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História Pélago - Efeito Alice


Escrita por: Harpina

Notas do Autor


Eu não ia postar isso hoje, o capítulo está muito chato e monótono e cansativo, mas o próximo já está quase pronto. Agora é só esperar o dia em que eu deixar de enrolar e postar logo ele.

Capítulo 3 - Efeito Alice


“Quem é você?”, disse a Lagarta.
Não era um começo de conversa muito estimulante. Alice respondeu um pouco tímida: “Eu… eu… no momento não sei, minha senhora… pelo menos sei quem eu era quando me levantei hoje de manhã, mas acho que devo ter mudado várias vezes desde então”.
“O que você quer dizer?”, disse a Lagarta ríspida. “Explique-se!”
“Acho que infelizmente não posso me explicar, minha senhora”, disse Alice, “porque já não sou eu, entende?”
“Não entendo”, disse a Lagarta.

“Receio não poder me expressar mais claramente”, respondeu Alice muito polida, “pois, para começo de conversa, não entendo a mim mesma. Ter muitos tamanhos num mesmo dia é muito confuso.” 

                   - Alice no país das maravilhas

 

Muito pequena, quando eu era uma garota de verdade e vivia enfurnada entre os cobertores das muralhas que construíam meu quarto no orfanato, as pessoas que me surpevisavam alimentavam-me com sonhos de vidro, uma colherada por vez.

Lacrimejava com a sensação dos cacos rasgando-me por dentro, mas não reclamava uma vez sequer. E então eles iam embora,  beber chá com os fantasmas que esperavam nas sombras da sala, tremeluzindo devagar. 

Um fantasma me envolvia, passava a mão em meus cabelos e colocava-me pra dormir, cantarolando canções de ninar. E eu esperava todos se forem para dormir por mais cem anos em uma caixa de vidro fechada. As pessoas que sabiam onde a chave estivesse escondida, morreriam e eu finalmente poderia descansar um pouco.

Mas como poderia dormir com a queimação que se alastrava por meus pulmões a cada momento em que eu tentava puxar um pouco de ar com sofreguidão? 

Cacos de vidro não foram feitos para alimentar crianças, elas se afogam em futuros de papel e realidades de mentira. Mas por que não ensinaram-me isso na escola?  Sádicos professores esses, que nos ensinam a escrever e somar, entretanto não nos instruem a como proceder quando nosso estômago está inundado da mais salgada água e nossas cansadas pernas desistem de debater-se.

E eles riem de nós enquanto tampam seus pilotos e ingerem seus cafés sem açúcar.

Impulsionei meu corpo para a superfície, cavando um buraco de saída através da água quente que me envolvia.

Meus olhos ardiam enquanto eu tentava ver algo além da imensidão negrume que me rodeava. O sal arranhou minha garganta quando gritei, fincando minhas unhas nas palmas das mãos, com as narinas incendiadas e bolhas que deslizavam pelo meu rosto. 

Senti-me desistir. Esperando quietamente o sangue parar de oxigenar o cérebro, meus olhos celaram-se e nada mais eu via. Mas eis então que algo empurrou-me para sobre o mar.

E, quando finalmente meu corpo fora atingido pelo gelado sereno da noite, eu me permiti chorar desesperadamente, meu pranto misturando-se a água. Eu já mais não sabia onde começava lágrima e terminava oceano.

Banhada pela lua que se mantinha gloriosa e robusta no céu.

Esperneei até a areia molhada, vez ou outra desviando das rígidas rochas pontiagudas  e espinhosas que emolduravam a baía. Eu nunca me senti tão perdida.

Lancei meu corpo por sobre a superfície enrugada de uma grande pedra e agarrei-me a ela. Pequenas neblinas de ar saiam de minha boca e minha língua sensível era cortada pelo sal.

Enterrei minhas indagações e hesitei antes de entrar em pânico, chorando copiosamente e tossindo entre os soluços buscando retirar parte da água que inundava-me o estômago.

Já se fora a sensação de queimar e rasgar do sal, agora tudo se aquietou. Meus ofegos entrecortados era o único som que se ouvia sobrepondo-se ao farfalhar agitado do mar que cantarolava em sussurros o meu nome.

Levantei-me com as pernas trêmulas e o corpo molenga, zinguezagueando e buscando um caminho para fora das margens da baía. Berrei, pedi socorro — falhos e roucos. Não fazia idéia de como havia chegado ali, todavia não queria demorar-me divagando sobre aquilo ou então desesperaria-me de maneira ainda mais avassaladora.

Já sentia-me hiperventilar, minha visão nublou-se e, aos tropeços,  encostei-me numa árvore. Anestesiada, deixei-me cair no chão.

"Abra os olhos."

"Sakura..."

Eu odiei aquele frio que me adornava. Odiei a sensação de impotência,  de desespero. Queria abrir meus olhos. Queria levantar-me. Queria saber o que havia acontecido para meu corpo começar a desfalecer sobre a cama, que antes parecia confortável e agora, mais parecia um bloco de concreto mal polido.

Mas meus olhos estavam costurados e meus ossos estavam estraçalhados, boiando sobre meu sangue.

Eu descosturei os olhos. Aquela tarefa tão simples exigiu mais esforço que uma maratona. 

Minhas roupas pesavam quando consegui manter-me em pé. Tudo pingava com gotas  de água. A cama, as roupas, os olhos.

Suspiros fugiam das celas dos meus lábios, minhas palmas instáveis apoiavam-se na parede transportando meu corpo até o banheiro.

Joguei-me sobre o vaso sanitário e encarei meu reflexo disforme no espelho.  Sentia-me fora da realidade, mas minhas roupas encharcadas diziam-me que nada fora um temível pesadelo. 

Não fazia ideia de quando chegara em casa.

Não fazia ideia de como meu corpo fora parar nas águas da baía.

E, sem dúvidas,  eu não fazia absoluta ideia do porquê meus órgãos pesavam uma tonelada.

Arrastei minhas íris refletidas no vidro por sobre  meu corpo observando as manchas arroxeadas nos meus braços e pescoço, o azular dos lábios e a melodia do chocar contínuo dos meus dentes.

Eu me transformei num saco de areia que tremia de frio.

— O que está acontecendo comigo?

E só então notei que meus dedos espremiam o colar em minha mão. 

Os nós brancos.

Atirei-o contra o espelho, observando várias partes de mim estraçalhadas e caidas ao chão junto aos destroços. Ouvi passos. Senti as lágrimas. Vovó estava na porta, pressionando o celular na orelha e soluçando com um pano preso a boca. 

Ela gritou.

E eu apaguei. 

Quando abri meus olhos, me vi dentro de um quadro em branco e, embora nos livros a protagonista narra a situação como algo confuso e desesperador, eu a desmitifiquei.

Era desconfortável.

A maca era desconfortável, o rastro de luz que corria pela janela entreaberta era desconfortável, até mesmo o branco parecia branco de mais para os meus olhos.

Em Grey's Anatome o som do eletrocardiografo não era tão irritante. Todavia eu não estava assustada, pela primeira vez em horas eu tinha exata ciência da minha localização. Isso deveria soar agradável, certo?

Mas na verdade tudo era bem incômodo. 


Notas Finais


Maçante né? Sorry, obrigada pelos comentários e favoritos ♡ desculpem pela demora (meu respeito à todas as pessoas que postam pelo celular, é muito complicado)
Eu sou uma ninja, você não me viu aqui.
Com amor,
Harpina


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