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História O Cheiro da Lua - Aceitando o meu Destino


Escrita por: Moyashii

Notas do Autor


Muito obrigada a todos. Eu estou super contente e motivada a escrever cada vez mais.
Agradeço muito aos comentários, adoro quando meus leitores dizem o que realmente pensaram sobre o capítulo!

Boa leitura.

Capítulo 5 - Aceitando o meu Destino



Eu nunca imaginei que iria encontrar um lobo aqui em Fortrest, reparei mais uma vez nele por inteiro. Não era muito grande, mas parecia ser forte e habilidoso, seu sorriso era deslumbrante assim como seu cabelo castanho claro, porém o que mais me chamou a atenção foram seus olhos caramelos e seus lábios carnudos.

- Como eu não consegui sentir seu cheiro antes? 

Foi a pergunta mais curiosa que se formou em minha mente, por isso a escolhi.

- Então o perfume que eu comprei está funcionando. - Triton sorriu. - É uma tática para não ser percebido por outros como nós.

- Mas você também não sabia o que eu era até agora, estou errada?

- Está certa, é que eu ainda não tinha me acostumado com os cheiros da cidade e me confundi com o seu. - ele admitiu. - Eu sabia que tinha algo a mais em você, mas não o que.

- Aliás, por que você não quer ser reconhecido? 

Minha parte humana dizia que eu estava fazendo perguntas demais e que era melhor parar agora para não se envolver mais; porém a minha parte loba queria muito descobrir o que esse lobo poderia ser pra mim.

- Vim aqui à trabalho. - ele assentiu e depois suspirou. - Eu preciso deter o louco que vem matando essas pessoas.

- Então você tem certeza que de ele é um lobo? - soltei os joelhos e ajeitei-me em pernas de índio.

- Exato. - ele olhou para cima. - E você... Como descobriu que ele é um lobo?

- Eu não descobri.. Eu deduzi depois que minha amiga me disse umas coisas. - olhei para o céu.

Respirei fundo sentindo mais uma vez o cheiro do perfume de Triton, era algo forte e másculo - devia ser para enganar qualquer um - forcei meu nariz a captar outro aroma: o cheiro de nozes que ele mesmo exalava.

- O que ela te disse? 

Voltei a me concentrar na conversa e o olhei, ele estava me observando com muita atenção.

- Ela disse que os dois corpos foram achados com uma única mordida no pescoço. - olhei para as minhas mãos, vendo como elas eram pequenas. - Ela acredita que foi um lobo e já pensou em como matar um... Não que ela vá ter sucesso.

- Por que você acha que ela não teria sucesso? - ele deu uma risadinha.

- Ela disse que vai usar uma faca e só. - lambi os lábios pois eles estavam secos, deve ser por causa do nervosismo.

- Ela sozinha e uma faca, realmente, não tem chance nenhuma contra um de nós e muito menos contra um lobo assassino. - de repente ele parou de sorrir. - Porém se muitos fizeram como ela... Teremos um sério problema.

- Você acha que uma cidade pequena como Fortrest colocaria nossa espécie em perigo?

Estalei os dedos ciente do meu nervosismo... Agora que eu havia aceitado tudo isso, não poderia deixar acabar desse jeito.

- Eu acho que seria possível. - ele parou de me observar e ficou olhando a água parada do lago. - Mas eu estou aqui para impedir isso.

- Você veio sozinho? - indaguei.

- Sim, por quê?

- Bom.. Sei lá, achei que seria mais seguro se você tivesse um parceiro. - falei enquanto observava algumas flores que estavam nascendo perto do lago.

- Não se preocupe. - ele sorriu.

Um raio de sol iluminou seu rosto e eu senti meu coração acelerar, ele era lindo. Eu me perguntei como eu não havia reparado antes.

- Além de que se eu tiver problemas, posso recorrer a sua ajuda. - ele disse.

- Mas você não sabia que uma loba morava aqui, sabia? - parei de olhá-lo, mas ainda estava corada.

- Não sabia. - ele riu. - E pela sua reação... Suponho que você pretenda me ajudar.

- Claro. - foi minha vez de rir. - Esse cara vem e faz sujeira no meu lar, não vai ficar barato. - cruzei os braços.

- Interessante. - ele comentou. - Aceito sua ajuda.

Mostrei-lhe a língua e ele deu uma risada alta. Quando ele parou de rir, eu criei coragem para dizer algo que eu achava que, agora, só ele poderia me ajudar.

- Você se transforma quando quer, certo? 

- Sim... Depois dos três anos, mais ou menos, nós aprendemos a nos 
transformar. - ele levantou uma sobrancelha.

Maravilha. Eu sou a loba mais sem controle que poderia existir.

- Então eu tenho um problema e bem grave. - mordi o lábio.

Eu não precisei dizer mais nada, Triton estava me encarando com cara de surpresa.

- Puxa vida... Você tem transformações inesperadas.

- É... - assenti. - E são inesperadas mesmo... Acredite.

- Alguém já viu?

- Não, mas não vai demorar muito até que alguém veja.

- Mas você já conseguiu se controlar antes. - ele afirmou. - Porque se não, você já teria sido morta pelos caçadores ou minha alcateia teria conhecimento sobre você e teria mandado alguém para ajudá-la.

- Quando eu era pequena, eu conseguia me controlar e também não sentia tanta vontade de me transformar. - expliquei. - Mas quando eu fiz quinze anos eu decidi parar de me transformar e fiquei dez anos com esse controle.

Arrisquei uma olhada em sua direção, eu não sabia se ele estava bravo ou muito preocupado.

- E você perdeu esse controle recentemente, certo? - a voz dele era suave.

- Quando minha tia morreu, eu perdi a capacidade de me controlar. - segurei as lágrimas, não iria chorar na frente de um cara que eu acabei de conhecer. - Na verdade, até pouco tempo atrás eu odiava ser quem eu era...

- Eu posso te ajudar. - ele comentou. - Posso te ajudar a se controlar novamente, mas para isso você precisa saber as coisas boas de ser como nós.

Fitei-o com uma cara curiosa, ele percebeu e sorriu.

- Podemos começar hoje mesmo. 

- Mas você não tem que investigar o assassino? - perguntei, um pouco corada por pensar em passar mais tempo com ele.
- Já investiguei, ele só ataca durante à noite. - explicou. - Então ainda temos umas horinhas, topa?
- Claro!
Fazia muito tempo que eu não sorria desse jeito, eu até senti meus caninos um pouco afiados.

*

Sem perder tempo, Triton foi comigo até em casa para que eu pudesse pegar uma mochila com uma troca de roupa. Depois, voltamos a floresta e deixamos nossas malas dentro de uma caverna, achei interessante o fato de ele sempre ter uma troca de roupa na mochila.

Agora estávamos em pé na frente da caverna.

- Você não consegue controlar a transformação que vem por extinto, mas consegue se transformar por sua vontade? - ele perguntou, percebi que ele me observava.

- Não sei.. Eu nunca tentei. - admiti.

- Bom... Melhor você tentar. 

- A dor me faz recuar. - disse bem baixo, mas eu sabia que ele escutaria.

- Olha, eu tenho um truque para doer bem menos. - ele deu um pequeno sorriso. - Na hora em que for se transformar tente pensar no que você mais gosta quando é um lobo. - ele explicou. - Isso ameniza a dor e depois quando você for mais experiente vai doer menos ainda, porque você já vai ter se acostumado.

- Quantos anos você tem? - perguntei depois de me convencer de sua explicação.

- Duzentos e quinze. - ele afirmou. - E pelas minhas contas e suas informações.. Você deve ter vinte e cinco, certo? Logo, você ainda não parou de envelhecer, por isso dói um pouquinho mais.

- Como é parar de envelhecer?

- Estranho no começo, mas você se acostuma e até começa a gostar. - ele suspirou e me encarou. - Você está tentando me enrolar?

- Acho que meu psicológico está. - virei-me de costas e entrei na caverna. - Estou indo tentar o que você falou.. Ah, e se doer do mesmo jeito, eu vou te morder, então se prepare. - entrei na caverna e ouvi sua risada alta.

*

Não doeu tanto como antes e só foi preciso mentalizar que eu era uma loba correndo livre pela floresta. Assim que saí da caverna, Triton já me esperava na forma de lobo, era médio e castanho claro. Suas roupas estavam dobradas e foram colocadas do lado da entrada da caverna. 

Ele estava deitado, mas abriu os olhos assim que me viu, fitei seus olhos caramelos que de certa forma eram diferentes dos de Bryan.

Ele se levantou, caminhou até mim e mordiscou minha orelha em um gesto de aprovação. Balancei a cabeça, escondendo a vergonha. Depois, ele se virou e me deu um sinal com a cabeça para que eu o acompanhasse, senti-me agitada por dentro, eu adorava correr. 

Assim que começamos, mantivemos um ritmo rápido e constante, enquanto minha mente viajava com todas as sensações que a floresta me proporcionava, minhas patas pisavam com vontade na terra, meus olhos se mantinham em frente, minhas narinas não deixavam nenhum cheiro escapar, minhas orelhas atentas a qualquer ruído e meu pelo sentindo o vento que me mostrava que eu era livre. 

Eu estava tão bobamente feliz, essa sensação de liberdade era ótima... Como eu havia odiado essa outra parte de mim?

Triton parou quando alcançamos o lago, o mesmo em que havíamos conversado mais cedo, parei ao seu lado e percebi como eu era pequena. 

Como ele continuou parado, atrevi-me a chegar mais perto dele, não precisava de muito para que eu sentisse o seu inebriante cheiro de nozes, afastei-me em um pulo para frente e corri até a margem do lago. 

Olhei meu reflexo, nunca tivera feito isso antes, balancei a cabeça e observei meus pelos se mexerem, foi divertido e um pouco bobo. Mostrei meus dentes e notei que meus caninos não eram tão grande como os de Tia Ju, lambi-os, eu estava ficando com fome. 

Abaixei a cabeça e bebi um pouco de água, uma tentativa de me acalmar, depois me sentei e fiquei a espera de Triton fazer algo, não demorou muito e logo ele começou a caminhar na minha direção. Quando chegou ao meu lado, ele continuou nas quatro patas e eu percebi que ele estava sério demais, seu cheiro me dizia que estava preocupado com alguma coisa. 

Ele notou que eu o estava observando, então me empurrou para o lado, fazendo-me cair, levantei rosnando baixinho e pude ver algo parecido com um sorriso em sua boca.

Pulei e lhe dei uma mordiscada no ombro, surpreso, Triton rosnou fingindo ameaça, mas eu não cairia em um truque desses. Ergui a cabeça e dei-lhe as costas, provocando-o. 

Quando ouvi seus passos vindo em minha direção, eu corri para dentro da floresta, pelo menos achava que ali eu poderia fugir dele. 

Entretanto, fui surpreendida com um ataque surpresa e antes que pudesse entender o que acontecera, vi-me deitada de lado encarando uma árvore enquanto Triton segurava meu pescoço ao chão com uma de suas patas e, pela sua expressão, divertia-se com a minha derrota.

Assim que me soltou, grunhi, frustrada por ter perdido tão facilmente. Ele se sentou a minha frente e me encarou por um instante, depois ergueu a cabeça, seu focinho procurava alguma coisa, enquanto vasculhava a área - que era o que eu achava que ele estava fazendo - aproveitei para olhá-lo melhor. 

Ele era maior que a minha tia, seu pelo parecia tão gostoso quanto o dela e eu queria tocá-lo, seus olhos eram caramelos e eu estava fascinada por eles serem tão diferentes dos de Bryan. 
Suas orelhas não paravam de se mexer, ele só podia estar mesmo vasculhando, seu focinho trabalhava rapidamente para identificar ou achar algo; enquanto ele fazia tudo isso, eu só conseguia pensar em uma coisa: não queria me separar dele... Eu estava atraída por essa nova perspectiva de vida que ele me mostrara.

*

Já eram quatro e meia quando olhei em meu celular, havíamos acabado de voltar a forma humana e estávamos sentados dentro da caverna, a mesma onde havia os meus casacos velhos e onde havíamos deixados nossas mochilas. Triton me olhou com uma cara divertida quando viu os casacos amontoados de um lado da caverna.

- Casacos velhos para transformações inesperadas? - ele segurou uma risada.

- Melhor do que andar pelada pela cidade. - retruquei.

- Tem razão. - ele assentiu. - Mas então o que achou de hoje?

Aquela pergunta me pegou de surpresa, eu não sabia como respondê-la, era cedo demais para achar que eu estava gostando ou era tarde demais para admitir?

- Eu acho que gostei. - fui sincera. - Na verdade, acho que pode ser legal. - sorri para mim mesma.

- Isso é bom. - ele sorriu e depois me fitou. - Porém, pela sua carinha, parece que você ainda tem dúvidas.

Ele era o quê? Um bruxo? Mas bruxas não existem, certo? Bom, se criaturas como nós existimos, porque não bruxas, vampiros e zumbis? Balancei a cabeça e ouvi sua risada alta mais uma vez.

- Sim, tenho dúvidas. - comentei. - Só não sei bem quais são elas.

- Você é mesmo muito confusa. - ele parou de me olhar e se concentrou na chuva que começava a cair lá fora. - Quem te treinou?

- Por que acha que alguém me treinou? - a pergunta foi um pouco rude demais.

- Porque não é todo lobo que sabe caçar como você fez. - ele argumentou. - Além de que do jeito que você é complicada, duvido que você tenha aprendido tudo isso sozinha.

Bufei e joguei o peso do corpo para trás, apoiando-me em meus braços que estavam estendidos.

- Minha tia. - respondi com um bico. - Ela me ensinou tudo que sei.

- Qual o nome dela? - perguntou enquanto me observava.

- Judely. - suspirei. - Ela faleceu há pouco tempo.

Abaixei a cabeça e esperei que ele fizesse o que todos faziam e o que eu mais odiava, perguntavam como ela tinha morrido, sentiam dó e tentavam me consolar. Mas ao invés disso, ele deu um leve sorriso e voltou a olhar a chuva, então com uma voz suave e gentil, ele disse:

- É difícil quando perdemos alguém que a gente ama, mas temos que ser fortes para não perder o resto que ainda temos. - passou a mão no cabelo, arrumando um fio que lhe caíra no olho. - Você pode ter até pensado que não lhe restava mais nada, porém você se esqueceu de que você tem os seus amigos e que um dia , com certeza, você encontraria uma alcatéia.

Eu não tinha palavras, mas eu me sentia bem... Leve e tranquila, como se tudo que eu precisasse fosse ouvir esse cara dizer a simples verdade para mim. 

- Você está certo. - consegui dizer, ainda cabisbaixa. - E obrigada. - levantei a cabeça com um sorriso.

Foi rápido, mas eu pude perceber que ele havia corado, bem de leve, mas o suficiente para me fazer feliz.

- Então... Quais eram suas dúvidas mesmo? 

- Bom... Uma delas é meio estranha e eu nunca tive coragem de perguntar a Tia Ju, mas somos considerados lobisomens? - fitei-o, ele estava me encarando com a mesma cara divertida de agora pouco. - O que foi? - corei.

- Desculpe. - ele riu. - É que nunca ninguém me perguntou isso, mas respondendo a sua pergunta... Podemos ser até chamados de lobisomens, mas não acredite em tudo o que te falam sobre esse assunto.

- Eu nunca acreditei em nada. - afirmei. - Mas Judely disse que são três coisas que podem nos matar e uma delas é a bala de prata... Aí eu liguei isso aos lobisomens e, como você mesmo disse, eu sou confusa.

- Logo sua cabeça ficou um caos. 

- Exato.

- Bom.. Sobre as balas é verdade, mas quase todo o resto sobre os lobisomens comparados a nós é mentira. - ele sorriu, peguei-me vidrada em seus dentes brancos. - Por exemplo, não nós transformamos só na lua cheia, apenas ficamos mais fortes e podemos nos transformar quando quisermos.

- Tudo faz sentido agora. - ri.

- Sua risada é muito engraçada. - ele deu um risinho. - E ao mesmo tempo fofa, combina com você.

- Engraçadinho. - mostrei-lhe a língua. - Mas e aí quando você vai me contar mais sobre você? Só falamos sobre a minha vida tediosa.

- Sua ex-vida tediosa. - ele diz. - Porque eu vou te mostrar como é divertido ser como nós.

- Então, parece que hoje foi só uma amostra? - brinquei.

- Só. - ele passou a língua pelos caninos que estavam um pouco a mostra. - Apenas nós transformamos, corremos e caçamos... Nada de mais. 

- Isso é pra você perceber como minha vida era chata. - comentei. - Porque, pra mim, hoje já foi demais. - ri de novo.

Quando parei de rir, vi Triton me observar com um olhar doce, mas eu sabia que dentro desses olhos havia algo mais... Eu me sentia atraída pelo seu olhar, ou era pelo seu corpo todo?

- Mas se você quer tanta assim saber da minha vida... Eu lhe contarei algumas coisas. 

Esperei até que ele começasse a contar a história, demorou mais do que imaginei, mas eu não queria pressioná-lo. Além de que tínhamos bastante tempo, a chuva não parecia que iria ceder logo.

- Morávamos em uma floresta mais ao sul, o clima era bem frio, meus pais que haviam construído a nossa casa. - ele tinha uma expressão serena no rosto. - Minha mãe era linda, ela tinha olhos verdes e o cabelo caramelo, em forma de loba ela era formidável, era mais ágil e mais perceptiva do que meu pai. Ele era um cara engraçado, tinha olhos castanhos e cabelo castanho, era um lobo muito grande e forte... Os dois formavam uma bela dupla.  

Continuei imóvel, sempre atenta a qualquer mudança em sua expressão, eu queria conhecê-lo melhor... Queria saber tudo sobre a nossa espécie e ainda mais sobre ele, eu estava tentada a descobrir seu interior.

- Quanto eu tinha oito anos, alguns caçadores apareceram, minha mãe e eu logo sentimos o cheiro de prata que vinham das suas armas. Foi então que os meus pais me mandaram fugir, mas eu não queria, então, minha mãe me colocou dentro de um esconderijo que havia na árvore de trás da casa e me fez jurar que não faria barulho. 

Seu rosto não mudava e ele continuava observando a chuva, que ainda estava forte.

- Eu ouvi o barulho de roupas se rasgando e senti que ela havia se transformado, a situação estava mais séria do que eu imaginava, depois ouvi o rosnado dos dois e uma luta começou. Por um bom tempo, tudo que eu ouvia eram rosnados, homens gritando, tiros... Foi a primeira vez que senti o cheiro de sangue humano. Mas eu não ligava para isso, tudo que eu queria saber era se meus pais estavam bem.

Sua respiração estava tranquila, assim como sua fisionomia, mas seu cheiro me dizia que havia algo mudando, mesmo que ele não quisesse que eu notasse.

- Eu achava que ia ficar tudo bem... Até que ouvi mais um disparo seguido do grunhido de dor da minha mãe. Naquela hora, eu fechei os olhos com força tentando afastar a verdade, mas o cheiro de sangue e morte me trouxe a realidade. Eles a haviam matado com uma bala de prata no peito. - ele respirou levemente. - Eu sei que depois daquilo, meu pai ficou furioso, eu podia sentir pelo cheiro que ele estava explodindo de raiva. E enquanto eu chorava, ouvi meu pai matar a todos, um por um, até que só sobrou um caçador. 

Fiquei surpresa por ele não ter chorado ou demonstrado dor, e então me lembrei do que ele me dissera mais cedo: “É difícil quando perdemos alguém que a gente ama, mas temos que ser fortes para não perder o resto que ainda temos”.

- Pela respiração do homem, ele devia estar quase morto, mas a respiração de meu pai dizia que ele estava exausto também. Eu quis gritar, só que eu havia feito uma promessa a minha mãe, então me segurei e esperei o que o destino me reservava. E então, ouvi um grito e depois senti o cheiro de sangue do caçador, eu me sentia aliviado por meu pai ter matado todos os caçadores e não demorei muito a sair do esconderijo, forcei a tranca e a abri. 

Inspirei com força, tentando captar tudo a nossa volta, era mais uma coisa que ele havia me ensinado mais cedo... Também me ensinou a entender melhor os cheiros que nos mostram os sentimentos dos outros.

- Quando fui para a frente da casa, vi os corpos dos caçadores e no meio deles o da minha mãe, eu corri e sentei ao seu lado, ela ainda estava quente, mas não respirava e seu coração estava parado. Comecei a chorar e vi meu pai se aproximando, ainda como lobo, meio que tropeçando. Eu sorri ao vê-lo, mas arregalei os olhos ao ver sua condição, ele estava acabado e havia usado todas as suas forças para proteger a mim. Tinha um tiro na perna, outro de raspão no pescoço e um nas costas. Caiu ao meu lado e grunhiu algo como desculpas, então fechou os olhos e aos poucos sua respiração foi diminuindo assim como seu coração ia parando de bater. As balas de prata não nos deixam cicatrizar, logo acabamos morrendo como se fossemos lobos normais baleados. 

Ele podia não estar chorando, mas eu estava quase “abrindo o berreiro” por ouvir sua história, e imaginava como havia sido difícil para ele.

- Eu não sei quanto tempo eu fiquei ali, chorando, mas quando eu finalmente consegui me recompor, eu lembro que no começo eu sentia ódio e até queria vingança, mas todas as noites eu tinha sonhos com meus pais e eles sempre me diziam que eu não deveria me vingar, que eu deveria seguir em frente e cuidar da vida que eles haviam me proporcionado. Então, depois de semanas lutando contra meus sonhos e tudo o mais, eu decidi seguir em frente e recomeçar a minha vida. 

Eu devia estar olhando surpresa para ele, porque quando ele me observou soltou um risinho.

- Sei que é um pouco estranho um garoto de oito anos viver sozinho e ainda estar vivo, ainda mais naquela época que os caçadores estavam querendo acabar com a nossa espécie. - ele respirou fundo. - Ainda bem que eles acham que estamos extintos.

- Eu nem sei o que dizer.

- Não precisa dizer nada e quer saber, me senti um pouco melhor por ter contado isso a você. - ele me observou com atenção. - Por que será?

Talvez você esteja atraído por mim assim como eu estou por você. Enrubesci, mas não foi o suficiente para que ele percebesse.

- Demorou muito para que você encontrasse uma alcateia? - perguntei com um pouco de receio.

- Encontrei a Lorena quando eu tinha trinta e alguma coisa. - ele afirmou. - Aí ela me convenceu a se juntar a alcateia dela, que agora é minha também.

Ficamos em silêncio por um tempo e eu fiquei imaginando como seria ter uma alcatéia.

- Deve ser legal. - falei baixinho.

- Ter uma alcateia? - ele sorriu. - É muito bom... É bem parecida com uma família. Você vai gostar, se quiser posso te levar até nosso líder, não acho que ele iria negar a sua entrada.

Será que meus olhos estavam brilhando, porque eu me sentia tão animada que meu corpo estava eufórico. Eu não respondi, apenas sorri e então ouvi sua risada alta.

- Você é especial mesmo. - ele me fitou com intensidade. - Parece que o tempo em que eu ficar aqui será muito divertido.

Senti minhas bochechas esquentarem, mas eu estava tão contente por o ter conhecido que nem me importei. Algo dentro de mim estava quente, era a felicidade de poder ter uma família de novo? Ou a sensação maravilhosa de atração que esse garoto-lobo me proporcionava? 

Na verdade, eu não queria pensar nisso agora, dei de ombros e me levantei, era hora de fazer o trabalho duro do dia, e finalmente a chuva estava dando uma trégua.


Notas Finais


Espero que tenham gostado.

E o Triton ainda me pertence. Aliás, queria saber o que vocês acharam da história do Triton?


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