Depois do incidente com a piscina, a competição foi suspensa por um dia inteiro por razões óbvias de segurança. A escola estava sendo examinada, milímetro por milímetro, em busca de possíveis falhas e defeitos que pudessem vir a causar mais acidentes como aquele. Por conta disso, todos os alunos estavam com um dia livre e eu pretendia passar o meu na cama, envolta pelo cobertor e admirando o quanto o teto era lindo. Mas não foi isso que aconteceu.
— Eu sei que é você Natsu, vai embora! – gritei para a pessoa que batia insistentemente na porta. — Eu quero ficar sozinha hoje, já disse! – sabia que a minha atitude era digna de suspeita, mas não conseguia deixar de me culpar pelo que havia acontecido, e, para piorar, a cenas não paravam de se repetir na minha cabeça.
As batidas pararam e eu suspirei aliviada voltando a enterrar a cabeça nos travesseiros. De repente, a luz tomou o lugar da escuridão quando Natsu puxou o cobertor de uma vez.
— Ei! – reclamei fitando seu sorriso brincalhão.
— Bela camisola. - ergueu as sobrancelhas. — Mas ficaria melhor ainda com mais uns babados. - joguei um travesseiro nele.
— Como entrou aqui?
— Pela janela. - respondeu como se fosse óbvio.
— Eu tinha me esquecido dela. - murmurei para mim mesma irritada. Ele se sentou ao meu lado e me puxou para o seu colo. — O que está fazendo?
— Te animando. - sorriu travesso me beijando em seguida. Quando nos separamos suas mãos, que se encontravam em minha barriga, começaram a me fazer cócegas.
— Para, para! - pedi sem fôlego entre as risadas. — Tudo bem, eu levanto!
— Promete? - exigiu.
— Prometo, prometo.
— Tudo bem então. - ele parou as mãos e eu me deitei ofegante. — Você é muito mole, Luce. - sorriu enquanto brincava com os fios do meu cabelo. — Só umas cócegas são o suficiente para te fazer implorar. Pergunto-me o que você faria se eu... - tapei sua boca com as mãos.
— Não se atreva. - ele segurou minhas mãos e as beijou.
— Tem razão, é melhor deixar surpresa. - fiz uma careta.
— O que faz aqui? Pensei que tinha te mando ir embora.
— Ah é mesmo! Anda, levanta, nós temos que ir.
— Para onde vamos? - perguntei levantando contra a vontade.
— Para a piscina! - deixei cair a escova de cabelos que havia pegado para tentar controlar o ninho de ratos que era o meu cabelo.
— O quê? - o olhei incrédula. — Depois de tudo que aconteceu?
— Exatamente depois de tudo que aconteceu. - ele apanhou a escova e se abaixou até ficar no mesmo nível dos meus olhos. — Olha, eu sei que você não gosta muito de piscinas, depois de quase ter se afogado e com tudo isso acontecendo, nós entendemos. - então era isso que eles pensavam que estava acontecendo? Que eu tinha hidrofobia? Mas talvez fosse melhor assim, a farsa ainda estava de pé e eu podia continuar sabotando os jogos. Esse pensamento me encheu de horror, quanto eu ainda teria que fazer para que ele ficasse satisfeito? Natsu levantou meu rosto, ele ainda estava falando. — Mas nós também achamos que se você não superar, esse medo vai te sufocar. - como se o medo de água fosse o meu maior problema. — E é por isso que vamos a piscina! Então, pegue o seu melhor biquíni porque eu sou muito exigente nesse quesito. - e sorriu maliciosamente conseguindo arrancar de mim uma risada estrangulada.
***
— Vamos Lucy, a água tá ótima! - foram as minhas boas-vindas. Erza estava na piscina jogando água para cima e nos outros como uma criança crescida.
— Já estou vendo que isso vai ser terrível. - murmurei deprimida. — Vamos, se formos agora ainda temos chance de escapar. - falei agarrando o braço de Natsu. Ele riu e segurou minhas mãos me arrastando para onde o resto do pessoal estava.
— Tem razão, - se abaixou quando passamos por Erza, evitando a água por pouco. — Isso vai ser horrível e você vai adorar. - suspirei, era impossível lutar com uma pessoa mais teimosa do que si mesmo.
— Tudo bem, eu vou lá colocar o biquíni, já volto. - comecei a me afastar, mas ele me seguiu. — O que está fazendo?
— Me assegurando de que você não vai fugir.
— E como eu faria isso? Pulando a janela do banheiro?
— Exatamente. Viu só, já estava até planejando. - não pude deixar de rir. Ninguém podia competir com isso, nem mesmo o meu mau humor. Entrei no banheiro com Natsu de guarda e troquei rapidamente a roupa pelo biquíni branco com flores rosa.
— Pronto. Viu, ninguém fugiu. - falei saindo e encontrando-o onde eu o havia deixado. Ele sorriu.
— Nunca se sabe. – e me puxou para um abraço.
— E então, gostou? - perguntei observando enquanto ele me olhava de cima a baixo.
— Hm... Acho que um oito cairia bem. - puxei suas bochechas.
— O que disse?
— Que você está linda, absolutamente maravilhosa. Nota dez.
— Bem melhor. - ele riu e escondeu o rosto nos meus cabelos. — Vamos ou eles vão achar que estamos fazendo outras coisas.
— E o que tem de ruim nisso? - voltou a rir, mas me soltou segurando somente minha mão. Aproximamos-nos em tempo de ouvir Erza gritar.
— Vem Jelly, a piscina tá ótima! - sorri ao ver o quão rápido a ruiva havia aderido ao meu apelido.
— Não, eu não gosto muito de água. - se esquivou. Bom, bem vindo ao time.
— Ah, deixa disso. - Natsu soltou minha mão e se aproximou dele dando-lhe um empurrão que o fez cair com estardalhaço na piscina. Um segundo depois sua cabeça emergiu da água totalmente sem fôlego.
— O que pensa que está fazendo? - gritou, mas Natsu o encarou de olhos arregalados.
— Ah meu Deus, seu rosto está derretendo! - se desesperou - Você não é o Jellal, é um alien disfarçado! Alguém chame as autoridades! Liguem para Área 51! - todos o olharam com uma gota, como ele conseguia ser tão idiota? Pelo visto a minha paranóia com os nossos amiguinhos lá de cima estava se tornando contagiosa.
— Deixa de ser burro Natsu, - me aproximei devagar, pela descrição só podia ser uma coisa — ele deve estar usando maquiagem, mas por que precisaria... - me interrompi ao fitar o rosto dele. Logo ficou claro o motivo e o símbolo, o símbolo em seu olho direito assumiu a frente e ampliou de tamanho preenchendo meu corpo de medo. Não consegui conter o grito que escapou dos meus lábios e no instante seguinte minha cabeça já afundava em direção as águas claras da piscina.
***
O beco estava escuro tal qual eu me lembrava. Havia um cadáver de cabelos loiros prendendo meu corpo no chão, o sangue vermelho escuro escorria dos ferimentos ensopando minhas roupas. Levantei o rosto vendo a pessoa que eu mais amava, morta. Uma risada fria ecoou pelas paredes penetrando em cada parte do meu corpo enchendo-o de horror. Voltei a cabeça, seguindo o som e lá estava ele. O capuz abaixado deixando exposto o cabelo azul e um símbolo no olho direito.
— Não, não pode ser. Você não pode ter feito isso...
“Acorde.” Um sussurro ao longe disse. “Vamos, acorde.” O tom de urgência se intensificou. “Volte para mim.”
— NÃO! - o grito explodiu da minha garganta e eu levantei de uma vez batendo a cabeça contra algo duro. Recuei zonza por um instante e meu olhar focalizou o rosto que eu acabara de ver nos sonhos. — Você! - exclamei tentando chegar até ele. Mas alguém me segurou com força me impedindo de avançar.
— Luce, calma, por favor. - Natsu sussurrou no meu ouvido ainda fazendo força para me conter.
— Não, me solte. Eu tenho que... Você! Por que fez isso? Minha mãe... todo esse tempo eu pensei... morta... - as palavras se embaralharam e eu acabei desabando contra Natsu que me sentou de volta na cama. Mal percebi que estava usando um vestido e que aquele era o meu quarto. Só o que me importava era aquele rosto que me olhava de uma forma tão triste que fazia meu coração doer. — Como eu não vi isso antes? Quando eu estava morrendo no hospital eu vi o símbolo. - não conseguia aceitar, como Jellal podia ter feito isso?
— Bom eu estava usando maquiagem, - falou pela primeira vez ao ver que eu não ia mais atacá-lo. — e é isso que ela faz sabe, impede de ver. - ele deu de ombros.
— Mas eu já te dei um banho de bom dia, como isso não apareceu daquela vez?
— Ah, era pra ser maquiagem a prova de água, naquela vez funcionou nessa não foi muito bem. – fez uma pequena pausa. — Eu devia pedir o meu dinheiro de volta.
— Aham, e dar uma de Activia? - revirei os olhos percebendo de repente a súbita mudança de assunto. — Não pense que eu não percebi que você está tentando me distrair. Diga-me Jellal, por que matou a minha mãe? - ele suspirou desistindo.
— Tem razão, eu a matei. - ouvir as palavras vindas da boca dele era ainda pior do que imaginá-las. Ele ergueu a mão antes que eu pudesse pular em seu pescoço novamente. — Mas a única parte de mim que fez isso foi o meu rosto. Pensa bem Lucy, eu tenho sua idade, a pessoa que matou sua mãe estaria bem mais velha a essa altura.
— Mas você falou...
— Que matei sua mãe? Sim, mas não fui eu quem fiz isso. Foi o meu irmão. - o chão pareceu ceder sob os meus pés e Natsu me segurou mais firme com medo que eu pudesse desmaiar novamente.
— O seu... irmão? - ele assentiu. — Mas se você sabia, porque não me contou? Tantos anos perseguindo o vazio e você sabia e não me contou...
— Eu não sabia. - deu um suspiro cansado. — Descobri há algumas semanas, a Gabriela estava me ajudando. - ele puxou uma pasta das costas e estendeu na minha direção. Natsu a pegou e me entregou ainda com medo que eu pudesse pular no pescoço do azulado se ele me deixasse só. — O que é isso? - abri a pasta e encontrei várias folhas contendo perfis de várias pessoas.
— Uma noite dessas, nós invadimos uma velha mansão abandonada na parte norte da cidade e lá encontramos isso. - apontou para a pasta. — São ordens de assassinato e se você continuar vai ver... - deixei a pasta cair com um baque surdo, as folhas se espalharam pelo chão enquanto minhas mãos tremiam. —... é, o perfil da sua mãe estava lá. Ao que tudo indica, a morte dela foi encomendada.
— Encomendada? – repeti ainda entorpecida. — Você quer dizer que alguém mandou que a matassem? – ele assentiu. — Mas... o que seu irmão tem haver com isso?
— O meu querido irmão mais velho é um assassino profissional, ele atende a esse tipo de pedido. – indicou novamente os papéis espalhados pelo chão.
— E o que isso tem haver com você? – Natsu perguntou antes que eu pudesse abrir a boca.
— Quando eu fiz nove anos, ele saiu de casa com tudo de valor que tínhamos, pouco tempo depois minha mãe morreu devido a uma grave doença e eu passei a morar na rua sem ter condições e nem para onde ir. – ele fez uma pausa como se pudesse rever aqueles momentos só de falar neles. — Eu o encontrei mais uma vez, pouco tempo antes de encontrar o Gajeel e logo em seguida, você. Ele tinha mudado, disse que eu havia destruído a vida dele quando nasci, e que por isso ele iria destruir a minha. Por isso ele copiou a minha aparência e passou a se especializar em assassinatos. Essa foi mais uma das razões pelas quais eu não podia passar muito tempo em uma cidade só, tinha medo que me vissem e me confundissem com ele.
— Então... – falei devagar, finalmente entendendo o que ele queria me dizer.
— Sim, foi ele que matou a sua mãe usando a minha aparência. – encarei minhas mãos e tentei relaxar os punhos, não havia sido ele enfim.
— Desculpe. Eu não devia ter suspeitado de você. – pedi ainda de cabeça baixa, com os olhos ardendo em lágrimas. — Eu sinto muito. – Natsu finalmente me soltou e logo outro par de braços substituiu os dele. Olhei para cima, era Jellal.
— Ora, vamos lá, por que você está tão chorona? – ele riu. — Você não é assim.
— Desculpe.
— Tudo bem. – ele acariciou meus cabelos como fazia antes nas noites em que eu não conseguia dormir por conta dos pesadelos. — Vamos resolver isso juntos, como prometemos, certo?
— Certo. – levantei a cabeça e consegui dar um sorriso. Não importava o quanto eu tivesse que me machucar, eu ia fazer aquele cara pagar. — Você ainda não me disse o nome do seu irmão.
— Ah, isso. – ele sorriu de forma sombria. – O nome dele é Mystogan. Bem apropriado, não acha?
***
Em algum lugar do outro lado da cidade, uma garota se arrastava pelo telhado de um velho armazém. Os cabelos pretos tinham traços de poeira assim como as roupas e os braços. Ela observava com atenção o movimento de entrada e saída pela porta principal tentando desvendar o complicado sistema de segurança, mas nada que pensasse fazia sentido. Sentia a frustração lhe acompanhar como uma velha companheira de muitas eras, não poderia entrar lá a não ser que desvendasse esse enigma.
Dois dos caras que antes carregavam pesadas caixa de madeira para dentro pararam a movimentação ao ver um homem alto e de capa se aproximar. A garota se encolheu mais nas sombras sentindo o corpo enrijecer com a tensão presente no momento. O que ele estava fazendo aqui?
— Já terminaram? – perguntou abaixando o capuz e deixando a mostra cabelos azuis e uma marca no olho direito.
— Quase, este é o último carregamento. – um dos brutamontes respondeu pousando uma caixa a seus pés.
— Ótimo, quero tudo pronto para os nossos visitantes. Agora já não deve demorar muito. – um sorriso maligno e frio deformou suas feições. — Mas antes, - a garota prendeu a respiração e começou a recuar, precisava contar isso para Jellal urgentemente. — acho que os senhores gostariam de saber que temos uma bisbilhoteira nos vigiando dia e noite. Por que você não se mostra, Gabriela? – por um instante seu corpo paralisou, mas logo um jorro de adrenalina lhe deu a força necessária para se levantar com um pulo e disparar pelo telhado, correndo o mais rápido que podia. Mas antes que pudesse pulara do prédio e mergulhar no vazio de um beco que a levaria da forma mais rápida para longe dali, sentiu algo atingir sua perna e ela cambaleou de dor caindo a poucos passos da beira. Olhou para cima e viu a capa escura se arrastando pelas telhas acompanhada daquele sorriso que ela odiava. — Que bom que veio se juntar a festa.
— Mystogan. – o tom frio e controlado permaneceu presente apesar da enorme vontade de gritar que sentia. Olhou rapidamente para a perna machucada examinando o lugar onde a bala penetrara e contatando que não havia atingido nada importante. — O que faz aqui? Pensei que estivesse se escondendo em algum buraco por aí como o rato que você é.
— Ora, me responda você, não estava nos espionando?
— Ele nunca iria cair em uma armadilha tão idiota assim. Ele é mais esperto que isso. – sentiu a dormência se espalha pela perna, tinha que parar logo o sangramento.
— Ainda continua idolatrando ele como fazia quando era criança.
— Cale a boca! – gritou furiosa.
— Vejam só, é verdade não é? – o sorriso aumentou. — Você faz todo esse trabalho sujo para ele e o que recebe em troca? Nada.
— Cale a boca! – falou agora em um tom mais baixo.
— Aposto que a essa altura ele já tenha te substituído e você ajudou com isso, não foi? – a garota o encarou com um ódio fervente. — Você sabe que eu estou certo, acho que ainda deve se lembrar, eu sei de tudo. Sabe, - a olhou avaliativamente. — se você quiser voltar, o seu lugar será sempre seu. Não importa o que diga, - se abaixou sussurrando no ouvido da garota que tremia de raiva e dor. — sempre pertencerá a mim.
— Eu nunca voltaria, não depois do que você fez comigo. Nunca! – ele recuou com o rosto sério.
— Se é assim, então você ira fazer parte do espetáculo principal. Não era isso que queria descobrir? – e se voltou fazendo um sinal com a mão para que os capangas a amarrassem e a levassem para dentro. — Essa cidade vai queimar como o inferno e eu estarei no topo de tudo para assistir.
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