" Querida Nina,
De antemão, quero dizer que não a culpo. Tudo poderia ter sido diferente se tivéssemos seguido por outros caminhos e tomado escolhas diferentes das que tomamos. No entanto, ainda assim, eu não a culpo.
Em grande parte devo tudo o que eu sou e tenho a você. Você me ensinou muitas coisas e me preparou para esse mundo que, aparentemente, visto sob uma visão romântica, é fácil e indolor. Devo dizer que não, não é nada fácil. Eu agradeço por ter me preparado.
Eu consegui chegar onde eu queria, e sei que não teria conseguido sozinha.
Mas, tia, será que fizemos as escolhas certas pela coisa certa?
A maioria do tempo eu acredito que fizemos as escolhas erradas pela coisa certa. Quero dizer, eu as fiz.
Pois, outra vez, se houver um culpado, sou eu — é minha vida, logo se tornam minhas escolhas.
De qualquer forma, não podemos mais mudar o que aconteceu. E a única coisa que resta é continuar vivendo. Sequer tenho certeza se me arrependo ou se faria tudo de novo se pudesse voltar no tempo.
Agora sei que perdi muitas coisas para ter tudo o que eu queria, mas ninguém pode simplesmente ter tudo, não é?
Bom, neste caminho, eu perdi o amor. Sim, ele é a única coisa — talvez a mais preciosa —, que não está inclusa neste tudo.
Enfim, nada pode ser feito. Eu fiz minhas escolhas e agora lido com elas diariamente.
Lamento que não tenha dado certo para a senhora, mas obrigada por ter me apoiado, porque afinal, deu tudo certo para mim. E quanto à isto, estou satisfeita e realizada.
Mas veja pelo lado bom: a senhora está casada e muito feliz. Eu não tive esse privilégio. Aliás, minha melhor amiga Hailey, também não. Você lembra dela, não é? Eu sei que lembra. Vocês nunca foram grandes amigas.
Hailey nunca se casará, porque o amor que ela sentiu a traiu e isso a fez jogar-se de uma cobertura a baixo e espatifar-se no chão.
Eu nunca vou esquecer de sua imagem. Ela estava apenas parcialmente íntegra quando fora enterrada.
O amor tira coisas das pessoas, inclusive a vida. Em outros casos, como o meu, é a vida quem tira o amor das pessoas.
Mas acho que você não vai entender isso.
Estou de partida agora, vou cair na estrada novamente.
Mais uma vez, é bom escrevê-la novamente, tia.
Carinhosamente, da sua sobrinha,
Evelyn."
Deixo a carta na caixa de correio de Nina na manhã do meu vôo para Nova York e corro de volta para o carro como uma criança.
É o último dia de férias e estamos voltando para casa.
— Evelyn, tem certeza que não quer entrar?
— Acho melhor não, querido. Ainda não estou pronta. Talvez no ano que vem.
— Tudo bem. Talvez no ano que vem — repete ele. É a mesma coisa que eu disse no ano passado, e provavelmente o que direi no próximo ano.
O motorista dá partida e, aos poucos, minha antiga rua vai se tornando uma visão longínqua, logo o mesmo acontece com meu país e minha casa a partir de certo tempo. Quando deixamos o solo, parece que parte de mim é deixada para trás também.
Nas alturas, tudo parece apenas um esboço esquecido de uma tela impressionista.
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