No dia seguinte na parte da manhã, Callie surpreendeu-se quando a mãe apareceu na empresa. Não eram nem nove horas ainda. Ergueu-se falando preocupada.
– Mamãe? Aconteceu alguma coisa?
– Não aconteceu nada. - Lucia respondeu sentando diante dela.
– Então? O que faz por aqui?
– Faz seis meses que está vivendo com aquela mulher.
– Eu sei muito bem disto.
Lucia retirou a cigarreira da bolsa lentamente. Callie estava quieta ouvindo com atenção.
– Depois disto você mudou radicalmente.
– Está enganada. Eu não…
– Você vive calada pelos cantos. Meteu-se em um mundo que não consigo te alcançar. Nunca mais consegui ter uma conversa como tínhamos antes. Continua indo lá em casa, mas quando lá está, não está de corpo e alma.
– Que ideia! Está vendo coisas mãe, eu ainda sou a mesma…
– Não é não! Sinto muito que não veja o que aquela mulher fez com você.
– Essa conversa de novo? A senhora podia virar o disco.
– Estou falando que você foge de mim.
– Mãe…
– Se envolveu demais com ela e não quer admitir.
– Eu só não tenho vontade de falar sobre este assunto.
– Não tem porque fugir da verdade!
– Quando tudo isto começou eu tentei explicar, não se lembra?
– Sobre suas necessidades e anseios de mulher? Lembro sim! No início deve ter sido isto mesmo, agora tudo mudou porque você se apaixonou!
Callie afastou a cadeira se erguendo. Foi até a bolsa onde pegou um cigarro. – Por quê? Por que deixou isto acontecer? - Lucia perguntou exaltando-se.
– Não acredito que esteja apaixonada por ela. Mesmo que eu esteja, isto não é algo que eu poderia ter evitado. - Callie respondeu sem olhar para mãe.
– Ah, Callie, você…
– Nem sei se é paixão!
– Talvez seja pior. - Acrescentou a mãe sorrindo desgostosa. – Talvez seja amor, Callie! Se for vai ficar para sempre se deixando usar por aquela aproveitadora.
Callie voltou a sentar abrindo a agenda. Não conseguia olhar para a mãe. Um turbilhão de emoções lutava em seu íntimo.
– Olhe para mim! - Lucia exigiu enérgica. Callie ergueu os olhos fitando-a sem poder fugir. – Sei que teve casos passageiros no passado. Deve ter pensado que seria a mesma coisa. Teria só que transar e mais nada, mas perdeu o controle das emoções. Você caiu de amores por ela e agora tem medo até de me olhar nos olhos.
– Veio aqui jogar isso na minha cara? Acha que tenho culpa do que eu sinto?
– Eu só não queria que tivesse sentimentos nobres por ela. Não vê que ela só está te usando para obter prazeres sexuais de graça?
– De graça? Ora…
– Por acaso ela te paga? - Lucia perguntou ansiosa.
– Não é isto mãe, como pode falar assim comigo? Não vê que eu faço tudo para vocês terem o que necessitam? - Questionou admirada.
– Antes foi por nós, ainda é?
– Ela nos emprestou o dinheiro. Vou pagar tudo a ela. Já se esqueceu disto?
– É claro que não esqueci! Você deve dinheiro e vai pagar com juros. Portanto, ela está te usando como se fosse uma prostituta!
– Mãeeeeeeeeeee!
– Ser lésbica é uma coisa! Prostituta é outra bem diferente!
– Mas, por que…
– Esqueceu-se como foi parar na cama dela? Não escolheu e nem desejou isto. Ela te obrigou, lembra-se?
– É claro que me lembro! Mas, que droga mãe! Por que está me crucificando assim? Não percebe o quanto é difícil para mim?
– Tão difícil quanto da primeira vez?
Os olhos de Callie cintilaram antes de fugir dos da mãe. Abriu uma gaveta procurando pelo isqueiro que não encontrou na bolsa. Achou-o em seguida acendendo o cigarro. Ao acendê-lo percebeu como suas mãos tremiam sem controle. Abaixou-as rápido para que a mãe não visse. Percebeu que não podia enganá-la quando a ouviu afirmando ironicamente.
– Só de falarmos sobre ela já se descontrolou toda. Treme mais do que uma gelatina. É assim que fica quando estão juntas?
– Meu Deus…
– Precisa se mostrar tão vulnerável? Não é de estranhar que ela tenha deixado você completamente louca de amor!
– Não estou louca de amor. Também não quero mais falar sobre este assunto. Não quero brigar com a senhora. Tenho milhões de coisas para fazer. Passarei em casa mais tarde, por favor, deixe-me trabalhar! - Pediu indo até a porta.
Lucia caminhou de cabeça erguida até a porta. Ali parou fitando-a profundamente.
– Antes de ficar triste comigo, pense que só desejo o seu bem. Até a noite!
Callie fechou a porta voltando para a cadeira. Não tinha como negar que sentia coisas loucas por Arizona. O desejo que sentia agora era incontrolável. Nem sabia mais se conseguiria pagar a dívida sumindo depois da vida dela. Talvez pudesse sumir da casa dela, mas da cama, achava impossível. Pensava nela o tempo todo. Isto a perturbava profundamente. Ansiava por correr para casa, porque sabia que ela a esperava. Bastava olhar para ela para sentir as coxas úmidas. Nenhuma outra mulher causou aquele efeito devastador sobre ela. Passou a mão na testa de onde começava a brotar gotas de suor. Aquilo não era amor ou seria?
Ouviu uma batida leve na porta. Girou a cadeira voltando-se e viu Jo Wilson entrando com sua costumeira expressão séria.
– Bom dia!
Jo cumprimentou-a sentando diante dela.
– Bom dia!
–Vim saber se leu o relatório e o que achou do crescimento das vendas nestes seis meses.
– Eu li sim, Jo. - Abriu a gaveta pegando a pasta com um sorriso. – Estou muito satisfeita com os índices. Ia mandar chamá-la. Acabei de expedir uma ordem para reativar o galpão 9. Quero que mande sua equipe agir imediatamente. Quero colocá-lo em funcionamento o mais rápido possível. Eu te dou carta branca para contratar quantos funcionários forem necessários.
– Será feito! Vou mandar redigir outro contrato. Pode ser? - Jo sorriu observando-a silenciosa.
– Perfeitamente. Também quero te dar os parabéns pelo excelente trabalho que tem feito aqui, Jo!
– Obrigada! Quem sabe possamos jantar hoje para comemorar tanto sucesso.
– Oh, não!
– Não? - Jo perguntou estranhando o tom taxativo.
Callie observou que Jo estava novamente vestida de preto. Usava uma bota italiana diferente a cada vez que a via. Era uma mulher interessante, alta e elegante. Os cabelos castanho claro e sedosos, o rosto delicado ficava encantador quando ela sorria. A marca de cigarros que ela fumava era a mesma que Arizona fumava. Achava aquilo cada vez mais estranho. Será que ela era a espiã de Arizona ali na empresa? Elas eram muito parecidas, tanto no modo de agir, quanto no modo de se vestirem.
– Eu vivo com uma mulher. - Callie explicou olhando-a nos olhos. - Prefiro voltar logo depois do trabalho. Sei que ela está sempre em casa.
– Te esperando, suponho. Bom, isto explica tudo.
– Pois é.
Jo sorriu cruzando as pernas charmosamente.
– Você acha que a convido para jantar com segundas intenções?
– Não achei. Eu…
Jo voltou a falar sem permitir que Callie continuasse.
– Também tenho uma mulher, Callie. Costumo me sentir só porque ela não vive aqui. Na realidade estávamos em negociação para ver quem iria ceder. Para o meu alívio ela aceitou vir viver comigo. Estamos juntas há dez anos. A gente começa uma relação encantada com o sexo e a excitação do início, mas só o tempo trás a maturidade de um amor verdadeiro. E claro, de um relacionamento sólido. Qualquer dia você vai conhecer a minha mulher. Ela é muito apegada à casa que tem na Itália. Faz muito tempo que vive com essa mulher?
– Seis meses. - Callie deu a resposta calando-se.
– Não quer falar, eu entendo.
– Não é isto. Fico realmente feliz por saber que você é comprometida. Às vezes sinto vontade de conversar com alguém em que possa confiar. Acontece que sobre este assunto, não me sinto confortável para falar.
– Tudo bem. Foi bom conversar com você.
– Também gostei. - Callie sorriu mais relaxada.
– Bom, vou colocar a mão na massa. Com licença!
Sua cabeça fervilhou de ideias o resto do dia. Sabia que estava com a consciência pesada por não ter falado sobre seus sentimentos. Simplesmente não conseguia falar sobre o que sentia por Arizona com ninguém.
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