Madison
Prendi o meu cabelo em um coque frouxo de novo assim que paramos no primeiro sinal. Já estava ficando uma bagunça completa e eu o lavei ontem. Reclamei por longos minutos com Gabriel por falta de capacete, até ele me prometer que iria começar a usá-lo.
Abracei a cintura de Gabriel com ainda mais força quando ele acelerou a moto ao passarmos pelo sinal. As ruas estavam vazias, mas mesmo assim o garoto parou em todos os sinais. É um menino fumante que segue as regras, afinal.
Em um momento, o vento frio bateu na minha pele, mesmo com a blusa de manga e a calça. Como um impulso, minhas mãos invadiram a jaqueta de Gabriel e se acomodaram bem ali, sentindo os gominhos do abdômen sob a blusa. Quase soltei um suspiro de prazer.
Passamos pelos prédios e casas típicos da Califórnia, até chegarmos à área das praias. As palmeiras balançavam com o vento diurno, o céu estava começando a clarear e o sol começava a aparecer em poucos. Dava para ver, lá no fundo, as ondas do mar batendo fracamente. O cheiro praiano típico invadiu minhas narinas.
-- A gente tá chegando? – Gritei para ele, por cima do vento.
-- Mais ou menos. Tenha paciência. – Respondeu ele, na mesma altura. Então virou o rosto um pouco para trás, me olhando de canto. – Ei, Mel, você não tem medo de altura, tem?
Cerrei os olhos.
-- Por quê?
-- Tem ou não?
-- Não tanto.
Ele assentiu levemente e voltou a atenção para a estrada. E eu voltei a minha para a praia.
Quando percebo a praia ficando mais distante, vejo que estamos começando a entrar em uma subida. Mesmo assim, a praia continua em nossa vista. Aperto meus braços na cintura de Gab assim que a subida fica mais íngreme. De um lado, as ondas da praia continuam batendo contra a orla. De outro, uma montanha alta e rochosa acompanha a subida.
-- Onde a gente tá? – Pergunto, receosa.
-- Não se preocupe, você tá segura.
-- Não sei se isso é uma verdade.
Ele ri um pouco, acelerando a moto.
-- Não confia em mim? – Gritou, por cima do barulho.
-- Não! – Berrei de volta.
Ele riu mais uma vez, e então diminuiu a velocidade quando paramos de subir. O terreno estava reto de novo. A moto parou assim que chegamos a um lugar no canto da estrada – vazia, por sinal.
-- Chegamos?
-- Quase. – Disse ele, e desceu da moto. – Vem logo.
Mais uma vez, segurei a mão que ele estendeu para mim, mas desta vez, para descer da moto. Com o baque dos meus sapatos contra o chão rochoso, meu cabelo se solta do coque e cai sobre os meus ombros. Eu só tiro os fios intrusos do meu rosto e os passo para trás.
Olho para frente. É alto, mas não tanto. Dá para ver toda a extensão da praia daqui. O movimento das ondas e do vento batendo contra as palmeiras. O sol está mostrando os primeiros raios, finalmente. Um laranja forte se estende por toda a praia. As nuvens estão se afastando, mas criam uma paisagem perfeita. O que sempre vemos do campus, mas aqui é mais amplo. Mais aberto. Consigo ver todo o céu pela extensão da praia. E é tão lindo.
-- É lindo, não é? – Gab pergunta, olhando na mesma direção que eu.
-- Muito...
-- Vem, vamos descer. – Ele aponta para uma escada que surge em meio às plantas que complementam a pequena montanha que estamos.
-- Acabamos de subir, Gabriel.
-- E agora vamos descer. Para de reclamar, mulher. – Resmunga. – Presta atenção porque aqui tem espinhos. Daquele tipo que agarra na pele.
-- O quê?! – Exclamo, arregalando os olhos.
-- Vem logo. Confia em mim. – Pega a minha mão e me guia até a escada.
-- V-você vai deixar a moto aqui?
-- Eu sempre deixo. Ninguém vem aqui. Tá tranquilo.
Ao ver a minha relutância em entrar naquele lugar por causa dos espinhos, ele suspira e começa a tirar a jaqueta. Eu nunca o vi sem a jaqueta. Isso vai ser interessante.
E tentador. Puta merda, ele... ele é tão gostoso quanto parece. Os braços são musculosos e tão... perfeitos sob a manga da camisa preta. Se a minha mãe tivesse vendo isso, ela daria um berro e surtaria o suficiente para ser comparada com uma adolescente.
-- Toma. Veste isso aqui. O couro é grosso. – Gabriel me entregou a jaqueta.
-- Mas e você? – Pergunto, vestindo a peça.
-- Eu sei como passar por aqui com cuidado. Vem.
Ajeito a enorme jaqueta em meu corpo, ela bate um pouco acima da minha coxa. Seguro a mão de Gabriel mais uma vez e começamos a descer a escada com degraus rochosos.
-- Isso escorrega... – Comento, descendo depois de Gabriel.
-- Se você escorregar, eu seguro você. – Diz, simplesmente, mas com a voz firme. – Prometo. – Assenti, sentindo arrepios percorrerem meu corpo.
Depois de muitos degraus, de quase morrer de medo de algo me acertar e de me perguntar milhões de vezes o motivo de eu estar aqui, a escadaria acaba e Gabriel afasta uma grande folha que impede de vermos o que tem à frente. Ele passa primeiro, mas continua segurando a minha mão.
Descemos um grande degrau – ou só uma grande pedra – e, finalmente, consigo olhar para frente e não para o chão. A areia toca meus tênis agora e estamos na praia. Ou uma versão menor dela. As pedras cercam a área dos dois lados, e o único meio possível de sair daqui é nadar até o outro lado – ou subir essa escadaria. É uma praia particular.
-- Nossa... – Perco o ar com a visão. Não tem como descrever.
Parece simples, mas para mim, de alguma forma, não é. Mesmo amando ver o pôr e o nascer do sol, nunca experimentei vê-los de uma praia. E me arrependo por isso. Em Londres, os dias são mais chuvosos e fechados, então era difícil encontrar um dia bom para ir à uma praia e ficar até o fim do dia.
Quando paro de olhar por um momento para o céu, vejo Gabriel tirando os sapatos e começando a tirar a blusa.
-- O que tá fazendo?! – Pergunto, assustada.
-- Indo para a água – explica, como se fosse óbvio. E então tira a blusa.
E eu babo naquele tanquinho por completo. Puta merda, o que é aquilo? Lavaria roupa facilmente ali. Completamente trincado. Ai, mamãe, me salva...
Fico surpresa por não ter nenhuma tatuagem. Totalmente limpo. Isso é uma novidade.
-- M-mas... Agora? A gente precisa voltar pro Campus, seu louco!
-- As aulas só começam às oito – responde, tirando a calça. Não, não, não! Viro para o outro lado rapidamente. Ouço uma gargalhada dele. – O que foi, Mel? Tá com medo de resistir ao meu corpo?
-- Não. Não sou eu quem não pode transar por um ano. – Dou de ombros, mas não viro. Tenho medo de babar assim que bater os olhos nele.
-- Não precisava me lembrar disso. – Ouço um suspiro. – Para de drama. – Continuo me recusando a virar. Passado alguns segundos, escuto um grito do tipo “uhuuul”. Reviro os olhos. Ele realmente entrou. – Você precisa entrar, Mel, a água tá ótima!
Viro o corpo em direção à água. Ele está bem ali, dentro d’água. Olhando para mim. Agradeço aos deuses por não poder ver de sua cintura para baixo.
-- Não, valeu! – Grito. – Vou ficar só olhando.
-- Ah, qual é! Tá com medinho, é?
Riu levemente. Ele não sabe o quanto eu posso ser corajosa. Dane-se. O que poderia acontecer de pior? Ele nem pode transar mesmo.
Você pode não resistir a ele, idiota! Minha consciência diz.
Eu consigo fazer isso. Digo a mim mesma.
Tiro meus tênis e os deixo de lado, junto com a jaqueta que Gab me deu. Em um suspiro, levanto minha blusa e a tiro, jogando ao lado da pilha de roupas de Gabriel. Abaixo minhas calças e as chuto para o mesmo lugar. Sorrio fracamente ao conseguir ver a expressão surpresa de Gabriel.
Só de roupas íntimas, caminho até a água. Sinto a água morna bater em meus pés e fico aliviada. Não está fria. Desvio o olhar para a água em meus pés por um momento enquanto vou entrando lentamente, e quando volto para o lugar em que Gabriel estava, ele sumiu, bem no momento em que uma onda maior passa por lá. Segundos depois, ele emerge da água e passa as mãos no cabelo. Que gato...
A onda que passou por ele, passa por mim e bate na minha barriga quando estou mais próxima dele.
-- Eu jurava que você ia usar uma desculpa de que não tem biquíni. – Gabriel comenta, impressionado.
-- Não tenho esse tipo de frescura. Calcinha e sutiã são iguais a biquíni. – Dou de ombros.
-- Eu concordo. Ambos são tentadores de olhar. – Balança a cabeça em afirmativa. – Principalmente em garotas morenas... Com olhos cor de mel, baixinhas, e com o corpo marav...
-- Já chega, cara. – Rio, franzindo o cenho.
Não gosto que elogiem meu corpo. Não acho que os elogios sejam verdadeiros. Meu corpo não é igual aos das garotas da minha idade. Magro e esbelto. Eu tenho algumas dobrinhas que se sobressaem quando eu me abaixo, por exemplo. Minha barriga não é totalmente reta. É bem grandinha, por sinal. Eu sou magra, mas meu corpo tem mais gorduras do que os outros conseguem ver.
-- Gostou daqui? – Perguntou ele, virando-se em direção ao nascer do sol.
-- Demais. – Repito a ação dele, ficando ao seu lado. – Como encontrou esse lugar?
-- Foi no início do ano passado. Eu tinha brigado com o meu pai e fiquei muito puto. Subi na moto sem rumo nenhum. Quando cheguei ali em cima, vi aquelas escadas e decidi descer. Eu estava sem jaqueta, e um dos espinhos me acertou. Doeu pra caralho. Mas eu nem me importei, só continuei descendo. Encontrei isso aqui. Desde então, sempre venho aqui quando preciso espairecer. Praticamente toda semana. – Rio do seu drama. – Nunca vi ninguém vir aqui. Acho que ninguém sabe que isso existe. Bom, agora você sabe.
-- Bella, Ty e Ethan não sabem?
-- Eles sabem que tem um lugar que eu vou pra pensar, mas não sabem onde.
-- Hm... – Brinco com a água.
Mal percebo quando Gabriel afunda o corpo sem avisar. Nem me importo, continuo a mexer com a água. Sinto algo puxando minha perna para baixo e solto um grito antes de afundar na água.
Aperto os olhos fechados e prendo a respiração. Começo a me debater e meu cotovelo acerta alguma coisa. Me acalmo mais quando escuto um grunhido de dor de Gabriel, mesmo embaixo da água.
-- Ficou maluco?! – Exclamo, indignada, quando emergimos.
-- Você não tinha molhado o cabelo ainda. Só dei uma ajuda. – Ele diz, risonho. – Caralho, como você é forte desse jeito?
-- Sei me defender como posso.
-- “Sei me defender como posso” – repete ele, com uma voz fina e nada parecida com a minha. – Blá-blá-blá.
-- Deixa de ser infantil. – Jogo água nele.
-- “Deixa de ser infantil” – repete de novo, e joga água em mim.
Começamos uma típica guerrinha de água, arrancando gargalhadas de ambos. Tento chegar mais perto e afundá-lo, mas ele é forte demais, não consigo. Então é ele que empurra meus ombros para baixo e me afunda. Puxo seu pé embaixo da água e finalmente o pego desprevenido.
Mas no momento em que vou voltar para a superfície, tento me apoiar na areia no fundo para subir, mas não há areia. É algo mais fundo. Isso faz minha perna afundar mais.
Abro os olhos, não tendo escolha. Gabriel está de olhos abertos embaixo da água – como? Eu não sei – e vê minha situação. Com uma velocidade extraordinária, me alcança e segura a minha cintura, me levando até a superfície.
-- É um buraco. Cuidado. – Avisa, depois que consigo voltar a respirar. Não demora muito para que eu perca o ar de novo com a proximidade dos nossos corpos e rostos. – Você tá bem?
-- Tô. Foi só um susto. – Dou um sorriso amarelo.
Ainda abraçando minha cintura, Gab nos afasta um pouco do buraco. Uma onda um pouco maior passa por nós e me impulsiona para frente, deixando meus seios colados no peito dele. Meu olhar não se decide se olha para os olhos azuis profundos ou a boca carnuda de Gabriel. Ele parece estar na mesma situação comigo.
Lentamente, deslizo minhas mãos pelos braços musculosos dele. Pouso-as nos ombros. Se continuarmos assim, não vou conseguir resistir. Então faço a primeira coisa que vem a minha mente. Empurro os ombros de Gabriel para baixo. Finalmente, consigo afundá-lo porque estava distraído. Sorrio, vitoriosa. E conseguindo recuperar o ar que faltava.
O moreno volta à superfície, passando a mão no cabelo.
-- Ah, qual é, Mel! Eu estava sentindo uma conexão! – Diz ele, rindo.
-- Só nos seus sonhos, garoto fumante!
Solto uma gargalhada, começando a nadar para trás quando Gabriel vem em minha direção com um olhar predatório. Afundo minha cabeça quando percebo que ele vai jogar água em mim. Ficamos nessa brincadeira até dar o horário de voltarmos para o campus.
É, pode ser que a minha – ainda não muito existente – amizade com Gabriel possa durar mais do que eu pensei.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.