Quando você pensa em uma viagem, você com certeza não imagina crianças berrando no seu ouvido - porque elas já deixaram de gritar faz algumas boas horas e aquilo tinha passado do nível normal que poderia ser humanamente aceitável. Você também não imagina que estaria no inferno, literalmente.
— Não acredito que alugou uma van sem a merda de um ar-condicionado. — Reclamei pela quarta vez.
— Não acredito que eu inventei de trazer você. — Jaebum reclamou também. ‘Tá achando ruim, me processa, querido.
— Já que tocou no assunto, por que me trouxe aqui? — Perguntei.
— Que assunto? — Jaebum fez-se de desentendido.
— Você nasceu trouxa assim ou fez cursinho para aperfeiçoar?
— Porra! — Ouvi Toninho resmungar.
— O que foi agora? — Jaebum perguntou, impaciente.
— Então, cara, digamos assim: se por acaso, um exemplo sabe, um cara tem uma van, mas não tem a documentação dessa van e tivesse uns policiais ali na frente, o quão puto você ficaria com esse cara? — Toninho indagou e eu senti o cheirinho de “vai dar merda”, no ar.
— Não me diz que essa droga que você chama de van não tem documentação! — Jaebum disse alterado.
— Qual é cara? Eu só supus. — Toninho se defendeu. — Você acha que eu, Toninho Conceição, ia alugar uma van sem documentação? Imagina.
— Eu vou matar esse desgraçado. — Jaebum tentou mais uma vez ir para cima de Toninho, mas eu o contive me colocando na frente dele.
Por fim, a van não tinha documentação. E se você acha que Jaebum surtou, tentou matar Toninho estrangulado, xingou ele em cinco línguas diferentes e que precisou de Mark, Junior e eu para conter o cara, você está completamente certo. Resumindo toda essa história de Jaebum querendo matar o mundo, estávamos todos na delegacia, sentados naquelas cadeiras horríveis enquanto assistíamos Jackson tirar meleca do nariz.
— Eu juro que se não estivéssemos numa delegacia, você já estaria morto. — Jaebum rosnou mais uma vez.
— Para de implicar com ele, Jaebum. — Pedi, já cansado de ouvir ele reclamar a cada meio segundo.
— ‘Tá defendendo ele agora? — Jaebum perguntou indignado.
— Youngjae, eu não curto esse lance de ser ativo, mas você é tão gracinha que por você, eu até topava — Toninho disse. — Tão lindinho assim, me defendendo.
— O quê?! — Perguntei aborrecido. — Eu lá tenho cara de passivo?
— Ui, então seria o ativo? — Toninho sorriu malicioso. — Adoro homens controladores.
— Só não te mando tomar no cu porque sei que você gosta. — Jaebum debochou.
— Gosto não, meu amor — Toninho rebateu afetado. — Eu adoro.
— Francamente, eu não mereço ficar ouvindo vocês dois. — Me levantei, ou tentei, porque Jaebum me puxou para se sentar ao seu lado novamente.
— Seguinte, vamos passar a noite em um hotel e amanhã ligamos para alguém vir buscar a gente. — Jaebum explicou,
— Não, eu já dei um jeito nisso — falei. — Minha avó mora aqui perto e liguei para ela avisando que a gente ia para lá.
— Então a gente vai para a casa da vovó? — Toninho sorriu maliciosa. — Eu vou ser a chapeuzinho e o Jaebum o lobo mau? Já tenho até a fantasia, o lobo vai comer quem?
— Você é um idiota mesmo. — Revirei os olhos.
— É um idiota que vai passar a noite na cadeia — Jaebum disse. — Vamos logo sair desse lugar, porque Jackson já ‘tá quase pegando a arma daquele policial que está dormindo ali.
— Você não vai me deixar nesse chilindró, né? Jaebum, minha roupa nem combina com esse lugar e eu não paguei duzentos reais numa escova marroquina para ficar batendo cabelo nessa cafofo. — Toninho se levantou exaltado.
Tem razão, a roupa dele não combinava com o lugar.
— E o Toninho? — Perguntei ao ser puxado pelo braço. — Não podemos deixar ele aqui. A roupa dele não combina. — Debochei.
— Não acredito que você está pensando em levar esse cara junto. — Jaebum me olhou indignado.
— Não, ‘tô pensando em levar o papa com a gente. — Revirei os olhos. — Ele vai, e pronto.
— Não vou aceitar uma merda dessas.
— A merda começou com você que não pesquisou sobre o cara antes de alugar a van dele. — Acusei.
— Ah, então agora a culpa é minha?
— Não, a culpa é minha. — Falei com escárnio. — Toninho vai, e fim de papo.
Eu não era homem de aturar draminha, ainda mais draminha de macho.
Eu fui criado com a minha vó. Recuso perguntas do tipo: “e a sua mãe?”, porque eu nem sabia o nome dela direito e isso nunca me afetou. Na realidade, o que me afetou foi ter sido criado com a minha vó.
A velha era toda simpática, religiosa, de boa com a vida até que meu querido avô morreu e ela se rebelou contra o mundo, simpatizando-se com a causa gay. Basicamente, a vida da minha avó era participar dessas paradas gays muito loucas que geralmente a gente via na TV.
— Não sabia que tinha finalmente aceitado seu lado boiola. — Essa é minha vó falando, senhoras e senhores.
— Oi vó, eu tô bem e a senhora? Poxa, também ‘tô morrendo de saudades. — Ironizei assim que parei à sua frente.
— Esse é seu namorado? — Ela perguntou apontando para Jaebum. — E esse aqui é seu amante? Querido, você ‘tá evoluído, hein.
— Eu não sou gay, vó. — Bufei.
— Você já deu a bunda para saber? — Ela perguntou e eu engasguei, tossindo até meu pulmão sair pela boca.
— É o que eu sempre digo, vó. — Toninho interveio na conversa. — Se quiser tirar suas dúvidas, saiba que estou aqui, gatinho. — Ele piscou para mim.
— Cara, você fica cada vez mais escroto sempre que abre a boca. — Jaebum reclamou jogando as malas no chão.
— Esse deve ser o namorado. Prazer, eu sou a vó. — Ela se apresentou para Jaebum.
— Eu sempre soube que Youngjae tinha um quê a mais para o lado rosa.
— Sou Jaebum. — Jaebum, o traíra, sorriu para a minha vó. — E esses são meus filhos, Jackson, Bambam, Yugyeom, e Mark. — Disse apontando para cada um dos pirralhos. — E o último ali é o namoradinho do meu filho. — Apontou para Junior.
— Meu Deus, aqui tem mais viado do que parada gay, ‘tô adorando!
— Viados eles, eu sou bem hétero. — Me defendi.
— Você beijou meu pai esses dias. — Mark me acusou.
— Vocês se beijaram? — Toninho perguntou colocando a mão sobre o peito, em uma pose ofendida. — Meu amor, hétero gosta de piriquitinha, não de ficar beijando boca de macho.
— Aceita a bicha louca que tem dentro de você. — Ele disse malicioso. — E eu achei que essa sua boquinha tava guardada para mim.
— A única coisa que ‘tá guardada para você é minha mão na sua cara. — Jaebum disse.
— Dá para todo mundo parar de agir como se eu fosse viado? — Pedi já impaciente e querendo sair do assunto sobre o fato de que “beijei os lábios de Im Jaebum”.
Peguei minhas malas e Yugyeom no colo, indo em direção a um dos quartos. Nem ferrando que eu ia deixar as minhas malas, minha cria e minha pessoa no meio daqueles loucos.
— Você beijou meu papai? — Yugyeom perguntou inocente.
— N-não foi bem assim.
— Então agora você é oficialmente minha mamãe? — Ele perguntou todo esperançoso.
— Não…
— Ele é! — Ouvi Jaebum dizer atrás de mim.
Teu cu que eu sou. Não, espera aí. Não sou cu de ninguém, eu só quis dizer que... Ah, você entendeu.
— Eu sou? — Perguntei confuso, mas na verdade eu estava querendo gritar que não, eu não era.
— Você é. — Ele confirmou me olhando.
— Quem disse?
— Eu disse. — Ele sorriu torto. Queria matar Im Jaebum por estar sorrindo tanto ultimamente. — E sua vó ‘tá te chamando lá na sala.
Im Jaebum saiu do meu lado para deixar as malas dele e das crianças perto da minha e se aproximou novamente para pegar Yugyeom do meu colo, segurando minha nuca e depositando um maldito beijo na minha boca.
Quem ele pensava que era para me beijar assim, do nada? E quem meu coração pensava que era para achar que estava pulando carnaval em plena Sapucaí?
Quando eu desci até a sala, eu me encarreguei de olhar para os meus pés e não abrir a boca, porque, cara, eu sabia que se eu abrisse minha boca para falar alguma coisa, iria parecer aqueles CD’s riscados; obviamente ia gaguejar mais que gago falando um trava-línguas. Eu novamente estava parecendo uma mocinha.
— O que aconteceu com você, Youngjae? — Minha avó perguntou. — Está parecendo aquela vez que você deu seu primeiro beijinho e voltou todo tímido para casa. — Opa, valeu por melhorar ainda mais as coisas, vó.
— Papai e Youngjae estavam se beijando — Yugyeom dedurou. Poxa, Yugyeom, eu te crio com tanto amor e carinho para você me trair assim?
— Não estávamos, não. — Defendi e valeu Deus, por não me fazer gaguejar, fico te devendo uma.
— Sabia que vocês eram namoradinhos. — Minha avó comemorou.
— Poxa, achei que ia ter aquela famosa chance. — Toninho disse murcho. — Mas não tem problema, eu aceito um ménage.
— O que é ménage, papai? — Bambam perguntou curioso.
— Uma coisa que você não precisa saber. — Jaebum disse, pondo as mãos sobre os ouvidos do filho.
— Não acha que já ouvimos muita merda para um dia só? — Perguntei. — Eu ‘tô bem a fim de dormir.
— Eu também estou bem a fim de dormir com você. — Toninho sorriu para mim.
— Menino, respeito! Youngjae vai dormir com o namorado dele. — Minha avó retrucou.
— Já disse que ele não é meu namorado. — Falei por sei lá qual centésima vez. —
Porra, Jaebum, você nem para ajudar. — Reclamei para o mais velho, que apenas riu da minha situação.
— Que seja. Namorado, amante, amigo, é tudo a mesma coisa, no final é você quem beija ele, não eu. — Minha avó disse sem paciência. — Já disse que ele dorme com você e não tente argumentar comigo, porque você sabe que é inútil.
— E as crianças? — Perguntei, já desistindo do lance de “Jaebum dorme com Youngjae”, porque mais tarde eu daria um jeito naquilo.
— Os mais novos dormem no mesmo quarto que vocês, Mark e Junior dormem na sala, o viadinho purpurinado ali, — apontou para Toninho, que mordia a ponta dos dedos de pernas cruzadas. — dorme no quarto de hóspedes junto com a loira que ‘tá no telefone até agora. — Por um minuto havia me esquecido da Patrícia. Estava até ficando feliz.
— Ótimo, agora eu ‘tô indo dormir. — Me pronunciei e chamei as crianças para subirem comigo.
O quarto era grande, mas não tinha nenhuma cama, parecendo completamente minúsculo e bagunçado com todos aqueles colchões no chão. Eu mal conseguia trocar as crianças, porque elas achavam divertido demais ficar pulando sobre os colchões e bagunçando as camas improvisadas que eu tentava arrumar.
— Você poderia tentar me ajudar. — Reclamei para Jaebum, que brincava com Bambam no colo.
— E perder toda diversão que é te ver todo nervosinho? Jamais.
— Desde quando você ficou tão engraçadinho assim?
— Desde que você entrou na minha vida. — Ele disse rindo, mas parou quando viu meu olhar de “cala a boca e vem me ajudar agora”.
Terminamos de arrumar as camas e depois começou a tarefa difícil que era fazer Jackson e Bambam pararem de falar e pular sobre os colchões já arrumados. Após sete séculos, as crias calaram a boca, deixando apenas Yugyeom, que dormiu tão rápido que Deus até se espanta.
Mas sabe aquele lance de eu ter feito faculdade de filosofia e ser péssimo em exatas? Então, eu não calculei que três crianças dormindo, menos dois adultos acordados resultaria em um Youngjae constrangido e nervoso.
— Por que ‘tá me olhando assim? — Perguntei, já incomodado com o olhar de Jaebum sobre mim.
— Você ‘tá parecendo um filhotinho medroso. — Jaebum riu enquanto ia se deitar.
E puta merda! Eu era um ser humano muito burro. Não, cara, eu era a coisa mais burra existente em todo universo. Quando coloquei as crianças para dormir, não pensei em deixar um espaço no meio delas para eu me alojar ali, levar sete chutes no estômago e dormir junto com eles. Tudo bem que Jackson chutava enquanto dormia, ou que Bambam às vezes roncava, ou que Yugyeom ia grudar em mim mais que chiclete no asfalto quente, eu aceitava isso de boa, só não aceitava o fato de que o único lugar vago era do lado de Im Jaebum.
— Não vai vir deitar? — O filho da puta com certeza devia estar rindo internamente da minha cara.
— Não com você aí do lado. — Disse convicto.
— Ótimo, então dorme em pé. — Ele riu e ocupou todo o espaço restante que era para eu deitar.
Realmente estava levando muito em consideração dormir em pé, mas qual é. Eu sou o pior tipo de sedentário que existe. Em dois segundos eu já não aguentava mais minhas pernas.
— Se chegar perto de mim, ou tentar alguma coisa, eu juro que te castro. — Bufei e fui em direção ao colchão.
Jaebum soltou um risinho baixo e deu espaço para eu me deitar. Já estava um calor dos infernos, mas assim que eu deitei naquele colchão, parecia que eu estava fazendo um tour pela mansão do carinha lá de baixo.
— Não tentar nenhuma gracinha? — Jaebum perguntou. — Não sei se você se lembra, mas foi você quem me beijou naquele dia. — Quis tacar uma bigorna na cabeça dele.
— Poxa, eu não me lembro. — Falei, encarando o teto. — Minha avó costumava dizer que nós só lembramos das coisas que foram significativas e boas para nós.
— Vou acabar achando que você quer que eu te lembre como foi, Youngjae. — Ele disse, e eu o senti chegar mais próximo de mim.
— Você não é nem louco. — Meu corpo parecia estar congelado no lugar.
— E se eu fosse? — Jaebum perguntou pertinho do meu ouvido.
Okay, eu não era gay, porém ouvido é sacanagem demais. Não existe hétero quando se tem alguém sussurrando no seu ouvido. Ainda mais quando esse alguém tem uma voz fodidamente sexy.
Eu me virei para mandá-lo calar a boca, mas como eu disse, eu sou péssimo calculando as coisas, ainda mais espaços, o que ocasionou nos lábios de Jaebum muito próximos aos meus.
— V-você tem que parar com isso. — Eu falei, mas nem eu mesmo entendia o que eu queria dizer.
— Parar com o que? — Conforme seus lábios iam se mexendo, eles encostavam minimamente nos meus.
— Com isso. — Continuei falando coisa com coisa.
Talvez eu tenha que admitir que tinha uma pitadinha de viadagem, e essa pitadinha virava uma bicha louca toda vez que Jaebum estava perto demais. Ele parecia tão entorpecido quanto eu e não demorou muito para seus olhos descerem até meus lábios. Eu pude sentir cada pelinho do meu corpo levantar, cada poro se abrir, meus lábios secarem e meu cérebro gritar: “puta merda, eu preciso beijar ele”.
— E vou te beijar agora. — Jaebum disse, e eu? Concordei.
Sua boca veio ávida e rápida até a minha, sugando meu lábio inferior com força. O barulho da sucção me fez tremer. Seus braços rodearam minha cintura de um modo desajeitado e desconfortável por estarmos deitados, mas me puxaram em sua direção, fazendo meu corpo ficar apertado contra o seu. Sua língua vagou pelo vão entre meus lábios e adentrou a minha boca, e foi nesse momento que eu percebi que era loucura demais. Eu já havia o beijado, mas não por puro deleite e prazer; eu o havia beijado para dar uma lição nele.
As mãos grandes de Jaebum apertaram a curva da minha cintura e minhas cordas vocais foram contra mim quando gemi baixinho e comecei a corresponder o seu beijo.
Era completamente diferente do primeiro. Era desesperado, intenso e quente, muito quente. Levei minhas mãos aos cabelos de Jaebum e os apertei entre meus dedos, recebendo um murmúrio de aprovação. Nossos corpos se friccionavam um contra o outro, fazendo aquilo se tornar ainda mais forte. Jaebum me beijava como se estivesse esperando isso há dias e, bem, eu? Talvez eu estivesse correspondendo na mesma intensidade.
— As crianças... — Resmunguei, me afastando quando percebi que tinha coisas que estavam prestes a acordar, e eu não me referia as crianças.
— Estão dormindo. — Voltou a me beijar, mas eu o afastei, rindo baixo do seu desespero. Ele me olhava em desaprovação.
— Eu ‘tô falando sério, Jaebum. — Afastei meu rosto do seu, mas continuei com meu corpo entrelaçado ao dele.
— Já te falaram que você é muito chato? — Jaebum perguntou, tentando aproximar seu rosto novamente do seu.
— Devo estar aprendendo com você. — Falei e ele roubou um último selar de lábios. — Vá dormir. — Pedi, porque eu não sabia mais como agir, não sabia mais o que falar, nem se devia olhá-lo.
— Uhum. — Murmurou, ainda me encarando.
Ficamos assim por vários minutos. Jaebum deitado de frente para mim, apenas escutando as respirações pesadas das crianças. Eu queria agradecer muito a Deus, Jesus, Buda, São Sebastião, ou sei lá quem mais pela luz estar apagada e Jaebum não poder ver o quanto eu estava vermelho.
Ele riu baixo, percebendo meu desconforto e trouxe sua mão até meus cabelos, aproximando seu corpo da minha cabeça até que estivesse perto o suficiente para começar a afagar meus fios. Eu murmurei em aprovação e pude sentir Jaebum sorrir com o queixo apoiado na minha cabeça; o fato era que ela ia explodir a qualquer segundo. Há um mês atrás, eu achava peitos a coisa mais incrível do mundo, mas naquele momento, Im Jaebum parecia ser a coisa mais incrível do mundo
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