O barulho de um salto alto batendo contra o piso chegava a ser angustiante. Minutos atrás, aquele no qual se nomeou Klaus Krüger havia balançando uma pequena sineta prateada com cabo em formato de pinheiro, e justamente nesse momento todos os outros quatro desconhecidos se levantaram e começaram a recolher os utensílios da mesa, mesmo que ainda estivessem com um tanto de comida. Em certo momento a sala estava apenas com o dono do solar e seus preciosos filhos, em um silêncio constante e amedrontador. E foi aí que o som constante começou a aparecer.
Senhor Krüger apenas observava os jovens com uma expressão indecifrável, neutra e calculista. Enquanto isso, aquela que ainda usava uma máscara de pássaro metalizada deslizava pelo salão em um vestido longo e saltos altos. Com o batuque incansável ela trazia um carrinho preenchido por pratos de vidro e ao centro um gigantesco bolo coberto por glacê e suspiros, um verdadeiro banquete para olhares alheios. A mulher então serviu os jovens e deixou o seu senhor por último, e após fazer uma reverência se retirou sem falar uma palavra ou encarar as expressões confusas dos jovens. O primeiro a colocar uma garfada na boca não demonstrou algum tipo de convulsão ao ingerir, o que mostrava que aquele bolo ao menos não mataria alguém na primeira mordida e iniciou a comilança entre os outros.
Em certo momento, alguns já haviam terminado a sobremesa e se entreolharam em uma tentativa de ver se todos ainda estavam vivos ou pelo menos em um estágio que o processo para o sétimo palmo abaixo da terra não estivesse tão avançado. Klaus deliciava-se calmamente com seu recheio de chocolate, não se importando se fazia caras e bocas e os restantes do local o olhavam fixamente com certa peculiaridade.
—Sabem… — o homem começou. —Eu amo a culinária. Desde os mais exóticos até o mais comum. Da região mais distante do planeta até a mais próxima do conforto do meu lar. Eu me consideraria um louco por sabores se não fosse pelo meu prato favorito.
Uma garota com os cabelos ruivos e longos olhou para o seu novo tutor e lhe perguntou sem malícia ou receio:
—E qual seria?
E Klaus se calou. Uma tensão se instalou no conforto das cadeiras estofadas causando a sensação de que haviam pregos por baixo do estofado, e o piso antes tão bem lustrado e cintilante agora parecia querer engolir os pés e prendê-los para não correrem. Ninguém se atreveria a sequer considerar a hipótese de simplesmente se levantar e correr para a saída mais próxima que havia - no caso não havia sequer uma janela ou passagem sem ser aquela em que a mulher de vestido havia passado, apenas a maldita escada em espiral.
—Vamos dizer… que eu tenho um gosto sofisticado demais para vocês compreenderem agora. Espero que com o tempo nossos laços cresçam e fortaleçam para vocês entenderem.
—Desde que não envolva petiscos suínos…
—Jamais me atreveria a dar de comer aos meus filhos seus pontos fracos.
Algo de estranho estava acontecendo.
Naquele instante um rapaz que se sentava à sexta cadeira ao lado direito do anfitrião, se ergueu e olhou para Krüger com os olhos marejados.
—Será que eu poderia… me retirar… senhor?
—Mas já? Oras meu filho, sente-se a sua nova família e aproveite o momento.
—Já me sinto satisfeito e… gostaria de me deitar um pouco.
O sorriso nos finos lábios se desfizeram com a insistência do garoto. A carranca psicótica tomou o lugar de um rosto sereno e a voz tomou um tom mais rouco e seco.
—Sente-se. Agora.
Estava óbvio que o adolescente queria fugir. Até o mais idiota da sala conseguia compreender as intenções do jovem, e essas foram completamente massacradas pelo pavor que a presença tenebrosa das sobrancelhas cerradas traziam. O jovem se sentou novamente e dessa vez encarava o chão, quando então percebeu que em seu guardanapo de pano havia um bilhete estranhamente dobrado dentro do mesmo. Com cuidado ele fingiu limpar os lábios e capturou o pedaço de papel o colocando entre sua cintura e calça. Ele leria aquilo depois.
Um dos rapazes que antes estava presente retornou a sala agora vestindo sua máscara de lobo e cochichou algo no ouvido do dono do solar. Klaus deu um risinho e mandou o garoto seguir o planejado e se levantou em seguida em bons e plenos ares.
—Sinto muito meus queridos, porém terei que me ausentar no restante da noite por motivos de trabalho. Como devem ter percebido, cada um de vocês terá um quarto. Estão ordenados em ordem alfabética da esquerda para a direita desde o terceiro andar até o quinto. Kyle irá acompanhar cada um aos seus aposentos e contar as informações no trajeto.
E assim o majestoso ricaço caminhou para a única saída daquele luxuoso cômodo e o tal de Kyle se dirigiu para o início da escada.
—Vamos lá, quem é o primeiro da lista… —Encarava uma prancheta enquanto batucava os pés contra o chão. — Você!
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.