não aceita que você tem um filho, então você deveria repensar a sua relação.
— Ora, Emma… — disse em ar de riso — Por acaso está com ciúmes?
— Não seja babaca! Se você não me respeita como amiga, me respeite como mãe do seu filho.
— Ei, foi só uma brincadeira, eu… — ela o interrompeu.
— Vê se cresce, cara. Quer saber? Cansei! Quando você decidir ser um pai de verdade, procure seu filho e reze para não ser tarde demais.
Cortou a ligação sem ouvir a réplica. Já estava farta de ouvir as idiotices de Neal. Era sempre a mesma conversa e as mesmas desculpas. Sentou-se no sofá, ao lado de Regina e jogou o corpo para trás, sentindo-se exaurida.
— Como ele está? — abriu os olhos, encarando o olhar de avelã a sua frente.
— Está tão chateado que nem quis conversar. — suspirou.
— Acha que ele me ouviria, meu anjo?
— Você pode tentar. — deu um sorriso fraco.
Regina subiu lentamente pensando no que poderia fazer para ajudar. Henry não era seu filho de sangue, mas ela nutria um amor imenso pelo garoto. Praticamente o havia visto crescer, o conhecia e entendia como a palma de sua mão.
Quase uma hora depois, a morena desce de braços dados com Henry. Ambos tinham os olhos e a pontinha do nariz avermelhados, indicando que haviam chorado, embora trouxessem também um sorriso leve enfeitando o rosto. O rapazinho se aproximou da mãe e sentou ao seu lado, lhe dando um abraço apertado.
— Mãe, eu tenho tudo que preciso em você. — beijou-lhe a face. — Eu te amo!
Emma devolveu o carinho e sorriu agradecida para Regina. Aquelas simples palavras trouxeram-lhe uma enxurrada de emoções. Ser mãe não era uma tarefa fácil, ela tinha seus momentos de fraqueza. Não era uma mãe perfeita, era uma mãe real. E momentos como aquele lhe davam a certeza de que estava no caminho certo ao educar seu filho. Henry se tornaria um homem de verdade.
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