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História Massapê - Segredos e Descobertas


Escrita por: Nevertheless

Notas do Autor


Olá, Brubs aqui!
Wow, fiquei muito surpresa com o retorno rápido que vocês deram a minha fic e agradeço por todos os elogios. Sei que agora tenho ainda mais responsabilidades em trazer alguma coisa que atenda as expectativas de vocês.
Como eu disse, os capítulo estava pronto e fiquei TÃO ansiosa para postar logo que fiz a minha atualização mais rápida da vida de ficwritter HASUDHSA.;

Massapê _provavelmente_ será atualizada semanalmente, todo sábado ou domingo.

Ah, perdoem os erros por falta de beta ;=;

Obrigada e boa leitura ?

Capítulo 2 - Segredos e Descobertas


Fanfic / Fanfiction Massapê - Segredos e Descobertas

O branco encarava o pequeno menino de pele escura a sua frente com seu típico olhar confuso e curioso, que destacava os olhos grandes do rosto delicado. Sua mãe dava instruções em tom sério ao moreno que segurava firmemente pelo braço antes de empurrá-lo de leve para frente, estimulando KyungSoo a receber seu novo brinquedo.

E de fato, Jongin era não muito mais do que um brinquedo.

 

Os olhos da senhora continuavam fixos no moreno,  animal selvagem que poderia reagir de forma adversa, fugir ou machucar alguém. Mas Jongin não tinha para onde ir. A compra oficializava o trato silencioso de obediência que ele foi instruído a seguir contra sua vontade. Era criança como KyungSoo, mas tinha consciência de um adulto. Foi domesticado e ensinado a ser bicho domesticado, e dentro de si, alimentava a indignação e o rancor.

 KyungSoo agora era seu senhor.

 

“Ele é seu, meu filho” resmungou a Senhora, ao mesmo tempo em que levantou o rosto do pequeno objeto para que o mesmo parasse de olhar fixamente para o chão.

 

“Meu?” Repetiu confuso. Não entendia como poderia ser dono de um garoto e era ingênuo demais para compreender.  Seus olhos se encontraram pela primeira vez.

 

 “Qual seu nome?” perguntou, encarando-o.

 

“Jongin”. Sussurrou.

 

“Jong...in...Jongin. Seu nome é bonito.” KyungSoo sorriu. A mãe também sorria, animada com que para ela era a aprovação de seu presente, e não um desperdício dos contos de réis que gastou com ele.

 

 Jongin não sorria.

 

E o branco não entendia porque o menino da pele um tom mais escura do que a dele e alguns tons mais claros do que suas mucamas não sorria.

 

Desejou no mesmo instante vê-lo sorrir.

 

Não sabia que podia obrigá-lo a sorrir se fosse a sua vontade, pois Jongin obedeceria. Não sabia que o que dissesse ao seu novo brinquedo humano, ele acataria. A inocência de quem ainda não compreendia as diferentes cores não tinha capacidade de ver a divisão existente no mundo a sua volta.

 

A criança branca era pureza de pele e de coração.

 

KyungSoo pegou na mãozinha de Jongin e o arrastou-o pela casa, para longe da vista de sua mãe. Agora ela poderia livrar-se de um incômodo, já que o pequeno escravo seria responsável por cuidar, brincar e vigiar KyungSoo todos os segundos do dia. Os pequenos agora pararam no espaçoso quarto do senhorzinho, que correu até um baú para buscar brinquedos para os dois. Ele estava acostumado com as mucamas e os escravos velhos que circulavam pela casa-grande e serviam aos seus pais, então ter alguém de quase sua idade para brincar o alegrava muito.

 

“Sabe brincar?” Perguntou KyungSoo, estendendo um pião feito  de madeira com listas pintadas a mão.

 

“Não sei se lembro, senhor” murmurou Jongin, olhando para o brinquedo e depois para os próprios pés.

 

“Meu nome é KyungSoo. Não me chame de senhor, porque sou menino ainda, e não tenho barba”. E fez um bico involuntário enquanto desembestava a falar sobre sua idade, os senhores, os escravos, como sempre estava doente, e sua vida.

 

Sem perceber, todos os sentimentos e lembranças guardados dentro de si foram confiados facilmente aos ouvidos de Jongin, que o ouvia com atenção. Na cabeça do moreno, o seu senhor seria um menino mimado que o trataria com violência, como uma mercadoria descartável. Certa vez ouviu dizer que os “senhorzinhos” eram tão cruéis quanto os capitães do mato. Mas naquele segundo, quando via os olhos do pequeno senhor brilharem com cada pensamento ingênuo, magoado e puro, sorriu.

 

Não queria confiar no branco e sabia que não poderia esquecer o status do menino, mas seu coração dizia que KyungSoo era diferente. Os olhos eram grandes demais, a boca grande demais e a diferença no modo de tratá-lo transmitiam-lhe segurança e tranquilidade.

 

Talvez um dia ele fosse um adulto diferente dos que encontrou nos seus poucos anos de vida.

 

“Do que você está rindo?” Perguntou o pequeno, admirando-se com o primeiro sorriso sincero que viu de Jongin.

 

“Você é engraçado, Senh... Soo”

 

“Soo?” Repetiu como da primeira vez.

 

“É um apelido” Retrucou, em um sorriso que se transformou em gargalhada. Não sabia se podia tratá-lo assim, mas sentia liberdade para tentar.

 

 “Também quero te dar um apelido” Murmurou, pensativo. “Hm, de vez em quando, vou chamá-lo de Kai, que o frade me ensinou que significa “oceano”. Apesar de achar Jongin um nome bonito, gosto de Kai também”.

 

“Kai” Imitou o tom de voz de KyungSoo como se o debochasse de brincadeira. Parou no mesmo segundo com medo de que o branco reagisse da mesma forma que o capitão, e fez menção de fechar os olhos e esperar um tapa pelo abuso. Mas seus ouvidos foram massageados por um riso solto e infantil.

 

E daquele momento em diante, o branco prometeu a si mesmo que falaria qualquer besteira para que o seu novo amigo sorrisse como dessa vez.

E o moreno prometeu a si mesmo que daria uma segunda chance aos homens de pele alva.

 

✘✘✘✘

 

Cresceram juntos.

 

Conforme os anos transcorriam e os ciclos da cana-de-açúcar movimentavam todo o engenho e a economia do país, os laços de cumplicidade entre os dois estreitavam-se cada vez mais.

Jongin cuidou do mais velho todas as vezes que a saúde lhe faltava, estando ao seu lado nas noites em que febril e cansado, só queria ficar bom para brincar com o seu amigo. O moreno afastava a solidão alheia contando-lhe histórias sobre seres mágicos e bichos da floresta. A saúde ficou mais forte com a idade, e agora era difícil ver KyungSoo preso a cama, já que o garoto estava ocupado demais correndo no quintal da casa-grande com Jongin para ser acometido por uma doença.

 

A senhora da casa ficara tão feliz com a mudança que passou a tratar o escravo muito bem, permitindo que vigiasse seu filho nas aulas com o frade e assim deixando que ganhasse a pouca educação que a elite masculina no Brasil tinha acesso. Jongin tirava sarro da letra horrível de KyungSoo, que se gabava por saber mais palavras do que o outro. Um espaço a mesa era reservado ao moreno porque aos olhos de KyungSoo, Jongin era tão livre quanto ele e esse sentimento era evidente no modo que tratavam-se.

 

Os anos e os pequenos privilégios borraram o laço de escravidão que havia entre os dois, mas não se fazia impossível de esquecer. Havia um apego à casa-grande e ao seu senhor e por isso Kai nunca cogitou desaparecer entre a mata que cobria todos os cantos do engenho. Mas era esperto e usou a liberdade que conquistava para conhecer os arredores das grandes terras e frequentar a senzala, onde querendo ou não, linhagens de sangue o prendiam ao lugar. Sabia de tudo o que acontecia, e dividia com KyungSoo, que passou a alimentar uma nova visão de si mesmo e da escravidão.

 

O patriarca da casa, o pai do branco, era um Senhor de Engenho corpulento que costumava fazer a Senhora da casa chorar e as mulatas da cozinha tremerem em sua presença. Jongin o via raras vezes, pois este sempre estava ocupado usufruindo da influência da cana-de-açúcar, do poder das terras e do luxo que era trazido da cidade para sua casa. KyungSoo preocupava-se com as lágrimas e o rosto marcado a dedos de sua mãe, e não entendia como e por que ;  e Jongin o distraia das relações adultas com brincadeiras que aprendera com os negros.

 

KyungSoo aprendeu a correr descalço pelas plantações da cana alta, sentindo a liberdade entre os dedos que tingiam de vermelho os pés brancos. Aprendeu a cuidar dos próprios machucados e a não depender das mucamas cansadas e exploradas. Aprendeu a valorizar a vida alheia independente da cor, idade ou raça, vendo que o mundo era muito mais do que ele era ensinado pelos seus iguais.

 

KyungSoo ensinou as letras, a etiqueta, a religião e os bons costumes a Jongin. Ensinou que o pensamento do berço não será necessariamente o pensamento a persegui-lo pelo resto da vida. Ensinou que o europeu também é brasileiro e responsável pela mistura e que a cultura também fazia parte do novo mundo.

 

O aprendizado era mútuo, assim como a sensação de dependência que existia entre os dois.

 

No alto da colina afastada da casa-grande, deitava-se os dois sempre para ver o  pôr do sol, deixando que os raios leves tocassem a pele uma última vez. Kai contava piadas sobre o rosto vermelho de KyungSoo enquanto o outro debochava da pele marfim cada vez mais escurecida pelo excesso de sol que Jongin tomava todos os dias. A formalidade do discurso já havia se perdido a muito tempo, e os segredos que eventualmente houvesse entre os dois, também.

 

Um dia, o engenho inteiro ardeu em comoção com a fuga de um negro da terra, que achou um escape perfeito entre a senzala e a plantação e no meio da madrugada camuflou-se e levou consigo mais dois homens, a mulher e o filho adolescente. Ao mesmo tempo em que os feitores – os homens responsáveis por vigiar os negros e capturá-los em caso de fuga -  vociferavam nervosos e agitados que buscariam e castigariam o fugitivo até a morte, Jongin desejou como nunca que ele nunca mais fosse encontrado. Mas infelizmente alguns dias depois, o rapaz foi descoberto e arrastado de volta ao tronco, onde teve suas costas marcadas com o mais forte dos chicotes diante dos olhos de todos os seres inferiores da senzala, como uma lição que deveria ser aprendida. Jongin queria esconder de KyungSoo a barbárie, mas foi inevitável. O branco correu até a senzala e viu com seus próprios olhos, pela primeira vez um homem de pele escura ter seu corpo instantaneamente tingido de vermelho vivo e desfalecer.

Não houve gritos, apenas silêncio, sangue e suor.

Queria gritar, queria pará-los, mas era apenas uma criança que não sabia nada do mundo, das regras e que o mandante do castigo era seu próprio pai. Jongin o carregou para longe, e sentou-se com ele entre as trilhas que dividiam a plantação de cana-de-açúcar. Ficaram em silêncio por muito tempo, até que KyungSoo conseguisse recobrar a fala arrancada pelo choque brutal da realidade.

 

“Você sabia, Jongin?” Perguntou, depois de minutos de silêncio.

 

“O quê?”

 

“Que ele iria fugir?”

 

Sabia. Kai conhecia os homens, conhecia a senzala e conhecia todos os sentimentos que ardiam no peito dos escravos do engenho, mesmo que estes o desprezassem por sua pele mais clara e a permissão de viver na casa-grande, cheio de um luxo que nunca teriam. As mazelas que viu e sentiu o amadureceram, mesmo sendo apenas uma criança como KyungSoo, e sabia que a cena que presenciou também amadurecera o branco.

 

“Sim, eu sabia Soo”

 

“Você pode me prometer uma coisa?” Perguntou abruptamente, fitando-o.

 

Os olhos grandes já não mais lacrimejavam como antes e Jongin segurou as pequenas mãos de seu senhor entre as suas, apertando-as de forma afirmativa. A diferença de cor não era gritante como deveria ser.

 

“Jongin... se um dia você quiser fugir, deixar a casa... me conte. Conte-me tudo o que pensar e sentir. Não guarde segredo algum de mim, e eu farei o mesmo.”

 

Kai acenou com a cabeça, com um sorriso triste. Como poderia ter coragem de um dia fugir da única coisa capaz de mantê-lo ali para sempre.

 

“Prometo”.

 

E dali pra frente, nenhum segredo nunca mais foi guardado.

Eram livros abertos até que a adolescência chegou.

 

✘✘✘✘

 

 

A puberdade aconteceu ao mesmo tempo para os dois, já que a idade que os separava era de apenas um ano. Os segredos eram privilégios que não tinham e tudo o que sabiam era rapidamente compartilhado. Tudo o que Jongin descobria ao redor do engenho e do falatório entre os escravos, contava ao moreno e KyungSoo compartilhava sobre as falsidades e o tititi que rondava a Vila Nova e as outras casas senhoriais da época.

 

A proximidade entre os amigos era mais do que intensa, mas a timidez era algo que começou a brotar dentro de um deles quando um  passou a reparar excessivamente no corpo do outro e as brincadeiras começaram a tomar feições disfarçadamente provocativas.

 

Um dia, Jongin foi beijado. A moça era cinco anos mais velha do que ele e era dama acompanhante da tia-avó de KyungSoo, que posou por uma estação do ano na casa-grande. O branco quando soube, se corroeu de ciúmes e discutiu feio com Jongin pela primeira vez na vida, usando de argumentos sem nenhum fundo de razão. A pontada que sentia no peito e que o guiou a expulsar Jongin de seu quarto crescia ainda mais com o pensamento de ter aqueles lábios tomados pela garota que passou a odiar. “Kai é meu, ele me pertence e isso eu não permitirei”  Pensou, nervoso. “Meu”

 

Quando acalmou-se, parecia capaz de ouvir a si mesmo esbravejar quando Jongin contou-lhe do beijo, perguntando-se o porquê estava agindo daquela forma. Estaria ele nutrindo sentimentos maiores do que uma amizade pelo moreno? Desejando seu amigo de formas mais intensas, um homem?

 

Não poderia. Deus iria castigá-lo por tamanha aberração e o inferno não era um lugar que gostaria de ter como sua última morada. Sodomia era um ato condenável e nunca comentado. Um tabu negado e proibido. Tentou apegar-se as histórias de Jongin sobre como isso era comum em algumas tribos, na antiguidade e nos contos, mas isso não acalmou a sensação de que aquilo era um erro. Alguns dias depois, perdoou Jongin e tentou esquecer o acontecido sem contar a ele o pensamento de posse que o dominou naquele dia.

 

Ele guardou de Jongin o primeiro segredo.

 

Kai ficou extremamente aliviado quando o branco o perdoou. Mal sabia ele, mas tinha odiado a atitude da mulata fogosa, que o perseguiu por todos os lugares do engenho durante a estadia da tia-avó de KyungSoo na casa-grande. A moça declarou-se para ele no ultimo dia, e mesmo após a rejeição, roubou-lhe um beijo sem permissão que deixou o moreno estático por alguns minutos. Não desejava contar para o branco, mas um escravo acabou vendo os dois jovens e tinha medo que seu senhor descobrisse o mal entendido pela difamação maldosa daquele homem bisbilhoteiro. Jongin era homem, mas sentiu-se enojado com a invasão e a primeira pessoa que lhe invadiu os pensamentos foi KyungSoo e os brancos lábios imaculados.

 

Aqueles lábios eram uma espécie de fixação de Kai, pois era cheios mesmo que o branco não tivesse nenhuma mistura negra em seu sangue. Não conseguia esquecer a suavidade do toque quando adoeceu pela primeira vez a algumas estações atrás. Foi a vez de KyungSoo cuidar de seu amigo doente e passar noites em claro zelando pelo seu sono e trocando panos molhados para expulsar do corpo moreno a febre insistente. Na noite em que fingia dormir, o branco depositou um beijo em sua testa delicadamente. Aquela suavidade fazia o corpo de Jongin estremecer até hoje com o desejo de experimentar novamente a sensação.

 

Kai tinha desejos pelo seu senhor, não apenas sentimentos profundos de amizade. Havia aprendido com o branco o que era pecado, mas para ele nada daquilo importava ou fazia sentido, pois o Deuses dos negros eram justos e os espíritos protetores ajudavam-o a aceitar o sentimento dentro de seu coração. Ele tinha apenas receio da reação do branco e por isso decidiu conter-se até que essas sensações não coubessem mais dentro do peito.

 

A reação de seu senhor encorajou-o a ser um pouco mais travesso e conseguir com o tempo descobrir se o branco sentia o mesmo. Mas em um primeiro momento, ia se conter.

 

E esse foi o primeiro segredo que guardou de seu senhor.


Notas Finais


Espero que não tenha ficado muito confuso todo o tempo que passa de um período da vida deles para o outro.
O próximo capítulo é com certeza um dos meus favoritos, HOHOHO.

Beijos, até a semana que vem :3


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