- Faz muito tempo que não te vejo. - É a primeira coisa que Leonor diz ao me ver naquela tarde.
A cafeteria onde marcamos de nos encontrar está pouco movimentada, observo a garçonete ruiva caminhar enquanto atende as poucas mesas ocupadas ali.
- Eu sei. - digo, meio trêmula.
Continuo olhando pra qualquer lugar que não seja Leonor sentada a minha frente
- Estou preocupada com você - ela diz e sinto meu estômago embrulhar de culpa
Odeio que as pessoas se preocupem comigo.
- Eu sei. - repito, agora mais firme, mais culpada.
- Seu pai me contou do que tentou fazer... - ela diz baixinho, como se nem pudesse acreditar - Você não tem noção da merda que tentou fazer Maddy? E se seu pai não tivesse entrado no quarto a tempo?? Se você tivesse morrido Maddy!? - ela pergunta, os olhos verdes arregalados em pânico
Leonor e eu nos conhecemos na escola, quando ela entrou eu estava no 1° ano, eu era esquisita, ela também, então decidimos nos juntar e sermos amigas. No último ano que passou, nós nos tornamos muito próximas, mas isso mudou de 7 meses pra cá. Bom, tudo mudou de 7 meses pra cá.
- Mas não morri. - infelizmente - Foi isso que meu pai disse a você? Que ele me encontrou no quarto entupida de remédios!? - questiono sentindo a rotineira raiva pelo meu pai
A verdade é que não tinha sido ele a me encontrar, e sim uma funcionária qualquer lá de casa que invadiu meu quarto e me viu engasgando com o meu próprio vômito, ja que meu pai nem sequer falou comigo nos últimos 6 meses.
- Olha Maddy, sei que você está abalada pela morte da sua mãe... - ela começa a dizer, mas antes de qualquer coisa, eu a interrompo.
- Não quero falar sobre isso Leonor. Não precisa se preocupar comigo, ok? Estou fazendo terapia, e estou tomando alguns remédios, relaxa.
- Tomando remédios!? Mais remédios? - ela pergunta incrédula
- Foram indicados pelo médico, e fica tranquila, são poucos. Está tudo sob controle. - tento sorrir, mas sinto meu rosto esticar como se eu não soubesse mais fazer isso.
Leonor suspira, passa as mãos sobre o cabelo curto loiro e me encara daquele jeito esquisito que apenas ela faz, que te faz ter vontade de se ajoelhar diante dela e pedir perdão.
- Maddy... Eu só... Sinto muito sua falta. - ela diz por fim, e tudo bem, também sinto falta dela, sinto falta de tudo, até mesmo de mim.
- Eu também. - respondo.
*******
O relógio pequeno que ficava ao lado da minha cama marcava 8 horas da noite, o que queria dizer que eu estava ali deitada na cama a um bom tempo. Mas eu não tinha a mínima vontade de me levantar.
O computador estava apoiado nas minhas pernas enquanto eu assistia um documentário sobre algum serial killer que eu fingia estar prestando atenção, quando batidas na porta do quarto interrompem a fala de uma vítima que sobreviveu ao serial killer.
Olho com tédio para a porta e desligo o computador, devagar me levanto e abro a porta, quando me deparo com Dinorá, uma das funcionárias aqui de casa.
- Senhorita Madison, seu pai está a chamando para jantar. - ela diz robótica
- Não sinto fome, diga a ele que não irei. - tento falar o mais educada possível
- Ele insiste senhorita, disse que a sua presença é obrigatória.
Sem muitas opções, assinto e decido acompanhar Dinorá até a sala de jantar onde vejo meu pai sentado bebendo um copo de whisky
Meu pai nunca fez questão da minha presença, não consigo entender o que quer comigo.
Me sento devagar, segurando a vontade de voltar para meu quarto.
Observo Dinorá servir nosso jantar e depois se retirar, o silêncio que se estende é costumeiro, não é novidade não ter assunto com meu pai.
- Não vai comer? - ele pergunta
Ergo o olhar para encara-lo, sentado na ponta da mesa, vestido em suas roupas sociais, sempre elegante, sempre dando ordem, um chefe, um empresário, um líder, nunca um pai.
O lugar ao lado dele, onde mamãe costumava sentar, está vazio, apenas o silêncio que ela deixou.
Se estivesse aqui, ela estaria perguntando sobre a escola, planejando viagens, fazendo planos para começar algum curso ou apenas conversando algo bobo comigo, fazendo tudo parecer mais vivo e feliz, preenchendo o vazio dessa mansão.
- Não sinto fome. - respondo finalmente.
- Pois deveria sentir. - ele rebate, autoritário.
- Não serei uma boa companhia hoje prefiro ir para o meu quarto. - digo já me levantando
- Não. Sente-se aí, quero conversar com você. - ele diz ríspido
Não posso mentir dizendo que não estou curiosa para saber o que ele quer me dizer, mesmo sabendo que as chances de ser algo bom são nulas.
- Sua situação está muito preocupante, Madison. - meu pai diz - Andei pensando em colocá-la em um colégio interno. - ele diz direto, sem rodeios.
- Como é que é!? - pergunto sentindo minhas mãos suarem
- Vou te colocar em um colégio interno. - repete, calmo.
Não se irrita Madison, mantenha calma.
- Mas eu não quero ir. Sinto que não estou pronta para voltar a estudar pai. - digo, tentando não soar tão desesperada como estou.
- Madison, não é uma questão de estar pronta, e sim uma questão de precisar viver. Você está a meses trancada nesse quarto, fazer isso não vai trazer sua mãe de volta, muito menos te ajudar a superar a morte dela. A vezes precisamos sair do nosso cômodo e voltar a viver, mesmo que seja difícil!
- Cômodo? Acha que esse é meu cômodo? Acha que estou satisfeita com a minha vida!? Acha que estou confortável com a minha vida!? Eu perdi a minha mãe! A única pessoa que se importava comigo, diferente de você que sequer sabe meu nome completo!
- Não acho que esteja satisfeita com sua vida Madison! Se estivesse não teria tentado tirá-la. Pra mim também não está sendo fácil! Acha que não dói em mim!? Eu perdi minha mulher! Não é só você que sente falta dela porra! Eu estou tentando Madison, tentando cuidar de você, mesmo não sabendo como! - ele argumenta, agora já alterado.
- Acha que me mandar para um colégio interno vai ser uma forma de cuidar de mim!? - digo, aumentando o tom igual a ele - Você está literalmente se livrando de mim! Me jogando para escanteio, como eu sabia que iria fazer, mas quer saber?! Eu não ligo! Não me importo com isso. Que se foda! - digo me levantando da mesa e indo em direção a porta quando ouço a voz dele novamente
- Você vai na próxima segunda.
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