- Eu estou tão feliz de ter te achado, Lucas! – ele sorria largamente e seus olhos azuis brilhavam como se diante de si estivesse uma estrela.
Eu estava extremamente desconcertado! Jamais imaginaria o encontrar aqui ou em qualquer outro lugar, além do mais, eu estava com meus amigos e com o Felipe exatamente ao meu lado quando ele me roubou esse beijo na bochecha.
- Eu sei que você deve ter ficado muito chateado comigo, mas eu preciso falar com você! Preciso explicar o que aconteceu! – ele falava ainda abaixado ao meu lado e eu não conseguia formular nenhuma frase para falar para ele ou para meus amigos.
- Vai lá, Cadu! Vai conversar com seu amigo! A gente vai ficar aqui! Eu ainda estou com fome, vou comprar mais alguma coisa... – ouvi o Alves falar e eu movi minha cabeça em sua direção instintivamente.
- Pode ir, Cadu! Você não deve nada pra ninguém!Vai lá! – Sato sugeriu, de uma forma séria que eu não entendi muito bem. A Vick estava ao seu lado e me olhava curiosa.
- Lucas, por favor... – Tiago se levantou e pediu, com uma expressão cheia de esperança.
Meu coração estava acelerado e eu mal conseguia respirar. Realmente, eu não sabia o que fazer. Nem coragem de olhar para o Felipe eu tinha...
Mas ficar ali e deixar que todos os meus amigos soubessem o que tinha acontecido entre eu e o Tiago não era um opção e resolvi levantar e acompanhá-lo.
Ele sorriu ainda mais contente quando eu me levantei e então ele foi ao meu lado enquanto falava e resolvi só escutar, sem muitas expectativas.
- Eu sei que você deve ter ficado muito chateado por eu não ter te ligado, mas eu juro que tentei, só que eu perdi seu número... – ele falava enquanto eu andava cabisbaixo, relembrando aqueles momentos que passamos juntos no finalzinho das férias, ainda na praia.
- Como você perdeu? – perguntei, o olhando de canto.
- É uma coisa chata de contar, mas é melhor eu te falar tudo... – vi que ele ficou sem graça, mas eu também queria só a verdade. – Naquela noite, eu havia marcado de me encontrar com meu ex. Eu tinha terminado o nosso namoro no ano novo, quando descobri que ele havia saído com uns amigos e me traiu. Pra mim, traição não tem volta e quando eu descobri, acabei na mesma hora, mas eu estava na praia e ele estava aqui em Curitiba, então ele passou praticamente um mês inteiro querendo conversar comigo pessoalmente e eu acabei cedendo e marcando de me encontrar com ele naquela noite.
Enquanto ele falava, lembrei que ele havia me dito que tinha um compromisso e depois iria me ligar, mas isso nunca aconteceu.
- Eu fui fraco, acabei bebendo com ele e nós dormimos juntos... – senti sua voz ficar baixa e seus olhos se entristeceram.
Não sei se eu poderia confiar no que ele estava falando, mas no fundo, eu mais que ninguém sabia como era ficar frágil depois de beber.
- Quando eu acordei no outro dia, imediatamente me arrependi de tudo que aconteceu e me lembrei de você. – fez uma pausa, me olhando, como se me admirasse. - Ele ainda estava dormindo quando eu achei o meu celular e fui procurar o seu número para te ligar, mas eu não achei o seu nome e vários outros contatos do meu celular. Eu tentei de tudo, mas eles haviam sido apagados, foi quando meu ex acordou, eu o confrontei e ele admitiu que pegou meu celular enquanto eu estava dormindo e apagou vários contatos novos que ele não conhecia e entrou no meu Facebook e também excluiu vários amigos meus de lá. Pra mim, aquilo foi a gota d’água. Nós brigamos feio e a partir dali, não havia mais volta, eu o expulsei de vez da minha vida! – ele concluiu.
Eu escutei a tudo em silêncio. Não duvidei, mas também não sabia se poderia acreditar e mesmo que acreditasse, o que aconteceria a partir dali?
- Eu te procurei naquela manhã, na mesma praia, com esperança que você aparecesse, mas no fundo eu sabia que você não estaria lá. Depois, procurei no Facebook e no Insta, mas você faz ideia de quantos “Lucas Eduardo” existem? – ele suspirou.
- Você não iria me achar mesmo... – o observei, me encarando curioso. – Meu Face está como Cadu... – expliquei.
- Cadu? – ele estranhou.
- Meu nome é Lucas Eduardo, mas meu apelido é Cadu. Todos me chamam assim...
- Entendi... – deu um riso bobo – nunca que eu iria imaginar! Teus amigos agora a pouco te chamaram assim e eu nem percebi...
Enquanto andávamos, acabamos passando pela praça de alimentação e chegamos a uma das saídas do shopping, na parte de trás, ao lado do estacionamento. Era um local mais tranquilo e que tinham poucas pessoas esperando por um táxi ou carro de aplicativo. Em meio ao jardim e as árvores, eu e ele continuamos conversando e cada vez mais eu sentia o mesmo frio na barriga que senti quando nos conhecemos na praia.
- Eu também te procurei no colégio que você disse que iria estudar. No primeiro dia de aula eu até cheguei atrasado, mas voltei lá várias vezes e nunca te vi, nem na entrada e nem na saída... – ele mais uma vez parecia decepcionado com sua falta de sorte.
- Eu sempre entrava e saía pela saída dos fundos do colégio... – o respondi.
- Fundos? – deu um suspiro – eu nem imaginei que havia outra saída...
Eu não consegui disfarçar e também dei um pequeno riso, lembrando da sensação de achar que tinha o visto na primeira semana de aulas.
- E você? Não quis me procurar na PUC? – perguntou, me encarando seriamente.
- Eu... eu achei que você não queria mais me ver, então pensei que seria chato eu ir te procurar... – confessei.
- Mas eu adoraria se saísse de uma aula chata e te encontrasse por algum corredor... – de novo aquele sorriso encantador, que fazia meu coração falhar algumas batidas. – Eu te procurei durante todos esses meses e ainda não consigo acreditar que te encontrei...
Estávamos parados, ao lado de algumas árvores, frente a frente, quando sua mão esquerda veio até o meu rosto e acariciou minha bochecha. Ele foi chegando cada vez mais perto, mas apesar de eu estar começando a me sentir feliz por tê-lo encontrado novamente, eu estava confuso e ainda existia o Felipe em minha vida, que por sinal, estava na praça de alimentação, a alguns metros de distância.
Senti meu corpo tremer com sua aproximação, mas ainda não me sentia bem para permitir que isso acontecesse e acabei baixando o rosto, fugindo de seu beijo.
- Eu entendo que você possa não ter acreditado em mim e não queira me dar uma segunda chance... – ouvi sua voz desanimada, falando próximo a meu rosto.
- Não é isso... – doeu meu peito ao ouvir seu tom. Não foi culpa dele. Ele me procurou e por todos esses meses eu estava achando que ele simplesmente havia me esquecido, mas foi exatamente o contrário. E eu? O que sentia por ele, depois de todo esse tempo? Depois de reencontra-lo?
- Então, você está com outra pessoa? – perguntou ainda com aquele mesmo tom sôfrego.
Volvi meus olhos para aquela imensidão de azul a minha frente. O que eu diria, se nem ao menos eu sabia?
- Eu... – o que falar? Como classificar a minha relação com o Felipe? - ... mais ou menos... – suspirei.
- Mais ou menos? – ele ficou confuso. – Como assim?
Eu nunca tinha falado sobre isso com mais ninguém além do Nando e era difícil colocar em palavras, mesmo assim, senti que deveria tentar.
- Eu e ele... nós só ficamos de vez em quando... nada sério... – ensaiei explicar, sentindo uma enorme dor no coração por ter que usar esses termos, mas fazer o que se essa era a realidade?
- Lucas, você não merece ficar com alguém que não quer nada sério com você... – sua voz se tornou macia e ele continuou acariciando minha bochecha. – Você merece alguém que te ame e te respeite a cada segundo do seu dia... – seus olhos estavam fixos nos meus e sua boca tão próxima, falando de um jeito que trouxe paz e tranquilidade para meu espírito. – Merece alguém que te dê carinho e atenção, merece alguém que lute por você incessantemente, assim como eu estou disposto a lutar...
E então, eu não estava mais em mim. Nenhum juízo parecia existir nesse momento, nenhum sinal de sensatez ou de resistência.
O Tiago me seduzia de um jeito que eu não conseguia recuar. Seu carinho e sua atenção, suas palavras doces e amáveis, tudo era extremamente envolvente e por alguns segundos, esqueci de todos os aborrecimentos dos últimos dias e me permiti, me entreguei.
Seus lábios macios encontraram com os meus, sua língua abriu espaço ao entrar na minha boca e delicadamente envolver-se com a minha. Tão lento, tão suave.
Era como se meus sentidos estivessem me transportando para aquele dia, aquela praia. As mesmas sensações, as mesmas emoções. Lembrava com perfeição do cheiro de praia, do sol batendo em nossa pele, de como ele estava gelado e molhado depois do banho de mar e eu todo encantado com o cara que era tão direto e desinibido.
E então, a lucidez voltou.
- Tiago... eu não deveria... – me afastei, não tendo coragem de o encarar e soltando minhas mãos, que haviam se agarrado a sua cintura.
- Não diga que você não deveria... você pode tudo! Você é dono da sua vida e das suas escolhas...
Ele falou baixinho, me encarando como se suplicasse para que eu ficasse mais tempo, para que eu o beijasse mais, para que recuperássemos o tempo perdido e em minha cabeça, começaram a pipocar pensamentos que jamais tinham se passado por minha mente antes.
E se o Tiago tivesse me ligado? E se tivéssemos nos encontrado na saída do meu colégio? E se nós estivéssemos juntos desde a praia? Será que eu teria me apaixonado pelo Felipe? Será que eu estaria vivendo todas as angústias que eu tenho hoje? Será que eu estou certo em me permitir desistir do Felipe e me arriscar com o Tiago?
E aqueles olhos azuis como o céu me olhando com tanta angústia, com medo... medo de me perder mais uma vez? Medo que eu me afastasse? Medo de que eu não desse a ele a segunda chance que ele pediu?
Mais uma vez um impulso violento me atingiu e eu levei meus lábios aos dele.
Esqueci completamente do mundo. Esqueci que estávamos a céu aberto, em plena tarde de sábado em um shopping dos mais movimentados de Curitiba.
Esqueci e me envolvi. Era como se só eu e ele existíssemos nesse momento.
Me agarrei em sua cintura, apertando seu moletom entre meus dedos e não quis que esse momento acabasse. Só quis ficar com ele junto a mim e me deixar envolver pela paz que ele me fez sentir enquanto me beijava com aqueles lábios lentos e língua suave.
- Lucas, me dá essa chance? Me deixa te provar que eu realmente gosto de você! Que eu quero ficar com você! – falou, segurando meu rosto entre suas mãos assim que mais um beijo terminou.
- Eu... eu quero tentar... – respondi, sendo imediatamente envolvido em seu abraço quente e aconchegante.
Por um momento, senti medo. Medo que isso que eu estava sentindo e vivendo acabasse, por que depois eu não sabia como seria e isso me assustava muito.
Eu queria fugir da realidade. Esquecer do restante e só ficar ali, aconchegado no seu abraço, mas as coisas não acontecem como o esperado...
- Ah, droga... – o celular dele tocou e ele retirou do bolso, lendo o nome escrito na tela. “Vanessa”.
- Atende, pode ser importante... – sugeri.
- É minha colega de faculdade. - Ele desligou a chamada e novamente acariciou meu rosto. – Eu tinha combinado de almoçar com ela aqui no shopping e depois irmos juntos pra Biblioteca da Puc e fazermos um trabalho lá, mas ela teve um imprevisto e não pode vir. Eu já estava de saída, indo esperar com ela lá quando te vi, sentando na mesa com seus amigos, que devem ter pensando que eu era um doido chegando daquele jeito perto de você... – ele riu, um tanto sem graça.
- E foi a melhor coisa que aconteceu nesse dia... – respondi, sincero, mas lembrando que meus amigos estavam me esperando.
- Eu vou ter que ir agora... eu preciso fazer aquele trabalho, mas eu não quero perder o contato com você! – estendeu seu celular pra mim, com o Facebook aberto.
Digitei o nome do meu perfil e foi o primeiro que apareceu. Entreguei a ele e logo ele enviou a solicitação, que eu imediatamente aceitei em meu celular. Depois, digitei novamente meu número no celular dele e ele fez o mesmo com o meu. Não havia como perdermos o contato agora.
- Eu preciso ir, mas eu te ligo depois... – me deu um selinho.
- Dessa vez, eu vou confiar que você vai me ligar... – sorri em retribuição e mais uma vez nos envolvemos em um beijo tranquilo e suave.
O acompanhei até o elevador que o levaria até o andar do estacionamento onde ele tinha deixado o carro e juro que meu coração se apertou ao vê-lo atrás das portas que se fecharam, mas me doeu ainda mais pensar que agora eu teria que encontrar meus amigos e o Felipe e dar uma explicação.
Será que eu conseguiria explicar alguma coisa?
Senti minha mão tremer por um breve momento, mas respirei fundo e fui. Precisava encarar isso de frente e por mais que eu tivesse medo do que iria acontecer a seguir, eu não quis pensar muito e acabar sofrendo por antecedência.
Quando fui me aproximando da mesa, só três deles estavam lá.
- Cadu, achei que você tinha fugido com o seu amigo! – Alves falou irônico assim que me viu chegar.
- Desculpe, eu acabei perdendo a noção de tempo... – falei, puxando a cadeira e me sentando, sem coragem de encarar meus amigos.
- Cadu, o que aconteceu entre você e seu amigo? – Vick perguntou, desconfiada e eu levantei meus olhos para vê-la.
- Fala a verdade! Você ficou com aquele cara, não ficou? – Sato foi direto.
Engasguei com minha própria saliva. Não consegui respirar e acho que até fiquei paralisado.
- Tu é gay, mano? Pode falar! A gente já suspeitava mesmo! – Alves me confrontou, com aquele ar debochado dele.
Engoli a seco. O que falar agora?
- Cadu, eu te conheço a quase dez anos e você escondeu isso de mim todo esse tempo? – foi a vez da Vick me acusar.
- Vick, deixa o Cadu! Ele sabe o que faz da vida dele! Ele não precisa dar explicação nenhuma pra gente se não quiser...– Sato a repreendeu, mas de forma carinhosa.
- Eu... eu deveria ter apresentado ele a vocês... – consegui falar, baixando o olhar e ficando extremamente envergonhado.
- Cadu... – dois braços envolveram meu ombro e o perfume doce invadiu minhas narinas quando senti um beijo demorado em minha bochecha. – Eu estou muito chateada por você ter escondido isso de mim! – ela falava ao lado do meu rosto – Mas isso não importa! Eu só quero ver meu melhor amigo feliz! – sorriu pra mim.
Juro que senti meus olhos se encherem d’água.
Eu tinha tanto medo de ser rejeitado, de ser desprezado depois que meus amigos descobrissem, que juro que essa frase trouxe alívio ao meu peito.
- Relaxa, mano! Você faz o que quiser da tua vida! Além do mais, sobra mais mulher pra mim! – Alves falou, comendo mais um palito da porção de batata que estava a sua frente.
- Prefiro que você seja gay, assim eu posso sentir menos ciúmes de você com a Vick! – Sato falou, rindo, enquanto minha amiga mostrou a língua pra ele - Meu gaydar não falha! Eu não sou gay, mas reconheço um de longe! Anos de experiência ao lado do Felipe! – brincou. – Sempre suspeitei que você fosse, mas respeitei sua privacidade, afinal, quem sou eu para questionar o que alguém faz da vida? – explicou.
Foi então que tomei coragem para perguntar.
- E onde o Felipe foi?- Sato e Alves se entreolharam, enquanto a Vick voltou a sentar na cadeira ao lado do Sato.
- Ele disse que ia no banheiro e saiu pra lá! – Sato fez a indicação em direção à um dos banheiros, mas era a mesma direção que eu havia ido com o Tiago. – Depois ele voltou e falou que estava enjoado, que alguma coisa não fez bem pro estômago dele e ele quis ir embora...
- A gente até quis ir junto pra ele não precisar dirigir, mas ele bateu o pé e falou que queria ir sozinho! – Alves completou.
- Ele estava muito estranho mesmo... – Vick comentou.
- Conheço bem esse estranho dele... – Alves soltou, mas imediatamente, Sato deu uma cotovelada nele.
- Não esquenta, Cadu! Ele vai ficar bem! – Sato falou com convicção.
Nada iria tirar da minha cabeça que ele tinha me visto com o Tiago do lado de fora do shopping, mas se isso aconteceu mesmo, o que ele sentiu? O que o fez ir embora assim?
Minha mão tremeu levemente sobre meu joelho abaixo da mesa e mais uma vez tive que respirar fundo, quando a Vick começou a me questionar sobre várias coisas.
- Cadu, como você conseguiu esconder tudo isso de mim e da Bia? E que cara gostoso era esse que apareceu aqui? Eu quero saber tudo!
-Cara gostoso sou eu, Vick? – Sato a interrompeu imediatamente.
- Sato, ele é gay! Que diferença vai fazer eu chamar ele de gostoso ou não?
E em meio a essa pequena discussão que começou, eu me perdi em meio aos meus pensamentos, uma hora lembrando do Felipe e de tudo que fizemos juntos, embora ele sempre me tratasse como amigo no outro dia e a imagem do Tiago todo atencioso e carinhoso, junto com tudo que ele falou pra mim.
Tão diferentes, mais iguais em uma coisa! Me deixar extremamente confuso.
O que estava acontecendo comigo? Como eu fui parar em meio a esse dilema?
Eu me sentia extremamente seguro e em paz com o Tiago, capaz até mesmo de esquecer minhas angústias, mas quando eu pensava no Felipe e em todos os sentimentos que ele me despertava, eu vacilava e me achava a pessoa mais errada do mundo...
Meu Deus, o que eu estou fazendo?
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