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História Novembro - Não fale das queimaduras!


Escrita por: Caroli_cunha

Notas do Autor


Oioioi meus linduuus!
Voltei depois de quase uma década kkk não acho bonito, juro '
Dessa vez, trazendo um capítulo para causar mais dúvidas e confusão nessas suas mentes férteis de leitores fieis que são! Muahaha
Espero que gostem
Divirtam-se!

Capítulo 46 - Não fale das queimaduras!


Fanfic / Fanfiction Novembro - Não fale das queimaduras!

Sentia-me faminto, não conseguia me lembrar da última vez que comi. Abri os olhos e vi, no fim do corredor, uma porta de madeira branca e fraca. Através dela, eu podia ouvir sons, mas não conseguia identifica-los. Então, larguei o molho de chaves sobre uma mesa de canto e fui me aproximando. Sentia meu coração acelerado, meu corpo tremia de medo do que poderia encontrar atrás da porta e, no fundo, eu já podia imaginar o que era. Não queria ver, mas precisava, sentia como se um magnetismo me puxasse para lá.

Até que cheguei bem próximo dela e parei. Respirei bem fundo e senti algo pesar em minhas narinas, uma dor no peito, minha boca seca.

 Abri e encontrei o que fazia barulho.

Reconheci muito rapidamente o corpo amolecido e suado de Spencer, debruçado sobre a escrivaninha do nosso quarto, as calças jeans mantinham-se presas um pouco acima dos joelhos apenas pelas pernas estarem separadas, as impedindo de descerem livremente até os pés. Tais pernas, roliças quase sem pelos, como de um pré-adolescente, tremiam e se contorciam na tentativa miseravelmente falha de fugir.

Algo me impedia esse tempo todo de ver seu rosto, mas quando consegui, vi sua boca amordaçada por um pano, os olhos denotavam pavor, entre lágrimas, suor e gritos desesperados.

Aqueles gritos falhados, roucos pelo esforço junto às últimas mudanças hormonais da puberdade, as arfadas e gemidos trêmulos de cansaço, as tosses de engasgamento por pressão da mordaça, todos aqueles sons ecoavam repetidamente na minha mente. Tudo era muito nítido e real.

Subi pelos quadris frenéticos do maldito, passando pela camisa amarrotada que cobria suas nádegas, com os botões abertos, exibindo um peito magro e cabeludo, escorrendo um suor tão forte que eu podia sentir o cheiro ocre e quente daquele animal. As mãos finas, mas fortes, agarravam a pequena cintura à sua frente, enquanto ele arremetia o corpo contra o de Spencer. Os movimentos eram intensos, com ódio, como se quisesse arrebentá-lo, sacudindo a escrivaninha e a fazendo se chocar contra a parede.

Aquele som de madeira contra o concreto também soava muito nítido na minha mente.

Mas o rosto, esse eu não podia ver, algo me impedia de enxergar se realmente era o professor de artes ou qualquer outro canalha. Mas não importa, eu ia matá-lo de qualquer forma. Impulsionado pelo horror e ódio, tentei adentrar o cenário, mas uma força me mantinha atrás da risca imaginária entre o piso do quarto e o do corredor.

Aquilo me deu uma sensação tão ruim, que comecei a gritar e me forçar a entrar, eu tinha que estar ali, tinha que fazer alguma coisa. Minha vontade era de socar sua cara até desfigurar, de enforca-lo até o último suspiro. Meu Deus, por que eu tinha que ser tão imprestável num momento como esse?!

Despertei num solavanco, olhei rapidamente para os lados, me levantando agitado. Olhei de volta para a cama e vi Spencer sentado sobre os calcanhares, me olhando assustado e intrigado. No impulso, agarrei-o pelos braços, mas não violentamente, dessa vez queria saber se estava tudo bem, embora estivesse o assustando mais ainda.

— Spencer, você tá bem?! Você está legal?! — Resmunguei, com o maxilar travado pelo desespero, ele ficou me olhando com dois olhos arregalados, me segurando pelos braços também.

Parei e respirei. De novo esse sonho bizarro.

— Amor? Você está acordado? — Estranhou, eu o apertei como se quisesse ter certeza de que ele estava ali, em carne e osso.

— Você está bem? Alguém te machucou?! — Perguntei, ainda meio fora de mim, e ele nada respondeu.

Praticamente caí sentado na cama, exausto após tamanho susto. Ele se atreveu a tocar meu ombro desnudo, me induzindo a deitar. Nem tinha noção do tempo, mas creio que ainda fosse madrugada, pois ele tinha uma cara de sono, os cabelos bagunçados e ainda usava o pijama.

— Spen, por que estava gritando? Alguém te machucou? — Continuei insistindo, e ele me tratando como se eu estivesse sonâmbulo.

— Não, eu tô legal! Você só sonhou, volte a dormir!

Não voltei, não fui capaz. Aquela aberração em forma de sonho perturbou minha mente o resto da noite e durante o dia também. Já ele, me abraçou e caiu num sono profundo que só terminou às seis horas da manhã, quando era hora de recomeçar toda a rotina.

Enquanto transitava pelo quarto, se arrumando com o uniforme do trabalho, eu o seguia com os olhos por todos os cantos que ia. Sentia-me cansado, tão poucas horas de sono eram insuficientes para mim, porém quando fechava os olhos, via aquela cena e não conseguia me manter nos eixos.

Então, ele se sentou na cama, com um espelho na mão e ficou arrumando os cabelos e as sobrancelhas e os cílios e sei lá mais o que, ultimamente andava mais vaidoso do que antes, e isso também estava se tornando mais uma pulga atrás da minha orelha. Até que, através do espelho, me viu o observando, deitado atrás de si. Os olhos cor de mel sorriram para mim, mas eu não esbocei reação, então ele me olhou por cima do ombro.

— Que foi, amor? — Perguntou, desmanchando aquele sorrisinho simpático e substituindo por um olhar de preocupação, de cuidado para comigo. — Te acordei, né?

— Não... Estou com insônia. — Suspirei desanimado, ele ficou um tempo olhando para mim, depois virou e continuou se arrumando.

— Amanhã eu tô de folga, o restaurante vai fechar esse sábado... O que você acha da gente fazer alguma coisa juntos?

Nossa, finalmente se lembrou de mim. Sorri levemente e assenti, vendo as covinhas se formarem em suas bochechas corpulentas, num sorriso sapeca com os lábios pressionados para dentro da boca, dançando com o pescoço. Nem ânimo de brincar eu tive, estava impressionado, traumatizado eu diria.

— Bom, já que você não vai dormir agora, levanta e toma café comigo? — Convidou, e eu fui.

Tentei fazer o café, mas ele disse que queria fazer para mim, então fui pôr a mesa enquanto ele terminava. Sentamo-nos um de frente para o outro e comemos, ele contando um monte de coisas, animado como se nem houvesse acordado tão cedo, e eu monossilábico, cansado, preguiçoso e com a cabeça a mil.

— Rapha, o que houve? Que cara é essa? — Ele se irritou com meu estado, então suspirei e me abri.

— Essa noite não foi boa pra mim... — Ele deu de ombros.

— Desculpa, mas não dava pra fazer nada, cansado como eu estava ontem! Mas prometo que hoje eu te recompenso... — Começou a se justificar, pensando que tinha a ver com sexo e essas coisas, como se fosse obrigação.

— Não, não! Nada disso, não estou chateado com você, foi só... Um sonho ruim que eu tive e isso me deixou meio abalado, sei lá... — Peguei sua mão entre as minhas e beijei carinhosamente.

— Sonho, é? — Estranhou por se tratar de algo incomum entre nós, desde quando eu me abalava com sonho? — Que sonho foi esse, a morte da sua mãe por engasgamento?

Brincou maldosamente, rindo enquanto lambia o dedo com geleia, mas percebeu que a piada não me atingiu então tratou logo de parar com as gracinhas.

— Spencer... Alguma vez já te fizeram algum mal? — Não conseguiria contar a ele, era vergonhoso e horrível.

— Uma vez, minha mãe comprou doce pro Stevie e disse que não comprou pra mim porque eu fui muito malcriado com ela... Daí eu chorei! — Contou sério, mas dessa vez conseguiu me arrancar um riso, rindo também.

— Bem feito! — Provoquei, voltando ao estado deprimido. — Me refiro a situações ruins mesmo, tipo, te machucar, fazer algo contra a sua vontade... Entendeu?

O sorriso foi se tornando desconfortável, sem graça, foi se esvaindo devagar. Ele então piscou, engoliu o suco com certa dificuldade, abaixando o olhar. Era isso, algo ruim havia mesmo acontecido e eu sabia antes do acidente, mas agora tudo vinha à minha mente como sonho e essa perturbação não era à toa, eu sabia.

— Não, nada nunca aconteceu comigo! Eu não tive uma adolescência legal porque eu era o nerd gordo da escola e os seus amigos me zoavam, mas nunca tocaram em mim!

— É, eu andava com muita gente ruim, que nem merecia atenção! — Pensei em Fernando, por exemplo, que um dia fui ingênuo o suficiente em considera-lo melhor amigo. — Mas eu te conheço como ninguém, sei que está mentindo ou omitindo, Spencer! Alguém já te tocou sem sua permissão?

— Não, claro que não!

—Spencer, diga a verdade! — Pedi em tom calmo, mas ele se transformou num piscar de olhos, se tornando muito agitado e irritável.

— Por que diz isso?! Por que quer acabar com o nosso café, puxando esses assuntos idiotas da sua cabeça e dizendo que eu estou mentindo?!

— Spencer, eu não falei isso... — Tentei, mas quando ele explodia, ninguém o acalmava mais.

— Eu não estou mentindo, ninguém me fez esse tipo de maldade, e você não deveria estar tocando nesse assunto logo de manhã! Será que você não pode simplesmente tomar seu café calado?!

— Então, se nada disso aconteceu, de onde vem essa queimadura nas suas costas? — Me arrependi amargamente em ter falado, por um momento esqueci que já havíamos conversado sobre isso e não deu certo.

— Raphael, põe uma coisa nessa sua cabeça: Eu não vou falar com você sobre esse assunto. E fique sabendo que você acabou com o meu dia, que tinha tudo pra dar certo... De novo! — Se levantou como um furacão e foi até o sofá, pegou sua mochila e a pendurou nos ombros, pendurando o avental das aulas de pintura na alça da mochila. — Quer saber? Esquece o que eu falei sobre sábado, eu vou pra casa da minha mãe!

E saiu furioso pela porta, não me dando tempo nem sequer de pedir desculpas pelo inconveniente. Mas pensem, se “nada” aconteceu, por que diabos ele ficou tão ferido com uma simples pergunta?

Ás vezes, só as vezes, me dá saudade da minha vida de solteiro, viu...

Durante o dia, mandei um monte de mensagens pedindo mil perdões, dizendo que eu não devia ter “acabado” com seu café da manhã, que ele estava certo em ficar irritado, enfim, tudo o que eu nunca faria, como Renee havia me ensinado. Ele visualizou todas e não respondeu nenhuma.

Poxa, logo agora que eu ia ser recompensado mais tarde...

Bem, já que eu estava novamente de mal com meu namorado, tratei de cuidar da minha vida. Organizei a casa, brinquei com Dólar, descobri a senha do meu antigo Facebook e conversei com meus colegas, que há muito não via, até encontrei algumas mensagens dos meus “contatinhos” que se Spencer visse, cortaria meu pescoço fora. Fiquei um tempo olhando minhas fotos antes do acidente.

Eu era bonito, forte, imponente. Meus cabelos não eram como agora, pareciam mais claros, mais vivos e eram mais compridos, meu sorriso era mais alegre, meu físico era de um verdadeiro atleta, eu não faltava ao futebol nem ao clube de natação.

Também compartilhava muita besteira, que hoje não faria igual, como o caso de postar foto de mulher seminua montada numa moto, por exemplo. Ou dar selinho na boca do amigo “hétero” e postar com um textão de feliz aniversário, bancando o machão.

Fotos em baladas, as melhores de toda a metrópole, eu tinha aos montes. Sempre bebendo e curtindo com grupos de amigos, cada um diferente do outro, o que me deixava deprimido em saber que antes eu era cativante e popular, e hoje sou o antissocial. De repente, uma mensagem apareceu no canto da tela, “Bruna Cavalcante”.

Ela respondia meu “oi” com “ oiiieeee sumidoooooo ”. Nunca entendi a necessidade de tanta repetição de letras. Ela perguntava se eu estava melhor, curado, então sabia do que aconteceu. Desenrolei a conversa por horas com essa moça, que por sinal era tão bonita agora quanto na época em que postou uma homenagem a mim, no meu aniversário de vinte anos. Uma beleza leve, natural, os cabelos longos e lisos, cor de chocolate, um olhar forte com um par de sobrancelhas marcantes, dona de lábios arredondados e rosados. Muito bonita mesmo.

Imagino se mamãe iria querer um neto dela.

Pensei, inclusive, em perguntar como foi meu acidente, o que exatamente aconteceu, já que eu ainda não me lembrava e meus pais não gostavam de falar sobre. Porém, depois do sequestro que sofri ao confiar em supostos “amigos”, preferi não confiar tanto assim nela. Papai sempre me ensinou que as mulheres são dádivas de Deus e que são delicadas e inofensivas, mas a verdade é que maldade e sacanagem não escolhem sexo nem gênero. Melhor não arriscar.

Horas depois e nada de Spencer me responder, mandei mais mensagens me desculpando por algo que eu nem tinha culpa, e ele foi frio o suficiente para visualizar tudo e mostrar que estava ali, mas não me respondeu nada pois pouco lhe importa o que eu penso ou não. Sinceramente, assim não dava pra ficar, estava muito ruim, piorando a cada dia.

Resolvi pedir ajuda a pessoa que talvez teria conselhos certos para me dar. Renee? Não, meu pai.

Sim, ele é velho e casado com uma das mulheres mais difíceis que conheço. Quem teria mais experiência para me ensinar?

Chegando à casa dos meus pais, Francisca me atendeu animada como sempre e já foi me empurrando para dentro, dizendo que mamãe estava desaparecida em mais um daqueles tratamentos de beleza, papai estava lendo jornal, sentado no jardim de inverno. Eles haviam contratado mais uma empregada doméstica, trocado os pisos da sala e a pintura das paredes por algo mais moderno.

Enfim, segui de encontro com meu velho, sendo recebido com muito carinho, diferente de quando mamãe estava por perto. Papai, no fundo, detestava quando mamãe e eu estávamos juntos pois era só briga e desentendimento, e o coitado ficava no meio, tentando apaziguar.

— E aí, pai? Como anda a sobrevivência na selva? — Zombei e ele conteve o riso, balançando a cabeça.

— Sua mãe e eu vamos muito bem, filho, graças a Deus! E você, como está? — Cruzou a perna e folheou a página do jornal.

— Na verdade... Não vou bem, pai!

— Por que não, filhão! — Mesmo que preocupado, evitava me olhar, distraído com a leitura.

— Ahm... Tô um pouco deprimido ultimamente, pai! — Ele me olhou por cima dos óculos de leitura. — Estou sentindo falta da minha vida antiga, sabe?

— Ah filho... Mas falta do que? Da faculdade? Se quiser, o pai volta a pagar suas mensalidades! — Se ofereceu de bom grado, tranquilo como é.

— N-não sei bem se é isso. — Ele apenas aguardou eu me explicar, ainda sem me dar tanta atenção quanto eu gostaria. — Pai, olha aqui! Meus músculos não crescem, eu to perdendo cabelo, minha cara tá cheia de espinha em plena idade adulta, pai! Eu não sou o mesmo... — Lamentei, e ele deu um risinho meigo.

— Fala pra sua mãe te emprestar uns cremes, quem sabe resolve...

— Pai, leva a sério!

— Raphael, músculo não significa nada! Você precisa começar a se preocupar com o que realmente é importante, que são suas experiências, seus conhecimentos, meu filho! Você já é um homem, não tem mais tempo para bobagens como essa, precisa focar na sua carreira, no seu desenvolvimento pessoal! Você está muito sossegado, está deixando o tempo passar!

Okay, esperava ouvir essas cosias de qualquer pessoa, menos de papai. Foi como despejar um balde d’água fria nas minhas costas.

— Sossegado, eu?! — Ele continuou lendo. — Pai, eu... Eu nem durmo mais, não tenho paz pra nada! Você não sabe, mas eu estou fazendo terapia com psicólogo!

— Nunca vi ninguém sair da lama passando com psicólogo... — Murmurou, torcendo a boca. Igualzinho mamãe, contaminado.

— Pai!... — Ele me olhou com pouca importância. — Eu sou doente, sabia?

— “É” doente?! — Tentou corrigir, mal sabia ele.

— Eu sou ciumento possessivo! — Se é que ele sabia o que isso significava. — Pai, eu quero que você me ajude, o que eu faço pra salvar meu relacionamento?

Ele quase engasgou de surpresa, com um olhar espantado e risonho ao mesmo tempo, ele se virou para mim e ficou um tempo. Devia estar pensando o que dizer, já que em sua cabeça, o certo seria me relacionar com uma mulher, para começo de conversa.

— Você quer “salvar” seu relacionamento?! — Deu ênfase, buscando a seriedade em meu olhar e eu assenti meio envergonhado e triste. — Filho, éhm... Meu Senhor, vocês jovens aparecem com cada ideia que... Não sei nem o que dizer, não esperava receber esse tipo de pergunta tão cedo!

— Spencer e eu estamos nos dando muito mal ultimamente, ele tá me tratando diferente, às vezes até parece que está... Me traindo! — Confessei e o vi disfarçar o desdém.

— Filho, às vezes, nós mesmos temos a solução para nossos próprios problemas, só não queremos enxergar. — Fiquei um tempo calado, olhando para meu pai e o mesmo arqueou as sobrancelhas, como se me perguntasse se havia entendido.

— Mas... O que exatamente você quer dizer com isso, pai? V-você acha que... Eu devo tentar dar um tempo com ele, ou...?!

— Você sabe o que tem que fazer! — Bloqueou o assunto, me dando quase certeza de que mais uma vez me incentivava a romper meu namoro. Sacudiu o jornal para desgrudar a folha, voltando a ler. — Só não aceite migalhas de amor, você é um homem, não um palhaço!



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