NOTAS INICIAIS IMPORTANTES
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A campainha do apartamento tocou ainda não eram seis da manhã.
Saltei do sofá com o meu coração aos saltos enquanto vários pensamentos me passavam pela cabeça, a pior de todas seria a ideia de que tudo o que tinha vivido naqueles últimos meses era uma grande mentira e que a Lydia nunca tinha sido encontrada.
-Scott? - questiono passando a mão pelos olhos numa tentativa de afastar o sono que ainda restava neles.
-Trouxe café. - apressa-se a falar Scott não esperando por um convite antes de entrar no apartamento.
-O que é que… O que é que fazes aqui? - experimento a falar deixando a porta atrás de si fechar-se com cuidado não querendo acordar a Elanor àquela hora, aqueles últimos dias tinham sido difíceis sobretudo para a minha filha e ela merecia uma boa noite de descanso.
-Pensei que podíamos começar a trabalhar logo de manhã. – declara Scott espiando por alguns compartimentos da casa antes de decidir-se entrar na cozinha como se a casa fosse sua.
-Antes do sol nascer? Aliás, como é que sabias onde eu vivia? - pergunto para logo de seguida receber um olhar de descrença por parte do Scott.
-Sou um agente do FBI, achas mesmo que não sei onde vives?
Aquela tinha sido evidentemente uma pergunta estúpida que lhe tinha feito e essa era a verdade.
-Não sabia como gostavas do café por isso trouxe-o completamente preto sem açúcar. - anuncia Scott pousando o meu copo de café sobre a mesa antes de voltar a olhar em redor.
A pequena janela por cima do lavatório deixava entrar os primeiros raios de sol do dia, mas ainda eram mal suficientes para iluminar todo aquele lugar.
-Tens algo para comer? - a nova pergunta de Scott surpreende-me levando algum tempo para reagir.
-Queres comer? - questiono de um jeito surpreendido pela sua falta de vergonha.
-Se me ofereceres. - é a resposta que obtenho de Scott acompanhada por um movimento de encolher os ombros que me faz questionar que tipo de parceiro é que me tinha calhado daquela vez.
-Afinal o que te trouxe aqui? - volto a perguntar apercebendo-me que o Scott não se daria a todo aquele trabalho para vir tomar o pequeno almoço a minha casa, ainda que algo me dizia que aquilo fosse um pouco a sua motivação.
-A vítima foi identificada. - o tom sério de Scott põe fim à boa disposição da sua entrada, hesitei por alguns segundos com uma faca na mão antes de criar a segunda fatia de pão e colocar as duas na torradeira.
-Quem...
-Jackson Whitemore.
Aquele nome não me era estranho e Scott devia se aperceber disso mesmo eu estando de costas voltadas para ele porque não demorou muito para ele acrescentar:
-Whitemore, filho do deputado Stephen Withemore e da estilista Sarah Whitemore.
-Jackson Whitemore. - repito experimentando aquele nome na ponta da minha língua, era com ele que a Lydia estivera durante todo aquele tempo?
Será que os pais deste sabiam o monstro que era o filho?
-Os pais já foram informados? - questiono apertando a bancada nas minhas mãos enquanto tentava manter a linha dos meus pensamentos clara.
-Não, Derek achou que deviamos esperar algumas horas para dar a noticia em vez de os acordarmos de repente a meio da noite. - declara Scott fazendo-me virar finalmente na sua direção e franzir a minha testa numa tentativa de mostrar que também não era correto fazer o mesmo comigo, mas o moreno parecia envolto nos seus pensamentos para se aperceber da minha atitude.
-Há algo que te preocupa. - aquela não era uma pergunta, estava claro no seu rosto que havia algo que Scott não conseguia responder.
-Se o Jackson teve todo este tempo desaparecido porquê é que os pais não relataram o seu desaparecimento?
Aquela era uma excelente pergunta!
-Eles são de Atlanta, certo? - questiono não tendo a certeza desse pormenor, muitas das noticias que lia sobre a vida do democrata podiam não ser verdades, aliás, eu como detetive que era tinha que acredita que eram mentira até prova contrária.
-O Jackson nasceu cá sim, mas ambos os pais são do Norte, Washington, penso eu.
-Na política desde cedo. - não consigo deixar de ironizar no momento em que a torradeira dava o sinal de que as torradas estavam prontas.
-Achas que devíamos ser duros? - a próxima pergunta do Scott faz me hesitar enquanto espalhava o doce de morango na torrada, lembrando-me que eu não lhe tinha perguntado se o desejava, mas uma vez mais foi o Scott que invadiu a minha casa por isso ele tinha que aceitar o que quer que eu lhe oferecesse.
-Duros? - questiono fazendo-me de desentendido, eu sabia onde ele queria chegar, eu tive conhecimento de algumas técnicas de interrogatório do FBI quando Theo foi meu parceiro, porém, eu não esperava que o Scott fizesse parte dessas técnicas.
Scott não teve oportunidade de responder, pois Elanor escolheu aquele momento para surgir na cozinha agarrada à sua boneca favorita – eu acho que aquela era a Britney, mas uma vez mais não tinha a certeza.
-Pequena, que fazes já acordada? - pergunto erguendo-me do lugar e apressando-me para perto dela levantando-a nos meus braços, estando mais perto conseguia notar as suas pestanas molhadas e os seus olhos levemente vermelhos como se ela tivesse estado a chorar.
-Tive um pesadelo, papá. - e ali estava, ela nunca me chamava daquela forma se não estivesse realmente assustada e isso só me levou aperta-la ainda mais nos meus braços numa tentativa de espantar qualquer que fosse o motivo que a tivesse assustado.
-Queres falar sobre isso? - eu já sabia qual era a sua resposta, mas mesmo assim não me importava em fazer a pergunta.
A sua pequena cabeça acena negativamente fazendo-me suspirar e levá-la para junto da mesa deixando-a no lugar que anteriormente ocupava.
-Quem é ele? - pergunta Elanor apontando descaradamente para Scott que tinha os cantos dos seus lábios cheios de geleia, os olhos do mesmo arregalaram-se perante a pergunta da minha filha e eu não consegui deixar de sorrir perante aquele cenário.
-Lembraste que o pai tem sempre um amigo a trabalhar junto com ele? - questiono baixando-me para ficar na altura da Elanor e ajeitar assim os seus cabelos que tinham escapado da trança com a qual ela sempre dormia. -Bom, o pai tem um novo amigo e esse amigo é o Scott.
-Ele está coberto de geleia. - segreda Elanor como se aquele fosse um comentário que ela não devesse fazer, contudo, o tom que ela decidiu usar não era baixo o suficiente para passar despercebido ao moreno.
-Ele é o monstro da geleia. - não consigo deixar de fazer referência ao monstro das bolachas pela qual a minha filha parecia obcecada nos últimos meses.
Elanor esconder a sua boca com uma mão deixando a sua risada escapar por entre ela fazendo-me levantar finalmente do meu lugar com o sentimento de dever cumprido.
-Limpa-te, estás a fazer figuras à frente da minha filha. - declaro estendendo um guardanapo para Scott que automaticamente agarrou apagando quaisquer vestígios de geleia no seu rosto.
-Não sabias que tinhas uma filha. - são as próximas palavras que Scott escolhe pronunciar no momento em que eu começava a aquecer o leite para Elanor.
Um copo de leite quente com uma colher de mel seria o suficiente para fazer com que a Elanor se esquecesse do seu pesadelo.
-Agora já sabes. - respondo encolhendo os ombros não conseguindo perceber o porquê daquela informação ser importante para a nossa parceria.
-Quantos anos tens, pequena? - pergunta Scott ganhando coragem para virar a atenção para a minha filha, mesmo de costas conseguia imaginá-la a mostrar os seus dedos a indicar a sua idade. -Uau! Isso são muitos, já és uma menina bem grande.
Aquelas eram as palavras suficientes para que o Scott ganhar a confiança de Elanor para a mesma poder finalmente usar a sua própria voz com ele.
-És novo? - é a primeira pergunta que Elanor faz no momento em que me aproximo deles e pouso o copo de leite à sua frente, a palhinha rosa já estava lá dentro indicando que era seguro para a Elanor beber.
A boneca, talvez a Britney, continuava nos braços de Elanor.
-Devo ter a idade do teu pai. - responde Scott não entendo a pergunta da minha filha o que me faz rir.
-Ela está a perguntar se és novo na esquadra.
-Ah ok! Sim, estou a trabalhar num projeto grande com o teu pai.
-Estás a ajudá-lo apanhar os maus que magoaram a Lydia? - questiona Elanor e eu não consegui deixar de acariciar o seu cabelo, a inteligência de Elanor não deixava passar nada.
Dali a uns anos eu teria problemas pela perspicácia que Elanor tinha dentro de sim.
Scott olhou para mim com uma dúvida nos seus olhos e eu apenas assenti com a cabeça dando-lhe a segurança de que ele podia responder aquela pergunta.
-Sim.
Elanor sorriu e encostou-se na cadeira desfrutando finalmente do seu leite em silêncio. Aquela foi a minha oportunidade para fazer sinal para o Scott seguir-me até à sala de estar, onde o sofá estava desarrumado pelo meu repentino despertar.
-Eu só consigo ir contigo à casa dos Whitemore depois da hora do almoço, é quando a minha irmã volta do trabalho e pode ficar a tomar conta a Elanor. - anunciou voltando assim ao ponto que estávamos a discutir antes da entrada da minha filha na cozinha.
Scott confirmou com a cabeça como se aceitasse as minhas palavras sem problema.
-E a Lydia? - questiona Scott e consegui perceber pelos seus olhos a preocupação que ele sentia.
-A minha irmã vai ficar aqui pelo apartamento, a Lydia estará em segurança.
Scott não parecia muito seguro das minhas palavras e não preciso expressar-me sobre isso em voz alta porque no instante seguinte já o McCall expunha os seus pensamentos em voz alta:
-Não seria mais seguro um polícia ficar por aqui? Não digo o apartamento, mas talvez no prédio.
-Isso só iria despertar mais a atenção dos meus vizinhos e eu… Sinceramente, eu não sei quem posso confiar agora! - declaro soltando um suspiro ao perceber o peso que sentia sob os meus ombros, fechei os olhos antes de acrescentar sem ter coragem para encarar o moreno nos olhos. -Eu acabei de recuperar a Lydia, eu não posso arriscar perdê-la novamente.
-Vocês eram próximos?
-Não leste os arquivos do caso? - não consigo deixar de perguntar perante a sua questão, qualquer pessoa que estava naquele caso tinha conhecimento do passado que eu e a Lydia partilhávamos.
-Estão a decorar as paredes do meu escritório, mas ainda não tive tempo de me inteirar de tudo. - esclarece Scott como se sentisse envergonhado de admitir aquilo. -Sei que foste tu que deste com o desaparecimento dela e sei que tiveste em muitas das buscas que houve nos dias a seguir ao seu desaparecimento, mas por agora é só isso que sei.
-Antes da Lydia desaparecer ela andava na minha escola, éramos amigos de infância e na altura que desapareceu estávamos a tentar perceber os sentimentos que tínhamos um pelo outro. - aquela era a forma mais simples que existia para explicar aquilo que havia entre nós sem colocar mais problemas entre nós, eu nem tinha entendido o que a presença da Lydia ali no meu apartamento significava para mim neste momento.
-Então vocês… - a pergunta de Scott nunca chegou a ser propriamente feita e a minha resposta estava completamente expressa no meu rosto fazendo com que ele mudasse o rumo do interrogatório. -Isso será um problema?
-Não! - a determinação estava no meu tom de voz. -Eu sei manter o profissionalismo.
Eu sentia que tinha acabado de contar uma mentira, porém, não voltei atrás nas minhas palavras.
Scott parecia perceber isso, mas também não teve o atrevimento de tocar no assunto, em vez disso deu alguns passos em direção à cozinha para logo de seguida hesitar na entrada, virar-se para mim e perguntar:
-Posso comer mais umas torradas?
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