A noite estava quente. Christine não conseguia pegar no sono devido a intensa dor nos joelhos esfolados. Ela havia terminado as suas tarefas mais cedo e foi dispensada por Carlotta que preferiu ir para casa mais cedo. Ainda era cedo; o relógio do teatro marcava nove horas em ponto. Christine então resolveu descer até a cozinha para buscar água limpa. No momento em que virou para encher a pequena jarra com água, deparou-se com uma figura sombria vestida de preto e usando uma máscara branca no rosto.
-Eu posso ajudá-la?-disse a figura sombria.
Christine ficou com medo e correu para trás da mesa, apossando-se de uma colher de pau.
-Acalme-se, senhorita..-disse ele com serenidade.-Não precisa ter medo de mim... Não lhe farei mal.
-Quem é você?!
-Sou alguém que vive neste lugar como a senhorita...
-O que você quer de mim?..
-Apenas ajudá-la, nada mais. Estou vendo que está com os joelhos machucados.
-Como sabe disso?
-Não importa. Apenas aceite a minha ajuda. Prometo que não irei machucá-la...
-Como posso confiar em alguém que esconde o rosto?!
-Isso não vem ao caso, senhorita. Apenas não se preocupe com isso e deixe-me cuidar de seus ferimentos.
-Como?
-Eu tenho um estoque de analgésicos e pomadas... Tenho algo aqui que irá ajudar a cicatrizar essas lesões e aliviar a dor.
Ele então mostrou um pequeno pote branco contendo uma espécie de pomada analgésica.
-A senhorita me permite?
Christine hesitou por alguns segundos, mas decidiu arriscar a ajuda. Mas ainda estava amedrontada. Ela então sentou-se em uma cadeira e mostrou os joelhos feridos. O estranho benfeitor aproximou-se dela e ajoelhou-se no chão e começou a aplicar a pomada branca sobre os esfolados dos joelhos.
-Como a senhorita se chama?
-Christine Daaé.
-É a nova criada de madame Carlotta eu suponho..
-Sim.
-Não é de admirar-se que está ferida desta forma...Aquela megera costuma torturar as empregadas com tarefas exaustivas.
-E o que o senhor faz aqui na ópera?
-É uma longa história, minha cara...
Christine o observava atentamente. Estava sendo extremamente gentil e cuidadoso ao aplicar a pomada em seus joelhos. Assim que terminou, levantou-se e disse:
-Pronto...Vai melhorar com este remédio, eu garanto.
-Muito obrigada, monsieur...
-Pode ficar com isso até que seus joelhos melhorem.
Ele entregou o frasco para Christine.
-Obrigada...Porque está me ajudando? Sou apenas uma criada.
-A senhorita é muito mais do que uma simples criada...Eu a ouvi cantar ontem a noite.
-Ouviu?
-Sim...Tem uma voz magnífica, srta. Daaé. Sem dúvida seria a nossa principal estrela da ópera.
-O senhor é muito lisonjeador...Mas isso seria impossível.
-Nada é impossível, minha cara. Principalmente para todos aqueles que sonham.
De repente, ele tirou uma rosa vermelha de dentro da manga do casaco e deu a Christine.
-Tenha uma boa noite, srta. Daaé.
Dito isso, desapareceu rapidamente dali deixando Christine intrigada. Ela lembrou-se do mágico mascarado do circo que havia lhe dado uma rosa vermelha semelhante àquela. Christine então retornou para o sótão. Deitou-se na cama e ficou pensando naquele mascarado misterioso.
Na manhã seguinte, desceu até o refeitório do teatro aonde tomou o café da manhã na companhia de Meg e da sra. Giry.
-Seus joelhos estão melhor?-perguntou Meg.
-Estão sim. Eu tive uma pequena ajuda ontem a noite.
-Ajuda de quem?
-Aconteceu uma coisa estranha ontem...Eu desci até a cozinha para buscar água e vi um homem mascarado na minha frente.
-Que homem era esse?
-Eu não sei. Estava usando uma máscara branca estranha.
-Machucou você?
-Não, pelo contrário...Cuidou dos meus joelhos feridos.
-Será o Fantasma???-Meg murmurou temerosa.
-Não tinha jeito de ser um fantasma, Meg. Era um homem de carne e osso.
-Disseram que o Fantasma pode assumir várias formas físicas. Podia ser ele.
-E você acredita nesses absurdos?
-Joseph Buquet o viu cara a cara e disse que era um ser horripilante. O rosto era tão nefasto quanto o da Morte.
-Para mim foi um completo cavalheiro. Não vi nada de assustador nele. Apenas achei estranho ele usar uma máscara cobrindo o rosto inteiro.
-Mesmo assim você correu perigo, querida.-disse a sra. Giry.-Não sabemos quem é esse homem que ajudou você.
-Ele disse que vive aqui também.
-Aqui? Desde quando? Nós nunca o vimos com esta descrição.
-Talvez seja algum ex-empregado.
-O que mais ele disse?
-Nada. Apenas aplicou a pomada nos meus joelhos e foi embora.
-Tenha cuidado com estranhos, minha querida.
-Eu sei. Meu pai me ensinou.
-Temos que voltar ao trabalho agora. Meg, volte para junto das outras bailarinas...Eu tenho que limpar o camarote de número 5.
-E eu preciso levar o chá para madame Carlotta.
Christine então levantou da mesa e foi preparar o chá de Carlota. Assim que preparou a bandeja, levou até o camarim da diva. Carlotta estava terminando de se maquiar quando Christine entrou carregando seu chá.
-O seu chá, madame...
-Obrigada.
-A senhora deseja mais alguma coisa?
-Não, hoje não. Vou lhe dar o dia de folga.
-Verdade?
-Sim. Você se mostrou muito competente e cuidadosa com meus pertences. Portanto lhe darei o dia de folga. Mas somente hoje.
-Muito obrigada, madame.
-Mas não vá se acostumando...Você ainda terá muito o que fazer por aqui. Volte amanhã de manhã bem cedo e limpe meu quarda-roupas e organize meus figurinos nos cabides.
-Sim, senhora.
-E não se atreva a chegar atrasada. Pode ir agora.
-Com licença.
Christine deixou o camarim sorrindo com profundo alívio. Assim que atravessou o corredor, encontrou Johnny que logo perguntou:
-Bom dia, mademoiselle...vejo que está sorridente...Qual seria o motivo?
-Ganhei o dia de folga.
-A bruxa velha lhe deu uma folga?
-Sim.
-É uma garota de sorte. E o que pretende fazer no dia de hoje?
-Eu não sei. Talvez visitar a sra. Valérius.
-Aproveite o dia de hoje então.
-Obrigada.
Christine então resolveu fazer uma visita para a sra. Valérius. Era uma bela tarde ensolarada de sábado. As ruas estavam movimentadas. Christine aproximou-se da residência da sra. Valérius e bateu na porta. Juliette abriu a porta e sorriu abertamente ao rever sua doce e melhor amiga.
-Christine!!
-Olá, Juliette.
As duas se abraçaram como se fossem duas garotinhas.
-Eu senti tanto a sua falta, Christine...
-Eu também senti a sua, Juliette.
-É ótimo ver você novamente...Entre.
Christine entrou e Juliette fecho a porta.
-Como está a sra. Valérius?
-Está um pouco deprimida por você ter partido para a ópera.
-Mas ela está bem?
-Sim, está...Ela está no quarto repousando um pouco.
-Eu vou até lá.
-Mas não demore. Louise fez aquele bolo de nozes que você adora.
-Eu não vou demorar.
Christine então subiu às escadas e foi até o quarto da sra. Valérius e a viu recostada sobre a cama lendo um livro.
-Com licença, sra. Valérius...
Assim que viu sua pequena Christine, a doce senhora pulou para fora da cama.
-Minha pequena florzinha!!!....
As duas se abraçaram fortemente como se estivessem separadas por muitos anos.
-Como você está, meu anjinho doce?
-Eu estou bem. Melhor agora.
-Oh, minha pequena Christine....Você não imagina o quanto eu sinto a sua falta...
-Eu também sinto a falta da senhora.
-Como está indo o trabalho no teatro? Aquela megera está te tratando bem ou mal?
-Está tudo bem, sra. Valérius...Madame Carlotta me deu o dia de folga hoje.
-Ah sim? Será o fim dos tempos?
As duas riram com ironia.
-É muito bom ver você, minha florzinha de jardim...Você faz muita falta nesta casa.
-Mas a senhora não está sozinha... Louise e Juliette estão aqui.
-Eu sei, mas...eu não estou habituada a ficar tão longe de você. Da minha pequena Christine...Tenho uma coisa para você.
-O que é?
A sra. Valérius entregou um envelope contendo muitas notas em dinheiro para Christine.
-Por que está me dando isso?-perguntou Christine seriamente após olhar o notas dentro do envelope.
-Para você comprar vestidos e sapatos. E outras coisas que desejar.
-Sra. Valérius, eu não posso aceitar... Eu já estou recebendo pelo meu trabalho na ópera....
-Não seja boba, querida. O salário que aquela serpente paga aos empregados não dá nem para comprar um pedaço de pão. Você vai aceitar sim.
-Mas eu não...
-Aceite, por favor. Eu ficarei muito feliz e satisfeita.
Christine suspirou fundo e disse:
-Está bem...Eu vou aceitar.
-Ótimo. Você poderá comprar o que quiser.
-Eu nem saberia por onde começar....
-Comece comprando roupas novas. Você é tão linda que ficaria perfeita em qualquer tipo de vestido.
-Muito obrigada, sra. Valérius.
-Não agradeça, meu bem. Para mim é um prazer enorme.
-Como andam as coisas por aqui?
-Tudo bem na medida do possível. Alfred ficou noivo de uma moça mais jovem do que ele.
-Ah sim? E quem é ela?
-Ainda não a conheço. Apenas sei que tem 31 anos.
-Eu fico feliz pelo Alfred. Sempre foi muito bondoso comigo e com meu pai.
-Camille não está nenhum pouco satisfeita com esta história...É contra o casamento.
-Mas o pai dela merece ser feliz.
-Camille sempre foi muito mimada. Você a conhece bem.
-E quando a senhora irá conhecer a noiva do seu sobrinho?
-Ele prometeu trazê-la na próxima semana.
-E a senhora está feliz?
-Eu estaria mais feliz se você estivesse aqui comigo.
Christine sorriu e recebeu outro abraço da sra. Valérius.
As horas passaram rapidamente naquela tarde. A ópera recebia a visita ilustre do conde Philippe de Chagny que estava no escritório dos administradores.
-O senhor não imagina o quanto estamos satisfeitos com a sua presença, sr. Conde..-Disse Richard exibindo um largo sorriso.
-O prazer é meu, meu caro Richard. Terei muita honra em patrocinar a ópera Garnier.
-A honra será toda nossa, monsieur.-Disse Armand.-Nosso último patrocinador infelizmente sofreu um grave acidente e acabou não sobrevivendo.
-Sim, eu fiquei sabendo da situação. Lorde Fontaine era um bom homem.
-Mas estamos realmente contentes pelo senhor ter assumido o patrocínio de nossa casa de ópera.
-Darei um jantar para comemorar. Assim que meu irmão caçula retornar da Rússia, darei um jantar em comemoração.
-Será uma grande honra, sr. Conde.
Nesse momento, Johnny dialogava com seu amigo mascarado, (o mesmo que ajudara na noite passada), no antigo depósito da ópera abaixo do palco.
-A ópera tem um novo patrocinador.-comentou Johnny.
-Sim, eu vi. É o filho do falecido conde de Chagny. Eu ouvi falar muito deles.
-Quando você trabalhava no circo?
-Eu conheci muitas pessoas importantes, garoto...viajei para muitos lugares da Europa. E aprendi muitas coisas também.
-Sim, você me contou uma vez.
-Preciso perguntar uma coisa...O que você sabe sobre essa moça, a nova criada de Carlotta?
-Quase nada. Não nos falamos muito.
-Ela se chama Christine...
-Sim, isso eu sei. Porque está perguntando sobre ela?
-Eu a ouvi cantar durante uma noite...A voz mais bela e suave que já ouvi na vida.
-Eu não sei nada sobre ela.
-A pobre coitada estava com os joelhos esfolados. Resultado do árduo trabalho que está fazendo limpando o camarim daquela cobra desafinada.
-Hoje ela parecia bem. A megera deu o dia livre de folga para ela.
-Uma bela novidade. Dificilmente Carlotta concede folga aos empregados.
-Pelo menos a pobre poderá descansar durante um dia. Qual seu interesse nessa garota?
-Eu não sei...A voz dela me chamou a atenção. Angelical, sublime, suave...De repente fiquei atraído.
-Tem alguma idéia em mente?
-Por enquanto não. Quero que você descubra mais alguma informação sobre ela. Além da voz, tem algo nela que me é familiar...Não me recordo o que é...Mas eu sinto que já a vi uma vez....
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