Já no intervalo das dez da manhã daquela terça feira, voltei a ficar inerte em meus pensamentos e meus lamentos enquanto estive sozinho a espera de Jimin e Taehyung. Sentado à mesa de sempre, no canto do refeitório, tomei o colar que Jade tinha me dado nas mãos e voltei a pensar nela.
Com aquele pingente de câmera fotográfica na mão, eu relembrei do momento que Jade tinha me dado ele de presente. Não foi um momento bom, lembro-me que brigamos depois daquilo. Eu estava triste por ela não ter ido ao meu aniversário e a tratei mal mesmo depois de ter sido presenteado.
Como fui idiota...
Quem me dera poder voltar no tempo e ter lhe exibido um lindo sorriso de agradecimento. Quem me dera ter agradecido de forma sincera a ela quando ela mesma colocou aquele colar em meu pescoço. Lembrei-me também de quando passei mal depois da boate por ter bebido muito... Ela viu que eu usava o colar mesmo depois de tanto tempo e disse que ficou feliz por isso.
É, mas no momento, eu jamais conseguiria saber como ela estava. Não sabia se estava bem, se estava melhorando e se minha ausência realmente causou algo bom na vida dela. Não sabia se estava comendo, se tinha continuado o acompanhamento psicológico e não sabia o que ela fazia nas horas vagas em que costumávamos nos encontrar.
Que saudade de você, minha princesa...
Eu pensei que não aguentaria me ausentar tanto. Na verdade, não estava sendo fácil e por muitas vezes pensei em desistir de tudo aquilo. Mas resolvi seguir o conselho de Eunha sobre o tempo de Jade e resolvi fazer o que ela tinha me pedido – por mais que isso doesse tanto.
– E aí? – Jimin chegou com seu sanduíche na mão.
– Oi. – Falei ainda nas nuvens e com uma expressão feia no rosto.
– O que foi? Que cara é essa?
– Estou meio pensativo... – Falei com o colar nas mãos.
– Como você é difícil, Jungkook. – Jimin deu de ombros. – Já se passou quase um mês e meio, mas pra você sempre parece que foi ontem. Sua cara de decepção nunca termina, cara.
– Não deveria julgar meus sentimentos já que você não sabe como me sinto. Não sabe como me senti com tudo que houve entre Jade e eu, então não deve falar como se soubesse de tudo.
– Foi mal! Desculpa então se parece que estou te julgando! Acontece que eu quero o teu bem e por mais que eu tente fazer algo para ajudar, você não reagi! – Explicou.
– Talvez ainda não esteja no meu momento de reagir.
– Acho que você não quer reagir porque não quer ter que esquecer tudo que houve.
– Podemos falar de outra coisa? – Lamentei.
– Tudo bem. – Deu de ombros. – E como vão as coisas com Eunha?
– Não falei com ela desde então.
– E não vai falar?
– Eu falei que preciso resolver isso sozinho, Jimin-ssi.
– Eu sei, não estou te obrigando a nada. Só estou perguntando, pois vocês saíram juntos naquele dia e se deram bem, pensei que queria continuar tento contato com ela.
– Tem razão, eu poderia ter mandado ao menos uma mensagem. É que fiquei com os pensamentos nas nuvens por esses dias e acabei nem pensando muito em Eunha.
– Salvou o número do celular dela que te enviei?
– Sim. – Assenti.
– Ligue pra ela, tenho certeza que ela vai gostar.
– Vou ver se faço isso hoje mais tarde, apesar de não saber o que dizer a ela quando ela atender.
– Por que não chama ela pra sair? Vocês podem ir à sorveteria ou a um lugar assim, podem voltar a conversar e dar as risadas que você me contou que ela provoca em você.
– Pode ser uma boa ideia, mas antes preciso saber se ela está livre.
– Só vai saber se ligar, e o telefone você já tem.
– Vou resolver isso mais tarde. – Assenti.
E foi logo depois que paramos de falar de Eunha, que Taehyung chegou nos chamando para ir buscar o lanche. Jimin já tinha o seu sanduíche, então só eu fui até a fila com ele. Voltamos a mesa depois de termos pegado e eu voltei a pensar no assunto enquanto eles conversavam.
E isso, ficou nos meus pensamentos até a noite daquele dia. Foi um dia cheio de coisas a fazer e eu nem vi as horas passarem. Quando me dei conta já estava perto da hora que eu costumava dormir e mais uma vez eu lembrei do que Jimin tinha falado sobre Eunha.
– Ligo ou não ligo? Ligo ou não ligo? – Falei comigo mesmo enquanto Júpiter me fitou ao ouvir minha voz.
Andando de um lado pro outro dentro de meu quarto com o celular na mão, eu decidi ligar. Fiquei nervoso e envergonhado, seria a primeira vez que eu iria fazer isso com Eunha e tive um pouco de timidez no momento. Mas, fui corajoso, abri o número e liguei.
– Alô?
– Eunha? – Falei nervoso e tímido.
– Não acredito! Jungkook?
– Sou eu! – Respondi totalmente corado.
– Ei, como conseguiu meu número? – Ela riu.
– Jimin.
– Ah, eu deveria saber! E ai, como vai?
– Tudo bem! E você, como está?
– Tudo bem, estava aqui jogando no computador.
– Gosta de jogar?
– Bastante! – Sorriu.
– Uau... Estou impressionado! – Falei surpreso.
– Deixa de ser bobo! – Deu risadas – E então, qual é a boa?
– Gostaria de saber se estará livre amanhã à tarde.
– Sim, eu só estudo de manhã.
– É, eu também. – Respondi. – O que acha de irmos ao cinema amanhã? Pensei que poderíamos ver o filme daquele carro dos Transformers.
– Bumblebee?
– Sim, esse mesmo!
– Eu estava mesmo querendo ver esse filme! Sim, podemos ir! Pode ser de tarde ou à noite, você pode escolher!
– O que acha melhor?
– Pode ser no começo da noite, as sessões estão mais vazias.
– Então está combinado! Vou ver o horário da sessão e te ligo de volta!
– Okay! Estarei esperando!
– Até logo! – Falei e logo desliguei a chamada.
Ainda surpreso com tudo aquilo, voei ao meu notebook e logo fui o site do cinema. Deixei aberto na tela os horários, os valores e também os acentos disponíveis. Liguei de volta pra Eunha e lhe passei todos os detalhes.
E assim, marcamos nosso passeio para o dia seguinte.
Ao final de tudo, me senti feliz por ter falado com ela e por ter marcado a ida ao cinema. Mas, ao mesmo tempo, eu me sentia errado por fazer isso com Eunha, mas ter Jade em meu coração no mesmo momento. É, já tinha mais de um mês, mas de forma alguma eu conseguia superar.
Depois de me animar com Eunha, fiquei triste por pensar em Jade. Com o celular na mão eu quis ligar pra ela ou ao mesmo gravar um recado pra ela ouvir depois. Mas pensei que não seria uma boa ideia e acabei desistindo já que foi isso que ela pediu pra mim.
Em nosso grupo no Kakao, Jimin voltou a perguntar sobre Eunha. Decidi não falar nada assim como eu não falava nada sobre Jade. Aquilo tudo era entre eu e ela, mais ninguém precisava saber. Então deixei o assunto passar e apenas foquei em não voltar a ficar triste.
Quarta feira à noite
Decidi escolher uma roupa simples para aquele passeio. Estava frio lá fora e eu teria que me agasalhar bem, mas não quis exagerar ou não ficar de acordo com a ocasião. Era só um passeio com uma ida ao cinema, não tinha muito que inventar.
Coloquei uma camisa branca e lisa depois do banho. Escolhi meu jeans com lavagem clara e para combinar, um Adidas branco de listras pretas. Depois de arrumar meu cabelo e de passar perfume, vesti um casaco amarelo por cima e logo fui pegar minha carteira.
Eu pretendia bancar Eunha em tudo. Eu tinha convidado ela e queria fazer essa gentileza. E até nisso, eu fui capaz de lembrar de Jade. Ela odiava quando eu pagava... E sempre se oferecia para bancar tudo que nós dois consumíamos. É, eu insisti tanto... Que agora nem isso eu poderia fazer mais.
Já com tudo pronto, saí antes que minha mãe chegasse e lhe deixei um bilhete com uma explicação qualquer – e sem detalhes. Saí de casa bem antes do horário, fui ao ponto de ônibus e fiz questão de chegar bem cedo ao local marcado.
E lá, eu comecei a aguardar Eunha. Pensei que ela gostaria de alguns chocolates, então logo pensei em sugerir isso a ela quando nos encontrássemos. Depois disso, voltaríamos à fila, compraríamos a pipoca já com os ingressos em mãos e finalmente iríamos para a sessão.
Enquanto isso, fiquei ali perto da entrada com meu celular em mãos. Abri o jogo do piano e fiquei tentando evitar que o desânimo e as lembranças me derrubassem. Parecia loucura, mas em cada momento eu tinha uma coisa para lembrar de Jade o tempo todo.
Ao jogar o jogo do piano, lembrei que eu a ensinei enquanto passávamos o tempo livre na recepção do consultório médico. Estar esperando ali naquele cinema também me lembrava dela, pois foi a última vez que saímos juntos.
Aquele tinha sido nosso último destino e foi ali que eu acabei falando demais e estraguei tudo. Jade estava tão bonita com aquele vestido naquela noite... Estava deslumbrante! Estávamos nos dando tão bem e ela estava tão animada... Mas agora...
Puxa vida...
Quando mais eu pensava que estava indo bem sem ela e que tudo isso iria passar como meus amigos me falaram, mais eu a encontro nos detalhes. Eu poderia passar boa parte do dia sem lembrar disso, mas sempre acontecia, mais cedo ou mais tarde.
A realidade é que Jade ainda está em meu coração e eu ainda tenho sentimentos. O que eu sentia não era pouco e isso eu fui descobrindo com o tempo. O que senti foi real e isso não acabaria tão fácil. E mesmo já tendo outra companhia, isso não me bastava. Eu ainda sentia muita falta da única menina que levava o mar no olho esquerdo.
– Jungkook-ah? – Ouvi uma voz feminina.
Nesse momento, tirei o celular da direção de meus olhos e quando olhei pra trás, dei de cara com Eunha se aproximando sorridente enquanto acenava pra mim. E se teve uma coisa que me deixou surpreso assim que a vi, foi sua blusa branca com o símbolo do Overwatch.
– Aí está você! – Falei sorridente.
– Ei, mas você está muito bonito! – Novamente agarrou em meu pescoço para um abraço forte, bem como ela tinha me dado antes.
– Obrigado! – Correspondi seu abraço e senti até um alívio na sensação ruim que eu sentia antes. – Gostei da sua blusa!
– Só jogadores prós podem usar. – Fez piada.
– Eu tenho uma igual. – Respondi.
– Ah, não minta pra mim!
– Está falando com o mais viciado em Overwatch deste bairro! – Sorri.
– Finalmente alguém que entende meu vício por jogos! – Ficou animada. – Desculpe a demora, peguei um trânsito horrível na avenida principal.
– Não tem problema, estamos adiantados. – Falei. – Vamos comprar o ingresso?
– Vamos! – Caminhou ao meu lado até a bilheteria.
Fiquei ali naquela pequena fila junto com Eunha. E enquanto fomos lentamente andando a cada vez que a fila diminuía, continuamos falando sobre jogos e eu ainda me via empolgado por ela ser tão parecida comigo nos gostos e até especificamente nos jogos que mais jogava. Até que, nossa vez chegou.
– Não se preocupe, deixa comigo! – Falei ao ver que ela foi pegando umas notas no bolso do seu jeans.
– Mas, Jungkook...
– Eu convidei você! – Falei novamente e logo dei meu dinheiro a atendente do guichê.
– Tudo bem... Obrigada! – Cursou-se.
– O que acha de uns chocolates? Ainda temos tempo para ir à loja no segundo andar, você quer?
– Ah, eu aceito! Vamos indo! – Animou-se.
Na primeira vez que me encontrei com Eunha naquela boate, tive a impressão de que ela era totalmente mais madura e mais “pra frente” do que eu por já estar naquele lugar sozinha. Mas quando mais eu a conhecia, via que ela era uma garotinha simples que gostava de se divertir.
É, mas se tinha uma coisa que eu não mudei de ideia nisso tudo, foi sobre sua beleza. Eunha realmente parecia uma boneca ao usar seus converses, aquela maquiagem que a deixava corada e também aquela boina que tanto combinava com ela.
Chegando a loja de doces com a fachada toda colorida, entrei com Eunha e deixei ela escolher o que queria. Peguei algumas coisas pra mim e depois de ter acertado o valor no caixa, voltamos ao cinema e fomos direto comprar a pipoca. Depois disso, finalmente fomos para a sala.
De fato, a sessão não estava tão cheia mesmo o filme estando pouco tempo no cinema. Nos acomodamos, tiramos uma foto juntos – a primeira – e depois disso, começamos a dividir a pipoca. E logo em seguida, os chocolates que eu tinha comprado.
O filme teve uma hora e cinquenta de duração.
Ao final, Eunha e eu ficamos animados com toda aquela ação e saímos de lá falando pelos cotovelos. Continuamos passeando pelo shopping enquanto acabamos com os chocolates em questão de poucos minutos. E como nossa sessão foi no início da noite, quando tudo acabou, j á era tarde.
– Vai de ônibus pra casa?
– Sim.
– Te acompanho. – Falei.
– Você é sempre assim tão bonzinho? – Ela riu pra mim.
– Infelizmente. – Assenti sorrindo.
– Por que infelizmente? – Perguntou quando fomos andando pro ponto de ônibus onde ela deveria ficar.
– As pessoas boazinhas só se dão mal, mas mesmo sabendo disso eu sequer consigo mudar.
– E não deve mudar, só continue sendo quem é e isso está ótimo.
– É, acho que sim. – Dei de ombros e fiquei sério.
– O que houve?
– Nada... – Tentei me livrar de um pensamento que tive com Jade ao passar naquele lugar. – Vamos indo pro ponto de ônibus.
– Vai mesmo mentir pra mim?
– Não quero falar disso...
– É sobre a tal garota, não é?
– Como sabe?
– Nas vezes que falou dela pra mim, você segurou seu colar forte assim como está fazendo agora.
– Me desculpa...
– Ela ainda não apareceu?
– Ainda não... E eu não aguento mais de saudades.
– Mas ela vai voltar! E você precisa estar bem para recebê-la! Ou quer que ela te veja assim quando for te procurar?
– Já faz quase um mês e meio, Eunha... – Falei quando chegamos ao ponto.
– E daí? Sabia que você demorou nove meses pra nascer?
– Você faz piada com tudo. – Dei um sorriso amarelo. – Parece como eu era antes de tudo isso.
– Deveria voltar a ser assim, seria mais legal estar contigo sorridente do que estar assim com essa cara de chato. – Riu.
– Desculpe por falar isso contigo...
– Ah, deixa de ser bobo! Sou sua amiga e não me importo de ser sua companhia por esses dias! Está tudo bem!
– Mesmo?
– Mesmo. – Assentiu. – Olha só! É o meu ônibus!
– Nossa, foi tão rápido... – Lamentei por parar nossa conversa.
– Me ligue mais tarde caso queira falar, está tudo bem falar disso. – Me abraçou e eu a guardei em meus braços naquele momento.
– Obrigado por ser tão compreensiva.
– É uma das minhas dezenas de qualidades. – Fez piada. – Vá com cuidado! Nos falamos depois!
– Até logo! Boa noite! – Acenei quando ela foi pro ônibus.
E mais uma vez, me vi sozinho quando Eunha foi embora e levou toda a sua alegria consigo. Vi enquanto o ônibus se afastou e por um tempo, fiquei ali parado sem saber o que fazer. Olhei de um lado para o outro e só depois de um tempo, resolvi ir pra casa. Fiquei um bom tempo no terminal rodoviário e só então, cheguei em meu lar.
Chegando lá, cumprimentei minha mãe depois que ela falou que tinha visto o meu bilhete e logo meu pai também chegou. Mostrou que tinha comprado sorvete para o jantar e nem isso me fez ficar animado. Fui ao meu quarto e me joguei na cama.
Meus amigos disseram que aquilo iria passar logo, mas não estava passando. Um mês e meio desde a última vez que nos vimos e tudo ainda se repetia em meus pensamentos. Ainda era ruim lembrar de tudo e eu ainda sentia saudades.
O medo de Jade era que eu acabasse me envolvendo demais, mas quer saber? Isso já tinha acontecido e nem ela tinha se dado conta – muito menos eu. Eu me acostumei a ela, me apeguei muito mais. E quando tudo teve um fim, eu me vi sem o que eu mais amava no momento.
Já na hora de dormir, depois do jantar e quando eu já me via de cabeça cheia, pensei em ligar para Eunha para desabafar. Eu tinha Jimin e Taehyung que eram mais próximos, mas eu não me agradava muito do que eles falavam. Minha nova amiga parecia saber melhor como lidar comigo quando eu estava triste, então foi pra ela que liguei.
– Hello!
– Oi, Eunha...
– Tem alguém triste do outro lado da linha?
– Por que está dizendo isso?
– Sua voz...
– Minha nossa! – Fiquei surpreso.
– O que está sentindo?
– Pode me ouvir agora?
– Estou no meio de uma partida, mas posso sim.
– Não precisa, eu...
– Pausei.
– Me sinto incompleto... E muito sozinho também. Assim desanimo cada vez mais e não me sinto alegre com nada.
– Será que não se alegrará nem com uma piada ruim?
– Piadas? – Sorri. – Você parece eu.
– Como assim?
– É uma tática que uso pra alegrar as pessoas.
– Funciona, não é? – Ela riu.
– Às vezes.
– Posso tentar?
– Claro. – Assenti sozinho.
E quando eu me dei conta, já estava dando risadas com Eunha ao celular. Ela era mais boba do que eu e isso me surpreendeu, porque eu pensei ser o maior de todos. Começou a falar um pouco de sua escola e comentou que as provas estavam por vir.
Mudando de assunto sobre as piadas, começamos a falar de nossas avaliações e conversamos tanto que quando me dei conta, já era muito tarde. E tanto eu quanto ela, teríamos aulas na parte da manhã do dia seguinte.
Foi depois de quase uma hora de ligação que nos despedimos. E eu, me obriguei a dormir depois de ter parado de falar com ela. Pois eu sabia que se ficasse acordado, a tristeza voltaria – e isso era algo que eu não queria.
Dia seguinte
Fiquei entediado por ter excesso de pensamentos durante aquela aula. Era a aula que eu mais gostava depois da de matemática, mas mesmo assim não me animei. Fiquei “pra baixo” só de pensar em ir mais tarde pra casa e ficar sem nada pra fazer...
Foi aí que tive uma ideia.
Lembrei de quando, na ligação da noite anterior, Eunha me falou sobre sua escola. Lembrei-me do nome e por ela estudar no mesmo turno que eu, pensei que seria pouca a diferença entre nossa saída. Comecei a cogitar a ideia de ir me encontrar com ela por lá para fazer algo diferente e isso foi ficando mais forte em meus pensamentos.
Pensei que eu conseguiria chegar até lá bem rápido. Primeiramente eu teria que despistar Jimin e Tae quando vissem que eu não estava indo pra casa, e depois disso eu poderia ir encontrá-la sem medo. Esquematizei tudo em mente, fiquei com a mochila já arrumada e quando ouvi o sinal anunciar o fim da aula, voei até o corredor e logo segui o rumo até Eunha.
Dez minutos depois de andar na direção contrária, eu já poderia ver a escola. Decidi ligar pra ela para saber se ela já tinha saído ou não, então não demorei a fazer isso.
De primeira, Eunha não atendeu. Pensei então que ela estaria em aula por não ter atendido depois que tanto eu insisti, então apertei o passo e fiz de tudo pra chegar antes dela naquela rua principal. E foi pouco tempo depois que eu cheguei, que ela retornou a ligação.
– Kook-ah! Me ligou?
– Sim.
– Desculpe por não ter atendido, eu estava na sala de aula e só agora eu estou saindo para poder ir pra casa.
– Está saindo?
– Sim, algumas amigas decidiram ficar para as aulas de reforço da parte da tarde, mas eu quero ir embora e vou ter que ir sozinha.
– Será mesmo que vai sozinha?
– Como assim?
– Falta muito para chegar aqui fora?
– Aqui fora? – Ela falou já animada. – Não me diga que...
– Eu já cheguei há dez minutos.
– Não brinca comigo! Eu vou te dar um soco se estiver me enganando!
– Quer que eu envie uma foto?
– Eu... Eu já estou chegando! Onde está?
– Bem na porta da escola.
– Oh, meu Deus... Estou te vendo!
– Parece que eu estava dizendo a verdade, não é mesmo? – Dei risadas.
– Já estou indo! – Falou animada e desligou a ligação.
E só depois de uns segundinhos, eu vi Eunha vindo em minha direção. A escola dela era super tradicional e isso eu pude notar em seu uniforme xadrez com blusa social e uma sainha de cintura alta. Ela usava a mesma boina de sempre e estava com sapatinhos de boneca que faziam parte do uniforme.
Ao me ver, veio sorridente enquanto andou rápido em minha direção. Pedi que ela esperasse o melhor momento pra atravessar a rua e só depois disso, ela voou em minha direção e simplesmente me sufocou com um abraço forte e feliz.
– Não acredito! Não acredito que veio! Por que não me avisou?
– Eu decidi na hora da saída e resolvi fazer surpresa. – Expliquei sorridente.
– Puxa vida! Eu estou muito surpresa! – Sorriu. – Tudo bem? Como está?
– Estou melhor, e feliz ao ver que você gostou de me ver.
– Eu também estou feliz e estou impactada por você estar aqui. – Falou animada.
– Eu não queria ir direto pra casa hoje, então pensei em passar aqui para darmos uma volta. Tenho pouco dinheiro na carteira, mas acho que posso te leva pra almoçar em algum lugar mais simples, o que acha?
– Sério? – Arregalou os olhos.
– Eu queria fazer algo diferente e você é a única pessoa com quem posso contar. No momento é a única amiga que tenho então pensei em você.
– Sim, é claro! Podemos ir!
– Não tem problema se não for pra casa agora?
– Jungkook, eu não sou uma criança. – Ela riu.
– Desculpa, senhorita adulta! – Levantei as mãos em rendição.
– Vamos indo! Estou morrendo de fome!
– Vamos! – Falei caminhando ao seu lado já com um lugar em mente para podermos almoçar.
– E então, como foram suas aulas de hoje? – Perguntou ela.
E foi só eu encontrar Eunha que já fui contagiado por sua alegria. Ela me enchia de perguntas sobre meu dia, queria saber se eu estava bem e assim como eu, adorava piadas. Me animei com as coisas que ela dizia e assim cada vez mais eu gostava de estar com ela.
Ela não se importava muito em dizer coisas bonitas ou ficar dando ideia pra o meu sofrimento e tristeza. Ela não tinha tanta proximidade assim comigo de estar abraçando o tempo todo ou de andar de braços dados, mas só de estar com ela eu já me sentia tão bem que isso não fazia falta. Ela me fazia rir durante meus lamentos e isso era surreal.
Fui com Eunha até a pensão que eu tinha falado. Realmente era simples e totalmente “pouca coisa” mas ela mostrou que não se importava com isso e logo ficou animada em montar seu prato. Depois disso nos juntamos à mesa, dividimos um refri e logo começamos a comer.
E nem enquanto comia, ela parava de tagarelar.
Mas eu não me importava em ouvir. Eunha me mantinha distraído com seus assuntos e eu até me via totalmente envolvido nele quando ela falava sobre jogos. E foi bem nesse momento que ela falou que por estar perto da época de provas, ela teria que dar uma pausa, pois teria que estudar. E antes mesmo de fazer isso, já estava se lamentando.
É, mas a semana de avaliações passaria rápido e foi nisso que eu fiz ela acreditar. Comemos nossa comida gostosa enquanto continuamos falando e por fim, quando nos vimos cheios, decidimos descansar e ir embora. Paguei a conta e depois disso, voltamos a andar pelas calçadas.
Fizemos uma boa caminhada sem rumo. Continuamos conversando sobre coisas diversas e nisso, a hora foi passando. O tempo foi mudando de acordo com o entardecer e foi nesse momento que vimos que uma bela chuva iria cair. E então, pensamos em ir pra casa.
Já faltava pouco para as quatro da tarde quando acompanhei Eunha até o ponto de ônibus. Uma ventania nos embalou até lá, mas quando chegamos, nos protegemos e vimos como a cor do céu tinham mudado – realmente ia chover muito mais tarde.
E logo que chegamos, avistamos o ônibus de Eunha vindo de longe. Mais uma vez eu lamentei, por mais que tivéssemos que ir embora, eu gostava tanto de estar com minha amiga que sentia falta quando não estávamos juntos. Mas, ao menos agora tendo seu número, eu poderia ligar pra ela quando quisesse ouvir uma piada. E isso, me faria bem.
– Será que podemos fazer algo no final de semana? Pensei que poderíamos ir ao fliperama jogar uns jogos retro, o que acha?
– Acho que não vai dar... Como eu falei, minha semana de provas vai se iniciar agora e eu terei que ficar um pouco ausente. Vou aproveitar o tempo todo para estudar e manter minhas notas altas.
– Ah, é verdade... E quando terminam as avaliações?
– Em uma semana e meia.
– Poxa... Será que até lá você não terá um tempo livre?
– Eu te ligo, vamos ver se conseguiremos marcar algo.
– Então ta bom! – Falei.
– Obrigada pelo passeio, Kook-ah! – Novamente me abraçou e dessa vez, me beijou no rosto de forma fofa e agradecida. – E obrigada pela refeição, estava ótima!
– Gostou mesmo? – Corei com o beijo na bochecha.
– Muito! Estava muito gostosa! – Assentiu. – Agora já vou indo! Até breve e obrigada mais uma vez!
– Até logo, Eunha! Te ligo mais tarde! – Acenei e ela fez o mesmo pra mim.
Puxa vida, depois daquele carinho que recebi de Eunha em forma de beijo na bochecha, fiquei totalmente envergonhado. Para ela ter feito isso do nada, penso que seja algo que ela costuma fazer e não acha isso nada de mais. Mas pra mim, que nunca tinha ganhado um beijo na bochecha de uma menina antes, foi animador.
É, Eunha era mesmo uma ótima pessoa.
Me arrependo amargamente pela forma como a tratei quando nos conhecemos. Mas graças aos céus, ela não desistiu de fazer amizade comigo e aqui estamos hoje. Eu poderia ter estragado tudo com meu comportamento, mas ela não se importou com isso e seguiu em frente tentando ser minha amiga.
Pois é, e ela conseguiu.
Eu nunca tive uma amiga na vida. Na verdade, por um tempo eu tive Jade e isso foi antes dos meus sentimentos se confundirem. Depois disso, a olhei de forma diferente e não queria mais só a amizade. É, mas nem isso e nem outras coisas eu pude ter.
Já Eunha, realmente era uma boa amiga. Era divertida, simpática, se importava comigo e isso me fazia muito bem. Não tinha qualquer interesse nela como mais do que já éramos, Jade ainda habitava meu coração e eu jamais olharia para outra. Mas posso dizer que eu passei a me sentir bem não somente com ela, mas agora, me sinto assim com Eunha.
E isso é bom, pois eu sempre quis ter uma amiga. Eu nunca fui muito cheio de sucesso ao me aproximar das garotas nem para amizade, mas isso com Eunha foi tão fácil que fiquei mais confiante. Ela me mostrou como era bom ter outro amigos diferentes e isso me fez bem.
Ao chegar em casa – morrendo de frio pela temperatura do lado de fora – fui direto ao banho e depois fui cuidar de Júpiter. Em seguida, fui ao meu quarto e me deitei para o um cochilo quando o relógio marcou cinco da tarde. E foi nesse momento que Tae me ligou.
– Espero que não tenha esquecido da noite do videogame.
– Ah é... Hoje é sexta feira. – Falei bocejando.
– Minha nossa, você tinha esquecido?
– Estava com outras coisas em mente...
– Jimin vai chegar às nove.
– Vou ver se chego neste horário também. Quer que eu leve algo? Algum dos meus consoles ou mesmo um refri para o lanche?
– Está tudo em ordem, não se preocupe.
– Então ta bom, vejo vocês mais tarde!
– Até lá, Kook-ah! – Ele disse e logo desligamos.
E só depois disso, eu fui me deitar como pretendia. O vento lá fora agitava as árvores e eu pude notar a tempestade que estava por vir naquela noite. Posso dizer que isso me embalou e em pouco tempo, eu já estava cochilando.
Acordei quando já era perto das oito da noite. Ao ver a rua molhada, notei que um pouco da chuva já tinha caído, mas no momento tinha parado. Despertei, cumprimentei minha mãe quando a encontrei no corredor e logo ela perguntou se eu iria até a cada de um dos meninos para a noite do videogame.
É, nem ela esquecia.
Falei que sim e avisei que em breve estaria indo pra casa do Tae me encontrar com ele e com Jimin. Falei que arrumaria minhas coisas em breve e que não precisaria de carona. Ela assentiu depois disso, pediu que eu avisasse antes de sair e logo continuou andando pelo corredor.
Arrumei algumas roupas em minha mochila da escola depois que tirei os materiais. Duas cuecas, meus produtos de limpeza, duas camisas e uma bermuda caso o tempo mudasse. O carregador de meu celular, minha escova de dente e qualquer coisa mais que eu ainda iria lembrar.
Com tudo pronto, fui me banhar.
Sequei o cabelo o quanto antes, pois o tempo estava frio e eu não queria adoecer. Me vesti ainda no banheiro e logo voltei ao quarto. Notei que ainda estava cedo para o horário marcado, então pensei em me distrair um pouco usando o notebook.
Pensei em iniciar um jogo qualquer, mas assim que abri o navegador, acabei sem querer clicando no atalho para o Twitter. Foi então que mudei de ideia e fui até lá ver alguns memes ou tirinhas engraçadas que eu gostava de compartilhar.
Olhando para foto do meu perfil, pensei em atualizar. Fui nas configurações, escolhi uma que estivesse boazinha e logo coloquei pra carregar. Gostei do resultado na miniatura, então resolvi abrir meu perfil inteiro para ver como tinha ficado o feed.
E foi nesse momento...
Que me deparei com minha última postagem.
Era uma foto de uma criança com heterocromia. Sim, era uma garotinha que tinha um olho castanho e um olho verde. E bem naquele post que eu tinha dado RT, vi o user de Jade que eu tinha marcado ali para que ela pudesse ver. E isso, tinha uns dois meses.
Muitos comentários legais tinham na foto daquela menina sobre seus olhos e sua singularidade, foi por isso que eu a marquei na publicação. Queria que ela visse que sua peculiaridade era bela e merecia ser admirada, fiz isso para que ela se sentisse bem consigo mesma... Mas até hoje não sei se funcionou.
Coloquei a setinha do mouse em cima de seu user ali marcado e seu perfil abriu numa miniatura. Não vi seus posts, mas vi a foto que ela usava de perfil e notei que era um grande círculo preto. Ali não tinha muitas informações sobre ela, na verdade, não havia nada sobre sua pessoa.
Mas, quando ainda éramos amigos, Jade disse que aquele perfil era privado e que ela fazia ele de diário às vezes. O seu já estava cheio e lotado, então como uma válvula de escape, ela postava algumas coisas ali. Eu ainda era seu seguidor, um dos poucos, então poderia ver seus posts.
Tive receios de ver alguma foto sua. Eu tentei me afastar de tudo que me lembraria ela por um bom tempo e evitei pensar em tudo isso. Mas naquele momento algo me impulsionou a ir até lá. Eu não sabia o que queria achar ali, mas o impulso foi grande e quando eu fui ver, já estava em seu perfil.
A foto de seu ícone era um breu, uma escuridão. Mas a foto de capa, era uma grande tarja preta sem vida e estranha, deixando seu perfil um tanto sem graça e também meio sombrio com o tema preto que ela também aplicou nas configurações.
Não era assim antes...
Tive receios de dar de cara com uma foto recente. Tive receio de voltar a sentir meu coração acelerado por ela e ao pensar nisso, eu lamentei. Queria me obrigar a não ter curiosidade, mas não aguentei. E foi assim que aos poucos eu fui descendo a tela para ler os posts.
Mas foi no primeiro tweet que eu simplesmente perdi meu chão em questão de segundos. Ao ver o que tinha ali, fiquei totalmente transtornado, minha respiração ficou ofegante e meus olhos se encheram de lágrimas...
Não, não era possível!
Olhei de novo e não acreditei no que eu vi. Senti-me tonto quando me deparei com aquilo mais uma vez e isso me fez querer surtar de uma vez só ao pensar no que tinha acontecido. Fiquei aflito, nervoso e louco ao mesmo tempo.
Levei a mão até a cabeça e simplesmente me vi perdido. Um amargo na garganta me invadiu e eu quis chorar no mesmo instante. Fiquei sem reagir diferente, ali de frente ao notebook, fiquei paralisado, boquiaberto e totalmente com o coração dilacerado.
E mais uma vez... Eu fui olhar para aquele tweet.
Jade tinha deixado ali apenas três emojis querendo dar sua mensagem através deles. Um deles, era uma cruz na cor preta. O segundo, era um emoji de anjo com uma auréola na cabeça e com asas nas pontas. E o terceiro, uma estrela cadente.
Eu entendi bem o que ela quis dizer, e nesse momento, eu me vi a ponto de surtar por pensar que Jade não tinha desistido da ideia. Uma cruz, um anjo e uma estrela – o que dizem que as pessoas viram quando falecem. E ao entender, eu me vi a ponto de desmaiar.
Olhando pro post ainda descontrolado e sentido minhas mãos tremendo, vi que ela enviou aquele tweet com o GPS do celular ligado. E ao abrir o mapa de onde o aplicativo indicou que foi feito o post, vi que se tratava da grande represa de água doce que tinha em nossa cidade.
E Jade tinha postado aquilo... Há meia hora atrás.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.