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História Pardebi - You thought


Escrita por: Marurishi

Notas do Autor


Tags do capítulo: Revelação. Aniversários. Reflexão.

Capítulo 14 - You thought


 

“You thought I couldn't last without you.

But, I'm lastin.” [13]

 

Stefian Ampartavani, o grande entusiasta das ciências periféricas com tópicos paranormais, estava mais uma vez em Nelovânia para propósitos secretos, para os quais precisava encontrar outros paranormais.

 

O nome do principal cientista pesquisador da parapsicologia chegou até Stefian há pouco mais de um ano: Dr. Venk Daekh.

 

O cientista havia retornado à sua cidade natal, Parkedale. Sua profissão rendeu ganhos suficientes para proporcionar uma boa vida e estudos em ótimas instituições para os três filhos, que escolheram profissões bem diferentes da do pai. No entanto, o declínio de sua carreira no Armoshoba e o desejo de continuar as pesquisas fizeram com que ele investisse muito mais do que tinha, vindo à falência. Com o diagnóstico de sua doença e sem reservas financeiras, a família sofreu as consequências.

 

Foi nessa situação que Stefian encontrou os Daekhs: Dr. Venk estava internado em uma clínica lutando contra a demência, completamente incapaz de fornecer a Stefian qualquer conhecimento ou continuidade sobre os ambiciosos projetos, a esposa, que tinha grande conhecimento das pesquisas do marido, havia falecido há alguns anos e o mais velho dos três filhos estava inválido devido a um acidente de trabalho.

 

De certa forma, Stefian havia encontrado os Daekhs num momento crucial, já que enfrentavam doença, desemprego, dívidas e até ameaça de perder a única casa que lhes restou. Mesmo com o patriarca incapacitado, os filhos seriam úteis para seus planos, pois desejava ter acesso às pesquisas secretas do Dr. Venk e nada mais apropriado do que conquistar confiança e amizade deles. Foi por esse motivo que saldou a dívida judicial da propriedade em Parkedale e contratou o filho do meio, Naigel, para ser seu assessor pessoal.

 

Na situação complicada em que os Daekhs estavam, aquela era uma proposta irrecusável. Contudo, na medida que iam convivendo, Stefian percebeu ter cometido um erro crítico, pois Naigel não era o filho que compartilhava do mesmo gosto do pai pela ciência, pelo contrário, ele era cético e preconceituoso sobre o assunto; o que fazia Stefian se irritar facilmente, mas tolerava porque precisava do rapaz, além de que gostava de ter sob suas ordens pessoas bonitas e elegantes, como era o caso de Naigel, com seus cabelos castanhos fartos, seus olhos cor de âmbar e o nariz empinado dando-lhe um ar petulante que Stefian adorava.

 

Naigel Daekh era 3 anos mais velho que ele. Formado em Comércio Exterior, tinha talento para os negócios. Mudou-se para a mesma cidade de Stefian, passando a acompanhá-lo em todos os lugares e assessorando-o em todos os aspectos, tanto nos negócios da empresa como também na busca por informações e pesquisas secretas.

 

Em Nelovânia, Stefian finalmente encontrou algo que desejava: Ryth Nateli. Mais do que apenas especulações ou testes sem comprovações, aquele garoto era um paranormal autêntico e isso fazia com que ele gastasse muito do seu tempo observando-o pessoalmente. Evidentemente, não contou para Naigel o fato do menino ser um paranormal, o que fazia o assessor desconfiar do interesse dele no garoto.

 

Conheceu posteriormente Kanth Lamazi. Se fosse tolo, poderia crer que se tratava de um mero acaso ser, justamente, aquele garoto a estar com Ryth Nateli, mas Stefian sabia que aquilo não era uma coincidência.

 

Naquele final de semana, estava na cidade para observar os garotos. Descobrir sobre o relacionamento deles não mudava em nada seus planos, o que mudou foi seu humor ao ver um homem mais velho fotografando-os de maneira inapropriada. Não permitiria que ninguém causasse danos aos seus preciosos garotos.

 

Ao sondar a mente do homem, descobriu fatos perniciosos que lhe reviraram o estômago. Desejou matá-lo imediatamente, mas ali não era um bom lugar, criaria uma nova oportunidade quando fosse propício.

 

Na sua opinião, aqueles garotos eram tão ingênuos que beiravam a estupidez, plenamente sem noção do perigo que corriam diante de uma mente doente e enciumada de um homem pervertido como Wis. Stefian tratou de avisá-lo, mas não poderia ser qualquer aviso, feito de qualquer maneira, deveria ser algo que lhes desse uma impressão para levar no resto de suas vidas! Não seria tão difícil impactá-los, tendo em vista que ambos os garotos eram quase leigos na paranormalidade, sequer dominando em totalidade os próprios poderes, algo que fazia Stefian os achar ainda mais patéticos e adoráveis.

 

Quando concluiu seu trabalho, tratou de lidar com Wis, queria estragar o dia dele, por isso o abordou de forma rude e se divertiu ao ver como o motorista ficou irritado em ser interrompido.

 

Ao voltar para o hotel, tinha novos planos.

 

“Thought that I would fail without you

But I'm on top.” [13]

 

 No dia seguinte, Stefian começou seu trabalho.

 

— Bom dia, chefe!

 

— Bom dia, Nagiel — Stefian, sentou-se à mesa para tomar seu café da manhã enquanto o rapaz entregava-lhe o tablet com a agenda do dia. — Como está seu pai?

 

— Infelizmente o quadro é o mesmo — informou enquanto servia o café. — A clínica pediu permissão para fazer o tratamento de choque, mas não estou certo se isso é bom.

 

— Evidentemente que não! São procedimentos extremamente agressivos. O que vocês decidiram?

 

— Meu irmão decidirá — falou enquanto organizava os pães sobre a mesa.

 

— Ele fará o correto, é sábio — elogiou sincero e encarou o rapaz quando ele se aproximou para arrumar a gola de sua camisa.

 

— Apesar do meu pai já não estar mais lúcido há anos — deu a volta por trás de Stefian —, o senhor ainda acredita nele? — perguntou enquanto abotoava o colarinho, ainda que não houvesse necessidade alguma de ajudar seu chefe a se vestir, Naigel fazia por prazer.

 

— Respeito seu pai, ele é um grande homem — tomou um gole de seu café e continuou com rigor. — Ainda que esteja insano, as pesquisas que ele desenvolveu durante toda sua vida são de valor incalculável — acrescentou com tom de reprovação. — Pena que essa sociedade imbecil não dê o valor adequado.

 

— Eu agradeço a consideração, ainda que considere o interesse na paranormalidade uma perda de tempo.

 

— Não deixe de me falar caso sua família esteja em dificuldade — ignorou o comentário, pois detestava o fato de Naigel ser cético. — Como está seu irmão?

 

— Desde a segunda cirurgia, ele parece ter quase voltado ao normal, com exceção das eventuais dores — aproximou-se de maneira bastante íntima para ajeitar os cabelos de Stefian, que estavam bagunçados.

 

— Seu irmão é excepcionalmente incrível, Nagiel, eu admiro-o e desejaria muito que ele pudesse trabalhar para mim — falou entusiasmado, não se importando com a intimidade e proximidade de Naigel, pelo contrário, apreciava.

 

— Me desculpe, senhor — afastou-se —, mas não consigo deixar de sentir-me ofendido com sua admiração por ele, já que Maros é apenas um mordomo enquanto eu tenho uma graduação e um futuro promissor na carreira empresarial.

 

— Não seja ridículo, Naigel — estreitou os olhos e encarou-o com olhar felino. — A profissão de mordomo está na lista das mais apreciadas, seu preconceito é descabido.

 

— Sua admiração se deve ao fato de que ele acredita na paranormalidade e eu não… — falou magoado, virando-se de costas.

 

— Exatamente — soltou a xícara sobre o pires com força desnecessária. — Sabe que detesto sua descrença e seus preconceitos. — E completou ordenando autoritário: — Saia!

 

Naigel não se importava em demonstrar abertamente sua insatisfação, Stefian preferia o irmão mais velho a ele, era fato e isso era inadmissível.

 

— Se precisar de mim, estarei no quarto ao lado — disse saindo para o corredor.

 

Desde que o jovem bilionário apareceu em sua casa, procurando seu pai, Dr. Venk Daekh, Naigel ficou fascinado, uma atração incontrolável e um desejo irracional de estar ao lado daquele rico e poderoso rapaz de cabelos platinados.

 

Quando Stefian fez uma proposta de emprego, Naigel aceitou sem pestanejar e, sabendo que os assuntos paranormais estariam sempre em vogue, fingiu interesse. Logo ficou clara a sua descrença, porém, tentava manter a compostura para não desagradar o chefe, mas quando Maros era introduzido na conversa, não conseguia conter seu ciúme e sempre acabava agindo com deselegância.

 

Stefian aproveitou o momento de solidão para refletir sobre seus planos para aquela semana, percebeu que havia conexões exageradamente fantásticas que estavam além de seus objetivos, como por exemplo: o fato de Maros Daekh, irmão mais velho de Naigel, ter sido mordomo na mansão dos Lamazis, cujo herdeiro era Kanth Lamazi, um paranormal e melhor amigo de Ryth Nateli, outro paranormal.

 

Era um presente dos deuses que todos estivessem conectados de alguma forma ou era tudo parte de um plano maior? Stefian precisava pensar e planejar, pois agora, além dos garotos, também precisava se preocupar com a moça de cabelos azuis e a tal amiga.

 

Tudo estava se conectando naturalmente. Pensou no tipo de conexão que essas garotas teriam futuramente e decidiu investigar um pouco mais sobre elas. Queria observá-las, principalmente, saber mais sobre a que se chamava Miyumi.

 

“You thought that I would die without you

But I'm livin.” [13]

    

A semana de exames foi exaustiva para todos os alunos do Colégio Damsakh, porém, Ryth e Kanth não precisaram de muito esforço para obter excelentes notas. Como sempre, o loiro ficou em primeiro lugar. A inteligência era algo natural e intrínseca.

 

— Achei que você não ia conseguir o primeiro lugar! — disse Alec, se aproximando de Ryth e Kanth, ao término das aulas. — Depois que Kanth chegou, você mudou tanto, achei que isso afetaria seu cérebro também.

 

Kanth revirou os olhos enquanto os amigos de Alec riram como se ele tivesse feito uma ótima piada. Como Ryth o ignorou, o ruivo prosseguiu:

 

— É sério, Ryth, parabéns por mais um ano sendo o número 1 do colégio — sorriu turvo. — Uma pena que no próximo ano não seremos mais colegas.

 

— Ah, você vai mudar de colégio? — perguntou Ryth, sem muito interesse.

 

— Claro que não! — riu debochado. — Por todas as coisas que andei sabendo, são vocês dois que vão.

 

Alec saiu rindo sem esperar por questionamentos. Na verdade, nem Ryth, nem Kanth estavam interessados nas asneiras que o ruivo dizia. Porém, como o vislumbre de uma tragédia, Kanth se lembrou das cartas anônimas e falou exaltado:

 

— Ryth, há uma possibilidade não muito remota de que o remetente seja o idiota do Alec!

 

— Das cartas? — pensou por alguns segundos, vendo Alec se reunir com seu grupo e se afastarem. — Creio que ele escreveria xingamentos, não poemas.

 

— Sempre achei que o remetente fosse alguém que soubesse sobre meus segredos, mas pode ser que não saiba de nada e escreva apenas como uma provocação, tal qual Alec o faz!

 

— Faz sentido, provocar apenas por prazer mesmo que não saiba de nada… — fez uma careta de desdém. — Ele não sabe nada sobre nós, mas fala como se soubesse algo importante.

 

— Ele usa os rumores sobre minha família para me humilhar desde o primeiro dia de aula — relembrou o seu primeiro encontro com Alec no banheiro, que ocasionou o início da amizade com Ryth. — Apesar de não ser segredo o meu sobrenome, como ele tinha tanta certeza que eu era o herdeiro e não apenas um parente?

 

— Por que os pais devem ter comentado sobre sua matrícula, esqueceu que ele é filho do diretor?

 

— Isso mesmo! Seria fácil para ele fazer esse tipo de coisa sem ser descoberto. Ainda que fosse, não seria punido como nunca é.

 

— Bem, se realmente for ele, não há motivos para nos preocuparmos — Ryth sorriu. — São só provocações vazias.

 

— Sim, mas se for ele, vou querer me vingar! — falou estreitando os olhos.

 

Ryth olhou um pouco surpreso para o amigo, pois não esperava que Kanth pudesse ter tal espírito de vingança, pois sempre fora amável e sensível; aquele tipo de reação não condizia com sua personalidade gentil. Era a primeira vez que ele demonstrava uma atitude totalmente oposta a sua passividade.

 

— Acha mesmo necessário?

 

— Não se preocupe, não vou fazer nada muito violento — falou sério.

 

— O que pretende? — ficou curioso e ao mesmo tempo, intrigado pela atitude do amigo.

 

— Vou devolver as cartas! — sorriu doce, fazendo tudo aquilo soar ainda mais estranho. — E escrever uma de agradecimento.

 

Ryth apenas balançou a cabeça negativamente e nada comentou. Na verdade, não sabia como reagir e esperava que Kanth não levasse aquilo adiante, afinal, não tinham certeza que o remetente das cartas fosse, realmente, Alec. Ryth não era o tipo que fazia algo precipitado; já não se podia dizer o mesmo de Kanth, mas o loiro esperava que aquele desejo de vingança fosse apenas algo momentâneo.

 

Estavam oficialmente de férias e mesmo que Kanth pretendesse devolver as cartas, não teriam mais tempo para isso, pois só voltariam a se ver no ano seguinte.

 

O que ambos concordavam é que encontrar Maros era a prioridade no momento e ficou decidido que usariam as férias para isso. A longa viagem dos Lamazis foi providencial e deu liberdade para Kanth agir com seus planos.

 

 Problemático era lidar com Wis durante as férias e na ausência dos pais.

 

“Thought that I would self destruct

But I'm still here.” [13]

 

Kanth não era autorizado a levar amigos para o apartamento, era uma forma de segurança, mas como os pais não estavam em casa, decidiu que, para Ryth, faria uma exceção. Pelo amigo, Kanth quebraria qualquer regra com prazer, até porque era uma maneira de ficar seguro. Apenas temia que o mordomo, Andreis, não o recebesse bem.

 

Marcaram um dia para se encontrarem no Mdidari e quando Ryth chegou na portaria, Kanth e Andreis o esperavam. Para alívio do moreno, o mordomo recebeu o amigo com simpatia, tratando Ryth pelo nome. Os garotos foram para o elevador principal enquanto o mordomo pegava o de serviço. Ryth perguntou curioso:

 

— Até o porteiro já sabe meu nome?

 

— É Andreis, nosso mordomo.

 

— Ah, entendi... — Uma questão surgiu. — Kanth, como são seus vizinhos aqui?

 

— Não temos vizinhos — respondeu naturalmente.

 

— Como assim? — estranhou. — O Mdidari tem vários apartamentos, é um prédio de luxo, que, inclusive, foi construído pela empresa dos meus pais. Você não conhece as outras famílias?

 

— Não há outras famílias, alguns apartamentos são usados pelos empregados, outros como escritórios para os negócios ou “guarda-coisas” dos meus pais.

 

— Guarda-coisas? — estranhou mais ainda. — Guardam o quê?

 

— Coisas! — abriu um sorriso turvo. — Não comece a fazer muitas perguntas sobre isso, ou vou ser proibido de te trazer aqui.

 

— Wau! — exclamou encarando o amigo. — Falando assim, soa como se os rumores sobre os Lamazis fossem verdadeiros.

 

— Eu nunca disse que eram falsos — falou sério e manteve o olhar reto para a porta. — Apenas não fique perguntando sobre essas coisas; eu não posso responder.

 

O elevador se abriu e eles saíram. Ryth não podia dizer se estava chocado ou apenas receoso em saber que era tudo verdade sobre a máfia dos diamantes de sangue liderada pelos Lamazis. Talvez, Kanth ainda tivesse segredos a serem revelados, mas nesses Ryth até preferia não se envolver.

 

Era a primeira vez que Ryth entrava no apartamento dos Lamazis. Diferente dos Natelis, que gostavam do clássico e tradicional, ali havia o exagero na quantia de dourado e brilho, bastante condizente com o estilo da família*. Sem delongas, foram direto para o quarto de Kanth. Jogaram os sapatos num canto e Kanth sentou-se na cama enquanto Ryth preferiu o sofá. Cada um com seu notebook no colo.

 

— Sabe, Ryth, eu estive pensando em algo que li num romance policial — falou o moreno, empolgado.

 

O loiro apenas o encarou, na expectativa de como aquilo poderia ajudá-los com o caso de Maros. Kanth prosseguiu:

 

— Eu pensei que poderíamos contatar o jornal local de Parkedale e colocar um anúncio para Maros — falou sério e gesticulou como se lesse um anúncio na parede. — Algo do tipo: telecinético de Nelovânia procura mordomo Maros Daekh.

 

— Você não está falando sério, está? — olhou atravessado.

 

— Claro que não! — riu alto e descontraído. — Só achei a ideia do livro interessante!

 

Ryth também riu, aliviado. Aproveitou para observar o quarto de Kanth, que, diferente do seu, não estava impecavelmente organizado. Não que fosse bagunçado, mas havia livros espalhados sobre a mesa, o casaco do uniforme jogado na guarda de uma poltrona, controle da tv largado no chão perto da cama e, o que lhe roubou toda a atenção, o coelho de pelúcia sobre a cama, como se fosse o dono do quarto.

 

— Por um momento pensei que pretendia mesmo se expor dessa maneira! — falou encarando a pelúcia. — Acho que isso só funciona em livros e filmes.

 

— Se bem que não custaria nada tentar! — desviou o olhar para o coelho, notando que Ryth o encarava e fez um rápido carinho na pelúcia. — Lembra do Sr. Kurdgheli?

 

Sim, Ryth se lembrava bem mais do que gostaria e apenas contorceu os lábios no que poderia ser um sorriso amargo. Aquele coelho de pelúcia presenciou um crime e era uma má recordação, mas dado ao fato de que Kanth parecia tão feliz ao ganhar o presente e o mantinha com carinho sobre a cama, Ryth engoliu suas lembranças ruins e focou unicamente no objetivo pelo qual estava ali.

 

— Já pensou em alguém para a missão em Parkedale? — perguntou ignorando todo o resto.

 

— Sim, a Kashi!

 

— Quem é Kashi? — olhou-o curioso.

 

— Uma das empregadas! Ela é estrangeira e morre de medo de ser despedida e mandada de volta ao seu país.

 

— O que tem de tão ruim no país dela?

 

— Pobreza, fome, guerras… Enfim, não importa a vida da Kashi, mas ela poderá ir e fará tudo o que pedirmos para fazer.

 

— Se ela é tão fiel assim, o quanto ela poderia ser útil para você no problema com o Wis? — perguntou levantando uma questão bastante delicada.

 

Kanth apenas suspirou pesado e silenciou olhando para o tapete ao lado da cama. Parecia até que Ryth ainda não tinha compreendido o quão complicado era aquele assunto e tudo o que vinha agregado.

 

— Eu acho que ela sabe — falou baixo —, mas morre de medo do Wis.

 

— Isso é muito estranho, por que todos têm medo dele se ele é apenas o motorista? — questionou intrigado. — Existe uma hierarquia até mesmo entre os empregados! Por que ele parece estar acima de todos?

 

— Por que ele não é apenas o motorista…

 

— Como assim?

 

— Ryth, eu pedi para você não fazer perguntas difíceis — encarou o amigo com um olhar reprovador.

 

— Tudo bem — levantou as mãos num gesto de rendição. — Achei que não deveria perguntar coisas relacionadas aos negócios dos seus pais.

 

— Isso também faz parte dos negócios — apertou os olhos, como se aquilo lhe fosse muito doloroso de discutir.

 

— Às vezes, sinto como se você escondesse mais do que eu posso imaginar, agora é sobre seus pais.

 

— Ryth, pare, por favor — alertou elevando a voz. — São meus pais e eu tenho apenas 16 anos, eu amo eles e dependo deles para viver!

 

— Tudo bem, eu já entendi… — estreitou os olhos e perguntou desconfiado. — Quando você fez aniversário?

 

Kanth foi pego de surpresa pela pergunta inesperada, desviou o olhar, constrangido.

 

— Uns meses atrás — respondeu tímido.

 

— Que dia?

 

— 18 de julho.

 

— E você não falou nada? — exaltou-se. — Não teve nenhuma comemoração ou algo do tipo?

 

— Não… Não podemos chamar atenção — levantou-se e juntou o controle da tv do chão. — Isso não é tão importante.

 

— Tudo bem, mas podia ter pelo menos me contato! — falou atônito. — Eu sempre me referi a você como mais novo, estou surpreso em saber que você é mais velho que eu!

 

— Você também não me disse quando faz aniversário — comentou casual, ligando a tv, mas tomando o cuidado de deixar no mudo para não atrapalhar a conversa.

 

— É 23 de agosto, mas eu odeio festas de aniversário e nunca quis ter uma.

 

— Wau, o dia da precisão vivaz! — riu zombeteiro. 

 

— Do que você está falando?

 

— Nada não, deixa pra lá — jogou o controle na cama e voltou a sentar. — Até porque nem acredito nessas coisas de signos.

 

— E como vamos fazer para que Kashi chegue em Parkedale e procure por Dr. Venk? — cortou o assunto para que não perdessem mais tempo com conversa fiada. — Passagens, hotel, transporte, essas coisas...

 

— Essa parte é a mais fácil — levantou-se decidido, abrindo uma gaveta de sua escrivaninha. — Cartão de crédito serve para quê?

 

— Não sei o que pensar, isso pode dar certo, mas pode dar muito errado! — passou as mão no rosto, nervoso.

 

— Qualquer coisa que conseguirmos sobre Maros será ótimo para nós! Se eu conseguir que ele volte a trabalhar aqui, então estarei livre do Wis para sempre! — falou com um sorriso enorme que balançou o coração de Ryth. — Você tem ideia do que isso significa?

 

— Claro que tenho — retribuiu o sorriso, pois era nítida a esperança que nascia ali de uma liberdade tantos anos ansiada, mas a realidade precisava ser encarada. — Você fala como se Maros chegasse e Wis fosse evaporar! Não vai ser assim, pode inclusive ser algo terrível colocá-los juntos, já que Maros sabe sobre Wis e Wis pensa que ele é um demônio.

 

— Exatamente por isso! — explicou: — Wis tem medo de Maros. Posso voltar a usar a telecinese para assustá-lo como fazia antes!

 

— Poderia fazer isso sem ter o Maros aqui, sei da sua promessa, mas me parece que você nunca deixou de usar totalmente.

 

— Eu sei das minhas promessas quebradas — falou magoado, mas se defendeu. — Destrancar portas é diferente de usar para ferir pessoas.

 

Voltando sua atenção para a tela do notebook, procurou o número da rodoviária. Parkedale era uma cidade pequena e não tinha aeroporto, a única forma de chegar lá era de ônibus.

 

— Quero Maros por perto, ele me traz segurança — concluiu.

 

— E eu? — questionou imediatamente. — Te trago o quê?

 

— É diferente — suspirou. — Você não pode ficar aqui 24 horas me protegendo.

 

— Você tem conseguido se proteger bem esse tempo todo sozinho.

 

Houve um momento de silêncio, Kanth balançou a cabeça e encarou o teclado onde suas mãos repousavam.

 

— Nem sempre — falou baixo e envergonhado. — Na maioria das vezes eu fracasso miseravelmente.

 

— Podemos enfrentar Wis juntos! — falou encorajando-o. — Wis precisa pagar por tudo o que fez.

 

— Quando? — perguntou sem esperanças.

 

— Quando você denunciá-lo às autoridades.

 

— E se não acreditarem em mim! — virou-se para encarar o amigo, seu olhar era desanimado. — Eu não tenho como provar! As leis são mal feitas, não há provas se não for comprovado o estupro e nunca houve um de fato. Wis é mais esperto do que eu consigo ser!

 

— Relações entre pessoas do mesmo sexo são consideradas ilegais e passíveis de punições! — disse convicto. — Ele será responsabilizado!

 

— Isso puniria a mim também!  — franziu a testa, amargurado. — Ryth, você está entendendo o que representa se alguém souber disso? — E completou com pesar — Eu sou o herdeiro dos Lamazis.

 

— Isso se aplica a nós dois — fechou os olhos e suspirou.

 

— Não precisa me lembrar de que não temos chances — levantou-se, ficando de costas para o loiro. — Por isso, é melhor trazer o Maros de volta.

 

Naquele momento, Ryth teve vontade de se levantar e abraçá-lo com todas as suas forças, fazê-lo compreender que estava ali por ele também e que lutaria por essa chance, mas lembrou-se de que também estava perdido na mesma ilusão e não deveria alimentar algo impossível. Permaneceu sentado, encarando o tapete.

 

Kanth tinha razão e de nada adiantaria abraços e promessas vazias enquanto ele não tivesse domínio sobre seu futuro. Naquele momento tenso, algumas esperanças foram descartadas e alguns sonhos foram mortos.

 

“Thought it would be over by now

But it won't stop.” [13]

 

 

 

 


Notas Finais


Hoje é meu niver, por isso saiu capítulo novo! hehe
Espero que tenham gostado das novidades!

[13] Música tema: Survivor - 2WEI
* Vamos relembrar como é o apartamento discreto dos Lamazis: https://www.youtube.com/watch?v=2gsZVYh6Okw


Obrigada a todos que aqui estão! ♥ Obrigada, Ana, pela betagem! ♥
Até breve!


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