História NATIESE - Uma patricinha em minha vida - Capítulo 76

           O outro dia chegou, e era sexta-feira. Natalie nem conseguiu dormir direito por causa do que houve na noite passada. Ela ainda estava sem acreditar que o pai tinha aceitado o namoro dela com a Priscilla. Agora só queria ver a cara da Laura quando soubesse. Porque ela sempre teve medo de contar que era bissexual.

            Depois de ter saído da cama, a patricinha foi se aprontar para mais um dia de aula no colégio. Enquanto isso, Sérgio Smith já estava aguardando o café. Ele observou Maria colocar todo o café da manhã na mesa. Pela cara dela, não parecia ter tido uma noite muito tranquila. Será que o encontro não tinha sido bom?

            — Maria, como foi o encontro?

            — Será que eu posso comentar isso com você depois que as meninas forem para o colégio?

            Sérgio Smith achou estranho o pedido dela. Porém, concordou.

            — Ok. Tudo bem.

            Em poucos minutos, Laura desceu a escada e chegou até a mesa e deu bom dia para a Maria e o pai. Tinha acordado melhor, porque não estava mais brigada com a irmã. Só ainda não sabia como tinha sido a conversa entre o Sérgio e Natalie. Mas também não quis perguntar nada a respeito.

            Natalie desceu a escada também e foi ao encontro deles. Ao chegar, ela deu um beijinho na bochecha do pai, da irmã e até da Maria.

            — Bom dia, família linda!

            — Bom dia, Natalie. — disse Laura, achando o jeito dela estranho.

            — Bom dia, filha. — disse Sérgio, sorrindo — Depois quero que traga a Priscilla para almoçar aqui em casa.

            — Claro, pai. Ela vai amar. — disse Natalie, animada.

            Laura ficou os olhando com cara de “Que porra está acontecendo aqui?”. Então, Natalie sorriu ao ver a cara confusa da irmã e disse:

            — Eu contei para ele, mana.

            Laura ficou com os olhos arregalados e se odiando por não ter assumido antes ao pai. Ela sempre achou que ele ia agir muito mal em relação a essa questão. Mas pelo que estava observando, não foi isso que aconteceu.

            — Pai, o senhor vai aceitar a Natalie namorar com a Priscilla? — perguntou Laura ainda incrédula.

            — Sim. Não há nada demais nisso. Elas se gostam. Então tem mais é que ficarem juntas.

            — O senhor não era contra a homossexualidade?

            — Sim. Mas percebi que ter preconceito é uma burrice. Todos nós temos o direito de sermos felizes com quem desejamos. — pensou um pouco — É claro que não vai ser fácil para as duas se assumirem em uma sociedade preconceituosa como a nossa. E eu até disse isso a Natalie... No entanto, quem disse que a vida é fácil? É preciso lutar para vencer os obstáculos.

            Laura ainda não parecia acreditar que aquele discurso pertencia ao pai. Seria um sonho? Parecia que tudo que ela desejava tinha se realizado ali naquele momento.

            Então ele continuou a conversa:

            — E se você também for lésbica, Laura... Tudo bem. Eu não vou te julgar. — declarou Sérgio.

            — Na verdade, eu sou bissexual, pai. — disse Laura já revelando o que queria revelar a anos atrás.

            — Isso significa que você gosta de meninos e meninas, não é?

            — Sim. Eu sempre quis dizer isso ao senhor. Mas sempre tive medo do que pudesse fazer. — revelou Laura.

            — É... — disse Natalie — Eu também tive esse medo, pai. Não queria magoar o senhor. Mas, ao mesmo tempo, não era certo esconder algo assim.

            Sérgio ficou pensativo por alguns segundos. Em seguida, olhou para cada uma delas e respondeu:

            — Eu entendo esse medo de vocês de mim. Nunca tolerei esse tipo de coisa, vocês sabem. Detestava quando chegava um gay na minha loja. Só que não quero que me vejam assim mais... Não vale a pena julgar as pessoas. Nós não somos nada para fazer uma coisa como essa. Somos só seres tentando ser felizes do jeito que a gente é. E isso é o que verdadeiramente importa em nossas vidas. — fez uma pausa — Vocês podem ficar com quem vocês quiserem, minhas filhas, desde que façam bem a vocês.

            Natalie e Laura ficaram bastante felizes ao ouvir esse discurso do pai. Parecia que nem era o Sérgio que elas conheciam. Ele tinha mudado muito. Mas muito mesmo. Após essa conversa, Natalie e Laura resolveram ir para o colégio. A patricinha estava com muita saudade de Priscilla e não via a hora de contar sobre a reação do pai.

            Enquanto isso, Maria sentou-se novamente a mesa e continuou a conversa que estava acontecendo antes das meninas tomarem café.

            — E então, Maria? Porque você não quis comentar sobre o encontro na frente das meninas? Houve algum problema?

            — Não. Quer dizer... Não sei se é um problema.

            — Me conte, mulher. O que é?

            — A Lanna Almeida voltou!

            Sérgio Smith quase caiu da cadeira naquele momento. Como assim a mãe das meninas tinha voltado? Ela tinha sumido do mapa.

            — Maria, por favor, me diga que é uma piada!

            — Não é, Sérgio. Ela fez um fake no Facebook para se encontrar comigo.

            — Não estou acreditando nisso! Essa maluca voltou? O que ela queria com você?

            — Ela quer que eu a ajude a conhecer as meninas.

            — Não... Agora você quer me convencer que aquela vagabunda quer conhecer as minhas filhas depois de dezessete anos? É isso, Maria? — gritou Sérgio já descontrolado por ouvir aquilo.

            — Sim, foi o que ela me disse, Sérgio. Ela disse que se arrepende muito de ter deixado as meninas. E também por ter te traído.

            — Maria, você só pode estar louca por acreditar naquela mulher. Ela não presta!

            — Eu entendo a sua indignação. Também achei estranho ela ter voltado depois de tanto tempo. Só que ela está com uma doença muito séria e quer ver as meninas antes de morrer.

            — Doença séria? Só falta você me dizer que aquela mulher está com câncer!

            — Sim, ela está com câncer. Ela está fazendo tratamento. Porém, o médico disse que ela tem poucos meses de vida. Isso significa que ela pode morrer a qualquer momento.

            — Que se dane, maria! A Lanna não tem vergonha na cara. Ela não ama ninguém. Só faz os outros sofrerem por ela. E, pelo jeito, não voltou diferente. Agora está até mentindo que tem uma doença séria para termos pena dela.

            — Não é verdade, Sérgio. Ela está usando perucas. Sem falar que está muito pálida e bem magra. Não é mais essa Lanna que está nos porta-retratos que você guarda.

            — Maria... — suspirou —  Eu não consigo perdoar essa mulher.

            — Eu sei. Não é fácil. Mas ela me pareceu muito sincera e disposta a reparar esse erro.

            Sérgio Smith permaneceu calado. Era muita informação de uma pessoa que antes nem aparecia para saber se as filhas estavam bem. Então Maria continuou a conversa:

            — Ela deixou o endereço do hotel em que está hospedada aqui no Rio... — pegou um pedaço de papel e colou em cima da mesa — Se você não quiser que ela veja as meninas, ela vai embora para São Paulo novamente e nunca mais voltará. 

            Maria o deixou sozinho. Sérgio Smith pegou o pedaço de papel e ficou olhando para aquela letra. Era uma letra redondinha e bonita. Mas acabou amassando aquele endereço. E isto fez com que os seus olhos lacrimejassem.

            Rodrigo chegou no colégio e viu Beatriz sentada sozinha no pátio. Então resolveu conversar com ela até tocar o alarme.

            — Bom dia, Bia.

            — Bom dia, Rodrigo.

            — E aí? Ainda está lendo o livro?

            — Sim. Já estou na metade. É muito bom.

            — Hum... legal. — disse ele, sem graça.

            — O que foi, Rodrigo? Você não parece bem.

            — A Natalie terminou comigo.

            — Sério? Poxa... Que coisa chata.  — disse ela, imaginando o motivo daquilo. — Mas não fique assim... Logo você encontra outra garota.

            — É... E o pior de tudo é que ela me traiu.

            Beatriz já ficou preocupada. Será que ela já sabia que a Natalie estava com a Priscilla?

            — Com quem, Rodrigo? — perguntando, tentando esconder que sabia de tudo.

            — Um cara que estava mandando mensagens anônimas para ela. Ela não quis dizer quem é, mas disse que está namorando com ele. E tem mais: Ela disse que eu iria saber quem era na hora certa.

            — Hum... Mas esquece isso... Não vale a pena gostar de alguém que não te ama.

            Ele suspirou.

            — É complicado, Bia... Eu ainda estou tentando entender o que esse cara tinha para ela ter me deixado...

            De repente, elas viram um grande movimento entre os outros alunos. Todos estavam fofocando sobre alguma coisa. Então, os dois amigos se levantaram do banco do pátio.

            — Bia, o que está acontecendo?

            — Eu não sei.

            Em poucos minutos, os dois viram duas meninas andando de mãos dadas pelo corredor do colégio. Rodrigo não podia acreditar em seus olhos. Ele ficou paralisado com aquela cena. Como isso pôde acontecer?

            Beatriz tocou em seu ombro e o chamou.

            — Rodrigo... Rodrigo?

            Rodrigo virou-se para ela e perguntou:

            — É isso mesmo? A Natalie está namorando com a Priscilla?