- Lu, precisamos conversar.
Era vinte e seis de dezembro e eu combinara todos os meus presentes - incluindo o relógio dourado que meu companheiro de quarto me jogara displicentemente dizendo para que eu aceitasse. A camiseta colorida que mamãe me dera era alguns números menores do que eu costumava usar e se grudava ao meu tórax, deixando meu corpo com um ar sensual e esguio. Claro que se eu fitasse meu reflexo no espelho por mais tempo haveria de achar muitos e muitos defeitos que feririam minha frágil vaidade. Sentado de pernas cruzadas no meu colchão, com o soro grudado nas veias por causa das enxaquecas, eu não tinha escapatória às palavras de Sehun. Aguardei de olhos arregalados enquanto ele chegava, tomava um lugar ao meu lado e me fitava com os olhos cinzentos estreitos.
Mal posso tentar descrever qual a sensação de ouvir alguém dizer “Precisamos conversar” mas creio que a maioria aqui já ouviu algo parecido. Eu me lembro de ouvir essa frase muitas vezes e o mesmo gelado coloidal vir acariciar meus órgãos internos em todas elas, aquela sensação de que algo muito ruim estava para acontecer. A primeira foi de minha mãe e eu, um garotinho de oito ou nove anos não tinha consciência do peso que aquelas palavras tinham. Após ela me contar que meu pai tinha ido embora, comecei associar a frase com acontecimentos malignos que viriam afetar minha vida de forma muito ruim. Quando ouvia-a, repetia a mim mesmo que daquela vez seria bom e era difícil eu estar certo quanto a isso. Chanyeol uma vez dissera-a para mim e no segundo seguinte desatava em um choro compulsivo, se enrolando em murmúrios desconexos sobre paixão, Baekhyun com um cara na balada, bebidas e declarações. Fora a única vez em que algo bom acontecera.
Agora eu me via atado a minha arara de soros e sendo comido por uma ansiedade estranha enquanto os segundos que Sehun demorava a falar se arrastavam por uma eternidade. Ele me fitava e parecia ter perdido as palavras.
- Sim? - eu insisti.
Ele suspirou.
- Estou confuso...
- Sobre?
- Você sabe sobre o que é... - Sehun me cortou friamente.
Talvez a culpa daquilo fosse minha. Eu era o mais velho, o mais aparentemente responsável, aquele que havia tomado a primeira iniciativa e semeado pensamentos confusos na mente de um garoto de quinze anos. Tinha mais experiência do que Sehun e deveria consertar aquilo.
- Foi seu primeiro beijo.
- Talvez... - ele deu de ombros.
- Eu não perguntei. Foi seu primeiro beijo, eu sei disso - meu companheiro de quarto corou e virou o rosto - Me desculpa, Sehun.
- Isso não muda nada... - disse.
- Óbvio que muda - retruquei - Você quer me dizer que achava que gostava de meninas e agora eu coloquei ideias erradas na sua cabeça.
- Exatamente.
- Quer me beijar de novo ou não?
- Quero - disse de pronto, com as sobrancelhas em um arco elegante.
- Então acho que resolvemos isso - cruzei as mãos sobre o colo - Sehun, você mais do que ninguém sabe o quanto a vida é inconstante e frágil. Se quer fazer alguma coisa, faça.
- E depois? - ele perguntou.
- Bem - senti minhas bochechas esquentarem - Acho que você vai ter que me beijar pra saber...
Nosso terceiro beijo foi sutil. Eu ainda não sentia Sehun completamente entregue, mas não estava bem longe disso. Pela primeira vez, ambos sabíamos o que estávamos fazendo. Sehun se inclinou e eu puxei seu queixo os últimos centímetros que faltavam. Rocei no canto de seus lábios, o provoquei mesmo que sentisse dentro de mim uma queimação indeterminada, brinquei antes de o beijar e ser aceito. As mãos dele eram carinhosas quando se embrenharam em meu cabelo e sua voz chamando meu nome era uma carícia que fazia arrepiar minha pele.
- Acho que agora é o depois - eu o senti sussurrar de olhos fechados, mantendo a proximidade com os dedos em minha nuca.
- Tenho o direito de pedir outro beijo? Ainda não sei o que dizer - brinquei, o puxando para mim.
- Acho que tem...
E o depois já não parecia mais tão importante quando voltamos a nos beijar.
- Vocês estão namorando?
Eu não sabia. Namoro era sentimental demais e eu, que nunca havia tido um, não sabia namorar... Amizade já era um ponto que havíamos superado, embora fosse o que estivesse mais próximo ao que éramos agora. Amigos que se beijam, talvez. Era difícil dizer que não estávamos namorando quando nos beijávamos quando dava vontade e nosso contato íntimo tinha aumentado. Sehun até tentara impor uma nova barreira reforçada entre nós, porém suas próprias vontades o traíam e ele se via voltando para meus braços. Íamos com calma, com selinhos breves, leves toques de mãos e o máximo que havíamos chegado era uma marca que eu deixara sem querer no pescoço alvo demais do meu companheiro de quarto. Em minha defesa, ele não era muito difícil de se marcar. Talvez nossa relação ainda não houvesse chegado em um ponto que fosse possível defini-la. E estávamos bem com aquela incógnita que éramos.
- Não - murmurei.
- Mas vocês se pegam...
- Sim.
- Então é um namoro?
- Não - repeti com um sorriso. Deixar Baekhyun impaciente era divertido - Acho que estamos tão carentes que nos apegamos um ao outro. Eu cuido dele, Sehun cuida de mim, vivemos felizes.
- Entendi - meu melhor amigo me disse - E vocês já... Hm? - fez um gesto obsceno.
- Não! - eu acudi, surpreso.
- Deve ser difícil aqui no hospital, né? - ele tinha a expressão maliciosa.
- Baekhyun!
- Oras, Lu, eu sei que você quer - eu bufei - Quão longe vocês chegaram?
- Não passamos de beijos e eu não vou forçar ele a nada.
- Então você quer?
- Baekhyun! - eu choraminguei, ele me deixava constrangido. Sehun parecia algo tão puro que eu tinha medo de tocá-lo intimamente, mesmo que por vezes meu corpo reagisse estranhamente perto dele.
- Promete que vai escrever todos os detalhes pra mim?
- Seu idiota...
- Promete?
- Prometo... Idiota.
Sehun era sutil.
Seus toques em meu cabelo eram sutis, as mãos quase mansas me provando devagar e seus lábios rosados incrivelmente macios. Ele era sutil também ao conversar com a voz rouca próxima ao meu ouvido e me dobrar as suas vontades discretas. Sutilmente me fazia derreter em seus olhares infantis e me perder em seus trejeitos.
Me fazia acompanhá-lo até o jardim. Sutil.
Minki andava ali com a mãe, uma mulher alta no auge da idade, com fios curtíssimos que pareciam artisticamente espetados. Ela o acompanhava correndo e o derrubava no chão com gentileza, rolando ambos pela grama alta entre risos e exclamações. Senti Sehun colocar um braço sobre meu ombro enquanto nós dois observávamos a brincadeira com sorrisos bobos no rosto.
- Queria saber como se formam aqueles cachos no cabelo dele - ele sussurrou em meu ouvido, beijando o canto de minha orelha. Eu me contorci em seus braços e sorri.
- São lindos, não são? Queria que meu cabelo fosse assim - brinquei, trazendo Sehun para meu lado e entrelaçando nossas mãos.
Andamos sem pressa até onde a mulher brincava com Minki e quando os olhos da criança focaram os meus, eles brilharam intensamente.
- Tio Lu! - gritou, desvencilhando-se da mãe e correndo até mim.
Minki correu até mim graciosamente como um elfo, pulando em meus braços abertos. Meu corpo frágil cambaleou para trás e as minhas costas estava Sehun para me sustentar, abraçando meus ombros. O menino ria alegremente e falava coisas tão rapidamente que eu não conseguia entender.
- Tudo bem, Lu? - Sehun me perguntou com delicadeza, embrenhando os dedos pelos fios do garoto.
- Estou bem sim - ri baixo.
- Certeza?
- Sim, Sehun - confirmei - Minki ainda precisa de uns bons centímetros pra conseguir me derrubar.
Começamos a conversar animadamente, brincando com o menino e fazendo o máximo que nosso corpo debilitado conseguia. Tão distraído estávamos que não percebemos quando a mulher dos cabelos espetados se aproximou e ficou a nos observar com interesse.
Ela tinha os olhos postos em mim e consegui fazer Minki parar em meu colo por tempo suficiente para vê-la com os dentes a mostra e o lábio inferior entre as presas. Ficamos nos encarando e rindo baixinho sem entender os pensamentos um do outro.
- O que foi? - perguntei, incomodado.
- Você seriam uma linda família - a mulher me disse calmamente.
- A-Ah, não... Nós não... - tentei explicar.
- Eu posso ver como ele cuida de você - ela continuou - Vocês formam um casal diferente, mas muito bonito.
E, de bochechas coradas, eu virei o rosto para que a mãe de Minki não visse meu sorriso beirando quase à esperança ao mesmo tempo em que Sehun, enrubescido, não sabia onde esconder a cara. Naquele momento, meu coração batia forte e eu nunca me imaginei mais feliz.
Eu nunca imaginei que a felicidade pudesse acabar.
Em meados de fevereiro, eu já sentia que o tratamento e a doença estavam levando a melhor sobre meu corpo. Agora não eram somente crises de enxaqueca e uma sensibilidade a luz que me atormentavam. Além dos costumeiros pontinhos brancos na vista, eu por vezes ficava cego alguns segundos antes de minha visão retornar com pontadas no cérebro. Eu tinha dores nos ossos e órgãos, tonturas repentinas, por vezes passava um dia ou dois completamente sedado ou fora de órbita. Andar até o jardim, por mais terapêutico que fosse, me tirava todo o fôlego. Sehun fingia não ver, assim como eu fingia não ver o sangue que ele tossia no lixo do banheiro ou seus fios negros abrindo espaço em seu couro cabeludo. Meu cabelo também tinha falhas enormes e, por medo de penteá-lo e me ver sem ele, estava em um estado deplorável. O Sr. Doutor continuava sorrindo em minhas consultas. E o sorriso parecia recém costurado a seu rosto: dolorido e falso.
Então resolveram que mudariam meus remédios.
E no primeiro tratamento estava mais que óbvio que aquilo não daria certo, mas eles tinham que insistir. Tinham que enfiar drogas e mais drogas no meu sangue que já não parecia tão saudável, pois que as enfiassem. Eu fui a primeira consulta, deitei na minha maca, recebi tudo aquilo que eles queriam. Doparam-me e, entorpecido, vomitei o conteúdo do estômago na privada assim que parei de gritar.
A segunda vez permaneceu inalterada. Crises de vômito, tonturas, dores terríveis que eu mal conseguia suportar um contato com Sehun. Me enclausurar em mim mesmo com minha dose mais que bem vinda de morfina era o que eu fazia de melhor naquelas duas semanas.
Na terceira, eu piorei.
Minha arara de soros fazia um som melancólico enquanto nos apoiávamos um ao outro para conseguir sustento, gemendo em meu ouvido o quanto deveria ser trabalhoso para ela levar meus medicamentos novos. Aposto que ela também gostava mais dos antigos. Meus dedos formigavam e minhas pernas pesavam toneladas, mesmo assim eu preferira dispensar a enfermeira. Por sorte, a sala de tratamento era apenas alguns metros do meu quarto e eu me esforçava para fazer aquele perímetro sozinho.
Meu companheiro de quarto estava deitado, sem camisa, as pernas cruzadas enquanto o tronco magricela se projetava para trás.
Sehun tinha quatro sorrisos.
Ele tinha um sorriso discreto, levantando somente o canto esquerdo dos lábios e os comprimindo timidamente, que eu achava especialmente bonito. Seu sorriso número um. Eu o sentia no meio do beijo, o via quando Sehun era pego em alguma atitude sentimental, era o riso silencioso de quando ele tinha sonhos coloridos.
Seu sorriso número dois era o mais frequente. Parecia ser morno como um raio de sol matinal e me fazia sorrir em desculpas, pois era sempre exibido depois de minhas atitudes infantis. Ele sorria sem exibir os dentes, então balançava a cabeça de um lado para o outro e fechava os olhos com um suspiro.
O sorriso número três era o sorriso das crianças. Um sorriso jovial que iluminava todo seu rosto pálido, exibia seus dentes retos e brancos, salientava suas bochechas e o mostrava a verdadeira face de garoto que ele nunca deveria ter perdido.
O último sorriso era o que eu via. Meu sorriso de meia lua, aquele que eu amava intensamente. E era único e exclusivamente meu.
- Hey, Lu - ele me cumprimentou de sua cama.
- Hey - eu respondi meio sem vontade.
- Você está pálido.
- Não estou muito bem - minha voz soava distante e fazia ecos. Eu via o mundo girar e, acreditem, é mais legal quando se está bêbado.
- Lu? - Sehun me chamou, porém parecia a quilômetros de mim.
- Sehun, chame um enfermeiro - eu pedi, caindo de joelhos.
Tentem imaginar a sensação de estar caindo em um abismo sem fim enquanto seu corpo rodopia e você não tem controle do próprio ser. Sim, é horrível. É algo que eu não desejaria ao pior de meus inimigos. Foi o que eu senti naquela tarde antes de tudo escurecer. Não dor, dor seria aceitável, dor é descritiva e compreensível. Era algo como angústia, um aperto gelado no peito e um bolo na garganta que me dava vontade de tentar retirar aquilo do meu corpo à unhadas mesmo sem saber exatamente do que tratava-se.
Tudo ficou calmo. Mas não exatamente calmo. Era um calmo cheio de bipes, de vozes, de dedos rudes me tocando. Eu tinha apenas meia consciência do que acontecia a minha volta e o movimento cambaleante da maca que me apoiava só fazia as vertigens piorarem. Morfina, minha velha amiga cujos efeitos eu me afeiçoara, me saudou novamente e arrastou-me para um sono pesado da morte.
Quando acordei, Sehun estava lá. Me olhava com a expressão fechada quase como se me repreendesse e só depois notei que suas mãos estavam em meu corpo. Eu dei um meio sorriso de desculpas, já que minha voz parecia inutilizada pela falta de uso e em resposta recebi seus suspiros derrotados.
- Há quanto tempo está aqui? - perguntei baixinho.
- Desde que você está aqui - ele disse, irritado.
- E por quanto tempo eu estou aqui?
- Três dias... - Sehun suspirou - Você tá bem?
Neguei com a cabeça e sua postura agressiva se abrandou. Seus olhos cinzentos vacilaram e ele puxou a poltrona para perto.
- Você não voltou para o quarto? - meus dedos caíram pesadamente antes de chegar em seu rosto.
Foi a vez dele negar.
- Fiquei preocupado com você, Lu...
- Não precisa se preocupar... Eles vão voltar com o remédio antigo.
- Eu não quero te perder... - ele encostou a testa na minha, não exigindo minhas palavras.
Então, naquele silêncio meio consentido, Sehun se deitou comigo, tomando cuidado com todos os tubos que saíam e entravam no meu corpo cheio de hematomas roxo-esverdeados. Falava sussurrando coisas aleatórias para que minha dor de cabeça não aumentasse e protegia meus olhos da luz. Eu, detestando minha fragilidade e adorando o carinho, tinha minhas mãos em seus ombros e agarrava sua camiseta com a força que me restava para garantir que ele não iria escapar. Depois de alguns sussurros, murmurei que estava com sono. Beijei seus lábios e adormeci com a cabeça em seu antebraço. Sehun ficou longos segundos a acariciar meus cabelos ralos e a aquecer todo meu ser com seu carinho. A típica imagem clichê de um casal apaixonado. Eu sempre gostei de clichês.
E horas depois, ele continuava do meu lado, incansável, silencioso, pálido. Parecia uma estátua grega, se não fossem visíveis para mim seus pequenos defeitinhos que o deixavam único e, porque não dizer, perfeito? Eu queria dispensá-lo daquela posição desconfortável, mas algo dentro de mim ansiava por seu contato. Meus olhos encontravam os dele e ali se perdiam em milhares de coisas que eu queria dizer e não conseguia.
- Você deveria voltar - murmurei enquanto todo meu corpo era a antítese de minhas palavras. Eu me aninhava ainda mais em Sehun, escondendo meu rosto na curva de seu pescoço.
- Você quer que eu volte?
- Não - confessei, carente.
- Não vou voltar então - encerrou o assunto.
Quando a enfermeira apareceu, creio ter lançado meu olhar mais mortífero para que ela saísse do meu mundo particular onde só existia eu e Sehun. Ela, corajosa e discreta, entrou no quarto e pediu que meu companheiro se retirasse. Sehun disse que ficaria em qualquer situação e quando os olhos dela se voltaram para mim, apenas arqueei as sobrancelhas. Ora, que o deixasse ficar... Derrotada, a mulher teve que partir, não sem ameaças de que voltaria com o Sr. Doutor.
- Eu não vou sair - foram suas palavras duras e desafiadoras quando a enfermeira retornou armada com o médico. Ela sorria como se provasse que não era nada difícil tirar um garoto leucêmico de quinze anos do quarto.
O Sr. Doutor a dispensou educadamente, então se aproximou da cama e se pôs a trocar minha bolsa de soro. As agulhas sempre pareciam arder por mais que eu achasse que já estava acostumado a elas. Uma na mão, outra no pulso, conferir minha pressão com aquele estetoscópio gelado no meu peito e mais outra agulha. Eu choraminguei e Sehun me envolveu gentilmente, com os olhos estreitos e pouco amistosos para o homem de jaleco branco.
- Eu não vou sair - ele repetiu mais sutilmente. O médico o fitou com os olhos arregalados e a cabeça inclinada, me lembrando um cachorro curioso. Viajou o olhar até mim e meu rosto delatava o quão desesperado eu estava por contato humano.
- E porque sairia? - perguntou, depois de um pigarro.
Sehun pareceu confuso e não menos relutante. Fechou os braços em torno de mim e eu gani involuntariamente para que tomasse mais cuidado.
- Luhan, eu já retornei os medicamentos antigos e seus testes melhoraram. Você poderá voltar em breve para o seu quarto. Enquanto isso, vou deixar avisado que o Sr. Oh Sehun está autorizado a ficar aqui, embora eu ache mais adequado pegar outro leito para ele, afinal, ele também está em tratamento e ambos juntos pode causar algum constrangimento.
- Obrigado, doutor - sorri sinceramente. Depois de uma piscadela ele se foi, e eu retornei a pousar a cabeça no peito de Sehun.
- Eu não sairia nem se ele mandasse - disse para mim, me dando um beijo no alto da cabeça e eu podia apostar que ele mirava a porta como se ela pudesse criar braços e nos afastar - Não vou deixar você ir embora.
- Eu não vou - sussurrei de volta, sentindo-o se aninhar em mim mais confiante e adormecer junto ao meu corpo.
E antes que meu próprio sono me vencesse, em um pensamento meio louco naquele meu abrigo humano com costelas salientes e uma respiração pesada a ser minha cantiga de ninar, pensei que não me importaria em morrer nos braços de Sehun. Não me culpem, minha realidade é essa e eu sabia aceitá-la. Por mais que me doesse e apesar de todo o egoísmo e dor que eu infligiria a ele, ansiava por permanecer próximo até meu último suspiro.
Felizmente, eu pude aproveitar mais com Sehun. Parecíamos colher migalhas de um tempo incerto e ir saboreando-as como se nunca mais fôssemos as ter. O amanhã era inóspito e imprevisível, principalmente depois de uma recaída onde eu sinceramente já dissera adeus à vida. Em seus últimos dias, fevereiro me deu meus remédios, meus cabelos, a pouca cor que eu tinha na minha pele de volta. Me deu beijos no jardim, tardes andando cambaleante nos corredores, meu ânimo. Já era março quando comecei a melhorar potencialmente. Em março, Sehun brigou com os pais, Baekhyun voltou a me visitar para ciúmes do meu companheiro de quarto, eu pude visitar minhas crianças na ala infantil.
Em março, eu o tive para mim.
Era o terceiro ou quarto dia do mês. Eu parecia relativamente bem há uma semana, tanto que começava a achar que meus meses prometidos realmente viriam. Conseguia andar pelos corredores, ficar horas no jardim, as crises de dor de cabeça diminuíram e, do câncer, só me restava a palidez cadavérica, os pontinhos brancos na vista, o pulmão protestando pra trabalhar, menos cabelo e um tumor. Entretanto, eu vinha tendo algumas crises de insônia sem precedentes. Acordava e permanecia assim horas seguidas antes de voltar a cair num sono que nunca parecia tão bom quanto o primeiro, tendo a respiração de Sehun como cantiga de ninar. Por vezes eu velava seu sono antes que meu próprio me consumisse, observando seu peito subir e descer lentamente. Em outras, eu me sentava do lado de sua cama e deixava que meus dedos o provassem como bem entendessem, acariciando seu cabelo, contornando seu rosto, tocando seus lábios, até que ele resmungasse e virasse para o lado ou então segurasse meus pulsos nas mãos, me lançasse um olhar que mesmo sonolento não deixava de ser acusatório, trocasse um beijo rápido com gosto de ferrugem e me mandasse de volta para a cama.
Naquela noite eu acordei com os bipes suaves de meus aparelhos - que de uns tempos para cá eram ligados todas as noites - e fiquei a observar a silhueta ossuda de Sehun. O ritmo de sua respiração era diferente do usual e ele se entrecortava por penosos suspiros.
- Sehun? - chamei no escuro - Está acordado?
- Estou - ele me respondeu depois de longos segundos, virando para mim.
- Você está bem? - perguntei.
- Acho que estou com câncer - pude ver seu sorriso tristonho.
- Isso é bem ruim - torci o nariz.
- Muito...
- Não consegue dormir?
- Acordei agora há pouco... Seus bipes aumentaram, achei que você estava... - ele deteve-se com um ruído engasgado. A medida que os meses passavam, nossa angústia só aumentava.
- Eu devia estar num sonho agitado... Desculpe - me encolhi, ajeitando o travesseiro.
A janela aberta deixava entrar uma brisa fria que me arrepiava, mesmo que lá fora o céu estivesse forrado de estrelas. Sehun puxou a coberta para cima do corpo e se remexeu no colchão.
- Sem sono?
- Nenhum... E você?
- Também não... Como se sente?
- Com falta de ar, mas bem, e você?
- Um pouco tonto, mas bem - sorri - Acho que é a primeira vez que não me sinto com câncer - brinquei.
Sehun esboçou um sorriso sem vida antes de desviar seus olhos para o chão.
- Lu?
- Hm?
- O que você queria fazer?
- Como? - ergui a cabeça.
- Eu digo, o que você queria fazer se saísse daqui? - ele se deitou de barriga para cima e fitou o teto.
- Acho que eu quero investir no meu futuro...
- Três coisas?
- Faculdade. Ter uma piscina. E... - me detive.
- E?
- Sehun?
- Hm?
- Vai me deixar ficar na sua vida se sairmos os dois? - perguntei para o escuro.
Ele demorou um tempo suficientemente longo para responder. Eu me preparava para chamá-lo baixinho caso ele tivesse dormido quando sua resposta chegou aos meus ouvidos.
- Sim... Se você me quiser.
- Então minha terceira coisa é ficar com você - murmurei de pronto - E você? Três coisas que você quer fazer quando sair daqui?
- Ter um cachorro - confessou. Eu sorri.
- Imaginei. Mais duas.
- Ir pra faculdade.
- Qual curso você quer fazer?
- Acho que eu quero fazer música - ele virou o rosto para a janela - Se você tivesse ido para a faculdade, que curso faria?
- Jornalismo - admiti com saudades de algo que poderia ter sido caso eu tivesse mais tempo. Poderia até mesmo fazer faculdade com Baekhyun.
- Parece chato.
- Pra você, tudo parece chato - brinquei com ele - Ainda falta uma coisa.
- Beber até ficar doido.
- Ah, isso é legal.
Eu gostava da estranha sensação leve de estar bêbado. Gostava de dar o primeiro gole e contorcer o rosto até que os outros descessem sem queimação por minha garganta. Gostava das dormências nos dedos, dos olhos pesados, na língua frouxa, da facilidade do mundo. Eu, infelizmente, não gostava da ressaca no outro dia. Ainda assim, ficar eufórico era uma das coisas que eu mais gostava.
Sehun virou os olhos para mim, inquisidor.
Queria dizer que há alguma parte da vida que eu me arrependo. Queria poder dizer que mudaria algo, mas não mudaria nada. Aos meus doze anos, eu tive meu primeiro porre. Fumei maconha pela primeira vez aos catorze e, nos efeitos dela, tive minha primeira vez com um homem. Usei algumas drogas mais pesadas até os dezesseis. Acho que é uma parte da minha vida que eu não repetiria. Porém, entre horas pondo o estômago pra fora, dormindo na rua, sendo pego pela polícia, transando com estranhos, não há nada que eu realmente queira esquecer. E, dentre as milhares de lembranças distorcidamente coloridas, escolhi uma azul neon com luzes laranjas que era a boate Secret para contar ao meu colega de quarto.
- Eu lembro de uma vez que eu bebi muito - comecei, sorrindo - Devia ter uns quinze ou dezesseis anos. Entrei com Baekhyun e outro amigo escondido em uma boate para maiores.
- O que aconteceu?
- Baekhyun ficou louco e fugiu pra pista de dança enquanto eu dava em cima de qualquer um que passava. Mesmo com a ressaca, era divertido sabe? Você acha tudo mais engraçado e fácil.
- E o outro amigo?
Fiz um esgar tristonho. Sehun não insistiu.
- E aí? - ele perguntou.
- Acabei beijando o barman no banheiro da boate - ri baixinho, apoiando a cabeça nas mãos - Baek diz que eu tenho uma queda por barmans e banheiros.
- Então você saía com muitas pessoas?_ era possível ouvi-lo se remexer na cama.
- Sim..._ sussurrei de olhos fechados, aproveitando o som daquela respiração não muito leve que Sehun tinha. A minha própria era pesada, como se estivéssemos constantemente em lugares onde o ar era rarefeito.
- Você é virgem? - Sehun disse e eu virei o rosto um pouco para o lado, escondendo o meio-sorriso que tomava meus lábios.
- Não - Perguntas como essa geralmente vinham seguidas de um “Como foi?”. Porém o silêncio que se seguiu foi mais pesado do que eu poderia e gostaria de imaginar. E, minutos depois, Sehun deu um suspiro penoso.
- O que foi?
- Adoraria transar com você agora - ele confidenciou, mas sua voz trêmula indicava coisas a mais.
De imediato me sentei na cama e olhei para o emaranhado de cobertas que escondia um corpo magricela e pálido. Os ombros encolhidos para dentro suportavam soluços que meu companheiro de quarto continha com os dentes cerrados. A pele do pescoço exposta à claridade o deixava fantasmagórico. Pela primeira vez, eu ouvia o choro de Sehun.
- V-Você está chorando? - minha voz não soou incrédula. Ela parecia frágil e quebradiça, revelando que vê-lo naquele estado causava muito mais em mim do que o usual.
- Não - ele tentou parecer irritado, no entanto um soluço alto e penoso cortou sua fala.
- O que aconteceu?
- Não foi nada...
- Diga.
- Estou com medo - choramingou.
- De quê?
- E-Eu não quero morrer virgem, Luhan - ele confessou, em súplica e seus olhos marejados me fitaram com intensidade quando ele sentou-se - Eu não quero morrer.
Me aproximei, trazendo comigo aquela arara com os soros. Beijei a pequenina lágrima que escorria por sua bochecha, a sentindo sumir salgada em meu paladar. Eu sabia o que tinha que fazer. Eu sabia o que queria fazer.
- Você não vai morrer virgem se quiser, Sehun - sussurrei de volta.
Ele me entendia e parecia singularmente assustado. Esperei sua expressão relaxar e seus lábios rosados se entreabrirem, tão delicados para mim. Com cuidado, colei minha boca a sua. Brinquei entre o beijo, sendo o mais delicado possível com o rapaz que parecia poder quebrar sem aviso. Pousei minha mão em seu joelho e o acariciei, dando indícios de que iria subir. Sehun soluçou e eu apartei aquele simples selar.
- Sehun? Você quer parar? - perguntei e ele negou de olhos fechados, com pequenos filetes reluzentes naquela claridade noturna escorrendo pelas bochechas - Está bem pra fazer isso?
- Luhan... Eu tenho tanto medo... De, dessa vez, ser definitivo... - ele me disse, soluçando como uma criança perdida.
- Não será... Você vai sair mais uma vez e nunca mais vai precisar voltar - o puxei para mim e senti seus dedos gelados traçarem caminhos pelas minhas costas.
- Meu cabelo está caindo... - confessou e tive vontade de guardá-lo numa redoma de vidro, onde o mundo não o faria mal. Porém, o mal estava dentro dele, o destruindo de dentro para fora. E eu queria poder retirá-lo com minhas mãos.
- Sehun... Isso vai passar - o beijei e delicadamente passei minha mão por seus fios macios, trazendo alguns comigo. Seria difícil vê-lo sem eles - Eu estou aqui com você.
- Lu, se eu ficar careca, você vai me achar atraente? - perguntou timidamente, entrelaçando meus dedos.
Eu sorri e rocei a ponta do nariz em sua orelha, controlando minha risada. Sehun, manhoso, estendeu o pescoço para minha disposição. O pescoço, afinal, sempre acabava sendo o ponto fraco de quase todos.
- Sehun, você é atraente, independente de você estar careca ou não - sussurrei de volta, prendendo mais alguns fios em meus dedos; fui agraciado com um suspiro ansioso.
- Lu?
- O que foi? - abracei seus ombros que tremiam.
- Eu não sei o que fazer... - aposto que essa confissão deve ter sido difícil para ele.
- Me deixa te ensinar? - o trouxe para mim e beijei o cantinho de sua boca naquele róseo pálido, incitando por mais.
- C-Com calma...
- Claro - lhe sorri.
Devagar, o puxei para um beijo. Confesso que já havia beijado muitas pessoas, homens e mulheres - embora eu desenvolvera uma predileção por homens logo cedo - tanto mais novos quanto mais velhos que eu. Alguns muito experientes, outros nem tanto. Mas beijar Sehun era diferente. Era algo que não só envolvia lábios, línguas e mãos. Uma sensação única que eu nunca havia experimentado na vida. Ele era incerto, hesitante e curioso. Sua boca fina se moldava a minha e ali permanecia por um bom tempo. Beijar ele envolvia não pensar em nada e sentir tudo ao mesmo tempo. Desculpem, não consigo descrever em palavras como era a sensação do simples ato que era beijá-lo.
Sehun estava distraído no beijo, aproveitando a união de nossos lábios como se fosse a primeira vez. Provavelmente protelava o momento em que eu tiraria sua roupa e o tocaria intimamente. Ou então, tinha apenas se esquecido de que eu aguardava algo a mais, planejando entre cada pausa uma forma de prová-lo sem o assustar. Ele me beijava com inexperiência e sua língua era curiosa, hesitante, com a pontinha gelada a resvalar nos meus dentes, os suspiros sem fôlego o fazendo parar vez ou outra quando minhas mãos passaram a tocar sua cintura, seu quadril, embrenhando-me de leve na primeira peça de seu moletom. E Sehun, em sua distração, mantinha seus dedos sobre meus ombros, seus olhos bem fechados e a boca a minha disposição enquanto eu provava de seu abdome liso, com suas costelas tão perceptíveis ao toque, os primeiros traços de pelos, os mamilos túrgidos. Os toquei, e Sehun se esquivou rapidamente.
- O que foi? - perguntei.
- O que você está fazendo? - ele retrucou, um tanto desesperado, encontrando minhas mãos sob sua camiseta e as tocando incrédulo. Ele estava quase a ponto de corar, com os olhos arregalados e a respiração chiada - Você...
Apertei novamente seu mamilo e ele se interrompeu, mordendo o lábio inferior e me fitando como se a culpa por distrai-lo fosse minha. Enfiei minha outra mão por sua camisa e comecei a provocá-lo.
- Não gosta? - perguntei, repetindo o gesto. A mão de Sehun apertou a minha e ele suspirou com a boca entreaberta.
- Lu... - ele choramingou de olhos fechados.
O empurrei para o colchão com uma sensação fervilhante na base do estômago que me fazia suar frio. Houve certa resistência e, se ele não estava tentando manter-se sentado, pelo menos tentava me fazer deitar junto dele.
- Luhan... - Sehun gemeu contra meus lábios, apertando meus ombros com força.
Eu duvidava muito que fosse capaz de fazer sexo na minha atual condição. Porém, Sehun despertava em mim meus desejos mais intensos. O perfume suave que desprendia de sua pele me incitava a beijá-lo. Seus suspiros pesados, suas mãos, cujos caminhos muitas vezes chocavam-se com os meus, começando a moverem-se curiosas e seus olhos cinzentos reluzindo na pouca claridade eram a tentação que me fazia desejá-lo mais e mais. Me movi contra ele, tomando cuidado com a arara de soros e senti sua ereção roçar em meu ventre. Ele gemeu, constrangido. Uma pequena criança tímida e virgem.
- Me deixa tirar sua camisa - ronronei contra seu ouvido, beijando sua orelha.
Não precisei de resposta antes de começar a despi-lo. Retirei com cuidado a agulha de seu braço e ele me ajudou a tirar o resto. Seu tronco era deveras alvo, as costelas se destacavam penosamente, os mamilos intumescidos possuíam um tom pálido, hematomas se formavam fácil com a fragilidade imposta pela doença e haviam algumas pintas pequenas salpicadas por sua pele artisticamente de forma que quis colocar o dedo em cima de todas só para ter certeza que elas existiam e zombar dele por causa disso. Talvez chamá-lo de dálmata.
Com uma perna de cada lado do seu quadril, debrucei sobre seu corpo. Senti minha camiseta ser puxada por dedos gelados e, quando ele percebeu que eu ainda não a tiraria, pousaram logo acima da minha calça, apertando meu quadril, o gelado de sua pulseira contra mim. Meus lábios se ocuparam em beijar sutilmente - afinal, qualquer brusquidão poderia marcá-lo e não seria muito agradável ter que explicar às enfermeiras a imensa quantidade de dentes na pele de Sehun, que em casos mais extremos podia acarretar em nossa separação - seu tórax e sua barriga. Quando suguei seus mamilos, Sehun afundou as unhas curtas em minha pele que ardeu e jogou a cabeça para trás, rodando os olhos sob as pálpebras e respirando alto.
Eu queria dar prazer a ele, mais do que qualquer pessoa um dia pudesse dar e fazê-lo ter uma primeira vez inesquecível. Infelizmente, o esforço de me manter sobre ele já trazia os costumeiros pontinhos brancos a minha vista, estrelinhas reluzentes que brilhavam em Sehun.
- Nunca ninguém me deixou assim - confessou para mim, com os olhos cinzentos reluzindo e a voz rouca.
- Vou considerar isso uma honra - sussurrei de volta, beijando suas clavículas proeminentes e levando uma de minhas mãos até o meio de suas pernas, conferindo suas reações.
- Eu nunca me toquei... - completou baixinho.
- Não?! - aquilo me pegou de surpresa e foi inevitável não arregalar os olhos. Tocá-lo, agora, parecia muito intimo.
- Eu nunca tive chance... - Sehun deu de ombros e as mãos que permaneciam em meu quadril tremelicaram de leve - Lu?
- Sehun, eu... - as circunstâncias eram diferentes. Eu não queria assustá-lo ou forçá-lo a fazer alguma coisa só porque estava assustado.
- Lu? Continua... - ele levou as mãos até a minha e me permitiu prosseguir.
O estimulei por cima do tecido e arranquei seus suspiros contidos. Fingi não perceber que minhas mãos tremiam e que meu coração tentava romper a caixa torácica, tamanha a força com que martelava contra minhas costelas.
- Nunca se tocou mesmo? - perguntei com um toque de malícia, arqueando uma das sobrancelhas. Sehun negou com a cabeça.
- Pessoas com câncer não têm tempo e vontade para ficar se masturbando - ele revirou os olhos e fitou a janela que deixava entrar uma brisa gelada.
- E, aparentemente, nem para fazer sexo... - completei, beijando seu peito e lambendo até sua clavícula. Senti seu corpo contorcer abaixo de mim e meu nome quase romper de seus lábios - Mas eu estou com muita vontade de fazer isso.
- Tira a camisa - soprou em minha direção. Me ergui por tempo suficiente para despir o tronco e senti os olhos cinzentos de Sehun me beberem e provarem com curiosidade contida - Você é muito magro - ele completou.
- A comida do hospital não é lá aquelas coisas - ri baixinho quando ele acariciou minha cintura e tomou um de meus mamilos entre os dedos - E você também não está o exemplo da saúde, sabia?
Sehun sorriu de canto e deixou-se a minha vontade. Meus dedos tocando seus pontos erógenos o faziam suspirar e, talvez fosse apenas uma impressão naquela pouca claridade, ele corava de vez em quando - mesmo que seu sangue defeituoso tornasse isso meio impossível.
- Posso tirar sua roupa? - pedi de mansinho, brincando com o cós de seu moletom e sentindo os ossos de sua bacia contra minha mão.
- Aproveita e tira a sua - provocou, sua voz tremendo de ansiedade.
Me ergui com dificuldade e escorreguei as calças pelas pernas, vendo seu olhar descer para minhas coxas e deterem-se no volume indiscreto em minha cueca.
- Isso é estranho pra mim - comentou baixinho, cobrindo a boca com a mão quando tirei a boxer e me exibi por completo.
- Estranho? - arqueei as sobrancelhas, deitando sobre seu corpo e deixando que seus dedos curiosos traçassem caminhos pela pele que eu acabara de expor. Ele acariciou minha bunda com a ponta dos dedos e a lateral de minhas coxas, antes de agarrar em minhas nádegas com pouca força.
- Sexo com um homem - ele sussurrou.
- Isso te incomoda?
Sehun rodou os olhos e fitou meus lábios abertos como se ponderasse.
- Acho que não... Não com você...
Voltei a sentar sobre seus joelhos com um sorriso meio indiscreto enquanto retirava as peças inferiores. Seus pés se contorceram assim que o livrei das roupas e ele sussurrou quando voltei ao seu colo.
- Está frio, sabia?
- Já vai esquentar - comentei baixo.
- Me toca, Lu - mandou com expressão séria, a boca entreaberta, um convite irresistível.
Dominei sua ereção entre os dedos e selei seus lábios antes de me ocupar em sugar seus mamilos e abusar do outro com a mão livre.
Sehun jogou a cabeça para trás e fechou os olhos, deleitoso. Beijei seu pomo de adão, com os gemidos que ele prendia a reverberaram sob meus lábios e ele engolir em seco várias vezes enquanto eu explorava seu íntimo.
- Gostoso? - perguntei malicioso.
- S-Sim...
- Vou te por na boca um pouco, ok?
- O quê? - ele se ergueu e, com a mão em seu peito, o fiz deitar de novo - Vai me chupar?
- Vou...
Tracei em beijos cada um de seus contornos até chegar em seu ventre. Dei alguns chupões audíveis na parte interna das coxas e mordisquei qualquer lugar não muito visível antes de segurar o membro túrgido pela base e o aproximar de meu rosto. Sehun, apoiado nos cotovelos, tinha os olhos postos em mim. Usei a língua para fazê-lo suspirar e ameaçar romper contato visual e abriguei a glande em minha boca, chupando-o devagarinho e brincando com seu prazer. Eu não conseguiria, nem se quisesse, fazer mais do que aquilo. Quando ele ganiu choroso e baixinho, soube que eram estímulos demais para minha criança virgem.
- Estou ficando zonzo - brinquei, piscando algumas vezes para que minha visão voltasse ao foco.
Deslizei minhas mãos por baixo dele, encontrando sua bunda, apertando, incitando-o. Sehun, bagunçado e ofegante, me fitou descrente.
- Com um homem é diferente... - murmurei didático enquanto distribuía alguns beijos pelo seu abdome liso e pálido. Era possível senti-lo se contrair às minhas palavras e sua respiração acelerar sob meus lábios.
- Lu? - me fitou com os olhos cinzentos arregalados - Luhan?
- Só... Relaxa - pedi com um sorriso de canto, acariciando suas pernas.
- M-Mas... Lu... - Sehun se estendeu manhoso, esquivando de meus toques cada vez mais insistentes. Dominei sua ereção entre meus dedos e o estimulei firme. Eu não era inexperiente. Ele fechou as pernas, tentando me impedir.
- Eu disse que com um homem é diferente - arqueei minhas sobrancelhas e cessei os movimentos. Não seria justo continuar masturbando ele e pedindo que decidisse se iria continuar ou não - Quer parar?
Sehun então ergueu o quadril o mínimo e se roçou manhoso contra minha mão. Eu sorri para ele e flexionei suas pernas para cima, colocando ambas em minha cintura.
- Eu sinto muito - murmurei, invadindo suas nádegas, o tocando mais que intimamente.
Sehun choramingou assustado e logo depois tapou a boca com as mãos. Deveria estar sendo confuso para ele, porque também fora para mim. Mesmo que em minha primeira vez eu estivesse drogado, quando aquele rapaz de olhos ferozes começou a me tocar naquele exato lugar, minha vontade foi de fechar as pernas e esconder minha intimidade. Claro que a maconha ajudou a inibir a dor. Mas não acho que me deixariam dar maconha a Sehun.
Enfiei um de meus dedos na boca, o deixando melado de saliva antes de dirigi-lo à entrada de Sehun.
- Isso é tão constrangedor - ele sussurrou, virando o rosto.
- Vou perguntar mais uma vez, quer parar?
- N-Não.
Eu o deflorei devagar. O íntimo quente buscou me expulsar enquanto eu massageava o círculo de anéis tentando relaxá-lo. Sehun gemeu, não um gemido de dor nem de prazer, mas como se o ar que estivesse preso em seus pulmões quisesse sair.
- Sehun, você não está colaborando - brinquei, mordendo o canto de seus lábios. Ele resmungou entre o beijo, agarrando meu cabelo com força e respirando pesado perto de mim. Eu não podia exigir muito dele, afinal, Sehun tinha apenas quinze anos e nunca sequer havia explorado o próprio corpo. Deveria, portanto, ser algo memorável.
- Lu, você está com o dedo nesse lugar... - ele choramingou de olhos fechados - É novo para mim... E eu...
- Você precisa relaxar - o beijei mais uma vez, meus dedos movendo-se dentro dele.
- É estranho... Dói um pouquinho...
- Vai passar, ok? Só relaxa...
Ele me fitou por baixo dos cílios e rebolou em minha mão. Continuei o massageando com empenho para que algo pudesse distrai-lo e usei minha boca para calar seus suspiros doloridos. Consegui depois de um tempo enfiar o segundo dedo e, assustado, Sehun mordeu meu ombro.
- Quero entrar em você - sussurrei.
- Vai doer?
- Um pouco... Vou tentar deixar o menos doloroso possível.
- T-Tudo bem.
Comecei a penetrá-lo de leve, segurando seus quadris estreitos e o invadindo com dificuldade. Vi quando ele agarrou os lençóis e senti seu corpo sofrendo espasmos abaixo de mim.
- Nossa! - revirei os olhos e pisquei algumas vezes, tentando recuperar minha visão meio fosca - Dói?
Sehun negou repetidas vezes, com o cenho franzido e o lábio inferior firmemente preso entre os dentes. Claro que estava doendo. Queria poder dispor de algo que fizesse deslizar para dentro mais facilmente, porém era tão apertado que eu duvidava que um lubrificante fosse tornar menos doloroso.
- Lu... Fique parado... Um pouquinho - me pediu em voz baixa e eu o atendi.
Seu íntimo quente e macio me apertava de forma quase insuportável e Sehun não ajudava ao tentar me expulsar. Quando seus dados perderam a força e ele pareceu se acostumar com a invasão, permiti me mover o mínimo dentro dele e respirar normalmente mais uma vez. Dedilhei seu tórax enquanto as lágrimas involuntárias escorriam de suas bochechas para fronha e ele parecia machucado. Porém, ele sorria para mim cada vez que eu o chamava - mesmo que alguns sorrisos parecessem mais esgares doloridos - e rebolava por conta própria como se para testar o nível de dor que podia suportar. Tive medo de fazê-lo sangrar.
- O que acha? - perguntei.
- Gostava mais dos seus dedos - ele admitiu abrindo um dos olhos e apertando as pernas em torno do meu corpo - Não está tão ruim... Só... Incômodo, acho. É como... Hm...
- Não fale demais - resmunguei, temendo me debruçar sobre ele e machucá-lo - Posso me mexer?
- P-Pode.
O estoquei a primeira vez e ele gemeu alto. Na segunda, choramingou. Na terceira, mordia o lábio inferior e franzia o cenho. Então passou a suspirar enquanto eu entrava e saía devagar, ondulando o quadril, tocando seu falo latente alternando velocidades e brincando com seus mamilos.
- Lu?
- Hm? Sim?
- Vai mais fundo... - murmurou desconexo.
- Mais fundo?
- Quando você vai mais fundo, eu sinto... Alguma coisa... É gostoso...
- S-Sim - sorri abobado, deitando sobre seu tórax e me movendo lenta e profundamente dentro dele, sentindo o membro dele pulsar entre nossos corpos que começavam a suar frio e esquentar. Meus bipes aceleraram e eu procurei controlar minha respiração com medo de que aquilo nos delatasse.
- Mais - pediu ao pé de meu ouvido, levando a mão até minha nuca e abrindo os olhos para me ver com sua visão desfoque.
Aumentei a velocidade enquanto ele continha os gemidos e contorcia-se abaixo de mim. Alguns movimentos bruscos o machucavam e os evitei o máximo possível.
Vi quando seu corpo quebradiço começou a sofrer espasmos que o dobravam e tiravam seu tronco do colchão com o primeiro orgasmo eminente. Soltei seu falo escorrendo pré-gozo e acariciei seus cabelos, beijando sua testa suada.
- Troca - falei.
- O quê? - ele me olhou, movendo o quadril de encontro a mim.
Eu me retirei dele, recebendo um gemido arrastado e seu olhar curioso. Minha cabeça rodopiou e, zonzo, me segurei nos ombros de Sehun até que as vertigens passassem.
- Lu?
- É só uma tontura - respondi.
Segurei o membro de Sehun pela base e o rocei contra minha entrada. Ele me agarrou os quadris e suspirou ansioso, fez-me rebolar em seu colo e apertou minhas pernas.
- É a minha vez? - perguntou com esperança.
- Sim, sua vez - sorri cansado. Meu fôlego realmente não era mais o mesmo.
Meus joelhos tremeram sem apoio quando me ergui para acomodá-lo dentro de mim. Deixei que Sehun fosse o sustento de meu corpo, com as mãos em minha cintura enquanto me masturbava para dissipar a dor de ser penetrado sem preparação.
- Me deixa fazer isso - ele pediu com a voz mansa.
Eu me lembro das mãos se Sehun em mim. De como ele foi carinhoso ao traçar caminhos por minhas coxas e substituir meus dedos pelos seus, menos experientes e mais quentes, hesitantes, me explorando enquanto me penetrava. Me lembro de seus olhos cinzentos me fitando de forma quase explicita, mirando meu tronco como se eu fosse o ser mais desejável apesar de minha cor macilenta, dos hematomas em meu estômago e de meus ossos aparecendo sob a pele. Me lembro de seu toque me fazendo esquecer todo o resto.
Debrucei-me sobre ele e ondulei o quadril, arrumando minhas pernas de forma que se tornasse menos doloroso e o beijei antes que ele pudesse falar algo.
- Isso é fazer sexo com um homem - sussurrei sem fôlego.
- E é muito bom - completou com um sorriso, soltando um gemido quando me contraí em sua extensão.
- A-Ah... Vamos com calma, eu estou cansado - ri contra seus lábios e senti seus dedos acariciarem minhas coxas em compreensão.
Tê-lo em mim era incrível. Eu poderia tentar arranjar mil palavras para descrever as diversas sensações que passavam por meu corpo, já que cada terminação nervosa, cada tecido, cada órgão dentro de mim parecia implorar por mais, no entanto nenhuma seria capaz de se comparar ao que eu sentia.
Rebolei de leve e Sehun gemeu satisfeito abaixo de mim. Queria tanto poder oferecer a ele uma cama confortável, algo intenso e sensual, beijos de tirar o fôlego. Porém eu só podia lhe dar um sexo com pausas num colchão reclinável e um chiado no peito com a perspectiva de desmaiar a qualquer momento. E mesmo assim, parecia ser tão bom para ele quanto estava sendo para mim. Seus olhos estavam semicerrados ainda com a marca das lágrimas fitando perdido meu corpo que ondulava sobre o seu. De ombros relaxados, ele tinha os braços em arcos até minhas coxas, com os dedos pousados sobre minha pele. Respirava alto e umedecia os lábios frequentemente.
- Luhan... É tão bom... - sorriu de canto para mim e meu coração apertou-se. Eu não poderia suportar a ideia de deixá-lo.
- Queria poder ser melhor - confessei, respirando com força para que meu cérebro tivesse ar o suficiente para levar aquilo até o final.
- Está ótimo... É... Quente - ele tentou descrever, porém as palavras não articulavam. Era mesmo minha pequena criança metida à esperta com mania de racionalizar tudo - E também... apertado - gemeu quase sem fôlego, mordendo o lábio inferior.
- Fique quieto ou... você vai desmaiar - sussurrei, enquanto os dígitos longos apertavam minha coxa e eu friccionava intencionalmente meu falo entre nossos abdomes.
- M-Mais rápido - pediu. Era algo que eu realmente queria poder conceder. Na verdade, queria que em um universo paralelo, eu estivesse saudável e proporcionando a melhor primeira vez para Sehun - P-Por favor - acrescentou ao ver que meu corpo não tinha muita força para impulsioná-lo para dentro de mim. Gemi tristonho, forçando minhas pernas a fazerem um serviço melhor.
- Vá por cima - disse em um suspiro lânguido, desejando que minha voz não parecesse tão chiada.
Eu nunca tinha me enroscado tanto em tubos quando naquela noite, enquanto deslizava suavemente para baixo de Sehun e ele circundava sua cintura com minhas pernas.
- Vai Sehun - permiti quando me vi, já sem ar, acomodado embaixo dele.
Ele me penetrou rápido, firme, extremamente excitante. Em troca de suas estocadas lentas, eu gemia deleitoso e lhe dava sorrisos meio exaustos que lentamente se tornavam em selares, depois em beijos, depois em nós dois procurando recuperar o oxigênio perdido.
- L-Lu... Eu estou quase - o ouvi sussurrar contra minha orelha e puxei seus fios castanhos para mim.
- Vamos até o final - respondi, suspirando pesado. Meu cérebro começava aos poucos a girar e a imagem do rapaz suado, pálido e atraente a minha frente estava ficando embaçada.
Então ele aumentou a velocidade. O máximo que podia sem arriscar nossas vidas. E gemia baixinho com o rosto enfiado no meu pescoço como se aquilo fosse a coisa mais gostosa que ele já tivesse feito. Como se fazer sexo comigo num hospital gelado, com a janela aberta e a porta destrancada, ligado a tubos que garantiam uma boa noite de sono e tendo que parar para não morrer de vez em quando fosse bom. E era. Era a melhor coisa do mundo senti-lo entrar e sair de mim, sua respiração chiada na minha pele, gelada e quente ao mesmo tempo e seus dedos agarrando meu braço com força como se ele tentasse não se perder de mim.
- S-Sehun... - murmurei quando o orgasmo me atingia, melando nossos corpos unidos.
E ele, em meio ao clímax, pediu um beijo. Eu o beijei delicadamente, ainda sofrendo espasmos que logo trouxeram o prazer dele. Então desabamos juntos, suspirando pesado e com o peito chiando em uníssono.
- I-Isso foi... - ele tentou resmungar e eu coloquei um dedo em sua boca, negando com a cabeça para que ele se recuperasse primeiro.
Ele me sorriu e imaginei que talvez aquele pudesse ter sido o mais bonito sorriso de dentes retos que alguém pôde dar.
- Bom - completou por fim, meio rouco e suado, naquela desordem de sexo e suor que o deixava parecendo um modelo de uma revista. Um modelo pálido e magro demais, mas ainda assim a coisa mais atraente que eu já poderia ter visto.
- Estou exausto... Queria poder ter feito melhor - confessei e lhe beijei a testa suada, enquanto o ajeitava junto a mim.
- Se eu sobreviver, vou querer transar mais... - ele riu e arranhou com delicadeza meu corpo. Arrepiei e propositalmente, gemi.
- Você não vai morrer... - soei irritado. Não é agradável ouvir a pessoa que acabou de lhe tomar para si dizer sobre morte. Mesmo se ela tiver câncer - Você vai sair daqui e vai ser muito feliz, entendeu?
- Luhan? - ele murmurou, suspirando.
- Sim?
- Quando sairmos daqui, eu quero ficar com você - segredou, apertando meu corpo com a delicadeza suficiente para não me machucar.
E eu murmurei de volta algo que nem mesmo entendi. Beijei com cuidado sua testa e lhe sorri tentando passar uma confiança que eu não tinha. Então, dormimos abraçados com nossos tubos enrolados e uma desculpa esfarrapada para dar para a enfermeira no outro dia.
No momento, era tudo que eu podia oferecer.
[Não me ame
O adeus sempre virá
Doí até respirar
Pensei que isso só doeria o quanto eu o queria
Mas estava enganado
Isso doí mil vezes mais
De novo, de novo... Isso não pode, não pode acontecer...
Eu continuo falando pra mim mesmo, como um bobo]
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