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História O Herdeiro do Fogo - Vinte e dois


Escrita por: bleedingrainbow e grouwundzero

Capítulo 22 - Vinte e dois


[Eijiro Kirishima]

A cada passo que dava em direção ao castelo, mais bagunçada minha mente ficava, pensamentos inquietos e meu coração pesado. Queria poder largar tudo e voltar correndo para a cabana, passar a noite ou até mesmo morar lá. Abriria mão facilmente de todos os privilégios do castelo se todos os meus dia fossem ser como a tarde de hoje ou como todas as nossas madrugadas de treino, mas agora, já não sabia mais se essas atividades eram divertidas porque eu realmente gostava delas, ou porque gostava de quem me acompanhava. 

Consegui voltar em segurança e sem ser notado para o meu quarto. Ali, sentado na cama e olhando para a janela onde me acostumei a ver um corvo pousado, me perdi em lembranças do almoço de hoje e até mesmo bem anteriores a isso. Pensava em tudo o que já ouvi falar e presenciei a respeito do relacionamento do meu irmão, sem perceber, me colocava na sua situação e por isso ficava profundamente desconfortável ao notar que algumas coisas da sua realidade de apaixonado se aplicavam a mim.

A forma com que ele ficava animado por receber uma carta da amada, como ansiava para vê-la e como a distância o machucava, os momentos felizes que viviam quando se encontravam e como ele fazia de tudo para arrancar um sorriso ou uma risada dela, mesmo que isso significasse fazer brincadeiras bobas e passar vergonha. Tudo isso se aplicava a mim, nunca ouvi meu irmão falar a respeito, mas tenho quase certeza que ele sente a mesma necessidade que eu, a necessidade de contato, mais do que querer, e sim precisar de um abraço ou algo mais, nem que seja um breve toque de mãos na hora de passar a espada. Não é possível que só eu tenha esses impulsos. 

Para qualquer outra pessoa, decifrar esses sentimentos seria muito fácil, mas pra mim não, pelo simples fato de que é impossível que os sentimentos que meu irmão tem pela senhorita Nejire, sejam os mesmos que tenho pelo Bakugo. Talvez aqueles sonhos tenham mexido bem mais com o meu coração do que com o restante do meu corpo.

Antes que pudesse me afundar mais nessa espiral, que não tinha qualquer previsão de chegar a uma conclusão, Denki veio bater em minha porta e me chamar para o jantar. Depois do meu pai, o que mais reinava no salão era o silêncio. Enquanto comia, me surgiu a ideia de falar com o meu irmão… Talvez pôr minhas dúvidas e sentimentos para fora, ao mesmo tempo em que ouvia suas experiências em primeira mão, me ajudasse a organizar toda a bagunça que acontecia dentro de mim. 

O jantar terminou, passamos alguns minutos a mais na mesa quando meu pai decidiu passar mais algumas informações - que não me importo - a respeito do meu aniversário, e então a hora de dormir chegou. Hanta e Denki me ajudaram com os preparativos e assim que se retiraram, me distraí por alguns minutos, apenas olhando pela janela, na direção da casa do Bakugo e me perguntando o que ele estaria fazendo agora. Pelas luzes apagadas, provavelmente já se deitou. Depois de espairecer um pouco com o ar fresco da noite, tomei coragem e fui até o quarto do meu irmão.

Engoli em seco e bati na porta.

— Está tudo bem? Aconteceu alguma coisa? Ainda é cedo demais pra você ter tido um pesadelo e nem está chovendo… — Tamaki falou preocupado assim que abriu a porta e me deixou entrar.

— Não aconteceu nada, só preciso falar com você… — mesmo sem permissão, fui direto me sentar na cama, esperando que ele fizesse o mesmo

— Eijiro, nada bom pode vir depois de você falar isso — me respondeu em um tom de brincadeira e, depois de fechar a porta, se sentou a minha frente — então diga, o que fez agora? 

— Não é nada disso… é que eu… eu… — só de pensar na pergunta que formulei o nervosismo e a vergonha me tomaram, meu rosto ficando tão vermelho quanto meu cabelo. Abaixei a cabeça pra fugir do seu olhar e respirei fundo antes de continuar — eu quero saber o que é se apaixonar, como isso funciona e todas essas coisas.

— O quê? — Tamaki parecia totalmente incrédulo com o que ouviu, e isso só me deixou com mais vergonha ainda. — Por que essa pergunta do nada? está interessado em alguém?

— Tudo é tão confuso sabe? Vocês andam falando tanto sobre esse assunto por conta do seu encontro com a Senhorita Nejire e tem essa pessoa que acho que estou interessado… Parece que meu coração tomou o lugar do meu cérebro. — Falei exasperado, deitando na cama e puxando um dos travesseiros para cobrir meu rosto.

Tamaki ficou em silêncio por um suspiro.

— Meu irmãozinho cresceu tão rápido… Anda, senta e olha pra mim. — Ele tirou o travesseiro do meu rosto e me puxou pelos braços. Agora era eu quem não conseguia manter o contato visual e muito menos falar. — Me fala um pouco sobre essa pessoa.

— Por onde eu começo? — Respirei fundo e continuei olhando para o chão. Desde que não falasse nomes acho que tudo bem me abrir um pouco, afinal, ele é meu irmão — Para muitos pode ser uma pessoa difícil, estressada, bruta e tudo mais, mas eu não acho. Na verdade, é bem fácil de se aproximar, é só achar as aberturas certas. Debaixo de todo esse estresse superficial, existe alguém bem doce, que cuida de mim, me ajuda a crescer, a ser alguém melhor, entende? Atrás de toda essa suposta brutalidade tem uma pessoa que na verdade é bem cuidadosa em tudo o que faz e, acima de tudo, que pode fazer qualquer coisa, até cozinhar melhor do que as cozinheiras do castelo. — Sorria enquanto falava, sentindo meu coração se aquecer só de pensar nele. — É uma pessoa que admiro muito, corajosa, forte, simplesmente incrível. Isso que nem falei da sua aparência, nunca vi nada mais lindo, não sei nem como descrever, é o tipo de coisa que só acreditaria vendo. 

— Ela parece ser incrível mesmo… Vocês são bem próximos? Devem ser, não é, já até comeu a comida dela. — Ele riu e eu corei violentamente. — O que sente quando está com ela?

— É estranho, são coisas que nunca senti antes… Meu coração fica acelerado e toda vez que vejo seu sorriso parece que atropela várias batidas. É como se eu fosse atraído o tempo todo, e precisasse ficar por perto. Parece que quando estamos juntos tudo é calmo, tudo está no seu devido lugar e eu poderia morar facilmente no nosso abraço… De verdade, eu trocaria fácil toda essa vida no castelo se pudesse ficar com essa pessoa pra sempre.

— Entendo… - Ele estava com um pequeno sorrisinho convencido e as sobrancelhas arqueadas, parecia estar me analisando e preparando uma das suas respostas espertinhas que poucos conhecem no príncipe herdeiro. — E o que você sente quando está longe dela?

— Temos mesmo que falar disso? Não gosto nem de pensar. Dói muito, parece que uma parte importante da minha vida foi tirada de mim e… Podemos mudar de assunto? Não vim aqui pra ficar falando, mas sim pra te ouvir!

— Eijiro, você precisa mesmo que eu fale alguma coisa? Você já sabe muito bem o que é se apaixonar e como é a sensação de gostar de alguém. 

— Como isso é possível? — Estava indignado, como ele podia dizer assim, com tanta certeza, que eu já estava apaixonado?

— As vezes me impressiona como você é tão inteligente para umas coisas e tão burro para outras. Eijiro, tudo isso que você falou é muito parecido com o que sinto pela Nejire, a diferença é que pelo o que me disse, você tem o privilégio de poder passar seu tempo livre pelas tardes perto dela. — Ele fez uma pausa, provavelmente pensando no que diria a seguir. Deitou-se na cama e me puxou para que fizesse o mesmo. Não nos olhávamos, nossa atenção focada no teto mesmo quando ele voltou a falar — Sei como é se sentir todo eufórico e bobo perto de alguém e sinto todos os dias um pouco dessa dor da distância. A única coisa que não entendo é quando diz que a sua garota é a mais bonita do mundo, porque sei que esse lugar é da Nejire. — Tamaki se virou na cama bem a tempo de me ver revirando os olhos, cliquei a língua e então nós dois caímos na risada. — Você não é o único que tem esse anseio de estar perto o tempo todo, mal durmo à noite de tanta ansiedade para vê-la. Quando gostamos de alguém, até as coisas mais banais se tornam importantes, as cartas são um exemplo disso, quantas mensagens não recebemos todos os dias aqui, mas as dela são especiais e você ouviu o que o Mirio contou pela manhã, a escrita dela é meu maior tesouro… Não deve saber o que é isso, já que você deve encontrar com ela sempre, mas entende o meu ponto? 

Concordei com a cabeça, compreendia muito bem o que queria dizer. As pequenas mensagens que recebi por meio do corvo e esse colar que não saía do meu pescoço eram o meu maior tesouro, não porque o papel era caríssimo ou a prata era da mais alta pureza, mas sim porque recebi das mãos dele.

— Acho que gosto mesmo dessa pessoa… — falei baixo, era mais uma afirmação para mim mesmo do que para o meu irmão.

— Eu tenho certeza que gosta dela. — Tamaki apoiou seu cotovelo na cama e apoiou sua cabeça na palma de sua mão. — Agora que já acordou pra vida, me fala mais, qual o nome dela? Ela é filha de quem? Não vai me dizer que fugiu das muralhas e se apaixonou por uma plebeia! É um amor proibido? — seus olhos estavam cheios de curiosidade, e continuariam cheios pela eternidade porque eu não pretendia responder nenhuma das perguntas. 

— Já falei demais, se contente com o que sabe… Boa noite. — empurrei de leve o antebraço dele para que perdesse o equilíbrio, uma provocação boba, e me levantei da cama, já estava quase na porta quando o ouvi me chamar.

— Eijiro, volta aqui… Brincadeiras à parte, se ela não for de uma grande família nobre, sabe que as chances de poder ficar com ela são quase nulas, certo? — Não me virei para ver o seu rosto, mas sua voz carregava certo pesar. Por que ele tinha que tocar nesse assunto justo agora que eu estava tão vulnerável?

— Eu sei. —  respondi seco e sai do quarto. Pude ouvi-lo suspirar antes de fechar a porta atrás de mim. 

Sua preocupação era válida, mas também não é como se eu tivesse qualquer esperança de que meu relacionamento com o Bakugo fosse evoluir para muito além de uma amizade e, quem sabe, uma parceria de combate. Ainda assim, pensar isso era um aperto em meu peito.

[Katsuki Bakugo]

Acordaria no mesmo horário, sempre, para treinar, cada vez mais intenso, até ficar difícil de pensar. Quando cheguei ao quartel, já começavam os treinos, e procurei a linha de frente dos cavaleiros para parar ao lado de Yoarashi, o qual estava berrando alguma coisa que eu não captei o que era enquanto se alongava freneticamente. Puxando meus braços para alongá-los, segui olhando para a frente sem realmente ver algo. Não me importei o suficiente para tentar entender tudo o que o cabeça de melão do meu lado estava falando, apesar de captar que ele falava sobre como o dia estava lindo e como queria treinar, pedindo insistentemente para Todoroki começar; meu olhar seguia fixo adiante até que uma mão acertou minhas costas - a mão do próprio insuportável ao meu lado.

— Ei! Está tudo bem, Sir Bakugo? — Yoarashi perguntou, e percebi que adiante Todoroki me encarava. 

— TIRE A SUA PATA SUJA DE CIMA DE MIM! — Eu a golpeei com minha mão esquerda e acertei seu peito com a outra mão aberta para empurrá-lo; mesmo que eu não tivesse usado força, era irritante que ele nem se mexeu um centímetro. Com homens como ele (e ogros, trolls e outras criaturas gigantescas como ele) era necessário usar a própria força delas contra si. Só deu uma gargalhada alta e tudo o que eu não tinha sentido de raiva habitual pela manhã estava de volta.

— Ele está bem, Sir Todoroki! 

Todoroki, com as mãos atrás das costas, se aproximou de nós dois com um andar calmo, mas seu olhar era estreito e atento.

— Sir Bakugo? 

— O que é? — Rosnei e fechei as mãos em punhos.

Um suspiro do nosso então comandante, e ele se virou com a voz ainda mais baixa para o ogro ao meu lado.

— Inasa, pode começar o treino por mim?

— Claro, Shoto! Deixe comigo! — Sorrindo ele apoiou aquela mesma mão no ombro de Shoto, que não pareceu sentir seu peso, e virou-se para os demais cavaleiros e para os recrutas.

— Gostaria que me acompanhasse até os barracões.

— Vai finalmente aceitar meu convite para um duelo? Tem que ser com platéia! — Rugi, provocando, mas ele seguiu me ignorando, com seu mesmo olhar de peixe morto para o horizonte ao que andava para os barracões. Apertei o passo para alcançá-lo e logo estávamos longe dos demais, quando pude retorquir com raiva. — Ei, ninguém anda à minha frente!

Foi só quando entramos nos barracões e ficamos à sós que ele tornou a falar algo.

— Bakugo, estou com algumas suspeitas muito perigosas.

Franzi o cenho, parando à frente dele.

— Do quê? Alguma ameaça?

— O senhor sempre confiou em mim, e fez vista grossa para essa situação quando se tratou do meu caso. Jamais me repeliu. Então quero que saiba que gostaria de oferecer o que eu possa para ajudá-lo antes que isso tome proporções perigosas.

— De que diabos você está falando?

— O senhor está se deitando com o príncipe?

Se eu estava esperando não deixar transparecer, meu ruborescer violento e a raiva desmedida já me deixaram fora de meus prumos.

— Retire AGORA esse absurdo que você disse antes que eu te retalhe! — Botei a mão na bainha da espada, mas Todoroki não esboçou reação. — Ande, RETIRE!

— Poderia, portanto, explicar para o seu comandante como o senhor sabia da presença de súcubos nos aposentos reais? Por que não te vi mais terminando sua corrida no ângulo de meus aposentos como sempre acontecia? Por que ontem o jovem de cabelos vermelhos passou a tarde inteira em sua casa na noite anterior e fez o mesmo quando o senhor saiu da prisão? Por que Tokoyami está voando de sua casa até o quarto do príncipe Kirishima sem parar mesmo durante o dia?

Eu estava tão surpreso por ter sido pego daquele modo que tal surpresa quase atrasou minha indignação que deveria ser a reação própria.

— O que- que merda é essa, Todoroki? Você está me seguindo? O que pensa que está fazendo, cuidando da minha vida desse modo, quer que eu te mate aqui mesmo?

— Eu sei o que acontece no quartel, Bakugo. Eu sou responsável pela segurança daqui agora. Eu reparo em tudo o que sai do normal. Estabeleço padrões. Não posso dar passo em falso, considerando tudo o que está em minhas mãos e o fato de que eu mesmo jamais posso cometer um deslize assim como os seus de ser visto nesse tipo de relacionamento. Quem era assim competente era o senhor, mas ultimamente está aéreo, desconcentrado, estranho e distante. Desde que retornou ao seu treino regular com sua corrida ao longo da muralha eu o vejo trabalhando até a exaustão em atividades que não vão te auxiliar à excelência. Compreendo que tudo o que vem acontecendo, desde Kamino até sua demoção, tudo isso pode afetar seu desempenho por si só. Contudo, tenho todas aquelas razões para desconfiar de que há mais acontecendo em seu coração.

Agarrei-o pelas roupas e ergui, jogando-o com as costas contra a parede, rosnando enfurecido. Eu fervia. Fervia. 

— Eu não estou blefando, Todoroki, se você falar mais uma única merda eu vou te destruir aqui e agora.

Ele me acertou uma joelhada na barriga e eu o soltei por reflexo da dor. Facilmente, desviou quando tentei golpeá-lo com a mão livre e chutou minha mão antes que eu conseguisse desembainhar a espada. 

Todoroki era, afinal, o homem que eu respeitava como segundo em comando. Respeitava o suficiente para aceitá-lo como esse falso comandante. Ainda assim, o fato de que ele me desarmava com aquela facilidade me deixou atordoado. Eu estava fora de mim. Desequilibrado mesmo para meus padrões.

— Pare com essa cena ridícula! — Ele chegou a erguer a voz, coisa rara. — Eu não o estou acusando, Bakugo. Apenas sei muito bem os riscos disso. Quero ajudá-lo. Talvez esteja apaixonado e sabe que não poderão aproveitar desse sentimento, talvez esteja se culpando por estar sentindo e se martirizando. Sei que não se escolhe, e o quão mais fácil o seria se o fizesse, mesmo que não se mudasse de ideia. Eu estou também à margem e sabe muito bem que eu entendo essa situação. 

— Que situação, você está louco? Comece a falar coisas que façam sentido!

— Está se fazendo de idiota? Sobre ter um relacionamento com um homem, maldito, do que acha que estou falando? Quer que eu grite aqui, sendo que sabe muito bem?

Encarei-o diretamente, como se ele tivesse me dado mais um soco no estômago e eu estivesse sem ação.

— Você-...?

Todoroki deixou cair os ombros.

— Realmente vai me dizer que depois de todos esses anos você não tinha sido um comandante tolerante, e sim apenas um cego e um idiota completo?

— O QUÊ? — Rugi, encurvando minha espinha.

Todoroki deu as costas, suspirando

— Bem. Queria oferecer meu apoio de volta, mas parece que nunca tive o seu. Passar bem.

Fui até ele, mas o segurei no ombro ao invés. Virei-o para que tornasse a me encarar e tentei manter a voz baixa.

— Quem é? 

— Eu assumo minha pena apenas sozinho, Bakugo. Se não descobriu até hoje, eu não vou te dar mais material para usar contra nós.

— Já cansei de dizer que não é da minha conta o relacionamento de ninguém, desde que não nos atrapalhasse! Não vou te expor por uma coisa ridícula dessa, seu cabeça de ovo.

— Eu agradeço.

Eu realmente só estava confuso. Ele também, esse tempo todo...

Não, Bakugo, não há nada de 'também'!

— O que te fez pensar que... é um relacionamento? Eu não- eu não tenho um relacionamento romântico ou sexual com Kirishima, nós somos... nós somos-... — Amigos? Parceiros? Mestre e aluno? Creio que meu silêncio ali fez Todoroki partir para conclusões.

— Minha conclusão foi mais relativa à conversa que tivemos sobre uma súcubo. Você tinha arranhões nos braços, típicos de garras de verdade, mas mais deles às suas costas. Marcas de sucção nos ombros. Conhecendo como súcubos podem atacar... 

— Súcubos tomam forma de mulheres! — Eu respondi de súbito.

— Pensei nisso de início com relação ao ataque que o senhor sofreu. Apenas acabei conectando com as demais informações, já que esses demônios possuem poderes de incitar luxúria e vocês dois continuaram se vendo mesmo após esse ocorrido. Ademais, nunca te vi interessado por uma mulher ou por qualquer pessoa que seja, em qualquer de nossas campanhas. A Srta Utsushimi vive com insinuações até hoje, e ela é uma mulher muito bela e limpa.

Agarrei-me aos meus cabelos, trincando os dentes. Aonde essa conversa estava chegando? O que eu estava admitindo? 

— Foda-se isso! Cuide de sua maldita vida, não é nem nunca foi da minha conta seus relacionamentos então vá lá com seu homem e me deixe em paz! Não quero sua opinião ou qualquer coisa de você, não quero falar sobre nada disso, por que até está sequer supondo essas coisas? 

— Se o senhor se sente atraído por homens, não é saudável que fique reprimindo esses impulsos, o senhor já tem o sangue quente e pode acabar cometendo grandes erros quando os instintos lhe subirem à cabeça. — A frase dele me acertou em cheio com as memórias do ataque da súcubo, e a frase seguinte com as memórias da tarde anterior. — E, ainda mais, se está apaixonado pelo príncipe, sabe bem o tamanho do problema em que está envolvido. Eu conheço diversos rapazes que estariam muito interessados pelo cavaleiro Bakugo. Rapazes discretos. Se quiser me acompanhar à taverna na noite de hoje...

Não aceitei seu convite, mas também não neguei. Apenas dei as costas e saí do barracão, havia muito em que eu precisava pensar. E era difícil demais tentar extrair pedaços de raciocínio do meio de toda a minha fúria, de toda a vontade que me dava de golpear algo ou alguém a cada momento que eu sentia raiva de meus próprios sentimentos e vontades. Parecia que se eu chegasse à conclusão que eu temia, era nesse momento em que eu a faria real.

Tentei me distrair pensando em outra coisa que agora me intrigava: quem era o homem com quem Todoroki disse ter um relacionamento? Eles conviviam ou mantinham contato há distância? Recente ou há tempo? Fui até o quartel de volta e peguei um arco para poder ficar parado e observando os arredores. Pelo que ele dizia, eu tinha tantos motivos para ter percebido que era um imbecil por não tê-lo feito, então era entre nossos malditos cavaleiros ou um dos servos próximos.

Nunca me importei com qualquer tipo de relacionamento entre meus homens. Fosse inimizade ou amizade, e até se fosse sexual. Homens que se amem o bastante para dar a vida um pelo outro possuem força superior em batalha, apesar de poderem também ser a fraqueza um do outro quando fora dela. Não era da minha conta. Eles que encontrassem a melhor forma de lutar e desde que se apresentassem impecáveis para mim e eu pudesse saber onde e como usá-los, que fizessem.

Questionei Todoroki na hora do almoço tentando arrancar dele uma expressão. Perguntei se era cavaleiro ou servo, interroguei-o durante todo o tempo das refeições e nada. Sempre a mesma figura pétrea que ele era.

Todoroki, ao meu ver, seguia impecável como o maldito sempre era. Não vi nenhum tipo de tratamento distinto entre os cavaleiros. Como sempre, todos obedientes, até mesmo o ogro do Yoarashi, que não conseguia calar a boca de entusiasmo, e foi só porque eu estava com o olhar afiado mirando em suas expressões como se fossem os alvos que eu mirava perfeitamente, vi que entre o bate-boca habitual um sorriu para o outro.

Eu comecei a gargalhar tanto e tão acidamente que tive que sair do campo. Não pela primeira vez nem naquele dia, todos olhavam para mim como se eu estivesse prestes a ficar louco.

Todoroki e Yoarashi. Eu não acredito nisso.

Ao mesmo tempo, era imensamente óbvio. Quantas vezes já não os peguei juntos de noite, treinando a sós, inferno, como eu pude ser tão cego, eles até voltavam de banhos no riacho juntos! Não que outros homens não façam isso, mas mesmo assim!

Lembrei-me de ver Yoarashi sempre cercado de mulheres. As poucas vezes em que acompanhei os cavaleiros às tavernas, provavelmente só porque estava com fome, ele não raro tinha uma meretriz sentada em cada tronco que ele tem por perna enquanto cantava e se empanturrava de comida. Só que para aquele animal que fazia amizade até com os pombos que pousavam nas vigas do quartel, não seria nada difícil fazer isso para manter as aparências. Ou tampouco seria improvável que ele quisesse foder tudo o que se move, como o troll que ele me parecia. Não vinha ao caso agora. Eu ria, já nem sei mais por que tanto. 

Na saída, quando guardávamos nossas armas, segui Todoroki até o cômodo do comandante, que costumava ser meu e guardava o que lhe fosse referente. Segurei a porta e o ouvi suspirar.

— É o Yoarashi, não é? — Eu murmurei, um sorriso torto. Ele tirava as manoplas de couro do treino de arqueria, mas não estávamos usando armadura.

— Aceitou o meu convite para hoje?

Bati com as mãos em sua mesa.

— Responda com sinceridade e eu aceito seu convite!

— Não sei se consegue perceber que seu aceite não é um favor pra mim, mas sim para o senhor.

Aquelas evasivas me diriam que eu estava certo, mas Todoroki foi evasivo igual quando sugeri qualquer pessoa ao longo do dia. Tentei ser mais provocativo.

— O que seu homem dirá quando souber que você mantém uma rede de outros rapazes discretos dos quais sabe as preferências?

— Eu não contei sobre o senhor nem mesmo para ele. Contudo, ele nos acompanhará essa noite. Ele também acreditava que o senhor já havia nos aceitado antes.

— HA! É ELE! EU DISSE! — Urrei, apontando para ele.

— Parabéns, Bakugo. Iremos direto daqui, ou pode nos encontrar lá. 

— E não há nada a contar, entendeu? Você está ERRADO!

— Como quiser. Tomemos apenas um hidromel, então. — Ele saiu de novo da sala com a mesma expressão nula com que entrou e permaneceu.

Voltei para a parte que eu mais detestava, ter que entrar na sala de armaduras para deixar as minhas peças de arqueria junto à dos outros cavaleiros. Mesmo sendo um cômodo grande, eu odiava aquela situação. Olhando para os cavaleiros, então, especialmente quando no final do dia foram todos se trocar, comecei a repensar aquela questão de atração mesmo sem querer. Eu nunca experimentei desejo sexual de todo modo, não importando quantas vezes eu encontrasse mulheres dispostas a se deitar comigo. Nunca dei atenção para qualquer um que aparecesse porque eu queria me concentrar, e aqueles homens que apareciam à minha frente... pelos deuses. Na maior parte da vezes fedem, são feios e repulsivos. Talvez o próprio Todoroki com metade do rosto queimado e mesmo o orc a quem ele se ligou eram mesmo os mais belos e desinfetados desse lugar horrendo. Nenhum dos homens que eu vi nus por termos que tomar banho em algum riacho durante uma campanha tinham qualquer apelo que me fizesse olhar duas vezes (senão de susto quando da primeira vez achei que havia uma maldita cobra entre as pernas de Yoarashi). Nenhum daqueles homens tinha cabelos sedosos e brilhantes da cor de sangue, não cheiravam a margaridas e erva-doce, não tinham grandes olhos com cílios longos e um sorriso que parecia ofuscar o sol-...

Inferno.

O que Todoroki estava insinuando era absurdo, mas por alguma razão ainda assim fazia sentido. Eu não podia negar que havia algo horrendo dentro de mim que me fez ceder à luxúria para culminar com a noite em que me encontrei com a súcubo. Talvez eu precisasse... talvez eu precisasse de qualquer indivíduo para expurgar esse tipo de vontade nociva, esses desejos absurdos que já se entremearam em meu corpo, e então mesmo sujo eu poderia ser seguro para Kirishima quando ao lado dele.


Notas Finais


Obrigada pela leitura, até mais ♥ Cuidem-se!


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