LETÍCIA
- Não pode ser! Como não pensei nisso antes?
Fernando estava com o papel em mãos e andando em círculos, parecia ter entendido aquela charadinha, mas nada fazia sentindo para mim, tampouco para Márcia ou Phillip.
- Fernando, o que é? – Estava impaciente, farta, esgotada. Foram muitas emoções adversas em tão pouco tempo.
- A pista mais boba de toda a vida! – Riu.
- Então eu levei uma bala em vão? – Márcia o fuzilou com o olhar. – Fernando, agora eu quero te matar!
- Fernando, para de joguinhos e fala logo! – Estourei.
- E de elefante, D de dado e U de urubu. – Gracejou. – Edu! – Nós o olhamos ainda sem entender. – Eduardo, Lety!
- Eduardo, Eduardo? O Eduardo que conhecemos?
- Tem outro?
- PAREM DE FALAR COMO SE SÓ ESTIVESSEM VOCÊS! – Márcia levantou o tom. – Esse caso foi o mais perigoso de toda a minha carreira, levei uma bala e essa porcaria de ferimento está latejando, e a não ser que queiram que eu desista desse caso, é bom falarem sem rodeios. – Se acalmou. – Ótimo, agora podem explicar.
Eu e Fernando nos entreolhamos e concordamos que era tolo continuar aquele diálogo privado.
- Eduardo é um amigo do pai de Lety, que também é meu amigo, na verdade, não nos falamos há muito tempo. – Riu rapidamente. – Ele é amigo do dono do bar, foi ele que me apresentou aquele lugar, e foi lá que eu levei os capangas de Aldo para nossas “reuniões”. Edu estava lá no dia do assassinato, mas não sei se presenciou a cena.
- Dane-se, pelo o que eu entendi as fitas estão com ele. Precisamos delas. – Márcia fez uns sinais para Phillip. – Onde está o endereço?
- Não... Não tem endereço.
Contei de um até dez, mas quem explodiu primeiro foi Márcia..
- Como não tem endereço? – Grunhiu.
- Não tem, mas eu sei um, espero que ele ainda resida lá.
- Esse cara tá sacanagem né? – Phillip, que eu desconfiava que tinha ficado mudo, mostrou que tinha voz.
- Não desistam do caso, não agora. – Fernando nos olhou com uma esperança inacreditável no olhar, misturado com uma súplica compreensível.
- Vamos logo. – Márcia bufou e saiu da nossa casa abandonada.
***
Estávamos a pelo menos cem quilômetros de nossa cidade, os comandos de Fernando nos levaram a um condado numa cidade afastada, nos afundamos mais naquele lugar que parecia cada vez mais inóspito e paramos finalmente numa rua desértica.
- Eu vou na frente. – Fernando já ia abrir a porta do carro.
- Ficou maluco?
- Se estamos nesse carro e não sofremos nenhum atentado ainda, é porque no mínimo posso sair daqui.
- Odeio sua bravura. – Resmunguei enquanto ele saía, assim que Márcia e Phillip ficaram no encalço dele, desci.
- É alí.
Ele apontou para a última casa – na verdade, um casebre -, em condições deploráveis, que parecia ter sido abandonado há anos.
- As coisas só pioram. – Márcia revirou os olhos e colocou uma arma na cintura, assim como Phillip. – Vai na frente, traste.
- Olha aqui...
- Quer mesmo discutir aqui, Letícia?
Me calei e seguimos.
Como Fernando foi na frente, fiquei entre Márcia e Phillip, um pouco desconfortável por estar entre duas pessoas armadas, mas seguindo.
Fernando chamou e não obteve nenhum a resposta, chamou mais uma vez e da porta saiu um homem segurando um fuzil; a temperatura de meu corpo caiu drasticamente em milésimos de segundo.
- Eduardo...
- Sei que seus guarda-costas estão armados, então entra só você ou manda eles deixaram as pistolas no carro. Escolha.
Ouvi o longo suspiro de Fernando.
- Sei que não confia mais em mim, entendo, mas preciso que me entregue as fitas da...
- Entra. – Olhou para os lados rapidamente. – Os quatro.
Fernando fez um pequeno aceno em nossa direção, e temerosos (Ao menos eu) entramos.
A aparência medíocre do casebre era apenas externa, o interior era limpo e organizado, e não repleto de poeira e outras sujeiras como imaginava.
O tal Eduardo colocou seu “brinquedo” sobre uma mesa e foi a uma estante próxima, pegou uma caixa, jogou sobre a mesma mesa e puxou uma cadeira para se sentar.
- Essas porcarias colocaram minha vida em perigo. Até hoje me arrependo de ter aceitado proteger isso. – Fernando abriu a caixa e ergueu as gravações que precisávamos. – Aldo descobriu que estava comigo e lógico, mandou me matar.
- Queima de arquivo. – Márcia sussurrou.
- Até que você não é tão burra, loirinha. - Voltou a olhar para Fernando. – Tive que forjar minha morte ou ele mandaria me procurar até a última camada de terra existente. Não sei se consegui convencê-lo, aquele psicopata é imprevisível. – Calou-se por uns instantes. – Ele pode estar monitorando os passos de vocês, saber que estamos todos aqui e mandar capangas para nos matar de uma só vez.
- Entregá-los a polícia é a única forma de sair dessa teia do mal. Mas não posso agir isso desprotegido, essas gravações são a única coisa que podem me dar proteção federal.
- O material é seu. – Tocou a caixa. – Mas terá que me tirar da frente da linha de tiro.
- Márcia? – Virou-se para onde estávamos.
- Se não que não querem morrer é bom que saiamos daqui logo, cada minuto é decisivo.
Suspirei esperançosa, as coisas pareciam estar caminhando para a resolução.
Pena que não era tão simples assim.
Antes mesmo que Eduardo abrisse a porta da casa, Phillip alertou um som estranho que ouvira, e logo recuamos. Eduardo olhou as câmeras escondidas que tinha (Por isso que ele sabia que estávamos armados!) e viu atiradores escondidos esperando para nos alvejar.
- Mudança de planos. – Saiu da tela de vigilância. – Todos para os fundos.
- O que tem lá? – Phillip questionou.
- Um carro e uma saída que dá numa estrada de terra, ligada a rodovia mais próxima. – Pegou um molho de chaves e mostrou. – Ou acha mesmo que ficaria nessa pocilga desprevenido?
E seguimos e realmente tinha um carro, desses que se usa em estradas de terra (Como se ele planejasse uma fuga há tempos), nos acomodamos e assim que a última porta se fechou, Eduardo arrancou nos tirando dalí.
Antes de chegarmos à rodovia, o carro ainda foi atingido umas vezes, a escapatória de Eduardo não era tão infalível assim, mas conseguimos nos livrar temporariamente do tormento.
- Vai ficar tudo bem. – Fernando sussurrou para mim quando encostei a cabeça em seu ombro.
Espero que sim.
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