História O Silêncio Dos Lobos - Renegado

Soo estava encurralado; Mas mantinha a cabeça erguida, firme.

-Você é um deles. - alguém disse.

-Eu não seria um deles se estivesse aqui. - Kyung proferiu e os resmungos recomeçaram em seguida.

Anne apareceu, sorrindo timidamente e apontando para a porta. Soo olhou para Hans, que só tinha olhos para a comida. Ele se levantou e seguiu Anne.

-Obrigado por ter me salvado. - suspirou, remexendo os ombros tensos. - Prefiro enfrentar duas dúzias de caçadores da resistência do que enfrentar eles. - ele aponta com o polegar para a mesa onde estava. Para as crianças.

Anne riu.

-Queria te mostrar os adultos. - disse. Soo engoliu a seco. - Se você quiser podemos vir outro...

-Onde é?

-É uma casa atrás.

-Tem outra?

Ela assentiu.

-Aqui tem todos os amparos para as crianças e adolescentes. O outro prédio, também parte do abrigo, também tem uma enfermaria - explicava, enquanto voltavam pelo corredor. - e um centro de reabilitação, além dos dormitórios.

- centro de reabilitação? - pensou, alto demais.

-Muitos deles perdem membros do corpo na viagem. Quando eu disse que a resistência Caçadora nos caçava, não era mentira. - os dois passaram por uma porta corrediça, levando-os para fora. O outro prédio ficava há menos de trinta metros e tinha a mesma estrutura do Abrigo. - Chamamos esse lugar de Lar. - abriu as portas duplas. Não era nada diferente da aparência do Hall, mas sem crianças. A enfermaria era duas vezes maior do que a do Abrigo. Do outro lado, ao invés de salas, era apenas uma, um centro de reabilitação com equipamentos hospitalares, esteiras, andadores e brinquedos recreativos para auxiliar a recuperação dos Renegados com membros amputados.

As duas seguiram para outra porta corrediça de vidro. Era o mesmo ambiente. Mesas e bancos de madeira. O cheiro de comida era exatamente igual. Apenas adultos circulavam pelo recinto. Mancos, depressivos e cabisbaixos.

Trinta e cinco cabeças viraram para onde Soo se encontrava. Anne suspirou.

-Esta é D.O Kyungsoo.

Não houve murmúrios, xingamentos. Apenas olhares incrédulos e raivosos. Soo travou a mandíbula, observando cada rosto sofrido e furioso.

Kyung deu dois passos à frente; as lágrimas ameaçavam cair. Ele desabou, ficando de joelhos na presença dos renegados.

-Por favor. Eu também sou um renegado. Renego meu sangue. Renego a resistência. Peço perdão.. por... carregar o nome D.O.

Ele engoliu a seco. Sua garganta parecia uma lixa. Ele encarou cada rosto ali, tentando expressar em palavras o seu arrependimento. - Peço perdão à cada um de vocês.

Todos continuavam o encarando. E de repente, todos se levantaram, largando seus pratos nas mesas e entraram pela porta corrediça, passando por ele. Ignorando-o.

Soo segurou as lágrimas, esperando que o último entrasse. Anne estava ao seu lado e pousou uma das mãos sobre seu ombro.

-Eu sinto muito.

-Eu sinto. - disse, com a voz embargada. Seu coração estava despedaçado; suas mãos tremiam em fúria. Fechou os olhos com força, permitindo que suas lágrimas desabassem. Ele abaixou a cabeça. Sua garganta doía. Sentiu raiva de si mesmo. De seu sangue. De suas origens. De suas ações precipitadas e vagas.

Ele abriu os olhos, olhando para o céu sem estrelas. Encarou a lua, a única luz que iluminava aquele ambiente. O que havia feito? De todos aqueles erros envolto de desacertos, naquele momento, pensava que o nome que carregava era um peso enorme em suas costas.

Fitou as próprias mãos, seguiu as linhas de sua palma. Ele era um D.O. Herdeiro do Dom caçador da família tradicional. Por mais que renegasse suas origens. Os aristocratas que fingiam governar uma sociedade aparentemente impecável dos caçadores eram hipócritas e mesquinhos. Ele só queria rasgar a garganta de cada um deles. Lembrou-se dos rostos de cada renegado que estava ali, poucos minutos, antes dele estragar o refeição. O quanto de ódio que eles sentiam por ele, pelos D.O, por cada família Caçadora, pelo sistema.

Chorando ali, desolado, ainda de joelhos, Soo pensava em uma saída. Em uma redenção. E claro, em seu espírito vingativo, apenas a retaliação aos poderosos.

E foi assim que, Kyungsoo havia se tornado uma máquina de matar. Ele levantou-se. Sob as revelações e a constatação de tanto sofrimento, Soo rendeu-se. Os ideais patrióticos de seu pai haviam se consumido em fogo. Kyungsoo havia se enchido de ódio, mais uma vez. O mundo havia lhe criado assim e Soo não passava de um produto da RC. O monstro dentro dele, o demônio que infernizava sua cabeça, gritava, cheio de fúria, coberto de razão. Suas pupilas dilatadas de escuridão escondiam a dor de seus erros. Ele só sentia ódio, ódio e mais ódio passar pelas suas veias; sua visão coloriu-se de preto, tão rápido quanto seus olhos piscavam; a cada respiração sentia seu coração bater em dor; em arrependimento; Ele encarou Anne, os olhos esverdeados cheios de amor e piedade. E entre seu sangue, suor e lágrimas, prometia, daquele dia em diante, que lutaria pelos mais frágeis.

De agora em diante, D.O Kyungsoo renegaria seu nome pelos renegados.