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História Noroi - Confissões


Escrita por: Natsume-nee

Capítulo 4 - Confissões


Como era esperado, eles brigaram. Mas dessa vez a culpa não fora do amargurado rapaz. Sakura, que às vezes tinha o péssimo hábito de falar antes de pensar, o ofendera profundamente com um comentário sobre como nem a própria família devia gostar da companhia dele. Sasuke, que, por mais que tentasse esconder, era muito emotivo, e odiava que as palavras dela fossem capazes de feri-lo.

Depois de um dia inteiro de tratamento de silêncio, Sakura se deu por vencida.

— Por favor, me desculpe. Eu não tive a intenção de ser cruel.

Mais silêncio foi o que ela ganhou como resposta. Suspirou, desistindo.

— Por favor, majestade. Tenha a  misericórdia de perdoar sua humilde súdita, que não suporta mais não poder ouvir sua majestosa voz.

Sasuke aguentou por cerca de dez segundos. Depois, caiu na gargalhada.

— Por todos os deuses, isso foi tão falso!

— Pelo menos funcionou. E você deveria rir com mais frequência – respondeu a mulher, com um sorriso no rosto.

— Não tenho motivos para isso – disse Sasuke, fechando a cara.

— Você é impossível!

Fizeram uma pausa para comer. Os suprimentos que Sasuke levara consigo logo acabariam, pois ele não estava preparado para sustentar mais uma pessoa em sua viagem. Haviam frutas, um pouco de queijo e alguns pães que, embora tivessem sido feitos pelo melhor cozinheiro do reino, já estavam velhos e não tão apetitosos ao paladar.

— Ei – chamou Sakura, enquanto mastigava seu pão com dificuldade – Sobre aquilo que eu disse antes…

— Não precisa falar nada.

— Desculpe-me, de verdade. Eu falo sem pensar, muitas vezes.

— Está tudo bem – mentiu o rapaz, cortando uma fatia de queijo e entregando para a mulher na sua frente – Eu… Eu sei que também fui rude com você. Peço que perdoe meus maus modos, senhorita.

— Se vamos viajar juntos, devíamos nos dar bem, não concorda?

— Não – respondeu ele, ganhando um olhar furioso que o fez sorrir.

— Vou ignorar suas tentativas de fingir ser grosseiro. Então, por que não me conta sua história?

— Você tem mesmo necessidade de conversar, não é? – suspirou.

— É claro! Vamos viajar por dias, não quero morrer de tédio.

Morrer…

Sasuke, de repente, se lembrou. A poção. Eles estavam viajando juntos, iam se aproximar e ela estaria em perigo. Mas como faria para convencer a moça a tomar aquilo?

— Conte-me a sua história. Dependendo do que tiver nela, eu conto a minha.

— Como assim dependendo?

— Quero saber se você é o tipo de garota que aguentaria ouvir o que eu tenho a dizer – respondeu ele, lançando-lhe o mais charmoso de seus sorrisos.

Sakura, de repente, se tornou muito consciente da região de seu baixo ventre.

— Eu aguento qualquer coisa vinda de você, senhor – disse e foi a vez de Sasuke ficar sem jeito.

— Pois então, o que está esperando?

— Bem, eu nem sei por onde começar – disse ela, sorrindo sem graça.

— Por que não me fala dos seus pais?

— Ah, eu não os conheci. Disseram-me que fui deixada na porta de um mosteiro quando ainda não devia ter nem um mês de vida. O monge que me encontrou se afeiçoou por mim e me acolheu.

— Mas mulheres não são proibidas de entrarem nesses mosteiros? – perguntou Sasuke, verdadeiramente curioso. Observou como os olhos verdes da garota brilharam ao lembrar-se de seu passado.

— Exatamente. Ele sabia que era proibido, mas Yamato não teve coragem de me abandonar. Criou-me como um garoto, sempre alertando para que eu mantivesse uma aparência suja e usasse vestes largas. Eu tinha a cabeça completamente raspada. Os outros monges nunca descobriram. Eram meus amigos. Me educaram e ensinaram todas as coisas que podia, desde matemática até latim.

Sed hoc mirabile est. Latinae linguae difficillimum est.

Quidem. Eles aprendiam a lutar e usar espada, para caso precisassem defender o mosteiro. E me ensinaram a fazer o mesmo.

— Isso é incomum – falou o rapaz, surpreso.

— Nada ali era muito comum, para falar a verdade – disse ela, sorrindo – Mas eu era muito feliz. Muito.

Sakura fez uma pausa e seu rosto se tornou repentinamente triste. Uma suave brisa percorreu o local, agitando a grama e fazendo o cabelo seu cabelo esvoaçar. As sombras das folhas da árvore sob a qual descansavam dançaram no rosto da menina, deixando-a com ares de mistério.

— Essa felicidade não durou muito tempo, eu presumo – falou Sasuke.

— Não, infelizmente. Alguns dias depois do meu sétimo aniversário, houve um acidente. Eu jamais soube o que aconteceu. Um incêndio tomou conta do mosteiro e eu, que estava dormindo em meu quarto, acabei inalando muita fumaça. Acordei no colo de Yamato, que estava ferido e corria pelo local em chamas. Eu me lembro tão bem do calor infernal que fazia… Quase posso senti-lo agora. Ele, enfim, me deixou em segurança e disse que precisava voltar para buscar o máximo de sobreviventes que achasse. Disse-me para esperar por ele numa cabana ali perto.  Eu esperei, Sasuke. Esperei e esperei. Mas no segundo dia, quando ficou óbvio que ele não retornaria, eu fui até o mosteiro. E só encontrei cinzas e destruição. E os corpos de meus antigos amigos. Saí correndo dali, sem rumo.

— Não consigo imaginar como uma criança poderia suportar. Eu sinto muito que tenha passado por isso.

— Ah, acho que fica pior ainda – disse Sakura, com um sorriso azedo – Como não tinha o que comer, e muito menos dinheiro para comprar, eu passei a roubar. Roubava comida, roupas e tudo mais que podia. Fui pega várias vezes e sempre levava surras por isso. Meu rosto era uma verdadeira aquarela de hematomas.

— Tem razão, ficou pior.

— Embora eu ainda parecesse um menino, eventualmente alguns homens descobriram o segredo que eu escondia ao me verem tomar banho num rio. Me ofereceram casa e conforto e eu, muito tola, aceitei. Não demorou muito para que eu percebesse o que eles queriam em troca. No lugar para o qual me levaram, você tinha que dormir com homens de todos os tipos e idades para pagar por sua estadia. Não lhes importava se eu tinha apenas sete anos. Quando descobri isso, eu fugi dali para o mais longe que pude. Um dia, quando mal podia caminhar de tanta fome que sentia, eu encontrei dois meninos brigando. Ao me meter entre eles acabei conhecendo a mulher que seria minha nova mãe. Ela gerencia um orfanato e, graças aos deuses, me acolheu. Os meninos que encontrei se tornaram meus irmãos. Eu devo tudo à essas três pessoas.

— Uau – suspirou o rapaz, chocado. Quem olhava para aquele rosto de bebê não imaginaria nunca uma história dessa magnitude.

— É, uau mesmo. Mas então, majestade. Minha história é sombria o suficiente para eu merecer saber a sua? - zombou.

— Sua história é terrível, de fato. Mas pelo menos teve um final feliz. Nem isso eu tive.

A moça olho-o por um longo tempo. Que segredos se escondiam por trás daqueles belos olhos negros? Por um momento, preocupou-se. Seria aquele rapaz uma pessoa ruim? Cruel? Por detrás de toda aquela pose de grosseria e antipatia, estaria um coração pervertido?

O momento passou assim que Sasuke se virou para ela com um meio sorriso. Um sorriso que era capaz de aquecê-la de um modo como ela não gostava de admitir. Não, nenhuma pessoa perversa sorria daquela maneira. O coração dele era bondoso, não puro, mas bondoso, ela tinha certeza.

— Bom, senhorita. Se deseja conhecer minha história, é melhor que tome isso – disse, entregando-lhe uma garrafa de metal com formato quadrado.

— O que é isso?

— Vinho. Ande logo, beba. Vai lhe dar energia. O caminho que temos de fazer é muito cansativo, como bem sabe.

Sem hesitar, ela bebeu tudo, de uma vez. Sentiu superficialmente o gosto do álcool na bebida. Havia um outro sabor singular que se sobressaia. Era doce e forte, muito forte. Ardia-lhe a garganta.

— Essa safra é uma porcaria. Esperava que um rei tivesse acesso à bebidas melhores – resmungou ela.

— Seu paladar de plebéia é que não está acostumado à sabores refinados.

É claro que aquele sabor incomum era fruto da poção contra o infortúnio que Sasuke habilmente colocara na bebida. Esperava que ela não notasse o sabor, mas, por medo, usara uma dose forte demais. Ao menos ela está segura.

Desfizeram o pequeno acampamento e se preparam para voltar à estrada. Enquanto montava em seu cavalo, o rapaz se pegou pensando na história de Sakura. Ele a admirou por ter sobrevivido à tudo aquilo e ainda ser, e essa parte ele jamais admitiria, uma pessoa tão encantadora.

O suave barulho dos cascos dos cavalos preencheram o silêncio por algum tempo, até…

— Bom, tudo começou…

— Oh! Ele fala!

— Se você tentasse ser menos irritante, eu agradeceria muito.

— O sujo falando do mal lavado – resmungou Sakura.

— Como eu ia dizendo – falou, e lançou um olhar ácido para a mulher à sua direita – tudo começou com meu pai. Ele era um homem rico e muito ganancioso. Um dia, ele fez um pacto com um demônio chamado Madara. Meu pai, que era tão tolo como era rico, queria ser rei…

— Então você é um impostor? - soltou Sakura.

— Vou fingir que não ouvi tamanha besteira. Madara disse-lhe que o preço do tal pacto seria a vida de meu pai. Ele achava que era capaz de derrotar o demônio antes que ele visse cobrar o preço. Pois bem, meu pai se tornou rei e o dia do pagamento chegou. É claro que meu pai se recusou se sacrificar. O demônio então acho uma maneira peculiar de cobrar seu preço… Ele matou minha mãe e lançou uma maldição, que dizia que meu pai estaria destinado a ser infeliz para sempre. Todos que o conhecessem o desprezariam e os poucos que conseguissem gostar dele, seriam tão desafortunados que acabariam morrendo pelas mãos do destino.

— Isso é horrível! Como ele conseguiu viver dessa maneira?

Sasuke riu, mas não havia nenhum traço de humor ali..

— Oh, ele não sobreviveu. A maldição teve a mim como alvo e por culpa minha. Eu, uma criança que ainda mal sabia andar, fui correndo para os braços de meu pai e o feitiço acertou em mim. Logo após isso, meu pai se matou. Fui criado pelo meu irmão que, para não morrer, tem que tomar todos os dias uma poção feita pelos sacerdotes do templo de nosso reino que evita que a má sorte caia sobre ele.

— Eu… Eu não sei o que dizer.

— Ora, mas isso é um milagre. Quem diria que uma história trágica era capaz de calar-lhe a boca. Se eu soubesse, tinha contado antes.

Ogro insuportável - disse ela, revirando os olhos. Mas era tudo encenação. No fundo estava horrorizada com o que Sasuke estava lhe contando.

— Aí está a velha Sakura que eu mal conheço e mal suporto - provocou ele – Enfim, eu sempre soube de tudo isso. Cresci sabendo que era amaldiçoado e que era um peso para meu irmão, embora ele negasse veementemente. Quando fiz dezoito anos, saí das asas do meu irmão e comecei a viajar por aí, sem rumo, quase igual a você.

— Só que você era rico e tinha o que comer.

— É, eu era mesmo. Um dia eu encontrei um rei idiota e velho que precisava de ajuda para proteger o próprio reino de um basilisco. É claro que eu consegui matar ele sozinho e o velho ficou grato. Por algum tempo vivi com ele, e éramos amigos. Mas a maldição não demoraria muito a cumprir seu papel. Algum tempo depois ele morreu e me fez seu herdeiro, por gratidão. E aqui estou eu, hoje, regente de um reino que não é verdadeiramente meu e que me detesta.

— Puxa…

— Está perturbada? – perguntou Sasuke, estranhamente presunçoso.

— Estou decepcionada. Seria uma história incrível se você soubesse contar direito. Sua narrativa é péssima, majestade.

Aquele era seu jeito natural de tentar fazer as coisas melhorarem usando seu bom humor. Sasuke percebeu e passou a olhá-la de uma maneira que nem sabia explicar.

— Sasuke? – chamou ela.

— Sim?

— O que eu te disse antes, a minha história, eu nunca contei a ninguém. Não tudo. Obrigada por ser um bom ouvinte… Eu precisava falar sobre isso.

— Não há de quê. Eu também nunca contei minha história antes… Mas você é uma péssima ouvinte.

Sakura sorriu.

Após passarem num pequeno vilarejo para comprar seus suprimentos, os dois jovens seguiram viagem, conversando quase amigavelmente.

Aos poucos iam se acostumando um com o outro, apesar do mau humor de Sasuke irritar Sakura constantemente. Era estranho para eles estar tão confortáveis na presença de alguém que conheciam há poucos dias.

Quando acharam uma pequena clareira, ideal para dormir, montaram acampamento e trataram dos cavalos. Enquanto guardava suas coisas, a moça olhou para suas armas e teve uma ideia curiosa.

— Ei! – chamou Sakura – Você sabe usar espada, não é?

— Isso é óbvio.

— Treina comigo – disse, sacando sua espada que refletia o brilho das chamas da fogueira que fizeram.

— Fora de cogitação.

— Por que? Está com medo de perder para mim? Não se preocupe, eu não vou zombar… Muito.

— Não quero ferir um rostinho tão bonito – respondeu Sasuke.

— Você não conseguiria encostar sequer um dedo em mim.

Sasuke bufou. Aquela menina era realmente teimosa. Mas ele podia muito bem lhe ensinar uma lição.

— Quero que se lembre que foi você quem pediu por isso.

Num minuto, ele pegou sua espada e atacou Sakura que, apesar de surpresa, reagiu na mesma hora. Ouviu-se o áspero barulho das duas armas se encontrando. Afastaram-se um do outro e começaram a planejar o próximo ataque. Sakura investiu e Sasuke bloqueou seu ataque com perfeição. Ela tentou encontrar uma abertura em sua posição mas era impossível com ele dando fortes investidas.

Embora Sasuke fosse mais forte, Sakura era mais leve e mais rápida. A luta estava equiparada. Aproveitando-se de um momento de distração dele, ela fingiu fazer um ataque circular com a cabeça de Sasuke como alvo. Enquanto ele preparava-se para se defender, ela mudou a direção do golpe e tentou atacar o lado direito do tronco dele. Sasuke custou a bloquear o ataque.

Sakura ficou confiante. Atacava cada vez mais rápido e via com prazer o rapaz ser capaz de apenas desviar dos seus ataques. Estavam ambos suados. Ela tentou jogar a espada em direção ao pescoço dele mas Sasuke se abaixou e rolou no chão por trás dela. O golpe de Sakura atingiu o chão com força. Rapidamente, Sasuke se levantou e antes ela se virasse, prendeu o corpo dela ao seu e pressionou levemente seu pescoço contra a lâmina afiada. Estavam ofegantes.

Quando ela largou sua espada, declarando derrota, ele substituiu o metal por sua mão, agarrando o pescoço dela delicadamente.

— Pensei que eu não fosse capaz de sequer encostar um dedo em você – sussurrou no ouvido dela, enquanto arranhava levemente a pele suada — Diga-me, isso é tocar o bastante para você?

— Tudo bem, você venceu – disse ela, tentando não demonstrar que os arrepios que as unhas dele causavam estavam perturbando-na.

Satisfeito, Sasuke soltou-a. Quando preparava-se para guardar sua arma, viu pela visão periférica um vulto rosa se mexer. Num ímpeto, Sakura pegou sua arma do chão e partiu para cima dele. O rapaz defendeu-se rapidamente, mas golpeou forte demais. A espada passou pela defesa de Sakura e foi direto até sua mão, cortando-lhe a palma. A menina gemeu raivosamente.

— Sakura! Você é maluca? Eu poderia ter arrancado seu braço! – gritou ele, preocupado. A maldita poção deveria estar fazendo efeito!

— Não precisa ficar assim todo exaltado. Estou bem – respondeu ela, escondendo a mão no bolso.

— Deixa eu ver como isso está.

— Desnecessário, eu já disse que estou bem.

— Anda logo.

— Não.

— Porra, Sakura – rosnou, puxando o braço dela com força.

Mas quando olhou para sua mão, não havia nada. Nem sequer um arranhão, nenhuma gota de sangue, nada. Como era possível? Ele tinha visto a lâmina abrir um rasgo na pele alva! A mão feminina estava tão imaculada quanto antes de começarem a lutar.

— Como eu disse, estou bem – sibilou ela, saindo do aperto da mão dele.

Sasuke estava abismado. Ele tinha visto o sangue, tinha visto a carne ferida. Estaria delirando em sua paranóia?

— O primeiro turno é seu – disse Sakura, indo dormir enfezada.

O rapaz não entendeu porque ela reagiu assim, mas ponderou que devia ser pelo fato dele tê-la segurado à força.

As horas se passaram. O suave crepitar da fogueira e o ocasional pio de uma coruja eram as únicas coisas que preenchiam o silêncio na clareira. Sasuke lia um livro que trouxera consigo do castelo de seu irmão. Não gostava de admitir, mas sentia saudades dele.

Quando percebeu que era a hora da mudança de turno, ele levantou-se para acordá-la. E então parou. O suave ressonar de Sakura mal era audível e seu rosto estava tranquilo como o de uma criança. Estava tendo um doce e profundo sonho. Às vezes até sorria minimamente. Ele não se mexeu. Era como se Sasuke estivesse hipnotizado pelo ir e vir de sua respiração.

Antes que pudesse se condenar pelo que fazia, ajoelhou-se ao seu lado, e se sentiu tentado a tirar os cabelos que caiam no belo rosto dela. Quando tocou os fios, pode sentir que eram muito macios.

Estava para tocar-lhe a bochecha quando algo chamou sua atenção. Uma mancha vermelha aqui, outra ali… A parte lateral da blusa da mulher estava salpicada de manchas de sangue.


Notas Finais


Espero que gostem!
Beijinhos.


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