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História Nothing - 4


Escrita por: myblacktea

Capítulo 4 - 4


- Alô? – ouviu a voz confusa do outro lado da linha.

- Oi, vó. – sorriu, o celular apertado entre a orelha e a parede fria.

- Lauren? – perguntou retórica. – Não era pra estar se preparando?

- A senhora ta assistindo?

- É lógico que estou assistindo! – pareceu ofendida. – Que tipo de avó pensa que sou?

- Desculpa, ainda não caiu a ficha de que faço parte de algo tão grande. – riu fraco.

- Grande é sua bandinha. – continuou óbvia. – Esse show é gigantesco.

- Obrigada por amenizar meu nervosismo. – ironizou. – Isso que dá eu realmente achar que te ligar é a solução.

- Menos, por favor, Lauren Michelle. – riu pelo nariz, estragando o teatro perfeito e Lauren sentiu os olhos marejarem. – Diga, o que lhe aflige?

Respirou fundo, olhando para cima e segurando a vontade de chorar que a possibilidade de estragar a maquiagem já feita só intensificou.

- Muita coisa. – admitiu, sentindo o peito abrir com a sinceridade finalmente falada. – Tanta coisa que chega a doer

- E aonde dói?

- Minha cabeça – fechou os olhos. –, pernas, braços... coração.

- A América não é burra, Lauren. – tentou consolar. – Qualquer pessoa que consiga escutar vai votar em vocês. Na verdade, até as surdas, se não foram cegas também.

Tentou controlar o eco que a risada refletia no banheiro.

- Não é só isso. – confidenciou. – Digo, não é só a competição.

- O que é, então?

Pegou o ar, mas sentiu que morreria antes de pronunciar as palavras certas. Queria ser direta pelo menos uma vez na vida. Estava cansada de dar voltas dentro da própria mente e isso deixava-a ainda mais exausta quando se tratava de precisar escolher palavras.

- Saudade. – consolou-se ao saber não ser mentira.

A tão eloqüente Lauren, invejada pela habilidade de expressão, se pegava constantemente presa dentro das próprias conclusões precipitadas.

A linha continuava silenciosa.

- Vó?

- Estou esperando.

- Esperando o que?

- Você dizer o resto.

O fato de não conseguir retirar o que diz a apavorava. Os conceitos de presente, passado, futuro e tempo no geral a davam mais medo ao apagar a luz do que a sensação de uma mão sobrenatural puxando seu pé se não o cobrisse. Não conseguir voltar no tempo e desfazer – ou até mesmo fazer – algo, era sua trava.

- Não agüento mais viver dentro da minha cabeça, vó. – espremeu a voz no soluço contido.

Não queria que a avó percebesse seu estado deplorável.

Pensava que quando batesse no limite, conseguiria finalmente responder em voz alta, clara e honesta todas as perguntas, mas sabia que essa atitude de esperar era exatamente como adiar uma tarefa. Deixava para amanhã, sendo confortada pela oportunidade e alivio momentâneo de adiar a decisão. Esperava seus pés sentirem o fim, sendo confortada pela sensação de que o veredicto ainda não era necessário – porque se ainda tinha o que nadar quer dizer que não estava em seu pior – e o alivio momentâneo se sobressaia por cima da carga extra que, conseqüentemente, aceitava carregar. Porém, não precisava pensar muito para descobrir que não existia fundo nesse poço. Talvez nem a morte fosse o fim.

- Mas isso é tão fácil de resolver. – a melodia da voz calma e carinhosa acalmou as lágrimas que ameaçavam se juntar as poucas já escorridas.

- Ah, é? – riu pelo nariz, desejando ser capaz de acreditar.

- É só sair dela. Saía da sua cabeça e o problema está resolvido. – solucionou. – Bem, esse problema está resolvido. Porque ai dentro é um problema e fora é outro.

Lauren não evitou o sorriso que saiu triste ao confirmar, mais uma vez, que ouvir sua avó era como ouvir a si próprio.

Sentiu-se mal por não contar exatamente o que acontecia e a sensação misturou com a saudade em precisar desligar.

- Obrigada, vó. – agradeceu, voltando a sentir a sinceridade bruta que a confortou. – De verdade.

- Nem vou responder. – voltou ao tom de voz irônico de sempre. – Agora preciso desligar. Minha neta vai aparecer na televisão e não posso perder.

- A senhora é muito abusada. – riu.

- Pelo menos agora sei da onde você puxou isso, então. – riu de volta. – Só não vai tropeçar e cair pro mundo todo ver, ok?

- Meu Deus – levantou, limpando os caminhos já secos das lágrimas. – Eu realmente deveria ter desligado na primeira piada.

- Eu te amo, Lauren. – despediu-se. – Deus te abençoe.

Assentiu mesmo sabendo que ninguém a viu, ouvindo a respiração da avó até a linha ficar muda.

Uma chama se acendeu no peito e verdadeiramente sentiu o calor aquecer seu corpo ao assistir os próprios movimentos no espelho, ao sair da cabine.

- Aqui, ela ta aqui! – Normani gritou, a agarrando pelos ombros. – Não se some nessas horas, sabia?

- Sabia. – sorriu largo e a expressão confusa da amiga a fez considerar sorrir ainda mais, se aquela fosse a recompensa. – Desculpe.

- O que aconteceu? – atropelou.

- Minha vó. – respondeu e Normani pareceu entender, ainda que a expressão perdurasse.

- Achou? – a cabeça de Camila apareceu na porta. – Ótimo, porque ta na hora.

- Já? – a Kordei virou-se apressada. – Ainda não passei batom! Camila, me beija!

- Não me tente. – a cubana rebateu.

Dentro de sua cabeça aquilo não tinha graça nenhuma, mas fora sim.

Teria sido uma brincadeira comum onde Lauren ignoraria e o mundo seguiria no fluxo normal, mas Camila não conseguiu esconder o ligeiro choque ao ouvir.

Virou-se na direção do som, flagrando o riso fraco sair dos sempre convidativos lábios de Lauren.

Pegou suas perguntas no ar, guardando antes de tornarem-se sonoras. Não conhecia Lauren por tanto tempo, mas não demorou a perceber seu jeito fechado e solitário de ser, e forçá-la só faria aquele sorriso – por mais que tímido – desaparecer. E Camila só tinha a intenção de aproveitá-lo.

- Jauregui! – Lauren ouviu e virou-se para a voz jovem. – Boa sorte.

Sorriu largo para o rapaz que acenava.

- Pra você também, Stromberg.

Normani chegou atrasada na fila indiana para entra no palco e Lauren fechou os olhos verdes.

Saía da sua cabeça e o problema está resolvido. – repetiu, ignorando qual seria o problema fora.

 

A única coisa que queria fazer era dormir uma noite pesada, tentando abstrair a ansiedade do resultado de amanhã. Talvez a leveza das palavras de sua avó refletiu na disposição de tentar e realmente considerou aceitar o convite das amigas, quando decidiram comer fora.

Se estava disposta a tentar, a chave para conseguir era começar a agir. Resolveu não pensar muito nas possibilidades de resposta, aceitando com um “claro” no final e assistindo as amigas tentarem esconder os olhares perdidos nos poucos segundos de silencio logo disfarçados.

O sorriso animado de Camila não tinha um único vestígio de surpresa e Lauren não evitou corresponder. Aceitar sua mão no caminho para o hotel e não soltar mais foi um reflexo que Lauren ignorou o significado, mesmo sabendo das conseqüências em seu peito.

E sentiu-se bem. Muito bem.

Ally sentou no colo de Dinah no banco de trás enquanto Normani tomou o lugar do passageiro e Lauren permaneceu quieta diante da infinita discussão gritada sobre onde de fato iriam.

Camila falava tão alto quanto Dinah e Normani, e Lauren precisou soltar sua mão expressiva que dançava cada palavra pronunciada, enquanto Ally só levantava a voz para realmente conseguir ser ouvida.

Tentaram passar a decisão para as mãos de Lauren, já que fazia algum tempo que não participava das poucas saídas do grupo, mas Dinah a interrompeu antes mesmo de pensar e a gritaria no carro recomeçou, arrancando mais uma risada de Lauren.

Consideraram tantos lugares que a mãe de Normani se irritou e parou no nome mais perto que conseguiu captar na conversa, estabelecendo o horário que voltaria e saindo.

- Queria comer algo salgado. – Normani reclamou enquanto seguiam para a doceria de decoração vintage.

- Se a gente fosse a uma pizzaria, eu provavelmente só comeria doce. – Dinah admitiu.

Normani segurou a porta para a fila entrar.

- Só quero comer, na verdade. – ouviu Camila atrás e sentiu o toque das mãos em sua cintura.

O coração apertou, uma corrente fria – que estava acostumada repreender – espalhando-se por suas veias.

Era um toque tão normal. Nem se lembrava mais das situações mais alheias em que de repente sentia os dedos da cubana em seu quadril, mas hoje sua mentalidade não podia deixar de se atingir. Afinal, se estava ignorando a mente, só restava ouvir o coração.

Ally pulou no vidro que separava os doces e Normani pareceu esquecer sua insatisfação.

- Meu Deus... e agora? – Dinah perdeu o chão. – Estou no paraíso?

Lauren balançou a cabeça, assistindo a cena decepcionada consigo mesmo ao cogitar a possibilidade delas agirem diferente em publico.

Esperou Camila a soltar, mas só sentiu as mãos movendo para sua barriga.

As únicas testemunhas eram os poucos funcionários que daqui a pouco fechariam o estabelecimento e um casal sentado na ultima mesa escondida. A sensação de liberdade, mesmo sabendo ser momentânea, foi muito maior que qualquer lembrete que a fizesse desistir.

Apoiou as costas em seu peito, sendo prontamente amparada pelos braços que firmaram o aperto.

- O que vai querer? – ouviu a voz assoprada.

- Provavelmente um cookie ice cream sandwich. – deu de ombros. – Ou cheesecake.

- Ou os dois.

- Ou os dois. – repetiu com graça.

- Sabe que até elas escolherem já vai ser, literalmente, a hora de voltar pro hotel, certo? – perguntou retórica.

- Claro. – respondeu óbvia. – Quer pedir e sentar?

- Escolhe uma mesa que eu pego.

- Ok. – concordou, mas nenhuma das duas se moveu.

Se as coisas já estavam subliminares com Lauren evitando, agora sabia que as chances de se arrepender eram quase certas.

Mas era um toque comum. Já dormiram abraçadas e Lauren nunca sentiu – ou se permitiu sentir – essa queimação no peito. Não tinha nada de errado naquilo.

Notou o som baixo do violão caindo do teto ao sentir o sutil balançar de Camila, reconhecendo a melodia folk de Ho Hey.

- Já escolheram? – Normani perguntou com uma expressão que Lauren não conseguiu decifrar, depois de uma pausa quase imperceptível ao observar a bolha que ambas estavam presas.

- Sim. – respondeu. – E vocês?

- Ainda não. – falou simples. – Podem ir sentando.

Encaixou os dedos nos de Camila pelas costas da mão antes de sair do abraço, começando a puxar para as mesas.

- Vou pedir os doces. – Camila sorriu largo, tentando se firmar no lugar.

- A Mani pede pra gente.

- A Mani ta aqui do lado – Normani fingiu-se de indignada, falando de si mesmo na terceira pessoa. – e não é escrava de ninguém.

- É rapidinho. – a cubana prometeu e Lauren revirou os olhos ao soltar o contato quente.

Escolheu uma das mesas com sofá de canto, em duvida se sentava de frente para a provável conversa sussurrada de Camila e Normani que sua mente – sem prova alguma – imaginou ou de costas, ignorando as hipóteses conspiratórias que insistiam em cercar o comportamento de todos ao seu redor.

Ajeitou a saia ao encarar a o estofado azul claro que casava perfeitamente com os quadros de gatos personalizados, fingindo não ver o casal que também abstraia o barulho que Camila agora participava.

A música mudou e chegou a conclusão de que realmente gostava desse lugar.

- Alguém pediu cookie ice cream sandwich? – Camila cantarolou erguendo os dois pratos sobre a cabeça.

- O que pegou pra você?

- Cheesecake. – sentou pesadamente, colando sua coxa nas de Lauren. – Assim a gente divide e não viramos uma bola tão grande.

- Que bom, porque engordar nesse nível não está nos meus planos.

- Engordar nunca está nos planos. – corrigiu, mas não parecia ligar para as palavras, preparando a colher antes mesmo de Lauren pensar em alcançar um dos pequenos cookies recheados.

Abaixou a cabeça com o riso fraco.

- Precisa aprender sentar direito quando estiver usando saia curta, Camz. – comentou achando ainda mais graça da situação.

- Mas ninguém ta vendo. – apontou para os lados, a boca cheia.

- Não importa. – abaixou o babado, ajeitando-o nas pernas da amiga. – Tem que acostumar.

- Você deveria estar me agradecendo por usar essa saia.

- Você que deveria me agradecer por te dar de presente. – deixou a mão escorregar do tecido para a coxa bronzeada.

O um segundo da reação a sua frente foi o bastante para sentir o peso do arrependimento ser derrubado bruscamente nos ombros como café quente em uma camisa branca. Assistiu os olhos de Camila se perderem, colando na mesa ao evitar qualquer contato. Os movimentos pareciam congelados com a surpresa da leve caricia que, por instinto, o polegar de Lauren dedilhava.

Culpou-se por não pensar. Culpou-se por dar uma chance para a resposta vaga que a avó deu para sua pergunta ainda mais abstrata. As coisas nunca mudariam e continuaria a se sabotar, perdendo o ar entre as próprias lágrimas ao encostar a cabeça no travesseiro.

E no segundo seguinte seu pensamento foi cortado pelo estado alerta da própria atenção, focando Camila limpar a garganta como se tivesse engasgado e continuar o caminho da colher para o prato ainda mais naturalmente que antes.

- Sempre tenho esse sonho estranho – começou, a voz em seu tom normal de animação e os olhos de volta nos verdes. – em que estou com o Bob Esponja e, nunca lembro exatamente o que estamos fazendo, mas ele literalmente abre uma porta da areia do nada. Daí, de lá, sai umas aranhas e que parecem vigiar um hambúrguer, ou algo assim. – Lauren piscou para o silencio, ainda sem palavras.

Estava confusa demais para tentar interpretar o breve momento em que Camila se desligou. A evidente hesitação em todos os aspectos a fez pensar que talvez tivesse ido longe de mais.

Olhou para baixo ao sentir a mão livre de Camila abraçando a sua. Relaxou instantaneamente ao perceber o toque estranho dos dedos rígidos e tensos na pele macia, tentando mascarar a experiência completa vivenciada em menos de três segundos.

- Estranho, não é? – finalizou e Lauren ergueu os olhos.

- Muito. – respondeu, indecisa se continuava ou não a filosofia que testava.

O sorriso que se abriu em sua frente foi entorpecente. Foi arte.

- Ainda não comeu nada. – a mais nova indagou. – Não paguei pra você deixar o sorvete derreter.

- Se o problema é dinheiro, eu resolvo já. – Lauren sorriu fraco, analisando qual seria a maneira mais casual de sair daquele contato, mas a mera tentativa foi impedida pelo aperto dos dedos que a seguravam. – Preciso da minha mão pra comer.

- Você tem duas.

- Sou destra.

- Eu também.

- Mas você está comendo com a direita.

- E daí?

Lauren piscou para o rosto sério, esperando a brincadeira ser denunciada.

- Sério? – levantou as sobrancelhas e o olhar de interrogação em Camila pareceu ser ensaiado.

Lauren deveria ter prestado atenção no ambiente quieto.

- Chegamos! – Dinah saltou no silencio.

Lauren e Camila pularam, quase batendo a cabeça na assustadora proximidade dos narizes, e Lauren quase se desculpou por estragar a noite do casal que provavelmente só não levantou por educação, já que as risadas altas ecoaram.

- Mais baixo! – repreendeu em um sussurro.

- Ela voltou, pessoal. – Normani sentou ao lado de Dinah, do outro lado da mesa. – Podem ficar mais calmos.

Revirou os olhos e voltou a sentir Camila acalmar a força inconsciente de sua mão. Soltou o desnecessário aperto do reflexo e encostou confortavelmente no sofá, mas não perdeu a firmeza segura na coxa de Camila.

- Do que estavam falando?

- Sonhos. – a cubana respondeu, roubando um dos intocados cookies.

- Nossa, eu tive um muito engraçado ontem. – Ally balançou a colher no ar, começando a narrar algo que Lauren não estava disposta fingir interesse, mas Camila pareceu estar.

Assistiu-a rir mais das partes sem sentido que das propriamente engraçadas enquanto comia e cada uma das garotas contava suas experiências. Não demorou muito para, como sempre, Camila se distrair ao ponto de esquecer sua prioridade.

Sentiu o calor da mão de Camila deixar a sua, observando a gesticulação de um assunto que não fazia sentido, e o peso da liberdade fez seu coração falhar algumas batidas. Podia se mover agora. Podia escapar com um movimento simples e gracioso.

E percebeu que não ter escolha realmente era mais fácil do que ser livre.

Não se moveu.

E quando, eventualmente, precisou mudar o peso do toque, Camila pareceu lembrar-se do porquê se policiava para não dizer coisas que seu cérebro necessitasse de gestos na explicação e a mão voou para a de Lauren novamente, como reflexo de pegar algo caindo.

- Tudo bem? – Ally perguntou preocupada.

- Sim, sim... – respondeu rápido. – É que... o açúcar me deixar assim mesmo.

A justificativa pareceu fazer sentindo, já que Ally balançou a cabeça e riu.


Notas Finais




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