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História O Demônio de Londres - Capítulo Único


Escrita por: TitocasMesquita

Capítulo 1 - Capítulo Único


♞ Titocas Mesquita♞

O Demônio de Londres

Capítulo único – Mary, a virgem

 

A banheira estava cheia de água quente, coberta por pétalas de rosas e essência de banho. Exalava um maravilhoso perfume, embaçando as janelas e os espelhos do cômodo. Minha criada ajudou-me com o roupão, tirando-o com delicadeza do meu corpo. Logo mais eu a dispensei, queria enrolar mais que o normal no banho.

Fechei os olhos e mergulhei o rosto na banheira, tendo a única imagem que tomava conta de minha mente um par de olhos azuis, tão claros quanto o céu em uma manhã de verão. Eu não sabia quem era a dona daqueles olhos azuis, mas era uma imagem que me atormentava há dias. Eu estava fascinada com tamanha perfeição, questionando-me se a minha mente estava começando a inventar coisas ou se eu até mesmo havia caído em algum encanto.

A sequência de fatos era sempre a mesma. Primeiramente o fascínio, mas logo vinha o arrependimento.

Emergi a minha cabeça e abri os olhos, respirando profundamente. Esfreguei a esponja por toda a extensão do meu corpo, tentando desviar aqueles pensamentos e pedindo perdão mentalmente. Chamei por minha criada, que lavou a minha cabeça e perguntou sobre o meu humor, alegando que eu estava pálida como quem tinha acabado de ver um fantasma.

- Quem dera fosse... – respondi, encolhendo-me na banheira.

Charlotte, minha criada, talvez fosse a pessoa que melhor compreendia o meu ser, conhecendo até mesmo o pior dos meus pecados. Este que partilhávamos em comum e que causara várias cicatrizes em minha serva. Este que nem ousávamos comentar com outras pessoas, ela era a única que sabia sobre mim e, desde que fora deserdada, eu era a única que sabia sobre ela.

- Eu ainda sonho com aqueles olhos azuis. – sussurrei, enquanto Charlotte me enrolava no roupão novamente.

Charlotte já estava com os seus quarenta e poucos anos, era uma mulher cheia de experiência, tanto como dona de casa como curandeira. Era cheia de manhas e caprichos, sempre encontrando saída para as mais complicadas situações. Eu não podia negar que até mesmo possuía certa beleza, seria sem sombra de dúvidas uma esposa excêntrica. Porém, de nada adiantava essas grandes qualidades se não serviriam de algo, afinal, o passado de Charlotte a condenava.

Após ter sido vista tendo relações com outra mulher e devido ao seu vasto conhecimento em relação ao corpo humano e medicinas, rumores surgiram e ela foi acusada de praticar bruxaria. Seu vilarejo inteiro pôs-se contra ela, que foi presa e torturada, conseguindo fugir por uma brecha horas antes do previsto para ir para a fogueira. Passou meses fugindo, esses meses que viraram anos. E então, quando estava longe o suficiente para não ser reconhecida, conseguiu a confiança dos meus pais quando curou uma doença de minha mãe que era até então, incurável.

Minha criada trancou a porta do quarto assim quando entramos.

- É possível estar apaixonada por alguém que só se vê nos sonhos? – minha voz era baixa, quase inaudível.

- Ahh... Jovem Mary. – a criada soltou uma risada baixa – A senhorita anda lendo muitos romances, não acha?

- Isso é tudo muito estranho... – me sentei em um banco em frente ao espelho, enquanto o meu longo cabelo loiro respingava no chão de madeira do meu quarto. Com as mãos leves, Charlotte penteava o meu cabelo e o secava com o auxílio de uma toalha. Depois que todos os nós haviam sumido, prendeu toda a extremidade do meu cabelo em alguns rolinhos que formariam cachos quando estivessem totalmente secos.

- Jovem Mary, o que a atormenta? Essa não é a expressão de uma garota apaixonada por um príncipe de seus sonhos.

- Não é um príncipe, Charlotte... – um soluço ficou preso na minha garganta. Abaixei a cabeça, arrependida e me culpando por sentir desejo por outras jovens. Não era correto.

Um longo momento de silêncio seguiu-se então, até que fui amparada pelos braços de minha criada. Naquele momento as nossas posições sociais não importavam, o que importava era apenas o conforto daquele abraço e o misto de compaixão e pena que ela tinha por mim. Suspirei pesadamente, ambas sentíamos muito.

- Vamos senhorita, não pode ficar para baixo logo hoje! A noite se aproxima e com ela o baile de aniversário de sua melhor amiga. Você vai se divertir muito, e quem sabe, não encontrar os tão perfeitos olhos azuis em algum rapaz que te encante? – ela apertou o meu ombro como uma forma de encorajamento, com um sorriso suave e que acalmaria qualquer um. Concordei com a cabeça, sorrindo também. Mas no fundo, nós duas sabíamos que aquilo não passava de uma ilusão.

 

* * *

 

Desci as longas escadas da minha mansão, segurando a barra pesada do vestido. Meu vestido era um misto de branco e cinza, caprichado nas rendas e bordados de flores também cinzas. Meu espartilho estava extremamente apertado, deixando-me com uma silhueta mais bonita que o normal. Chegando à sala principal, meus pais ali me esperavam. Ambos esboçaram um enorme sorriso quando me viram descer.

- Você está linda, minha filha. – minha mãe veio ao meu encontro, recepcionando-me com um abraço e tendo em mãos uma máscara de renda branca – O baile será de máscaras, não podíamos esquecer-nos do detalhe mais importante.

- Obrigada, mãe. – sorri, pegando a máscara de suas mãos e examinando-a. Fui até a maior janela que a sala possuía, como já era noite, servia praticamente como um espelho. Minha pele branca estava com um aspecto corado devido à ajuda de um blush vermelho e meus lábios, com um leve tom de rosa. Amarrei a fita de cetim da máscara atrás de minha cabeça, tomando cuidado para não desmanchar os cachos do meu cabelo que iam até o fim de minha cintura. Só então reparei no lado de fora. Pequenos pontos brancos caíam aos poucos do céu, deixando uma enorme pelúcia nas estradas – Olha, a neve chegou mais cedo esse ano.

- Minha filha... Temo em deixá-la sair sozinha essa noite. – a voz grave de meu pai tomou conta da sala principal – Notícias do Demônio de Londres estão se aproximando da nossa vila cada vez mais. Três jovens de idades entre dezesseis e vinte anos já foram mortas por esse assassino cruel... Prometa-me que não sairá da mansão dos Fraser até o amanhecer, que é quando o cocheiro chegará para buscá-la.

- Você tem a minha palavra, pai. – me aproximei do mesmo, segurando suas duas mãos e sorrindo – Hoje fará um frio sem igual, mais um motivo para eu não sair da mansão. Você e a minha mãe farão uma viagem tranquila até a casa dos meus avós, não precisam se preocupar comigo. – olhei em volta – Bem... É a minha deixa. Desejem-me um bom baile. – sorri, em despedida.

Charlotte veio em minha direção e me ajudou com a minha pesada capa, era também a capa mais aconchegante que eu possuía. Em seu capuz e mangas, pelos de urso branco se faziam presente. Abotoei o único botão da capa e coloquei o capuz, encontrando-me com o frio que a noite fazia.

Dei apenas um passo para fora de casa e de imediato encontrei uma rosa vermelha no meio da neve, era impossível não reparar em sua presença. Sua tonalidade estava mais para o vinho, próximo de sangue. Inclinei-me e segurei a rosa com as duas mãos, tomando cuidado com os espinhos. Era uma das flores mais bonitas que eu já havia visto.

 

* * *

 

O salão principal dos Fraser estava cheio quando cheguei. A música clássica soava alta e as pessoas se divertiam com o ritmo animado, dançando em sincronia com seus pares. Espalhados pelo salão, vários arranjos de flores em vasos formosos e bem decorados. A família não se importava em demonstrar avareza e não economizavam nos pequenos detalhes de ouro e pedras preciosas. Os tapetes, todos importados e também com detalhes em ouro. Levantei a cabeça, os lustres daquele salão eram estonteantes. Era tanto brilho e tanta riqueza que fazia com que eu me sentisse deslocada.

- Mary! – alguém gritou o meu nome. Vir-me-ei e encontrei Elizabeth Fraser correndo em minha direção. Assustei-me com a força do abraço, que quase derrubou nós duas – Finalmente você chegou.

Elizabeth estava boba e alegre, extremamente corada. Seu sorriso fazia-se dos dois cantos de sua face, bonito e com os dentes mais certos que eu já havia visto. O cabelo castanho escuro estava preso em uma belíssima trança, com alguns brilhos espalhados por sua extensão. Minha amiga usava um vestido azul claro e máscara da mesma tonalidade, que combinavam com o seu tom de pele e enalteciam os seus olhos castanhos escuros, que emitiam um brilho gentil e bem-humorado ao me verem. Ri da situação de Elizabeth.

- Você já abusou do álcool? – perguntei, segurando suas duas mãos carinhosamente.

- Eu? Nunca. – ela piscou algumas vezes, acostumando-se com a luz. De repente, lembrou-se de algo e seu sorriso cresceu ainda mais. Elizabeth deu alguns pulinhos e aproximou seus lábios de minha orelha, em um baixo sussurro – Eu apenas bebi duas taças de uísque importado.

- Apenas duas taças? – ri alto – Eu que sou forte para o álcool já teria caído no chão com essa quantidade. Elizabeth, eu sei que é seu aniversário – passei as costas de minha mão em sua bochecha – mas você precisa estar sóbria para atender os seus convidados.

- É meu aniversário... – ela fez um bico, como uma criança mimada.

- Eu sei. É por isso que lhe desejo a melhor noite de todas. – abracei-a novamente – Mas não é vomitando e caindo por aí que você conseguirá isso.

- Você parece os meus pais... Tem sorte de não ser arranjada para algum homem, ter que estar sempre apresentável é um saco. – Elizabeth bateu o pé no chão, mas logo balançou a cabeça e disse que iria curtir aquela noite. Ela me deu um rápido beijo na bochecha e correu para cumprimentar outros convidados. Abaixei a cabeça e ri baixinho, Elizabeth era louca.

Assim que levantei a cabeça novamente, meus olhos acompanharam alguns servos que estavam servindo vinho aos convidados. Sem pensar duas vezes, aceitei a primeira taça e a bebi aos poucos, degustando o sabor doce na medida certa do vinho. Fechei os olhos em satisfação, vinho era a bebida que eu mais tinha prazer em beber. Antes de terminar a primeira taça, eu já pegava a segunda e degustava na mesma intensidade.

Andei pelo salão, cumprimentando as pessoas que eu conhecia e me admirando com a decoração. Fim da segunda taça.

Ao beber a terceira taça, eu já arriscava alguns passos de dança com qualquer cavalheiro que se apresentasse.

Depois da quarta taça, o sono já começava a pesar os meus olhos. Eu também estava um pouco mais alegre que o normal. Parei do lado de um vaso decorado, prestando atenção nas flores que jazia. Brancas, azuis e amarelas.

- São lindas, não? – uma voz feminina me apanhou de surpresa, fazendo com que eu me assustasse. Eu estava deveras distraída, e a minha reação foi a de alguém flagrado fazendo algo de errado – Peço desculpas se a assustei.

- Não eu apenas... – vir-me-ei e por um breve momento, as palavras não encontravam o caminho para a minha boca. A mulher atrás de mim, de aproximadamente vinte e dois anos, usava um elegante vestido vermelho e creme de mangas largas. Sua cintura era fina naturalmente, sem ajuda de nenhum espartilho, e seus seios fartos. Era um corpo de dar inveja. Mas não era aquele detalhe que me encantava.

Sua pele pálida, quase que doentia, entrava em contraste com seus lábios extremamente avermelhados. O cabelo era longo e volumoso, com os cachos mais perfeitos que eu já vira, de tonalidade ruiva. Em seu pescoço, uma gargantilha com um pingente de algum brasão. Por de baixo de sua máscara de festa, seus olhos sublimes.

Azuis como o céu em uma manhã de verão.

Para mim, tão familiares e tão surreais, assustei-me e meu coração falhou uma batida. Eu estava hipnotizada apenas pelo seu olhar. Tal olhar marcante e – a meu ver – sedutor.

- Apenas...? – ela esperou a minha resposta, com um sorriso travesso nos lábios.

- Perdão. Eu... Apenas vendo as flores. – ri do meu nervosismo, era uma reação idiota. A ruiva ainda não havia tirado o sorriso travesso do rosto, o que me deixava ainda mais envergonhada – São mesmo lindas. – desviei o olhar para as flores.

- Você se importa? – ela perguntou, apontando para a minha quinta taça de vinho. Neguei com a cabeça, entregando-a para a garota. Seus lábios entreabertos, o vinho que descia a sua garganta, eu observava todos os seus movimentos com cautela, maravilhada.

Dei-me conta só então que havia bebido mais do que deveria. Eu já estava fora de mim, com desejos e tentações que nunca havia sentido antes.

- Eu me chamo Lena. – finalmente ela disse, cortando o silêncio e o nervosismo que seguia em mim. Então percebi que estava ficando estranho o meu olhar vidrado em seus lábios. Subi o olhar para os seus olhos, péssima ideia.

Havia uma aura em Lena que eu não conseguia explicar. Talvez, fosse humanamente impossível encontrar uma explicação para tal.

- Mary. – respondi, sorrindo de lado.

- Encantada. – ela mordeu o lábio inferior e sorriu logo após.

 

* * *

 

Minha memória já não lembrava quantas taças de vinho eu havia bebido, mas mesmo assim, pelo meu estado, eu sabia que haviam sido muitas. Cada vez mais eu ia abandonando a sensatez.

Sem medida alguma de esforços, eu cedia aos encantos e charmes de Lena.

A cada vez que ela sorria, meu coração acelerava. A música, servos, pessoas dançando pelo salão não importavam mais, era como se nem existissem. Lena, a garota ruiva que estava a centímetros de mim, era a única coisa que prendia a minha atenção. Só a sua presença já fazia com que o baile inteiro valesse a pena. Acabei com mais uma taça de vinho e deixei a taça de lado.

Por um breve momento, uma tontura fez com que eu fechasse os olhos com força e perdesse um pouco o equilíbrio. Uma mão gélida me reteve pelo pulso, fazendo com que eu abrisse os olhos com o toque inesperado. Minha visão estava embaralhada, mas no meio da confusão, os olhos de Lena não estavam perdidos. Concentrei-me neles até que tudo voltasse ao normal.

- Eu não me sinto bem. – sussurrei, encostando-me na parede.

- Eu vejo... – Lena se aproximou de mim. Ela passou levemente as costas de sua mão em minha testa, descendo para a bochecha e enfim, o pescoço, em um ato de aferir a minha temperatura. Soltei o ar dos meus pulmões levemente, eu havia gostado tanto daquele toque e ansiava por mais. Os cantos dos meus lábios se moveram em um sorriso bobo, e como eu ansiava por mais...

Logo percebi que não estávamos sozinhas, ao contrário. Tudo veio à tona de uma vez. As pessoas ao nosso redor, a música alta, a luz forte. Tudo me causou uma forte dor de cabeça e de imediato, tomei um choque de realidade. O quê diabos eu estava fazendo? E se alguém nos visse juntas?

Tudo aquilo era tão errado.

Eu não deveria ceder tão fácil, não deveria alimentar os meus erros e muito menos não devia decepcionar minha família...

- Eu preciso ir. – falei, me afastando de Lena e desencostando da parede – Foi um prazer te conhecer, Lena.

- Mary... O que...? – Lena estava confusa. Assim que eu me virei para deixá-la ali, sua mão voltou a me segurar pelo pulso. Fechei os olhos com força.

- Eu realmente preciso ir... Perdão, Lena. – soltei o meu pulso de sua mão. Seria melhor para nós duas que aquela conversa não se seguisse e ambas não alimentássemos algum tipo de sentimento.

- Você não quer ir. – Lena falou, firme em suas palavras – E também não precisa.

- Lena... Você não entende. – me virei para ela, encarando-a nos olhos. Ela deu dois passos, aproximando-se de mim. A barra do seu vestido estava por cima do meu e eu pensava em recuar, porém, não consegui. A ruiva me fuzilava com os olhos azuis profundos, tendo-me completamente sob o seu controle.

- Eu entendo melhor do que você imagina, Mary. Mas você não pode negar os sinais do seu corpo, se você precisasse mesmo ir, não estaria parada em minha frente. – Lena mantinha o olhar fixo em mim, sem perder a postura – Apenas... Fique um pouco comigo no lado de fora. Você está ardendo em febre, devia tomar um pouco de ar.

- E-eu...

- Não fique tensa... Eu não vou te morder, prometo. – ela olhou em volta e então aproximou-se do meu rosto. Prendi a respiração quando seus lábios roçaram no lóbulo da minha orelha – A menos que você me peça.

Eu ainda estava prendendo a respiração quando ela se afastou e esperou pela minha resposta. Todos os pelos do meu corpo haviam se eriçado com o arrepio que o sussurro causara em mim, eu não deveria ir...

Saindo do salão, eu estaria contrariando os meus pais. O pior de tudo, estaria desonrando a minha palavra. A verdade é que eu não tinha medo de Lena, ao contrário, além de um maravilhoso perfume de flores, ela exalava confiança. Eu sabia que ela não me faria mal. Porém, o que me amedrontava era o sentimento e o fato de não poder levá-lo para frente. Eu não deveria sair, tanto pelo meu bem, quanto pela honra da minha palavra.

Olhei para o relógio que marcava duas da manhã.

- Mary?

- Lena, eu não...

- Por favor. – ela estava mais uma vez séria. Suas mãos seguraram as minhas, quase que implorando a minha saída.

E mais uma vez, eu estava hipnotizada pelo seu olhar, fascinada pelo brilho surreal que eles possuíam. Lena não precisava de muitos esforços para me seduzir e me influenciar. Seria aquilo um feitiço ou era o que as pessoas apaixonadas conseguiam fazer? Mais uma vez, como um encanto, eu cedi. Concordei em sair com Lena.

Não tinha explicação alguma, mas o sorriso travesso dela fez com que eu não achasse mais nada daquilo errado. Não estava incomodada em descumprir a minha palavra para com os meus pais, não estava com medo do sentimento. Apenas queria tirar proveito dos planos que Lena tinha para mim.

Cedi. Ela me tinha em suas mãos.

Contrariei todos os meus instintos no momento em que saímos do salão. Nada mais importava.

O frio intenso penetrou a minha pele, mas eu não estava incomodada. A minha única preocupação era seguir Lena até onde ela queria me levar. A neve, fofa no chão, já conseguia cobrir nossos pés. Coloquei o capuz do meu casaco e estiquei meu braço, num movimento involuntário, entrelaçando os dedos da minha mão com os dedos da mão de Lena. Ela se virou e sorriu, aumentando a velocidade dos passos.

Quando percebi que estávamos correndo para sair do campo de visão dos guardas, comecei a rir, juntamente com Lena. Nossas risadas baixas e os nossos passos eram o único som da noite. A lua estava cheia, iluminando bem o nosso caminho. O céu estrelado era o melhor cenário para aquela noite. Chegamos a uns arbustos bem altos e só então percebi que era a porta de entrada para um labirinto.

Lena soltou a sua mão da minha e correu até a porta do labirinto.

- Você vem? – perguntou, com um sorriso arteiro nos lábios.

Também corri até a porta do labirinto, compreendendo que Lena queria começar um jogo. Ela correu até o fim do lado direito, entrando em alguma das passagens. Corri atrás, encontrando três entradas. Até que notei a neblina da noite, que atrapalhava um pouco a minha visão. Pressenti que Lena havia entrado na passagem do meio e foi para lá que corri, acertando em minha escolha. Através da neblina, vi um vulto ruivo correndo pelo labirinto.

Tentei me guiar pelo som de seus passos, porém, depois de um certo tempo eu me encontrava no imenso silêncio da noite. O único som era o som da minha respiração. Voltei a correr, entrando nas passagens sem pensar em nenhuma estratégia. Talvez estivesse andando em círculos, mas não tinha importância. O álcool não me deixaria fazer uma estratégia lógica de qualquer jeito.

Logo me encontrei sem saída. Na minha frente, um imenso muro repleto de folhas, impedindo-me de seguir. Duas mãos apertaram a minha cintura, me puxando para trás e arrancando um grito de mim. Cai na neve, com Lena logo do meu lado. Começamos a rir.

- Você me assustou. – virei meu corpo para ela, que fez o mesmo.

- Não é a primeira vez nessa noite. – ela mordeu o lábio inferior, analisando-me de cima a baixo. Sem delongas, ela desamarrou a máscara que ainda estava no meu rosto, deixando-a cair na neve – Eu estava ansiosa para vê-la sem essa máscara.

- Posso dizer que eu também estou... – foi a minha vez de desamarrar a máscara do rosto de Lena. Deixei-a cair e se perder na neve do mesmo jeito. Engoli em seco, Lena conseguia ficar ainda mais atraente que antes.

- Gosta do que vê? – seu tom de voz era sexy.

- É humanamente possível? – encarei os seus traços marcantes, eram tão simétricos, atrativos. Sua beleza beirava a perfeição. Passei o meu polegar pelos seus lábios, examinando-os com cobiça. O tom de vermelho que mostravam naquela noite era tentador.

Lena riu quando perguntei se era humanamente possível. Como nas outras duas vezes naquela mesma noite, ela segurou o meu pulso. Percebi que ela o estudava com cuidado, contornando as minhas veias visíveis, logo, depositou um beijo demorado ali. Depois cinco beijos rápidos se seguiram, um em cada ponta dos meus dedos. Sorri de lado, sentindo o meu rosto arder e meus batimentos acelerarem. Ao mesmo tempo em que Lena conseguia me acalmar, ela também conseguia me deixar nervosa.

Lena percebeu a minha expressão e então sorriu. Mas dessa vez, não era um sorriso travesso ou algo do tipo. Percebi então a malícia em sua expressão, fazendo com o que meu nervosismo aumentasse. Mais uma vez, não era medo o que eu sentia. Eu apenas não sabia como seguir, já que nunca tinha feito antes... O nervosismo era inevitável – e, o que ele fazia com o meu corpo também. Fiquei com medo de que Lena pudesse ouvir o meu coração de tão acelerado que estava.

Como se lesse a minha mente, Lena se arrastou para mais perto de mim e antes que eu pudesse pensar em algo, já estava com a cabeça deitada em meu peito. Foi então que fiquei extremamente sem jeito, todo o meu lado orgulhoso já havia sumido. Com o que se seguiu, eu agradeci mentalmente por estar usando a minha anágua mais confortável e menos volumosa e percebi que a de Lena não tinha volume algum também.

Ela ficou por cima de mim, usando uma de suas mãos para segurar os meus pulsos na altura da minha cabeça. Ficou me encarando sem falar nada, me fazendo corar ainda mais. Era como se me medisse, e eu, estava sem reação alguma. Não sabia o que fazer. O lugar que seus olhos mais gostavam de encarar era o meu pescoço.

- Eu tenho todo esse efeito sobre você? – ela sussurrou e nossos rostos estavam tão próximos que eu conseguia sentir o seu hálito quente tocar a minha pele. Neguei com a cabeça – Você diz não... – a ruiva fez uma pequena pausa, chegando até a roçar seus lábios nos meus, levemente – Mas seu corpo diz sim.

Nas vezes que eu tentava me aproveitar da nossa proximidade roubando-lhe um beijo, Lena fugia do meu beijo, como se quisesse me torturar.

- Lena... – sussurrei.

A ruiva partiu para o meu pescoço, dando alguns beijos demorados e leves mordidas. Mordi o lábio inferior, evitando que qualquer som saísse de meus lábios. Eu sentia que ficariam marcas ali e eu teria que me esforçar muito para encontrar uma desculpa razoável para justificar os roxos. Eu estava ficando louca enquanto Lena me provocava. Até que então, um gemido escapou dos meus lábios.

- Eu preciso que você peça, Mary... – ela sussurrou, entre os beijos e mordidas que revezava no meu pescoço.

- L-Lena... – hesitei, sem conseguir ao menos falar algo coerente enquanto beijos eram distribuídos na região do meu pescoço e clavícula – Por favor...

- O que? – ela fez-se de desentendida, sem parar com os beijos.

- Você está me deixando louca... – Lena era exigente e não satisfeita com o que eu havia dito, partiu para o lóbulo da minha orelha – Eu quero que você me beije.

- Apenas te beije? – ela sussurrou, colocando a ponta do seu nariz no meu.

- Ruiva... – abandonei a minha sanidade – Faça-me só sua.

Satisfeita com o convite, Lena mordeu o lábio inferior e passou o polegar frio sobre os meus lábios. Eu já sentia a sua respiração contra o meu rosto antes, porém, estava mais calma naquele momento, me acalmando também. Com uma de suas mãos, ela levantou levemente o meu queixo para que eu a encarasse. Minha respiração falhou quando percebi que aqueles olhos azuis que brilhavam no meio da noite tinham toda atenção voltada para mim. A boca entreaberta de Lena se aproximava da minha e eu não iria resistir, instintivamente fechei os olhos.

Sua língua invadia a minha boca sem nem pedir licença, em meio a um desejo feroz e um amasso desesperado. Lena soltou os meus pulsos, deixando que as minhas mãos ficassem livres. Segurei em sua nuca, em meio ao nosso beijo desajeitado, e com a outra mão percebi que estava fazendo o maior estrago no cabelo de Lena.

- Tem muita roupa aqui... – ela sussurrou, em meio ao beijo.

Apenas concordei com a cabeça, incapaz de falar algo. Mordi o lábio inferior de Lena enquanto nos separávamos, malditas roupas. Levantei-me e em menos de segundos, Lena já havia me colocado sorrateiramente contra uma parede. Meu vestido já estava totalmente caído no chão, sobrando apenas a minha anágua e o apertado espartilho.

As mãos habilidosas de Lena desfaziam os laços do espartilho sem dificuldade alguma, como se já tivesse feito aquilo diversas vezes. Já o meu trabalho estava extremamente facilitado no passo em que Lena não estava usando espartilho. Meu espartilho caiu no chão e então me senti extremamente exposta e envergonhada, Lena era a primeira pessoa que me via naquele estado. Ela riu da minha timidez, alertando-me que a pior parte – o espartilho – já havia passado.

Embaralhei-me na hora de desatar os nós de seu vestido, e Lena me ajudou. Sem demora, ambos dos nossos vestidos já estavam no chão, servindo como nossa cama improvisada. A iluminação da lua sobre a sua pele pálida era a combinação perfeita, exaltando as suas curvas e seios fartos. Por mais incrível que pudesse parecer, o frio não nos atingia naquele momento. Levantei o olhar para os olhos de Lena, que tinham um brilho imensurável de luxúria. Sem medo de cometer esse pecado, puxei-a pela nuca iniciando outro beijo. Porém, dessa vez eu já a conhecia melhor.

Eu brincava com a sua língua, estávamos em perfeita sintonia. Ela acariciava a minha cintura de um jeito delicado, guiando-me para o nosso canto improvisado. Ficando mais uma vez por cima de mim, fazia uma trilha de beijos no meu peito. Gemi baixinho, ela sabia muito bem o que estava fazendo – e como fazê-lo. Minha mente ficou nublada e a única coisa que pensei em fazer foi apertar as minhas pernas envolta da cintura de Lena, sensível ao seu toque.

A Mary da manhã desse mesmo dia já não existia mais.

Os lábios de Lena desciam pela minha barriga, sua feminilidade me deixava louca de desejo.

Seu alvo agora eram as minhas coxas. Depois de rápidos beijos, Lena cravou as unhas em minha pele, causando-me uma ardência. A dor, que deveria me incomodar, me dava prazer. Logo, um líquido viscoso escorria por onde as unhas de Lena haviam cravado. Eu estava tão perdida no prazer que o sangue era apenas um pequeno detalhe. Já ela, limpava a sujeira com a ponta da língua para não derramar.

Ela voltou os seus lábios para os meus, me fazendo sentir o gosto metálico do meu próprio sangue. Selou o nosso beijo com um breve selinho, levando os seus lábios até a minha orelha.

- Você caiu em uma armadilha, Mary. – sussurrou, com a voz sexy – Você gostou da dor, não é? Não vou me importar se você gritar...

Ela estava certa. Eu havia gostado da dor.

Meus olhos entreabertos se focaram no rosto de Lena. A lua cheia atrás de sua cabeça e a neblina da noite eram um perfeito misto, criando um clima sombrio. Os olhos azuis da ruiva brilhavam mais que a própria lua, um brilho que não era humano. Seus caninos se alongaram, em duas presas enormes e no canto dos seus lábios escorria sangue – o meu sangue.

Era uma imagem terrivelmente bela.

Qualquer um teria saído correndo, mas eu não me apavorava. Fechei os meus olhos e deixei que Lena me guiasse.

Seus lábios esbarraram-se nos meus, em um beijo bestial e regado de pecados. Uma de suas mãos descia em direção a minha virilha, até aquele momento era impossível me segurar. Gemidos rebeldes saíam dos meus lábios, era uma sensação maravilhosa. Lena sabia muito bem como me tocar, deixando-me em uma condição de êxtase. Nossas respirações mornas e ofegantes estavam entrelaçadas, um timbre sedutor aos meus ouvidos.

Com um descaso impetuoso, Lena abandonou os meus lábios quando estávamos chegando ao ápice. Naquele minuto, meus gemidos altos ecoavam pela noite. Aproveitando-se do meu convite minutos antes e sem esperar resposta alguma, a besta mordeu o meu pescoço com violência. Senti a pressão dos seus caninos penetrando a minha pele e gritei com a dor, com lágrimas escorrendo dos meus olhos.

Sem demora, a dor cedeu o seu lugar. Uma imensa onda de prazer e adrenalina percorreu por entre as minhas veias, aquecendo o meu corpo e acelerando o meu coração como nunca antes.

Entrei em um estado de transe. Aquela sensação era sobrenatural e eu desfrutava do gozo sem deixar nenhum efeito passar despercebido. A besta que sugava o meu sangue estava focada apenas naquilo e através dos ruídos que ela emitia, eu percebia que o ato era extremamente prazeroso para a criatura.

 

 

A adrenalina virou calmaria.

Eu sentia as minhas extremidades congelarem. Meu líquido vital se esvaia, junto com ele as minhas forças. As portas do inferno se abriam para mim ao passo em que meu corpo ia sucumbindo, fechei os olhos para nunca mais abri-los.



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