História Perfect Date - Parte 1

Perfect Date

Romance. Um gênero e tanto. O que há de melhor a se falar se não sobre amor? É ele que nos move, seja o amor pela família, pelos amigos, pela carreira ou o tão complexo amor romântico. 

Ela sempre leu livros e assistiu filmes sobre o tema, lembrava de se ver pequena admirando o amor entre a personagem Vivian de Julia Roberts e o Edward de Richard Gere em uma das tantas reprises de "Uma Linda Mulher". Ou até mesmo se pegar encantada por clichês adolescentes como "10 Coisas que Eu Odeio em Você", imaginando-se na situação da protagonista, que não tinha a mínima semelhança consigo.

Desde que se conhecia por gente, era uma amante do romantismo, gostava de observar o desenvolvimento do relacionamento de um casal até que ambos estivessem apaixonados, era tão belo como o amor podia ser certo e exato se somente assistido, mas não praticado. É, nunca ousou estar na mesma situação que as mocinhas dos contos que lia, pois sua idealização de um romance – perfeito e puro – não lhe permitia viver por si própria um de verdade.

Não se podia negar que Flora Fernández era uma garota desejada. Sendo bonita, jovem, gentil, e solteira, uma boa quantidade de rapazes já havia praticamente implorado por uma chance de um único encontro com a mesma, porém a latina somente recusava com seu receio de que suas expectativas jamais fossem atendidas. Em seus quase dezoito anos de vida, sua maior experiência amorosa havia sido uns beijos trocados com algum menino que já não lembrava o nome em um jogo da garrafa. Para sua infelicidade, o primeiro beijo não foi nada marcante como esperava, talvez por isto passou a evitar a brincadeira típica dos adolescentes.

Em sua perspectiva, quando se cresce acreditando nas formas de amor tão irreais que nos são apresentadas pelas diversas mídias, é simplesmente incabível aceitar a realidade que nos cerca de um relacionamento verossímil. Por que aceitaria uma paixão meia boca quando passou a vida inteira lendo sobre paixões arrebatadoras? Não fazia sentido, ao menos para seu coração.

Talvez no fundo sentisse apenas medo de não saber lidar com expectativas frustradas, mas ainda não havia chegado no estágio de admitir tal fato a si própria e lidar com isso.

Entretanto, este sentimento idealizador podia ser seu maior martírio, pois enquanto aguardava pela espera de um romance comparável àqueles que lia, somente assistia de camarote suas amigas viverem seus próprios amores, como faria hoje, em pleno Dia dos Namorados, data esta que Flora passou noites sonhando com um encontro perfeito que nunca ocorreu e talvez nunca ocorreria, não enquanto suas referências românticas fossem personagens literários.

— Stella, nós estamos atrasadas. – Musa berrou batendo o pé com a bolsa em seu braço. Era engraçado como a musicista se estressava sempre que saía junto da loira, já conhecida por seus atrasos.

— Já vou, já vou! – calçou seus saltos às pressas enquanto corria de um lado para o outro atrás de seus brincos.

— Os garotos estão nos esperando. – Bloom falou escorada na porta, também já arrumada.  

— Eles que lutem. – a loira debochou com seu tom único.

— Mas já estamos cerca de cinco minutos e trinta e sete segundos atrasadas. – Tecna declarou com os olhos em seu relógio de pulso. Seria algo estranhamente específico, mas vindo de Tecna nada desse tipo é surpreendente.

— Vamos acabar sem aproveitar o suficiente dos brinquedos do parque. – Aisha reclamou sentada em um sofá olhando a outra rodopiar pelo cômodo.

— Stella! – Musa a chamou outra vez, já sem a mínima paciência.

— Já acabei, se acalma. – respondeu sorridente pegando sua bolsa na cama.

— Todas prontas? – Bloom rodou suas pupilas pelo grupo notando uma ausência – Cadê a Flora?

A morena saiu do banheiro sem conseguir disfarçar a postura cabisbaixa. Se escorou na parede sendo assistida pelos olhares curiosos – e preocupados – das amigas e disse em um quase sussurro entristecido:

— Meninas, acho que não vou. – o grupo de imediato reagiu com um estranho misto de surpresa e previsibilidade.

— Por quê? – Tecna questionou, apesar de já imaginar o motivo, assim como todas alí.

— Vocês sabem... – iniciou – Isso é um passeio de casais no dia dos namorados e eu...

— Ei, pode ir parando. – Musa a interrompeu – Não ter um namorado não vai te impedir de sair com a gente. 

— Eu sei, mas é um pouco estranho, vocês também tem que admitir.

— Não vejo nada de estranho. – Bloom interviu – Independente de namoros, somos todos amigos só querendo nos divertir. Você não vai ser excluída.

— Você já está arrumada, isso seria um desperdício de look. – Stella desceu os olhos analisando as vestimentas de Flora, que consistiam em uma blusa rosa pastel de mangas compridas um pouco justa, junto de uma saia cinza estilo colegial fixada por um cinto emprestado pela loira, enquanto seus pés calçavam simples tênis brancos sem plataforma.¹

— Além de que, o Helia também vai. – Aisha soou maliciosa fazendo a acastanhada corar com a mera citação daquele nome. As meninas deram uma risadinha entre si com a reação.

— E-ei, somos só amigos. Vocês sabem disso. – gaguejou nervosa, o tema era seu ponto fraco, pois não podia negar a "quedinha" que tinha pelo asiático que tão bem a conhecia. Nada fazia somente devido seu receio de suas altíssimas expectativas não serem alcançadas, não queria ter de se decepcionar com alguém tão querido.

— Aham, muito amigos, hein? – Musa provocou, costumava a chamar de medrosa quando conversavam sobre o assunto, talvez estivesse certa.

— De qualquer forma... – Bloom cortou a conversa para o alívio de Flora – Vem com a gente, vai ser divertido.

A garota suspirou derrotada assentindo com a cabeça, enquanto suas amigas comemoraram. Sabia que teria mais uma noite horrível lidando com sua iminente realidade de solteira em meio a um grupo de apaixonados, mas não negaria o convite, se sentia menos pior em estar deslocada do que ser ingrata. Não admitira, mas uma parte de si torceu para que o destino – afinal acreditava na existência deste – a fizesse ter seu sonhado encontro perfeito, por mais irreal que isso parecesse.

...

O parque de diversões havia chegado há pouco tempo na cidade, mas já atraía os montes de jovens que desejavam aproveitar seus finais de semanas em suas alegorias. Nessa noite em especial, devido a data a se comemorar, o local estava totalmente decorado com ornamentos condizentes ao tema romancista. Por onde olhava havia casais de todas as idades e gêneros aproveitando o momento, era um ambiente aconchegante na visão de Flora. Seus olhos verdes brilharam tanto com o belo – e clichê – cenário que mal notou a presença dos outros amigos.

— Uhu! Meninos! – Stella acenou animadamente para o grupo de rapazes que vieram em suas direções. Quando andavam juntos pareciam uma boyband genérica de 2010 gravando um clipe pop.

— Achei que não viriam nunca. – Brandon disse puxando a loira para um beijo. 

Haviam se visto na escola ainda ontem, porém se abraçaram tal qual um casal separado por uma cruel guerra que finalmente vivia seu tão aguardado reencontro. Quase uma "Odisseia de Stella", nem os gregos escreveriam um romance tão dramático quanto ao daqueles dois adolescentes. 

— Agradeça aos atrasos de sua namorada. – Musa reclamou sendo abraçada por detrás por Riven que cheirou seu pescoço tirando todo seu mau humor.

— Perfume novo? – ele perguntou a fazendo assentir – Gostei.

— Lá vem a pegação do casal mais ativo de Magix. – Aisha provocou com um dos braços de Nabu apoiado em seus ombros.

— Nós não somos tão diferentes. – seu parceiro sussurrou em seu ouvido a fazendo sorrir ladina.

Quando lia algum livro, Flora corava e ria quando o casal principal fazia alguma insinuação sexual, por mais simples que fosse. No fundo, ela se idealizava na mesma situação e imaginava como reagiria, certamente não seria tão desenvolta quanto suas amigas e acabaria estragando todo o clima do momento com sua infeliz timidez, chegando à conclusão de que seria melhor ficar apenas na imaginação.

— Pelo menos procurem um lugar fechado. – Tecna, que evitava tantas demonstrações públicas de afeto, brincou ao lado de Timmy que falhava em tirar uma foto da namorada distraída.

— Deixem de drama, vamos aproveitar. – Bloom declarou com o braço de Sky enlaçado em sua cintura.

— Aproveitar já está nos meus planos. – o loiro disse roubando um beijo da namorada.

Achava curioso como cada namoro alí tinha sua particularidade, seja por causa das diferentes dinâmicas de conflitos de personalidades ou por qualquer outra questão pessoal. Aos seus olhos, relacionamentos únicos e admiráveis.

Era inerente a si própria, Flora não podia ver um casal que fazia uma breve análise mental sobre este, como se estivesse assistindo um filme onde eles fossem todos personagens e ela uma mera espectadora, o que não era tão longe da realidade.

Enquanto os jovens casais interagiam ao mesmo tempo em que falavam sobre os desejos de cada um para esta noite, adiantaram seus passos a ponto de deixarem uma certa dupla para trás. Estava tão ocupada com seus próprios pensamentos que não notou a encarada que recebeu de Helia assim que os grupos colidiram, tampouco percebeu que o amigo momento algum desviou o olhar de sua bela figura.

— Flora... – ele a chamou percebendo sua distração e a trouxe de volta ao mundo real – Que bom que você veio, fiquei feliz.

A morena não pôde deixar de sorrir com a frase, ele sabia alegrar seu humor com poucas palavras e isso era uma das tantas coisas que admirava nele. Levantou sua cabeça para encarar o asiático de timbre firmemente gentil, ele estava com seu típico penteado onde prendia frouxamente seus cabelos longos, suas roupas também eram familiares, estando com sua conhecida camisa azulada e calça jeans escura. Ele estava bonito, na verdade, ele era bonito e Flora reconhecia isso, ainda que não externasse.

— Sério? Eu quase que desisti de vir. 

— Ainda bem que voltou atrás com essa decisão. – ele disse com as mãos nos bolsos da calça – Não seria o mesmo sem você.

Olha aí: uma frase e a morena já estampava um sorriso de lado a lado nos lábios. Uma felicidade efêmera, porém ainda satisfatória.

— Não acho que eu faça tanta diferença assim.

— Ei, nem tente se diminuir assim. – repreendeu causando uma risada na amiga, que logo desapareceu dando lugar a um semblante triste – Flora, você está bem?

Não precisava de muito para que Helia notasse o baixo astral que rodeava a bela latina, ainda mais sendo ele, alguém que a conhecia muito bem depois de longos anos de convívio. Além de que, o rapaz não escondia seu olhar observador e dificilmente conseguiria deixar de perceber alguma mudança em sua personalidade comumente serena e plácida.

— Sim... Quer dizer... Hm... Eu acho. – respondeu perdida com as palavras.

— Eu sei que tem algo te incomodando. – sua expressão era como a de um detetive investigando seu principal suspeito – Pode falar.

— Não é nada demais, só... – contraiu os lábios nervosamente – Essa data me deixa meio para baixo.

— Por quê? Achei que gostasse de... – pareceu procurar palavras menos desconfortávsis – Coisas românticas...?

Ponderou por alguns segundos se realmente deveria comentar o assunto, mas a presença do amigo era reconfortante e de confiança, sabia que ele não a julgaria por mais constrangedora que fosse sua declaração.

— E esse é o problema. – suspirou prestes a jogar tudo para fora como se estivesse no ápice de uma sessão de terapia – Eu vivo idealizando sonhos sobre esse dia, mas a realidade é que só fico observando os outros viverem um romance enquanto sigo minha vida. Sou a única solteira do meu grupo de amigas, fala sério, Helia!

Ok, talvez tivesse soado um pouco dramática, tinha consciência do quão vergonhoso isso poderia soar aos ouvidos alheios, mas em seu âmago sabia que era necessário admitir o fato exposto em voz alta ao menos uma vez. Só assim iria abandonar a covardia e enfrentá-lo, pensava.

O rapaz pareceu analisar meticulosamente o que deveria dizer, não queria estragar a confiança que lhe foi depositada, já que claramente a garota havia acabado de fazer um desabafo bem pessoal.

— Flora, eu também sou o único solteiro do meu grupo, isso é normal. – prosseguiu decidindo arriscar – Além de que você só está solteira porque quer...

Apesar de seu leve tom humorístico, o garoto havia lançado uma indireta que, para sua infelicidade, falhou em atingir a morena.

— Não é que eu quero, mas não gosto da ideia de quebrar a cara caso seja tão distante do que eu imaginei. 

— Não custa nada tentar. – e então tomou coragem para a proposta  – Olha, posso estar longe do que você anda lendo, mas posso tentar melhorar sua noite.

A jovem se sobressaltou arregalando de leve suas pupilas. Alguns pensamentos indecentes passaram por sua mente, mas os afastou. 

— Como?

— Bem, poderíamos tentar nos divertir juntos. – ele desviava o olhar – Digo, não como um casal num encontro, mas...

Helia estava claramente enrolado nas palavras que dominava tão bem, não queria transparecer sua tentativa de flerte por mais que ele existisse. Por sorte, Flora não o lia tão facilmente quanto ele fazia.

— Um não-encontro de amigos? – o outro assentiu e alivou-se pela sugestão ter partido dela – Até que parece uma boa.

Ela riu de si própria por ter pensado que Helia lhe faria algum outro tipo de proposta quando na verdade ele só a convidou para se divertir como qualquer amigo preocupado faria. "Menina burra".

— Então... – tentava não se levar a sério, apesar de ter certos planos para essa noite – Você aceita este não-encontro? 

Com um sorriso levemente tímido, concordou. — Aceito.

E naquele momento, sem que nenhum dos dois soubessem, assim se iniciava o encontro mais imperfeito nesta data que deveria ser perfeita, ao menos na visão de uma leitora idealista.

...